* Publicado nesta data em coleiva.net
Parece que viraram febre,
durante a pandemia, os episódios envolvendo
autoridades ou nem isso, que desacatam e humilham os agentes
responsáveis pelo cumprimento das legislações municipais de resguardo. O
carteiraço vem acompanhado da senha “vocês sabem com quem estão falando?”. É de provocar vergonha alheia em quem assiste
aos casos ao vivo ou em gravações.
Hoje ninguém escapa das
câmeras dos celulares, bem diferente de alguns casos do passado, que presenciei, participei, ou tomei
conhecimento e que não tiveram maior
repercussão. Por isso, prefiro tratar desses episódios com alguma dose do humor
como o que envolveu cada situação. Já
contei no Facebook o que
aconteceu com o diretor do jornal, na velha Caldas Junior, que ao telefonar
para a redação foi atendido do outro lado de forma um tanto grosseira.
- Por
acaso, sabe com quem está falando? vociferou o diretor.
- Não, e
o senhor sabe com quem está falando? respondeu o da redação.
- Não!
- Ainda
bem,
E bateu o
telefone e imediatamente se mandou da sala.
Recebi
várias histórias parecidas, que teriam ocorrido em todas as redações da cidade. O jornalista Plínio
Nunes, meu revisor favorito, me relatou, por exemplo, uma variação da mesma situação, também tendo
a Caldas Junior como cenário. O
principal envolvido é um fotógrafo das antigas, o Edegar Planella, cidadão
rodado e muito chegado a uma falseta com
os colegas. Pois bem, o brincalhão
deixou um recado para o laboratorista do
Departamento de Fotografia: Se a Ruth me ligar, pode xingar à vontade e dizer
para não me procurar mais.( Ruth seria a namorada do momento, prestes a
perder o posto).
Eis que
toca o telefone no laboratório e, do outro lado da linha, a voz feminina pergunta
pelo Planella, com quem tinha combinado um contato naquele horário.
- Ruth,
né, ele mandou te dizer que....-, e despejou tudo o que tinha direito.
- Mas o
que é isso, moço! Sabe com quem está
falando? atalhou a atônita mulher.
- Não, - respondeu
o laboratorista.
- É a
Ruth, irmã do Breno Caldas, - esclareceu
a senhorinha, que tinha compulsão por viagens e provavelmente estava à procura
de fotos encomendadas ao outro profissional.
- E a
senhora por acaso sabe quem sou eu?
- Não,
meu filho, não sei.
- Ainda
bem. Sorte a minha.
E
desligou o telefone, maldizendo o colega bandalho.
E tem
aquela do carteiraço às avessas, lembrada pelo querido amigo Piero D’Alascio e
ocorrida em idos tempos no bairro Petrópolis. O Xaxá, um dos bêbados
folclóricos e itinerantes do bairro, já
altamente turbinado, vinha passando em frente à 8ª Delegacia de Policia, a famosa e temida Oitava, justo
no momento em que saía uma viatura policial com dois agentes. Quando o que dirigia
freou para entrar na avenida Protásio Alves, o nossos Xaxá enfiou a cabeça para
dentro do veículo e disparou:
- Quem
foi que autorizou vocês a saírem com esta viatura?
Consta
que ele pegou pena até leve, um tanto pelo
desacato e outro tanto pelo bafo
de trago sobre os policiais: ficou detido de três a quatro dias, sendo obrigado
a lavar os carros da delegacia. “Pior
foi ficar sem o trago”, teria se queixado depois.
O mesmo
Xaxá compareceu, também com o tanque cheio, ao velório do amigo Saul e deu um
ultimato, aos berros, à beira do caixão:
- Levanta
daí, Saul. Tu é homem ou aranha?
Imaginem
a cena. Só não foi expulso porque naquela época os velórios eram em casa e
fazia parte do ritual de despedida a presença de um ou mais bebuns representativos e amigos do pranteado.
Mas já
estou me desviando do foco desta coluna,
pressionado pelas lembranças folclóricas do bairro onde nasci e me criei. Só as
aprontadas do Xaxá dariam um livro.
O que eu queria era contar um episódio de carteiraço do
qual fui personagem, também no bairro Petrópolis. Recorro ao baú da memória,
lembrando que lá pela década 60 do século passado o Serviço de Recreação Pública
da Prefeitura promovia em Porto Alegre campeonatos
para a gurizada dos bairros. Numa rodada, o glorioso Tupy (com y para ficar
charmoso), enfrentou no campo do Ararigbóia o Rolinho, que era o time B de
infantis do Inter, treinado pelo saudoso e grande descobridor de talentos,
Jofre Funchal. Apesar disso e da
superioridade técnica do adversário, vencemos por 2 x 1 e, se não me engano,
foi de virada. O treinador Luciano D’ Alascio (irmão mais velho do Piero) foi
carregado em triunfo, junto com o Cizinho, autor do gol da vitória, pela nossa
numerosa e barulhenta torcida.
Já sem idade para disputar a categoria, aos 16
ou 17 anos, eu era o presidente do Tupy e naquela memorável tarde de sábado,
após o jogo tomei o maior porre da minha vida, uma mistura de cachaça, conhaque
e vermute no boteco em frente à Igreja São Sebastião, na Protásio Alves. Não
satisfeito, desafiei dois brigadianos que faziam a ronda por perto, chamando-os
de “Pé de Porco” (alusão aos PP nos capacetes, de Pedro e Paulo, como eram
conhecidas as duplas). Na época, era o pior dos desacatos - e olha que sou
filho de brigadiano. Só fui salvo da detenção graças à intervenção do Luciano,
que segurou os PMs, prontos para a enérgica
intervenção, com aquela frase:
- Vocês sabem
com quem estão falando?
Diante do
questionamento, os brigadianos estacaram e o Luciano emendou enfático:
- Com o
presidente do Grêmio Esportivo Tupy.
A intervenção
foi suficiente para permitir que eu fugasse para casa onde vomitei até os doces
da minha primeira comunhão.
Às vezes o “carteiraço”
funciona.
Pena que já não
se façam mais daqueles de antigamente. Agora somos obrigados a assistir
aos “angelnheiros” e ”deusembargadores”
tupiniquins, arrogantes, prepotentes, autoritários, cada um com sua estupidez, hostilizarem
quem tem a justa missão de protegê-los. Ainda bem que a Internet está aí para desmascará-los, pois chegou a
hora desse pessoal saber a quem estão destratando.
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