*Publicado nesta data em coletiva.net/colunas
Um time de futebol vencedor começa pela direção, sustentada em dois pilares: cuidar das receitas e das despesas e entender minimamente do esporte. No pilar das finanças para garantir os investimentos necessários em termos de estrutura e para qualificar o elenco; o conhecimento do futebol vai ser fundamental para evitar enganos nas contratações, por exemplo, ou para cobrar resultados da comissão técnica. Consagrados dirigentes da dupla como Fabio Koff, no Grêmio, e Fernando Carvalho, no Inter, tinham este perfil, mas também é verdade que viraram exemplos do chamado “pensamento mágico”, quando tentaram repetir conquistas, caso de Koff em 2013 e 14, ou evitar desastres, caso de Carvalho em 2016 , em circunstâncias diferentes das dos períodos de glória.
No caso do Grêmio de
Romildo Bolzan, vencedor da Copa do Brasil e da Libertadores em 2016 e 17 , o
roteiro do insucesso no pilar do futebol foi seguido à risca nos anos seguintes, mesmo sendo o campeão do
superavit, mesmo tendo feito grandes
investimentos no futebol, mesmo gastando
só neste ano R$ 58,8 milhões em reforços e mesmo pagando bem e em dia
o grupo de jogadores, que consome R$ 14,5 milhões/mês. Neste quesito, só perde para os ponteiros da Série
A, Atlético-MG, Palmeiras e Flamengo, fica adiante de Corinthians e São Paulo e está
quase o dobro à frente do tradicional adversário, o Inter (R$ 8,3 milhões).
Com esse nível de
investimentos, o que indigna os gremistas em particular, eu inclusive, e intriga os profissionais do futebol em geral
é o que teria levado levou o Grêmio a essa situação vexatória? A resposta, como
nos acidentes aéreos e desde já vai o pedido de desculpas pela comparação, é de
que a causa não é singular, mas um
conjunto de fatores. O Grêmio perdeu a identidade na forma de jogar, variando
de escalação e esquema jogo a jogo; cada técnico – e foram quatro no período e
um interino, com Felipão reeditando a
ideia do pensamento mágico – tentando
impor seus conceitos, nem sempre com o apoio dos jogadores e estes divididos em
torno da responsabilização pela queda de
produção, ora culpa dos novatos, ora dos cascudos; leniência da direção quanto às imposições do
vestiário; contratações equivocadas; disputa entre a cartolagem por
protagonismo para suceder Romildo; enfim, um círculo vicioso que abalou o
emocional do grupo e se refletiu no desempenho e nos resultados em campo. Tá
bom assim ou querem mais?
Na verdade, essas foram mais
consequências da causa principal para a fatura que está sendo cobrada agora:
o excessivo poder conferido por
Romildo ao técnico Renato Portaluppi. Nenhum técnico em tempo algum teve
tamanho poder no Grêmio e, arrisco a dizer, em nenhum clube brasileiro, tanto
assim que Renato teria provocado a saída em janeiro de 2020 de pelo menos sete
profissionais do departamento de futebol, do preparador físico ao treinador de
goleiros, da nutricionista ao fisioterapeuta. Antes havia trombado com o CEO do
clube e eventual executivo do futebol, Carlos Amodeo. As contratações indicadas
mereceriam um capítulo a parte.
Ninguém, fora da imprensa
especializada, sabia quem era o homem do futebol do Grêmio, e olha que pelo
cargo passou um ex-presidente, Duda Kroeff. Isso porque o homem do futebol do
Grêmio era o Renato, em linha direta com o presidente. Enquanto o Grêmio conquistou títulos, essa aliança
funcionou, e garantiu a Renato a estátua na frente da Arena e a Romildo
ótimas perspectivas como candidato ao governo do Estado. Como não há bem
que sempre dure, a aliança que foi benéfica nas vitórias, foi prejudicial nas
derrotas e um ciclo está chegando ao fim.
O Grêmio vive agora sua
agonia rumo ao indesejado
tri-rebaixamento, só que a estátua continua lá, incólume, enquanto Romildo sai
dessa campanha bem arranhado, inviável para qualquer candidatura. Já o clube,
nesse legado de terra arrasada, se prepara para um novo período de grandes dificuldades
em que a flauta dos colorados é o menor dos males.
O que fica de lição de
tudo isso é que não há imortalidade que resista a tantos fatores adversos,
especialmente a uma direção que se mostrou incompetente na gestão daquilo que é
a razão de ser do clube: o futebol.