terça-feira, 17 de dezembro de 2019

Dezembradas


*Pubicada em 16/12/19 em coletiva.net

- Almoço da Confraria 1
-  Balanço de fim de ano, com almoço, de entidade empresarial
- Lista dos melhores do futebol pedida por aquela rádio
- Happy hour da Confraria 2
- Escolha de  presentes para os amigos  secretos
- Amigo secreto na Confraria 3
- Pagamento do 13º da firma
- Jantar de fim  de ano da Confraria 4
- Prestação de contas da firma
- Prestação de contas, com jantar, de deputado amigo
- Sessão de autógrafos de livro do amigo.
- Festa 1 de aniversário na família
- Festa 2 de aniversário na família
- Almoço  e balanço de  fim de ano de entidade empresarial 2
- Presença na apresentação dos netos na escola
- Prestigiar empreendimento de amiga.
- Homenagem do clube, com jantar, aos  desportistas
- Escrever colunas
- Festa familiar com churrascada
- Festa de fim de ano da firma com amigo secreto
- Participação em programa esportivo
- Premiação da entidade que assessora
- Finalizar  aquele texto do livro encomendado.
- Pagamento do IPVA
- Pagamento do IPTU
- Renovação do seguro do Carro
-  Revisão dos 20 mil km
- Eleição na  entidade de classe
- Viagem Curta.
- Natal em família
- Virada do ano
Ufa!. Sobreviverei, mas com alguns quilos e litros a mais e bem menos  grana na conta. Vem logo 2020.


segunda-feira, 9 de dezembro de 2019

Forest Gump Tupiniquim


*Inspirada em fatos  reais

Vocês devem ter, como eu, aquele companheiro que participou, por relatos pormenorizados, de eventos épicos e momentos históricos. Verdadeiros Forest Gump tupiniquins. Chamarei meu representante de Augusto , porque deriva da palavra “augure”, que significa “aumentar” e tem tudo a ver com suas histórias.

Na verdade, ele nem sempre era o protagonista dos acontecimentos narrados, mas um conselheiro graduado ou observador privilegiado. Nessas condições era chamado para opinar sobre questões relevantes em ocasiões cruciais.  Transitava tanto pela política, como pelas decisões  esportivas  do seu clube do coração, além de eventos promocionais da comunicação, área onde recebeu as maiores honrarias, ainda segundo o próprio.

Nos relatos, sempre interrompendo conversas de terceiros e chamando a atenção para si, reproduzia diálogos algo formais, como convém:

- Caro Augusto, necessito da sua abalizada avaliação/opinião/consideração/sugestão sobre este tema transcendental. O que disseres pode ser decisivo para o nosso futuro.

- Meu líder, agradeço pela confiança. Veja bem, penso que...

Devidamente enaltecido, a partir de então se pavoneava para os circunstantes, emendando um caso atrás do outro de contribuições decisivas nas convocações para as quais fora chamado a se manifestar. Aliás, era sempre o superior hierárquico quem pedia socorro. O nosso modesto Augusto só intervinha a pedido.

Não conheci pessoalmente, mas quem conviveu com o gaúcho João Saldanha, jornalista e técnico de futebol, inclusive da seleção brasileira, conta que ele também era dado, nas conversas de mesa de bar, a incursionar como participante ativo de acontecimentos históricos. O mais importante e menos verossímil seria que fez parte da grande marcha dos comunistas, nos anos 30 do século passado, movimento que consolidou Mao Tse-Tung como líder da Revolução Chinesa. O fato de Saldanha ser militante comunista dava ares de veracidade ao relato. Outra façanha dele, contada sem constrangimento e sem comprovação, é de que se perfilara nas forças do general Montgomery no desembarque aliado na Normandia, o chamado Dia D, em 1944.

A verdade é que gente como o Saldanha que, é justo reconhecer, teve uma vida pra lá de movimentada, e o meu Augusto, menos épico em sua trajetória, são tipos inofensivos. No  máximo chateiam seus interlocutores por reproduzirem sempre as mesmas histórias.

Para a psicologia talvez se enquadrem como mitômanos, por possuírem tendência compulsiva para a mentira, grandes ou pequenas, dramáticas ou pitorescas, mas bem elaboradas para induzirem as pessoas a acreditar nelas. Fico em dúvida quanto a classificação porque o mitômano usa a mentira para enganar as pessoas e tirar vantagens, nunca admite a falsidade dos fatos embora tenha plena consciência de que não passam de histórias imaginárias. (Nada como ter psicólogas na família!). Na real, acredito que eles, o Augusto e seus iguais, acreditam. Acreditam que aquilo aconteceu e que eles tiveram participação relevante, numa espécie de memória construída. No caso de Saldanha, porém, era mais a revelação de seu lado brincalhão e debochado.

Agora fico a pensar o que dirão as pessoas daqui a alguns anos se aparecer alguém garantindo que conheceu um alto dirigente de uma instituição pública que acusava os Beatles de estarem a serviço do comunismo; ou aquele  outro que declarou que a escravidão foi benéfica para os  descendentes dos escravos; ou conviveu com gente que defendia que a Terra é plana; ou que privou com uma ministra da República que teve uma revelação extraordinária: viu Jesus num pé de goiaba. Isso sem falar nas histórias fantásticas que resistiram ao tempo, envolvendo um ex-presidente, sua sucessora e aquele que foi eleito depois.

Bah, assim as contações do Saldanha e do Augusto seriam meras bizarrices.



segunda-feira, 2 de dezembro de 2019

Cheiro de livro novo


* Publicado  nesta data em coletiva.net

Com os livros que produzi voltei a reviver a sensação que experimentava quando criança e recebia livros e cadernos novos, no início do ano escolar. Hoje, ao abrir o pacote com os exemplares recém chegados da gráfica, acariciar e folear o livro, sou transportado à infância do menino que compartilhava seu cotidiano – e o  material escolar - com mais sete irmãos.  Aqueles livros didáticos, especialmente, pareciam ter um cheiro só deles, um cheiro que não consigo descrever mas está entranhado lá dentro, em uma gaveta do cérebro reservada às grandes emoções.

Tanto os livros escolares como os cadernos eram encapados para mais bem conservá-los. Para isso, dona Thélia, minha mãe, usava papeis de presente, guardados zelosamente dos  aniversários e natais. Os livros, ai de quem riscasse neles porque seriam herdados, tantas vezes quantas fossem necessárias, pelo irmão que viria a seguir na série escolar. Os cadernos careciam de cuidados  redobrados porque os professores exigiam que  não tivessem  orelhas - aquelas dobras nas pontas - e nem manchas de qualquer natureza. Isso era levado em conta pelos mestres na hora da nota. Mesmo que os livros fossem legados, ano a ano, sempre havia um ou dois adquiridos virgens e estes eram motivo da desmedida satisfação do jovem estudante. Tinham cheiro de livro novo!

Me gratifica saber que não estou sozinho nessa nostalgia. Em evento recente promovido pela Associação Riograndense de Imprensa/ARI o médico e escritor JJ Camargo revelou que seu avô lá na Vacaria providenciava grandes lotes  dos lançamentos  da Editora Globo e assim que os livros chegavam eram cheirados  um a um.  “Quem não valoriza o cheiro  de livro novo, bom sujeito não é”,  afirmava o velho e letrado senhor, conforme relato rememorativo do neto. Voto com o avô, mas sem radicalismo quanto ao  caráter dos insensíveis olfativos.

Cheirinho de livro novo, esse é um prazer que se multiplica quando o livro é  de própria autoria. Por isso, sinto uma imensa pena dos  autores que tem suas obras imersas  nos e-books. E-books não tem cheiro.  E não me venham com  ciência, da mistura do papel e tinta, para explicar o que é memória afetiva e não resultado químico.

Acho mesmo que escrevo só para depois voltar a sentir o cheiro de livro novo dos livros da minha infância. Perdão pelo clichê: isso não tem preço.

segunda-feira, 25 de novembro de 2019

O tempora! O cynismus!


* Publicado nesta data em coletiva.net.

Estamos vivendo a era de fortes confrontos de ideias e polarização extremada de posições, mas ainda existe espaço para o bom e honesto cinismo. Bom e Honesto, aqui, com sentido de generosidade, um cinismo pra não magoar.

Há pelo menos duas situações clássicas em que o cinismo se manifesta em seus melhores momentos.

- Não  leve a mal, porque é uma critica construtiva.

- Respeito muito tua posição, mas...

No primeiro caso, a advertência é seguida de uma crítica demolidora, que joga pra baixo o alvo da manifestação, só que atenuada pela tal crítica construtiva e o criticado nem se anima a reclamar. Não adianta, gente, critica é crítica e sua versão construtiva é uma balela.

A posição respeitada, no segundo caso, sobrevive apenas à primeira frase do contraditório, sendo desconstruída – ou destruída - na sequência. Respeito, uma ova!

E tem aquela muito usada para romper relacionamentos, sem provocar grandes ressentimentos: “O problema não é contigo, é comigo”. Pura falsidade!

No andar de cima o cinismo campeia e atinge o estado da arte. No STF, cada voto por  “ “amor à Constituição”, como diria aquele primo do Collor, na verdade, parece esconder a defesa de interesses pra lá  de questionáveis. No parlamento, aqueles “Vossa Excelência” quando dirigidos à adversários políticos são o que há de enganadores.  Mais do que tratamento cerimonial exigido pelo protocolo, representam embuste  em grau máximo.  Não é o que ocupante da tribuna pensa daquele “salafrário, que eu conheço bem”, que agora está a contestá-lo.  O protocolo é o cinismo institucionalizado.

Esse pessoal até poderia dar aula ao presidente Bolsonaro, que não tem o mínimo de refinamento na aplicação do cinismo, tanto no trato com adversários como com os companheiros. Bolsonaro surpreende - aliás, nem surpreende mais – por ser direto e transparente. Não tomem isso como elogio, apenas é o reconhecimento de uma situação de fato.

Em se  tratando de cinismo, o correto seria olhar para a Grécia  antiga, onde os cínicos eram conhecidos  por desprezarem as convenções sociais. Pessoas de vida errante, maltrapilhas,  empenhavam-se em discursar  contra os  valores morais da sociedade da época. Era uma corrente filosófica que tinha em Diógenes (século IV, a.C), apelidado de O Cínico, seu representante  mais expressivo.  Diógenes procurava a virtude de uma vida simples e natural,  dessa simplicidade e espontaneidade  de que são feitas as pessoas  do bem,  diferente da análise  do filósofo alemão Peter Slotedijk. Em “Crítica à razão cínica”, de 1983, ele descreve o cinismo da sociedade contemporânea  como reflexo de um individualismo extremo que o cenário mundial delineou para todos. Vale lembrar que Slotedijk esteve  em Porto  Alegre, em 2016, no Fronteiras do Pensamento.

A análise dele se aplica integralmente ao Brasil atual, um país  dividido em todos os níveis, pleno de intolerâncias, carente de lideranças confiáveis, terra do vale-tudo, de tênues barreiras entre o certo e o errado e onde o cinismo nas relações parece ser o sentimento unificador.

Pensando bem, de forma pragmática, talvez seja melhor assim. Nestes tempos conturbados em que vivemos já estou achando, em favor de um pouco de leveza no quotidiano, que uma boa dose de cinismo é necessária para o país e mal não faz.  Assim, sai de cena o brasileiro cordial de Sérgio Buarque de Holanda e entra o brasileiro cínico da era bolsonarista e pós-PT.  Vai ver são da mesma matriz.


segunda-feira, 18 de novembro de 2019

Vozes do Além


*  Publicado nesta data em coletiva.net

- Se você disse alguma coisa não entendi muito bem,

Essa voz do além, em forma de advertência, me persegue e constrange nos momentos mais inoportunos: numa palestra importante, numa reunião decisiva, no transporte coletivo lotado. É uma voz feminina que surge do nada, porque não lembro de ter acionado algum comando do celular que justifique a vinda dela lá da nuvem onde estava homiziada. Ato contínuo tento neutralizar o som, mas como não sou manso na operação do celular, isso se revela inútil.  Além de invasiva, ela parece ter dificuldades de audição  e eu é que passo a receber olhares de reprovação dos circunstantes. Não faltam risinhos debochados. Bota vergonha nisso.

Já passei por situações mais  constrangedoras ainda por causa de certos áudios. Em evento para jornalistas, estava a me exibir para uma moça do interior quando recebo uma  mensagem pelo Whatsapp e decido verificar do que se tratava. Era o auge de uma relação sexual, com gritos histéricos da parceira. Eu devia desconfiar que aquele bandalho só me mandava mensagens de natureza erótica ou piores.  Resultado: o exibimento acabou, ainda mais  que a moça, olhou a tela e  sentenciou:

- Bah, mas o que é isso? Que pouca vergonha!

Jogue a primeira pedra quem já não  passou por uma situação parecida, mas sejam  honestos. Jogue  a primeira pedra também quem nunca  replicou uma mensagem  repleta de sacanagens para o endereço errado, o grupo da família, o chefe carola ou para aquela amiga para a qual você faz olhinhos com pretensões maldosas para o futuro.  Menos mal que agora o Whatsapp implantou o dispositivo que permite deletar as mensagens, mas o bagaceira tem que ser  ágil.

Um assunto puxa outro e acabo perdendo o foco, talvez perturbado pela lembrança dessas situações vexaminosas. Na verdade, queria falar do empoderamento feminino pelas vozes das assistentes virtuais, tipo a que me atormenta em momentos indevidos. A Siri, da Apple, a Cortana, da Microsoft, a Alexa, da Amazon são algumas das mais  populares. O Bradesco tem a Bia, a Oi a Joice, a Vivo a Vivi, o Carrefour a Carina e por aí vai. Maravilhas da Inteligência Artificial.  E tem a voz anasalada do GPS, aquela que pede para a gente virar à direita, a esquerda a 100 metros...

Registre-se que  são nomes majoritariamente femininos, a exceção do Theo, da  Sicredi e criou-se uma dúvida, pelo menos para mim, em relação ao gênero do dispositivo Echo, da Amazon, que sugere um nome masculino, mas que tem na Alexa a assistente virtual para comandos de voz em português. Isso me leva a suspeitar que se trata de um dispositivo trans, o que faz sentido nestes tempos  de plena aceitação da diversidade.

E, de novo, estou a divagar, escapulindo do tema do empoderamento feminino pela voz das assistentes virtuais. A razão para a preferência das mulheres, segundo estudos acadêmicos nos EUA, seria porque as vozes femininas são mais acolhedoras e geram empatia. Outro argumento dá conta de que o cérebro é desenvolvido para gostar mais de vozes femininas. A predisposição se originaria desde cedo, já  que os bebês atendem mais a uma voz feminina, mais compreensiva,  do que a masculina, que teria um quê de autoritária.

Há controvérsia, porém. Os tiques vocais das mulheres, apontam outros estudos, são criticados com mais frequência do que os dos homens. Teria ainda uma motivação mais cultural: a escolha das vozes femininas seria um caso de machismo, uma vez que as assistentes virtuais são criadas para seguir ordens e, assim, a mensagem que fica é a de que as mulheres seriam subservientes aos homens. Como são homens que geralmente criam essas assistentes, com vozes e nomes femininos, isso refletiria como os homens enxergam as mulheres: elas não são totalmente humanas. “Seria, portanto, uma  extensão da objetificação feminina”. Bah! Coloquei entre aspas e me apresso a informar que a opinião é da inglesa Kathleen Richardson, especialista em Ética e Cultura da Robótica da De Montfort University Leicester (Reino Unido)

A academia tem tempo e  disposição para esses debates controversos, cujo resultado, ao fim e ao cabo, é nenhum. E como no caso da voz do além, confesso que não entendi muito bem os argumentos.

Ah, eu queria falar ainda da Iris Lettieri, dos aeroportos a voz mais bela, mas acho que já esgotei o espaço e a paciência de vocês.

segunda-feira, 11 de novembro de 2019

Damares também gosta daquilo


Somente o amor consegue fazer  convergir  representantes de posições tão conflitantes como as da esquerda e da direita na atualidade brasileira. Explico: depois do PTinder, criado por duas militantes do PT para ajudar pessoas de esquerda a encontrar parceiros (https://coletiva.net/colunas/a-esquerda-tambem-ama,321113.jhtml), agora a ministra Damares Alves, quem diria, revela que está usando o aplicativo Tinder para encontrar um marido.

Se fosse uma ferramenta nova, derivação do aplicativo de encontros como no PTinder, sugeriria, no caso da Damares,  batizar o aplicativo como Tindireita.  Mas aí já estaria me intrometendo indevidamente na vida amorosa da polêmica ministra.

Polêmica, surpreendente e sincera. Quando fez o anúncio, Damares contou que pretende chegar as últimas consequências, ou seja, casar com o pretendente que se adequar as exigências dela. Aqui é lícito imaginar que exigências seriam essas. O candidato certamente irá se submeter a um questionário mais ou menos nessa linha:

- Menino veste azul, menina veste rosa?

- Acredita que a figura de Jesus possa ter aparecido numa goiabeira?

- Contra ou a favor  da ideologia de gênero?

- Contra ou a favor da Escola sem Partido?

- Contra ou a favor  da legalização da maconha?

- Contra ou a favor da  teoria   evolucionista?

-  A Terra é redonda ou plana?

-  Elza, do filme Fronzen, é lésbica ou não?

Por fim, a evangélica ministra irá fazer um questionamento definitivo para  aprovação – ou não – do candidato:

- Concordaria em dar graças ao Senhor em oração antes do coito?

Se passar no teste, o futuro marido vai permitir que Damares realize seus melhores sonhos, como ela mesmo contou, bem faceira: “Eu vou é dançar muito, eu vou é cantar muito e vou namorar muito". Tudo isso certamente será o prelúdio para “aquilo”, que a Damares parece gostar de verdade. Tanto quanto o pessoal do PTinder, que, porém, não foi utilizado por Lula e Janja para se emparceirarem. No caso, foi amor à primeira condenação.


segunda-feira, 4 de novembro de 2019

Tempo de Feira do Livro e de chopes

* Publicado nesta data em coletiva.net


Já estamos vivendo em tempo de Feira do Livro, o maior acontecimento cultural de Porto Alegre, pelo menos na minha avaliação.  Mesmo com o encolhimento nas últimas edições, diminuindo o número de barracas e concentrando as atividades na Praça da Alfândega, a Feira não perdeu seu charme e seu valor. Na verdade, os espaços se abriram, facilitando a circulação e a interação das pessoas.

Já confessei  que gosto tanto da Feira que, se pudesse, circulava por lá   todos os dias, o que ocorria quando trabalhava no Centro Histórico. O programa completo consistia em esgravatar as caixas de sebos, olhar invejoso para as estantes cheias de livros, adquirir o que me interessava e, melhor ainda, tomar um chope ali perto no fim da tarde. Num fim de semana, pegar a Santa e a netalhada e pernear na Área Infantil, escolher livros  para a garotada e encerrar com um lanche para elas e mais um chope para o vô, talvez dois,  porque caminhar com essa turma é para os fortes. Ah, e tem o dia do autógrafo daqueles livros que a Maria Clara, a neta mais velha,  define como “um monte de histórias bobas que os amigos contam pro vô”. Mesmo assim o ritual dos garranchos se repete há cinco anos, sempre num final de tarde para permitir uma esticada comemorativa e bebemorativa depois ( até parece que a Feira é apenas a desculpa para isso).

Nesta edição, minha relação com a Feira começou no sábado, no evento ARI Entrevista, com o médico JJ Camargo, cronista, escritor e referência internacional em cirurgia torácica. Foram momentos divertidos, prazerosos e repletos de lições de humanidade. O homem é fera em tudo o que se envolve;  depois  da entrevista ele autografou o seu “Se você para você cai”. No domingo, nova incursão para prestigiar dois amigos, o Vitor Bertini, que estreia com “Não me abandones” e, na sequência, “Invenções e Invencionices”, mais uma invencionice do profícuo Dilan Camargo, ex-patrono da  nossa Feira, aliás o ultimo antes da atual dinastia de patronas.

Vou prestigiar também as autoras do “Dezmioladas 3,” que tem sessão de autógrafos dia 10, às 14h30 no Memorial do RS e, nesse dia dedicado às gurias, às 16h00 vou conferir “As Jornalistas”, de Benedito Saldanha, para saber quais das minhas talentosas amigas foram contempladas. No dia 12, às 17h30 vou buscar meu exemplar de “Anotações de Um Leitor Curioso”, devidamente autografado pelo Antônio Goulart. Mais do que o leitor curioso do título, o Goulart esbanja experiência e talento.

Antes, dia 9, participo – eu e mais 27 autores -  da sessão de autógrafos do “Todos por Um”, dedicado ao José Luiz Previdi, no segundo andar do Memorial do RS. Acho  que reservaram um andar inteiro porque é autor que  não acaba mais. E agora permitam-me vender meu peixe: dia 8, próxima sexta-feira, tem a sessão de autógrafos do “Quando Eu Fiz 69”, já  em segunda edição. Atenção para o horário: das 18h30 às 19h30. Depois estão liberados para o happy.

Por fim, gostaria de indicar algumas obras as quais já tive acesso e que merecem atenção daqueles que apreciam a boa literatura. Começo pelo Pedro Gonzaga, meu primo literário mais talentoso, que está me deliciando com seu “Antes não era tarde”, lançado semana passada e que teve autógrafos na Feira no domingo. Quem também está me deliciando com sua obra é o Gustavo Machado com “Cavalos e Armas”, ótimo romance numa edição caprichada lançada este ano. Recomendo também o Léo Ustarroz, engenheiro que enveredou pela literatura e já está no segundo livro, “Regaste em Pamplona”. O autor estará na Feira nesta segunda-feira às 17 h falando da sua obra na banca nº 3,  da editora Metamorfose.

Para completar meu pacote de leituras para os próximos meses fica faltando apenas o livro  do Gilberto Jasper, “O Tempo é o Senhor da Razão e Outras Crônicas”, que será lançado  dia 21, certamente numa concorrida sessão de autógrafos, marcada para o Chalé  da Praça 15. Depois de garantir a dedicatória do alemão Giba, vale pedir  um chope e petiscos, interagir com os amigos e ouvir as conversas da mesa ao lado, porque é para isso que também servem as sessões de autógrafos.

segunda-feira, 28 de outubro de 2019

O poder da palavra


*Publicado  nesta data em coletiva.net

Sou verdadeiramente fascinado pela pregação dos evangelizadores dessas igrejas pentecostais.  Fico boquiaberto com a capacidade deles de transmitirem suas mensagens em nome do Senhor.  São máquinas de falar, equipadas com o que há de mais eficaz em termos de convencimento.  Experimentem assistir aos cultos na TV: os caras conseguem dominar qualquer plateia e fazê-las até mesmo acreditar que  os supostos milagres ali apresentados são reais,  que o paralítico voltou a  andar, que o cego recuperou a visão, que a doença abandonou o corpo do sofredor.  A força da imagem,  todo o colorido dos cenários e a movimentação durante o culto se curvam quando o verbo se impõe.  

Há que se respeitar e temer esse processo, porque não interessa o que as pessoas estão vendo, mas o poder da palavra, a capacidade de persuasão. Nossos missionários  provavelmente aprenderam com os tele evangelistas dos Estados Unidos que são mestres na oratória e na expressão corporal, embora sejam mais sutis na arte de arrancar contribuições dos fiéis, diferente dos tele pastores tupiniquins, excessivamente agressivos na dita arte.

No Centro de Porto Alegre, eventualmente, cruzo com algum pregador a brandir, Bíblia na mão e sempre engravatados,  contra os pecados e os pecadores.  Nesse caso, o que me impressiona é o volume da voz, sempre grave e sonoramente impositiva, enquanto o olhar se dirige ao infinito, onde talvez esteja recolhido seu deus.  Pouca gente presta atenção ao matraquear  dessas pregações, porque falta a mística dos templos,  mas eles não esmorecem e no dia seguinte voltam para imprecar contra os males deste mundo pecaminoso.

Acredito, mesmo, que o crescimento da cruzada evangélica está diretamente vinculado à força da palavra que emana dos seus cultos. E assim se espraia uma onda de conservadorismo, ao mesmo tempo em que outros sinais de poder terreno se sobressaem, como a formação de uma verdadeira bancada evangélica nos parlamentos, o investimento em templos salomônicos e em veículos de comunicação ou  em horários nobres nas redes comerciais.  Aqui vale a observação do professor de sociologia da religião da PUC-SP, Edin Abumanssur: “Antes a gente era católico por herança, agora existe concorrência”. E que concorrência, acrescento eu.

A rigor, não estou sendo original no reconhecimento do poder do discurso evangélico.  Silvio Santos, dono do SBT e um dos mais festejados  animadores da TV, chegou a afirmar há alguns anos que gravava em fitas os cultos do líder da Igreja Universal, o bispo Edir Macedo, para ouvir no carro. “O Edir Macedo me chama a atenção pela forma como fala”, explicou o homem do Baú.  Vale recordar que o bispo Edir é o proprietário da Rede Record, concorrente do SBT.

Que fique claro que não estou fazendo juízo de valor sobre a ação das igrejas evangélicas pentecostais e neopentecostais, se tem doutrina ou não, mas apenas constatando uma verdade:  seus líderes são bons de goela.  Eu mesmo acabei  sendo envolvido por um deles. Foi assim: tempos atrás, depois de uma reunião em que tratamos assuntos profissionais,  sugeri que o pastor com o qual conversava que me incluísse  nas orações dele. Estava querendo ser cordial, mas foi a senha para que ele pegasse minha mão e começasse a reza, invocando os céus numa voz tonitruante:

-   Vamos pedir bênçãos ao senhor Deus agora mesmo! Senhor, protegei este teu filho, que precisa muito de tuas bênçãos, do teu amor.  Estendei, ó Senhor, tua proteção e tuas graças aos familiares deste teu filho,  a nossa cidade e a seu povo para que nada de mal lhes aconteça...

E emendou, sem uma pausa sequer, mais uma dezena de pedidos de bênçãos,  enquanto segurava firmemente meus braços como se quisesse transmitir uma corrente de fé ao ateu  que habita em mim. Apesar de tudo, portei-me civilizadamente e o generoso pastor saiu convencido de que eu fora tocado por suas rezas.  O que ele não sabe é que eu estava preocupadíssimo em que alguém entrasse na sala e visse aquela cena pra lá de estranha. Precisaria de uma oratória de pastor para poder explicar e convencer.

*Texto publicado no livro Quando Eu Fiz 69, que  terá  sessão de autógrafos  na Feira do Livro de Porto Alegre  dia  8/11, as 18h30.
                                                                                                                                   

segunda-feira, 21 de outubro de 2019

Penúltimo


*Publicado nesta data em coletiva.net

Reza a crendice popular que não se deve usar o termo último para qualquer tarefa a ser executada. Último é o fim da linha e depois só a morte. Igualmente não convém usar último com o sentido de o mais recente. Não sou dado à crendices, mas costumo me ater ao rigor gramatical para preferir o mais recente ao último. Na verdade, tenho optado  mais pelo penúltimo (a), talvez como forma inconsciente de adiar o último, ou seja, o ato final.

Penúltimo tem seus encantos. Penúltimo é o vice ao contrário e o vice, como ocorre com frequência na política, pode ascender à primeira posição. Penúltimo é  bem dotado de classes gramaticais: é adjetivo quando significa que ocorre ou aparece imediatamente antes do último e é substantivo masculino  quando indica algo ou alguém que ocupa essa posição. Penúltimo  tem origem nobre, vem do latim paenultimus.a.um. Penúltimo tem a sonoridade das proparoxítonas e pode se orgulhar de conter quatro das cinco vogais, o que não é  para qualquer palavra. 

Quatro são também as versões de penúltimo em inglês, três delas compostas - second to last, next to last, last but one e mais uma latinizada, penultimate.  Ou seja, penúltimo está podendo em inglês.

A palavra permite ainda algumas frases de efeito, sendo que uma delas marcou um período da história recente da política brasileira: “...no Brasil de hoje o corno é o penúltimo a saber  - o último é  sempre o presidente Lula”. O autor:  Roberto Jefferson, aquele que fez as primeiras – e penúltimas ? - denúncias sobre o Mensalão do PT.  Bem menos chula é a do neurologista, fisiologista e antropólogo italiano Paolo Mantegazza (1831-1910):  “Nenhum homem se julgou jamais o último; até os mais humildes querem ser penúltimos. “

Pra falar a verdade, não consegui alcançar o que quis dizer o autor da frase, que se notabilizou por ter isolado a cocaína da coca, utilizada em experimentos para investigar seus efeitos em humanos. Vai ver  tinha dado um pega antes de criar a frase em questão.

Por penúltimo, cabe esclarecer que o mote para esta crônica não tem qualquer relevância e surpreendo-me ao constatar que o assunto já  rendeu pelo menos cinco parágrafos. É que me desafiei  a produzir um texto tendo penúltimo como tema, como ocorreu, tem gente que jura que é  verdade,  com Chico Buarque de Holanda ao ser desafiado a incluir a palavra paralelepípedo numa de suas composições. A genialidade de Chico teria atendido na antológica Vai Passar,
Vai passar
Nessa avenida um samba
popular
Cada paralelepípedo
Da velha cidade
Essa noite vai
Se arrepiar
Ao lembrar
Que aqui passaram
sambas imortais.

Maravilha. Agora quero ver ele fazer uma música usando penúltimo (a). Já  aviso que estou preparando  uma crônica sobre  paralelepípedo. Te cuida, Chico.


segunda-feira, 14 de outubro de 2019

Guerreiro das gôndolas


* Publicado nesta data em coletiva.net

(Vagamente baseado em fatos reais)

- Alguém viu o Hailander?

Quem pergunta é a Cyntha Prescila.

- Parece que tá lá no depósito.

Quem responde é Ricarlison.

- Não mesmo, vi o Hailander lá pros lados do vestiário.

A interferência foi da Kimberly

- Bah, este cara vive sumindo.

A queixa é do Uillian.

(- Já tá merecendo um corretivo)

O resmungo, quase inaudível, é do Dionathan.

- Este guri não  tem mais jeito.

 O repique é da Qelly Maria

Vocês estão autorizados a pensar que o Hailander, o guri do supermercado, recebeu o apelido por causa do personagem dos filmes e séries Highlander, conhecido como o Guerreiro Imortal,  o escocês que, mesmo ferido mortalmente em combate, ressuscitava tempos depois. Nosso Highlander das gôndolas teria o dom de desaparecer durante o  expediente para reaparecer tempos depois, lépido e faceiro, pronto para novas batalhas de empacotamento nas caixas.

Nada disso,  no crachá do garoto mirradinho, de cara espinhenta e cabelo espigado que lembra o primeiro ministro inglês, está escrito Hailander José da Silva.

O pai era fã do herói, mas a mãe não abriu mão de juntar o nome  do pai, seu Zé, homem respeitável no pedaço, ao nome do guri, que não fez jus à fama do avô nem a coragem do Highlander, mas tão somente à capacidade de sumir e reaparecer. Para não dizerem que não tem nada mais a ver com o personagem, o garoto é meio vesguinho como Cristofer Lambert, o Highlander original. Aliás, por  pouco  não recebeu o nome de Kristobert em homenagem ao ator, mas a mãe achou  que aí já era um exagero.

Quem revela esses histórico sobre o  garoto é o gerente do mercado, um sujeito simpático e amigo da familia, de nome estranho para aquele ambiente:

- João Carlos da Silveira, as suas ordens.

segunda-feira, 7 de outubro de 2019

Um negócio promissor


* Publicado nesta data em coletiva.net

Vivemos a era dos aplicativos. Na coluna anterior, inclusive,  gracejei sobre o PTinder, iniciativa digital para aproximar pessoas de esquerda. A constatação óbvia é  que empresas, instituições  ou serviços sem seus épis – é assim que os locutores anunciam nos  comerciais – estão fadadas ao fracasso.  Não vai faltar um acadêmico defendendo uma  tese de que estes tempos pós verdades se dividem em AApp/DApp.

A gama de serviços oferecidos não tem limites. Do transporte individual à entrega do rancho, do crédito bancário às compras nas lojas, dos consertos domésticos ao pedido de refeições,  tudo pode ser resolvido por meio dos épis. É a uberização do  nosso cotidiano  E tudo na agilidade de atendimento de, no máximo, 15 minutos. Nunca houve tanta comodidade para os cidadãos  e nunca haverá tanta dependência de um processo.

Sucede que meu amigo Solano* resolveu criar um aplicativo para fornecimento de acompanhantes e similares à domicílio, que ele registrou como UberSex. Por enquanto, é uma  startup, mas muito promissora como negócio. Claro que o sistema já existia por telefone, mas o amigo introduziu inovações nas suas funcionalidades, garantindo total privacidade aos demandantes, além de oferecer um completo perfil e os predicados dos e das acompanhantes. Sim, porque o serviço é multisex, inclusive com o agregado TransExpress que, junto com o GirlExpress e o BoyExpress, vem reforçar o conceito adotado pela firma – “toda a forma de relacionamento ao alcance de seus dedos”.

Ao me relatar os detalhes do empreendimento e pedir confidencialidade sobre outras inovações, fiz ver ao Solano, entretanto, que a expressão “ao alcance  dos  seus dedos” podia  significar uma ambiguidade diante da natureza dos serviços oferecidos.  A resposta veio acompanhada de um sorrisinho safado:

- Neste ramo de atividade, ambiguidade é fundamental. Veja o caso das “acompanhantes”,- e fez o sinal com os dedos simulando aspas.

E como se fosse um Zuckerberg do erotismo, passou a discorrer mais sobre a potencialidade do seu negócio, agora  sem ambiguidades:

- A  sacanagem tem que se modernizar e isso só pode ocorrer pelo modus operandi nas contratações, porque em termos “daquilo” (eu esperava que ele usasse um termo mais  chulo) não há mais novidades. Outra coisa: vamos garantir privacidade plena aos interessados, evitando, por exemplo, aqueles carrões negociando nas ruas com os trans, como ocorre  em alguns locais de Porto Alegre...
E, após uma pausa dramática, anunciou:

-  Agora estou planejando até em abrir franquias da UberSex. Por acaso, está interessado?

A proposta era tentadora, mas recusei de pronto. Tenho o maior  respeito pelos empreendedores, mas considerei que a UberSex não seria bem recebida como investimento no ambiente em que transito. Até  porque estou tentando me livrar da pecha de que só penso “naquilo”, sobretudo depois do meu último livro, Quando Eu Fiz 69.  Quem me conhece sabe que isso é uma tremenda injustiça, o que não impede uma discreta torcida pelo sucesso do amigo.

*Nome fictício.

segunda-feira, 30 de setembro de 2019

A esquerda também ama


* Publicado nesta data na coletiva.net

Afinal, parece que a esquerda brasileira começou a se reinventar.  Depois de ser derrotada nas urnas; depois de perder suas principais bandeiras de luta; depois do estrago provocado pela Lava Jato nas suas fileiras;  depois das divisões no seu campo político, surge agora uma iniciativa, pelo menos inovadora, que vai mexer com parte da militância: foi criado o PTinder, junção da sigla do partido com o aplicativo para encontros românticos Tinder.

A informação saiu na coluna da Mônica Bergamo na Folha de São Paulo. A ideia, segundo a nota da colunista,  é da advogada Maria Goretti Nagime e da filósofa Elika Takimoto, com o objetivo de promover o relacionamento entre pessoas de esquerda. A ajuda a um amigo que ficou na fossa depois de um pé na bunda da parceira foi o que motivou o PTinder. Ao ser apresentado como “bom de papo” e “de esquerda” o tal amigo atraiu muitas mulheres para seu perfil, surpreendendo a ele e a advogada criadora do aplicativo.

Fico imaginando se  bom de papo e de esquerda não é uma redundância, mas, enfim, talvez seja implicância minha. Igualmente pode  ser mera implicância os  diálogos que imagino para a paquera entre a moça de esquerda e um pretendente, digamos, neo esquerdista:

- Companheiro, primeiramente Lula Livre e fora o Coiso.

Em seguida, tudo on line, o sujeito será submetido a um questionário para comprovação de adesão ideológica à esquerda.

- Foi golpe?
- Bozonaro mito ou idiota na ONU?
- Intercept ou Lava Jato?
- Janot ou Gilmar Mendes?
- Escolas  cívico-militares ou Paulo Freire?
- Globo ou Record?
- Trump ou Maduro?
- Ciro é parceiro ou traíra?
- Nazismo é de direita ou de esquerda?

Dependo das respostas o pretendente pode se habilitar a um encontro presencial, desde que aprovado pelo comitê central. Depois precisa se submeter a uma última prova de fidelidade à causa.

- Companheiro, peço  que uses cueca vermelha no nosso encontro.

Cá entre nós e sem qualquer viés ideológico:  não há libido que funcione nem paquera que prospere com um roteiro desses.

quinta-feira, 26 de setembro de 2019

Campeões de audiência


* Publicado em coletiva.net em 23.09.19

Acho que já estou ficando chato na minha cruzada contra os vícios de linguagem dos repórteres de rádio e tv e mesmo de alguns âncoras. Não tenho culpa se a audição é o meu sentido mais apurado e a repetição de  alguns tiques incomodem este velho e cada vez mais rabugento jornalista. Outro dia postei nas redes sociais que o que mais tem aparecido, no momento, entre a garotada da reportagem é o tal de “aí”, muleta usada  às pencas, sobretudo, nas entradas ao vivo.  O Alex Gusmão, experiente repórter televisivo da Band em Brasília comparou o “aí” uma espécie de virgula no texto. Uma repetitiva vírgula mal colocada, acrescento eu.

Nos comentários da postagem, a maioria de jornalistas veteranos, surgiram críticas a outro campeão de audiência, o “né”, também excessivo até mesmo entre afamadas ancoragens. A Ligia Tricot, jornalista de TV de reconhecida experiência, lembra ainda o “qual  que  é”, que já mereceu até uma coluna deste que vos fala, intitulada “Um quê a mais” - https://coletiva.net/colunas/um-que-a-mais,306067.jhtml. Registo mais os modismos do “por conta de” e do onipresente “desconforto muscular” da meninada do esporte, sem contar o “a gente”, o “bacana” e um novíssimo e acariocado “cê” substituindo o você.

Já confessei em outra crônica que também tenho um cacoete, do qual não consigo me livrar, um “tá” que parece querer validar o que acabou de ser dito, mas como não sou comunicador de vídeo ou microfone, estou perdoado, tá.  Também é  verdade que vivo me policiando, tá.

Será que a os jovens e promissores repórteres que acompanho tem feito esse exercício de humildade para limpar dos seus improvisos os “aís” e os “nés”?  A empreitada cabe  também aos editores do material dessa turma. Atentos e exigentes, eles, os editores, vão contribuir para que meus já sexagenários ouvidos sejam menos incomodados. Antecipo agradecimentos.

segunda-feira, 16 de setembro de 2019

Vem, Crivella


*Publicado nesta data em coletiva.net

O Santiago, o Schroder, o Edgar Vasques e os outros chargistas envolvidos na exposição Independência em Risco, encerrada prematuramente na Câmara de Vereadores de Porto Alegre, ao invés de se enfurecerem com a vereadora Mônica Leal, presidente do legislativo, e seu colega Valter Nagelstein, deveriam erigir um monumento para eles.  Na pior das hipóteses conceder-lhes o título de Beneméritos dos Chargistas. Graças a ação dos dois para  a suspensão do evento, na verdade, um ato de censura, a exposição de charges com críticas ao governo Bolsonaro,  que  ficaria restrita aos eventuais frequentadores da Câmara de Vereadores, ganhou repercussão nacional, notas na imprensa internacional e uma avalanche de protestos de entidades e personalidades.

No Rio, o prefeito Marcelo Crivella é quem  mereceria um monumento  – ou um título de Benemérito dos Editores – depois de proibir a venda na Bienal do Livro de uma HQ, o popular gibi, com ilustração de um beijo entre dois personagens masculinos. Em meio a idas e vindas jurídicas, a publicação voltou a ser vendida e rapidamente esgotou-se  a tiragem. Em Porto  Alegre, também uma decisão judicial determinou que a exposição voltasse à Câmara de Vereadores.

Tirante algumas manifestações escatológicas de mau gosto entre os desenhos, as charges eram de muito boa qualidade, servindo para mostrar que essa arte ainda tem força, mesmo que a função dos  chargistas caminhe para a  extinção pelo espaço ocupado, cada vez mais, pelos memes. 

Divagações a parte, tanto no episódio da Câmara de Vereadores como no da Bienal, o que ficou claro, de novo, é que a censura, mais que uma manifestação autoritária e intolerante, torna-se, antes de  tudo, uma burrice, na medida em que expande o que ficaria restrito, contrariando o objetivo que os censores pretendiam, de esconder o exposto . Isso também é conhecido como tiro no pé. Foi desgaste e constrangimento para os agentes públicos.

Aqui vale lembrar que acabo de lançar um livro cujo título -  Quando Eu Fiz 69 – pode gerar interpretações maliciosas que não condizem com os conteúdos da obra. Entretanto, aproveitando a onda de apoio às manifestações censuradas e o inesperado sucesso conquistado por elas, passei a cogitar de encenar uma batida fiscalizatória fake quando da sessão de autógrafos marcada para o dia 8 de novembro na Feira do Livro de Porto Alegre. A sugestão me foi passada por  uma leitora presente no lançamento do  livro, terça-feira passada. Olha, se tudo der certo e o teatrinho for convincente, Quando Eu Fiz 69 vai vender mais que costela gorda no Acampamento Farroupilha. Vem pra Feira, Crivella.