*Publicado nesta data em coletiva.net
Os árabes são
pródigos em lendas, contos e mil
historias sem fim, mas uma delas é clássica e muito apropriada para enfrentar
as aflições destes tempos covidianos. É
a lenda Iazul, que Malba Tahan, pseudônimo do matemático e escritor brasileiro Júlio Cezar
de Melo e Souza (1895-1974), se encarregou de difundir entre nós, junto com variadas e coloridas histórias ambientadas no mundo árabe.
A lenda dá conta que um
generoso e bravo príncipe da Pérsia (o Irã de hoje), certo dia, após as preces
matinais, convoca urgente o sábio da corte, cuja nobre função (toda a adjetivação fica por
conta de Malba Tahan) era orientar as decisões do monarca, além de esclarecer as
dúvidas dele. O que preocupava o
príncipe era o conteúdo de um pequeno cofre que acabara de receber: um anel de
ouro, que pertencera a um potentado de
Candahar.
Ao examinar o anel o
conselheiro desvendou o enigma da peça: no rico escudo em forma de tâmara,
entre dois pequenos brilhantes, aparecia talhada a palavra Iazul. Entretanto, o Emir ainda se
consumia em dúvidas diante da revelação, ao que o sábio se apressou em explicar, como conta Malba Tahan:
- Iazul é uma
palavra mágica (...). Asseguro que é a palavra mais expressiva e eloquente
entre todas as que figuram no riquíssimo vocabulário persa. (...). Tem o dom de
nos tornar alegres, quando estamos tristes, e de moderar as nossas alegrias,
nos momentos de extrema felicidade e ventura.]
E prosseguiu,
desfazendo de vez o mistério, uma vez que o príncipe já estava p da cara,
querendo saber logo o significado da palavra:]
- Iazul
significa, apenas...Isso passa! Ou ainda: Tudo passa! Quando o
homem atravessa períodos de felicidade, de alegria cor-de-rosa, de sorte e tranquilidade,
deve pensar no futuro e ser comedido em suas expansões, sóbrio em suas
atividades. Convém que o afortunado não esqueça: Iazul! (Isso passa!).
Há ocasiões, porém, em que nos sentimos anavalhados pelos sofrimentos, pelas
enfermidades, feridos pelas desgraças, caminhando sob a nuvem da má sorte, da
ruína e atingidos pelos golpes imprevistos do infortúnio. Para que o ânimo
volte ao nosso espírito, proferimos, cheios de fé, fortalecidos de esperanças:
Iazul! (Isso passa!).
E concluiu, após
breve pausa dramática e para alívio do príncipe que não estava com muita
paciência para a verborragia do conselheiro.
- Sim, tudo passa!
Virão dias melhores, dias calmos, dias felizes; a prosperidade e a boa sorte
voltarão a iluminar a nossa jornada; a saúde será reconquistada; a serenidade
procurará pouso em nosso atribulado coração!
Claro que o talentoso
e prolifico Malba Tahan conta as lendas e delas tira lições para a vida com uma
maestria que este colunista bissexto não consegue alcançar.
Ao colunista só
restar acrescentar, depois de abrir sua caixinha:
- Para os que se
cuidarem e cuidarem dos outros, vai passar!
E se precisarem de trilha sonora para este período,
nada melhor do que a antológica Vai Passar, de Chico Buarque:
Num tempo
Página infeliz da nossa
história
Passagem desbotada na
memória
Das nossas novas
gerações
Dormia
A nossa pátria mãe tão
distraída
Sem perceber que era
subtraída
Em tenebrosas
transações
Página infeliz da nossa
história
Passagem desbotada na
memória
Das nossas novas
gerações
Dormia
A nossa pátria mãe tão
distraída
Sem perceber que era
subtraída
Em tenebrosas
transações
(...)
E um dia,
afinal
Tinham direito a uma
alegria fugaz
Uma ofegante epidemia
Que se chamava carnaval
O carnaval, o carnaval
(Vai passar)
Tinham direito a uma
alegria fugaz
Uma ofegante epidemia
Que se chamava carnaval
O carnaval, o carnaval
(Vai passar)