sábado, 30 de março de 2013

O Colecionador


Vou agregar a minha galeria de tipos inesquecíveis mais um: o Colecionador.  Vocês já conhecem o Apaixonado por Panturrilhas, o Tarado por Joanetes, o Deprimido que foi trocado por uma ideologia e o Ritualista, que sempre manda flores para a ex-amada no dia  que marca o aniversario da primeira transa.  Todos circularam aqui no ViaDutra mais ou menos recentemente.

Agora O Colecionador vem trazer ao respeitável público do ViaDutra suas histórias e suas experiências na certeza de que vou socializá-las. O perfil desse personagem se assemelha ao do Ritualista, pois venera a primeira vez, o primeiro encontro, a primeira transa.  Venera tanto que faz questão de marcar o evento com um troféu, daí o apelido que ganhou. Tudo começou quando ele conseguiu vencer a resistência de uma amiga, depois de um longo período de assédio e, emocionado, pediu para ficar com a calcinha da moça. Diante da negativa dela, erigiu sua própria cueca da ocasião como a lembrança daquele momento.  O troféu, agora um modelo fora de moda, está guardado em posição nobre no armário que ele batizou como O Memorial.  Cada peça exposta nessa espécie de sacrário é acompanhada da data do ocorrido e das iniciais do nome da parceira da ocasião. “Não ficaria bem expor o nome completo de interposta pessoa, afinal, alguns dessas situações envolvem casos, digamos, escabrosos”, explica ele, afetando algo de misterioso nas suas relações.

Tem de tudo na inusitada coleção: uma profusão de calcinhas pretas e vermelhas, meias com ligas, soutiens de todos os tamanhos, pelo menos um espartilho, brincos variados, gargantilhas com iniciais no pingente, botas e sapatos de salto alto e até uma cueca  samba canção, que não é a que deu origem ao acervo. Curioso e maledicente, indaguei sobre aquela peça específica, que poderia ser resultado de alguma relação homoafetiva, mas  a explicação foi convincente: “Tem mulher que adora usar as cuecas dos maridos ou namorados”.  Mas ficou ainda uma dúvida:  cuecas  dos maridos ou namorados? Aí tem, mas não espichei a conversa, apenas questionei o que motivaria uma pessoa de hábitos discretos como ele organizar aquele tipo de coleção, com muita diversidade e uma quantidade de peças de dar inveja. “Sou acima de tudo um romântico e custo a me desapegar das pessoas, por isso sempre guardo uma lembrança daqueles momentos especiais que vivemos”, esclareceu, com os olhos quase marejados pelas recordações que vieram naquele momento.

Não tenho porque duvidar da sinceridade de propósitos do meu amigo e quase me comovi também, mas ao fim e ao cabo, fiquei mesmo um tanto deprimido.  Puxa, teria tão poucas peças para colecionar.

sexta-feira, 29 de março de 2013

A pauta da Sexta-feira Santa


* Publicada originalmente em abril de 2012.
Repórter de plantão na Sexta-feira Santa enfrenta uma pauta obrigatória: a cobertura da encenação da Paixão de Cristo no Morro da Cruz, no Partenon, também conhecida como subida ou procissão do Morro da Cruz. O evento ocorre desde 1960, criado pelo padre Angelo Costa, já falecido, e cresce a cada ano, reunindo preferencialmente atores da comunidade. Lá no final da década de 80 do século passado este que vos fala era repórter de geral da Zero Hora, estava de plantão da Sexta-feira Santa e, claro, foi escalado para acompanhar a encenação.
Lembro bem que era um dia quente no final de março e para escapar das obviedades das coberturas tradicionais, decidi escolher dois ou três personagens interpretados por atores locais para, através deles, montar a minha matéria.  Um dos personagens era balconista de uma ferragem e intérprete do soldado romano que passava toda a encenação surrando, com uma espécie de relho, um dos ladrões, que na vida real era motorista de táxi.  É importante esclarecer que a encenação reproduz a Via Sacra  e suas 14 estações ou etapas do suplício de Cristo naquela sexta-feira, há mais de dois  mil anos. Só que alguns atores imprimem demasiado realismo a suas interpretações e era  caso do soldado romano que, volta e meia, pesava a mão contra o pobre e talvez bom ladrão. O infeliz olhava enfurecido para seu algoz, mas nada podia fazer durante a celebração religiosa, mesmo que o sacana legionário revelasse perversa satisfação em maltratar o companheiro de elenco.  Sei lá se não deu o troco após o evento. O soldadinho, um sujeito atarracado e malvado, bem que merecia.
O mais inusitado ainda estava para acontecer naquela encenação do século passado.  O gran finale seria a ascensão de Cristo, a partir da capelinha existente no platô do Morro da Cruz e onde ocorria o final da procissão.  O espetáculo no fim da tarde previa jogo de luzes, uma trilha épica e aqueles fumacinhas de shows,  que acompanhariam a subida do Filho de Deus feito Homem aos céus. Um engenhoso sistema mecânico elevava o ator, com suas vestes brancas, enquanto ele recitava lições de religiosidade. O ator já era o ex-vereador Aldacir Oliboni, considerado a réplica moderna do Cristo, de acordo como mostram as ilustrações que conhecemos.
Pois bem, lá estava o Cristo- Oliboni exortando os fiéis quando, à esquerda do platô, começou uma movimentação frenética. “É ele, é ele, sim!”, repercutia a massa.  Vocês estão autorizados a pensar que era o próprio Cristo redivivo comparecendo ao seu velório, mas na verdade era quase isso, guardadas as proporções e o período histórico. Quem surgia triunfalmente era Sérgio Zambiasi no auge da sua popularidade. O Zamba foi cercado e festejado pela multidão, enquanto Cristo subia ao encontro do Pai,  lentamente e quase de forma incógnita. 
Oliboni ainda tentou atrair a atenção dos infiéis, gritando palavras de ordem pelo sistema de som:  “Cristo está aqui!  Cristo está aqui! Agora é o momento  glorioso da subida aos céus. Venham, venham, é aqui que está o Filho do Senhor! Demos glórias ao Senhor!”, apelava o bom Oliboni. Inúteis apelos.  A massa queria mesmo era confraternizar – e fazer pedidos – a quem mais tinha a oferecer naquele momento.  Entre os consolos espirituais que Oliboni inspirava e os materiais que Zambiasi poderia proporcionar  a escolha do povo pecou pelo pragmatismo, mesmo na Semana Santa.
Confesso que fiquei penalizado com a situação do Oliboni, supliciado durante toda a subida do morro e justo no momento da sua consagração como Cristo e ator o público o abandonava daquela forma, trocando-o por uma situação tão mundana.  De novo, mais de dois mil anos depois, a história se repetia e  o povo renegava Jesus Cristo. 
Insensível público, mas depois fiquei pensando que fatos como o que presenciei talvez expliquem porque Sérgio Zambiasi chegou a senador e Oliboni, mesmo sendo Cristo por um dia, só agora conseguiu assumir como deputado estadual, ainda assim vindo da suplência. Mas aí já é outra história, nada a ver com a Semana Santa.
Boa Páscoa a todos. Que o coelhinho seja mais generoso que a massa que renegou Cristo-Oliboni.


segunda-feira, 25 de março de 2013

Caldo, ainda


Esse negócio de “caldo” está dando o que falar. A postagem anterior, A Teoria do Caldo, diferente do que pretendia o autor, lançou poucas luzes sobre a origem da expressão “da um caldo” e gerou mais indagações do que certezas. Eis que minha dileta amiga Cintia Votto, ela mesmo uma caldeável de primeira hora, coloca em contato o professor Ari Riboldi, autor da coluna A origem de palavras e expressões” no site Portoweb Cidadão, da Procempa, que oferece uma detalhada explicação etimológica da palavra “caldo” e por aí vai. Vale a pena conferir:

Dar um bom caldo
 
Caldo, do latim “caldus”, quente, aquecido, derivado do verbo “callere”, ser quente fisicamente ou psicologicamente. Os termos e expressões sempre têm uma origem literal e, por extensão, depois assumem acepções figuradas, por comparação. O caldo é o alimento líquido preparado a partir do cozimento, em água fervente, de carnes e outros produtos. É também o sumo de vegetais, frutas (cana, laranja, etc). Todos possuem alto valor nutritivo.

O caldo (canja) de galinha, por exemplo, é muito recomendado para nutrir em períodos de doença, após o parto, na chamada quarentena), depois de um “porre”. Revigora o corpo, devolve as energias e a capacidade física.

Na linguagem das relações sexuais, há muitos tabus – faço palestras também sobre esse tema para homens e mulheres. Empregam-se muitos eufemismos e metáforas para não ir direto ao assunto. As pessoas têm medo de falar do tema e de dizer os termos anatomicamente normais.  Nesse contexto, aparece também o “caldo”, “dar um bom caldo”. Como sou prático, venho da roça, conheço a lida diária, encontro resposta ali para decifrar palavras e expressões, pois são sempre de origem pragmática, calcadas no fazer cotidiano.

P or submissão histórica da mulher, a linguagem sobre sexo sempre tem a visão do homem, é machista. Fulano “comeu” a fulana. E o homem marcava na parede “mais uma”. Seu valor, no meio dos homens, era marcado pela quantidade. Por isso contar aos outros era essencial. Não sei se anatomicamente é o homem que “come”; parece que o verbo seria mais adequado para o que a mulher faz no ato sexual. O termo de agora é “pegar”. O homem deve ser pegador.

Mulher bonita, jovem, de boas carnes era, em tempos idos, um galeto. Sob o ponto de vista masculino, apetitosa, viçosa para ser comida. Como galeto, cozia rapidamente, dava bom caldo e suas carnes podiam servir também de alimento. Atualmente, o galeto fó substituído por gata, em alusão à beleza dos felinos.

Uma galinha velha não ferve na primeira fervura. Pode dar bom caldo, mas precisa de muita lenha no fogo, precisa de muito gás para manter a panela em alta fervura, em alta temperatura, por um longo tempo. Vai render uma boa canja, um bom caldo. A carne, possivelmente, deva ser desprezada, atirada aos cães, porque dela se extraiu tudo e ainda ficou dura para nossos dentes.  Dar um bom caldo, portanto, é ser atraente fisicamente, ter carnes esbeltas, esguias, atraentes aos olhos.

Com a emancipação da mulher, a linguagem sobre sexo tornou-se um pouco menos machista. Antigamente o homem era o lobo, o caçador. A mulher tinha que esperar, ficar bem composta, para não parecer oferecida e promíscua. Hoje ela tem o direito e a liberdade de também ser “caçadora”, embora ainda existam porco-chauvinistas e machistas reacionários.

Caldo, canja, galinha, alimento, sexo, comer, palavras que possuem um fundo cultural que retrata os costumes, o pensamento vigente em determinada época. São as palavras que “tecem” o “tecido” social de um “contexto” maior. Quem ainda possui vestígios de beleza, apesar dos anos, ainda dá um bom caldo. Como se verifica, caldo é uma metáfora, uma comparação direta. Já escrevi demais. Fico satisfeito se algo acrescentei para esclarecer o tal “caldo”.

Espero não ter entornado ainda mais o caldo. Meu intuito foi o de trazer mais luz aos já brilhantes comentários sem ferir suscetibilidades. Quem “ainda” pode dar um bom caldo está em decadência, pois o “ainda” é terrível. O “ainda” retrata algo que está por findar, no ocaso, no crepúsculo, com os dias contados.

PS: Sou um “expert” em galinhas. No programa Jô Soares, da TV Globo, fiz uma galinha dormir na frente do Jô e de sua plateia. Era uma franga paulista que conheci durante a entrevista. Portanto foi uma hipnose sem truques. Um abraço a todos.

Professor Ari Riboldi

sábado, 23 de março de 2013

A teoria do Caldo

Tenho sido provocado com frequência para explicar melhor o que significa o tal de "caldo", que serve para homenagear moças e senhoras das minhas relações pessoais ou virtuais. O que não falta é provocador no Facebook, mas não me intimido diante dos seus reptos,  até porque falar de "caldo é falar em algo prazeroso.

Acho que ouvi a expressão pela primeira vez lá pela década de 80 do século passado na redação de esportes da Zero Hora, que abrigava um time de cobras – e aí cobras pode significar tanto gente talentosa como malévola, algumas incorporando os dois conceitos na mesma pessoa. Pois, foi naquele ambiente que o Ademir dos Santos Fontoura, o Chimba, mestre na arte da diagramação e da sacanagem, cunhou a frase, referindo-se a uma colega de notáveis atributos físicos:  “Fulana dá um caldo!”.  Confesso que até perguntei o porquê da relação "caldo" x atributos físicos, mas fiquei tão impactado pela expressão usada,  justo no momento em que desfilava a nossa frente aquele monumento de mulher, que não gravei qual foi a explicação do Chimba
Lembro que anos mais tarde usei a expressão para saudar minha boa amiga Ana Fagundes, a Guiga e, com todo o respeito, constatei que ela gostou do que ouviu. Ou seja, “caldo” passou a ter a força de um elogio  e, vamos combinar, nenhuma mulher resiste a um elogio, mesmo quando comparada a uma alimentação basicamente aguada. Quando passei a comentar com um “Dá um caldo!” as aparições das minhas amigas no FB, não imaginava a proporção que o elogio ganharia, a ponto de ser disputado por umas como se fosse um troféu e repelido por outras como se fosse uma ofensa, até que recebem a explicação devida no caso das ofendidas.  Vale socializar a explicação:  "caldo" é uma designação reservada às desejáveis!

Criou-se, então, o movimento das "caldeáveis", que cresce dia a dia, inclusive em outras cidades, no país e até no exterior, a ponto de não conseguir reuni-las todas em uma grande confraria como pretendia. Por isso a confraria se reúne no meu coraçãozinho, onde sempre cabe mais uma.
Agora se me perguntarem o que tem a ver "caldo" com tudo isso, respondo peremptoriamente: não sei.  Só sei que funciona.

domingo, 17 de março de 2013

Parece que foi ontem

Como vocês já devem ter percebido  possuo  alguns amigos chegados a uma esquisitice.  Tem aquele tarado por panturrilha e aquele outro que adora um joanete, mais um que só fala em massagem tântrica  e ainda aquele que quase virou borderliner e  se fina cada vez que lembra da namorada que o abandonou quando aderiu a uma nova ideologia, cuja história foi contada aqui em Judas em forma de mulher.  E tem o que apelidei de O Ritualista. Voce já vai saber porquê.

Todos os anos ele adota  o mesmo ritual. Sempre em certa data ele envia a ela um determinado número de rosas, acompanhada de um cartão com apenas uma palavra que expressa um numero:  Um,Dois, Três...A quantidade de rosas corresponde ao número escrito no cartão e o conjunto todo diz respeito aos anos que se passaram desde a  primeira transa deles.  “Oito, mas parece que foi ontem”, escreveu ele no mais recente cartão e despachou-o com oito rosas vermelhas,  justo na data merecedora da homenagem. Sempre rosas vermelhas, símbolo da paixão amorosa.
No início a moça ficava lisonjeada com as flores,  mas as idas e vindas na relação já não produzem o mesmo efeito. A contrario, ela  mostra certa irritação com o buquê homenageante, especialmente quando estão apartados.  Mesmo assim ele insiste no ritual porque a data realmente representa um grande momento.  O momento culminante do esforço de meses de um homem determinado a conquistar aquele coração e aquele corpo. É uma linda hstória de amor, mas não me peçam detalhes porque são escabrosos em certas partes e podem gerar constrangimentos. 

Hoje, distanciados há longo tempo e outros aconchegos depois, ele confessa que ainda sente tremores quando lembra a primeira noite e o sentimento de dono do mundo que se apossou dele quando se entregaram um ao outro sem pudor nem culpas. Mas o que mais magoa nosso amigo é que  e todos esses anos nunca recebeu flores da parceira.  “A Celia Ribeiro garante que mandar flores a um homem é a coisa mais natural, só eu que nunca recebi sequer uma espada de São Jorge, uma hortência, um copo-de-leite, que dirá rosas”, lamuria-se.
Para consolá-lo informei que também nunca foi alvo de mimos floridos e que nem por isso deixo de presentear a amada com belos buquês. 

 

sábado, 9 de março de 2013

Exagerando na pieguice


Passado o Dia Internacional da Mulher, de tudo o que vi e ouvi, fiquei com a impressão que a celebração esteve reduzida às mazelas que ainda cercam o gênero feminino, um viés cheio de amarguras e cobranças, e de outro às mensagens piegas, apelativas, de um romantismo forçado, como se fosse preciso reafirmar o que não é praticado durante o restante do ano.  Até o caso do goleiro Bruno foi usado em anuncio de uma loja, mas aí já não é caso de mau gosto, mas um autêntico caso de  SN - sem noção.
Toda e qualquer situação, mas especialmente as adversas, tem que conter um aprendizado e, em verdade vos digo, que aprendi muito nestes dias.  Aprendi, por exemplo, que as mulheres ligadas aos movimentos sociais é que detém o conhecimento supremo do que é bom ou ruim, correto ou inválido no que diz respeito as suas iguais. Utilizam ,inclusive ,uma linguagem diferenciada, da qual devemos nos apropriar. Saúdo as militantes e  sou tentado a aderir a sua forma de luta, mas não acho que o reconhecimento do papel da mulher no mundo moderno passe pelo confronto entre militantes x "aquelas outras".
O que eu gostaria mesmo é que hoje e sempre fosse realçado o lado divino, a porção celestial das mulheres, aquilo que tem de  sublime e que nos leva a amá-las com todas as nossas forças e a cometer loucuras de apaixonado em nome desse sentimento, que,  com certeza, merece as benções das divindades.  E vale qualquer exagero porque  é no amor que a mulher se realiza plenamente. Em toda a forma de amor, mesmo a da freirinha que ama a Cristo acima de todas as coisas. Pieguice? Pode ser, mas,  em se tratando das mulheres, ainda prefiro exagerar pela pieguice do que pela chatice. #prontofalei!

quinta-feira, 7 de março de 2013

O homem que eu invejava


Foi o sempre atento Carlos Urbim quem postou no Face a foto da placa de uma rua de Lisboa, que segundo o talentoso escritor, dá medo de passar. Pudera, o logradouro lisboeta chama-se Rua do Capado.
São coisas assim que atiçam a minha imaginação. Quem seria o pobre sujeito que teve extirpado seu órgão? O que teria feito para merecer esse infortúnio? Deve ter sido algo de magnitude para ganhar uma rua só pra ele. É o tipo da homenagem da qual eu abriria mão, primeiro pelo motivo que deu causa ao tributo – o único órgão que admito perder e já perdi é o apêndice; e depois, como bem disse o nosso Quintana, “um engano em bronze é um engano eterno” – no caso do Capado, um engano em azulejo português, menos mal.
A postagem do Urbim remeteu-me quase de imediato para o  nome de um espaço público em Porto Alegre que sempre me intrigou e não poucas vezes foi motivo de piadas de baixa extração. Trata-se da Travessa Mário Cinco Paus! Fica no centro, entre a chamada Prefeitura Nova e um prédio do INSS, ligando o final da avenida Borges de Medeiros ao terminal de ônibus da rua Uruguai.  Em tempos idos, já foi um beco, mas recebeu um trato, foi ajardinado e hoje é local de grande circulação.

Isso posto, eis a pergunta que não quer calar: quem foi Mário Cinco Paus, o homem que sempre invejei desde a adolescência, quando só pensava naquilo? Teria mesmo o nosso Mário cinco órgãos genitais?  Como funcionariam: em paralelo, se completando, como pistões de um carro, uns subindo outros descendo? Era um homem realizado e de bem com a vida com seu instrumental diferenciado? E as parceiras do bom Mário como reagiam diante de cinco espetáculos do crescimento? E as pobres filhas do Mário, com esse sobrenome invulgar,  como devem ter sofrido  com brincadeiras de mau gosto, o antigo nome do bulling, nas escolas e outros locais que frequentavam?

Essas indagações, pertinentes e profundas acerca de um personagem da cidade, me acompanharam até os dias de hoje, quando resolvi pesquisar para saber quem foi Mário Cinco Paus.  Aí todas as bobagens que imaginei caíram por terra. O Mário Cinco Paus nada mais era do que um rábula, advogado não formado, que viveu na cidade no século passado. Ficou famoso pelos júris que defendeu e era apreciado pela classe jurídica de Porto Alegre. A alcunha que acompanha o sóbrio nome de Mário seria derivada de sua maestria  no popular jogo do pausinho, que reunia intelectuais, frequentadores da Livraria do  Globo e jovens advogados em animadas rodadas no Chalé da Praça XV. O dr.Mário costumava limpar seus oponentes no jogo do palitinhos. No primeiro governo do prefeito Loureiro da Silva (1937 a 43) esta figura quase folclórica foi homenageada com o pequeno trecho de pouco mais de 30 metros.
A placa de identificação do trecho revela que foi um filantropo, talvez por falta de outros predicados para ser em destacados, além de algo como O Rei do Pausinho ou O Mestre do Palitinho. Convenhamos, não ficaria bem.
E lá se foi minha inveja e meu complexo de inferioridade.

domingo, 3 de março de 2013

O Papa é gaúcho!

 
Imaginem se o colégio dos cardeais escolhesse o gaúcho de Cerro Largo, dom Odilo Scherer, como novo papa. Primeiro resultado da escolha: todos os jornais gaúchos estampariam nas capas do dia seguinte a manchete óbvia, cunhada por João Paulo II, décadas atrás, mas agora sem sotaque: O Papa é Gaúcho! Zero Hora vai mais adiante e uma parente qualquer vai informar à reportagem: “Desde pequenino ele já brincava de Papa”. 

Claro que O Bairrista vai se superar e publicar algo como “Cerro Largo exige sediar o Vaticano” e a Câmara de Vereadores local vai levar a sério a proposta e endossar a exigência, rogando à presidente Dilma que interceda neste sentido.   Na pior das hipóteses vai oferecer ao novo papa o título de Cidadão Emérito de Cerro Largo. Se nada der certo os cerro-larguenses vão se contentar em ganhar uma diocese, com catedral, bispo e tudo o mais. Mas em seguida Curasal reivindicaria as mesmas prerrogativas alegando que dom Odilo, quando criança, teria veraneado na praia e se banhado nas suas águas.

A pequena mas centenária Cerro Largo de pouco mais de 13 mil habitantes seria tomada pelas equipes de rádio e TV com suas parafernálias, para alegria do comércio e das moçoilas locais. A Globo produziria um especial para o Globo Repórter com a “dieta pontifícia”  e seria revelada sua santa preferência por uma costela gorda ou um pernil de ovelha, acompanhada de polenta com queijo.  Glória  Maria entrevistaria, direto da maternidade, os pais da primeira criança nascida logo após o Habemus Papa e que foi batizada como Odilo. Logo surgiriam os  Jaison Odilo,  os Odilo Maiquison, os Neymar Scherer e as Suelen Odila. “Incrível isso”, diria Glória Maria.
Dom Odilo causaria espanto ao escolher seu nome papal: Sepé Tiaraju I. Logo seriam editados livros e trabalhos científicos sobre o indígena guarani, tendo Nico Fagundes como consultor.  A Globo se apressaria em produzir uma minissérie “O Santo Guarani”, com Werner  Schünemann fazendo uma ponta como dom Odilo.

O novo papa incluiria a cuia de chimarrão para ilustrar o seu brasão e introduziria o hábito de sorver o mate amargo na Santa Sé.

Haveria grande curiosidade sobre a preferência clubística do novo papa. Os programas esportivos fariam enquetes: “Grêmio ou Inter?  Para quem torce o novo Papa? Disque....”, até que dom Odilo revelaria candidamente uma discreta preferência pelo  São Luis, de Ijuí, não pela força esportiva do clube, mas pela homenagem a um dos mais importantes santos católicos e também porque remete a São Luis Gonzaga, redução jesuítica onde nasceu o índio Sepé.
Enfim, Cerro Largo e a província de São Pedro nunca mais seriam os mesmos.  Até que começasse a surgir um movimento antagônico, alegando que dom Odilo saiu cedo do Rio Grande, que preferia vinhos italianos aos gaúchos, que não torcia nem pra Grêmio, nem pra Inter e ai...