sábado, 30 de maio de 2015

Uma manhã com Carlos Kober

Tive o privilégio de assistir na manhã deste sábado à palestra de Carlos Kober, na sede da nossa Associação Riograndense de Imprensa, que comemora 80 anos.  Lembro que conheci o  Kober numa campanha politica em 2002 e logo viramos amigos para sempre, o que no caso dele não é muito difícil.  Dono de  um baita currículo voltado para as produções audiovisuais,  foi professor da PUC, produtor da RBS TV, diretor artístico na Globo,  atuou na Globo Internacional e em especiais como Criança Esperança, Rock in Rio e séries como Castelo Ra-Tim-Bum, além  de coberturas jornalísticas especiais. Só o fato de ter produzido o programa do mala do Faustão já o credencia para as reflexões e provocações que fez à atenta plateia reunida na ARI.

Sem se preocupar com o politicamente correto e com aquele humor que caracteriza os gordos, Kober titulou sua palestra de O Comunicador Epilético, aquele que se movimenta desordenadamente e, assim, os resultados da sua produção são pífios, inconsequentes, sem credibilidade.  Lamentando que os profissionais mais experientes estão sendo alijados do mercado,  Kober condena a mesmice das atuais produções televisivas.  Ou são reality shows, comprados no exterior em detrimento da expertise nacional,  ou são programas de formatos muito parecidos entre si. Sobra, é claro, criticas para a Rede Globo que, com a mesmice e as fórmulas repetidas, estaria “perdendo audiência aos magotes”.

Observador da cena que sou, mesmo sem o pedigree do palestrante,  associo-me  humildemente às conclusões dele quanto as ofertas atuais na grade da principal geradora nacional, com seu edulcorado show para a periferia, o Esquenta (deve sair do ar logo) e com a insistência em atrações baseadas em entrevistas com atores globais, uma ou duas atrações musicais de sucessos do momento, um tema metido a polemico para debates rasos,  uma competição qualquer  envolvendo celebridades e  um grupo de jurados descolados, entre eles o famoso “especialista”.  Muita cor, primado da forma, pouco conteúdo. “E novela, novela, novela...”, esbraveja Kober.

Ele vai além e diagnostica que as grades de programação das TVs estão condenadas, uma vez que não cumprem mais seu papel porque o telespectador, com acesso a toda a gama de canais a cabo e a serviços como o Netfix, agora monta sua própria programação e ainda pode editá-la a seu gosto.  Esse fato e mais o afastamento das melhores e mais experiente cabeças, somada  a criatividade relegada a plano secundário,  provocaram a mediocrizarão do meio TV e perda de audiência já constatada. 


Kober tem visão de mercado – “jornalista tem vergonha de falar em faturamento, mas é ele que paga quem trabalha” -,  clama por produções com diferenciais e melhor formação para quem quer se especializar no meio . Dessa forma, a comunicação epilética será substituída pela comunicação planejada,  sem mesmice,  com ousadias, honesta nos seus propósitos – e este  foi mote do seu recado final, antes do magote de aplausos.

domingo, 24 de maio de 2015

Pois sim,pois não

Que língua a nossa, exclamava aquele cronista, diante das incongruências do português do Brasil. A gente calça as botas e bota as calças. Trata-se de um clássico do gênero  e uma solução linguística aceitável por causa da redundância que seria calçar as calças. Bobagens á parte, gosto mesmo dos divergentes "pois sim" e "pois não". Está tudo com sinal trocado:  o do "sim" expressa uma negação e parece exigir um ponto de exclamação, enquanto o do "não" é uma concordância e pode ser ainda um questionamento, se  acrescentarmos um ponto de interrogação. Vá entender.

Vejamos o caso de "caldo" e "sopa", que seriam sinônimos, só que aplicados para o sexo feminino ganham outras conotações: caldo refere-se a mulheres atraentes, desejáveis, e as que dão sopa seriam  aquelas tipo oferecidas. Já devo ter escrito algo a respeito.

Tenho certo fascínio por essas  complexas questões do idioma, digamos, e de  outras tantas que atormentam quem precisa se valer da língua culta, como nós jornalistas. Meu bom amigo Plínio Nunes, também jornalista, é especialista no tema assim  como o professor Ari  Riboldi, enquanto outro amigo de fé,  o Pedro Fernando Garcia de Macedo, tem nome de embaixador, domina bem o idioma,  mas não é nada diplomático quando  me acusa de ter faltado às (com crase?)  aulas de crase, (separar por vírgula?)   e virgulas. A sinceridade do Pedro, como se observa, me transmite insegurança, por isso sempre que me aperto recorro a ele para corrigir alguns textos que cometo.

Na verdade, vamos a mais especulações em torno do manejo da chamada “última flor do Lácio”. Reconheço que os marqueteiros sabem tirar o máximo do potencial das nossas palavras e expressões.  Reparem nas ofertas dos anúncios e anotem quantas vezes são anunciados descontos de “até 50%, 70%...” ou “preços a partir de...” ou “tudo a partir de 1,99”.  Limites acima e concessões pra cima.


Essa flexibilidade é um chamarisco e tanto para os consumidores desavisados,  mas nem sempre corresponde à realidade.  Aqui é assim: as liquidações ficaram tão desacreditadas que tiveram que adotar a nomenclatura inglesa saleSorry, mas aí a questão já não é mais de linguística. Acho que queria mesmo era  me indignar com as artimanhas do comércio e para isso me vali das artimanha do Português.

quinta-feira, 21 de maio de 2015

Sobre os chatos, de novo

Já escrevi e reeditei pelo menos uma vez um texto que trata das minhas agruras com os chatos. Agora decidi revisitar o tema diante de uma frase  da minha amiga Raquel, numa troca de mensagens com outro companheiro,  o  Evaldo, a propósito de uma terceira pessoa que o parceiro dizia não lembrar.  Uma frase simples, definidora: “Tu não lembra porque não  era um chato. Os chatos marcam mais”.

É isso, o chato está sempre presente na nossa memória justamente pela inconveniência de sua presença.  O chato é repetitivo, detalhista, invasivo, inoportuno e vou parar por aqui porque os atributos negativos são muitos. O chato é reconhecido na primeira mirada ou na primeira frase que pronuncia. Outra característica relevante: como no caso dos gays, não existe ex-chato.  Chatice é incurável. 

Particularmente convivo civilizadamente com os chatonildos, mais do que isso, eu os atraio   e, assim,  até coleciono algumas histórias,  engraçadas ou não, mas sempre interessantes, sobre essa relação.  Muitas delas aconteceram na redação de Esportes de Zero Hora lá pela década de 80 do século passado. A equipe da editoria era da pesada, sob o comando do saudoso Emanuel Mattos e depois do meu outro guru, o Nilson Souza, que está bem vivinho para confirmar os causos.

Na época, as redações de jornais e a editoria de Esportes em particular exerciam um fascínio indescritível sobre o malario de todos os matizes - boleiros em fim de carreira, técnicos desempregados, gente dos esportes amadores pedindo espaço, mães e pais de atletas promissores, uma fauna, enfim.

A presença dos chatos proporcionava momentos hilários também. O queridíssimo Nilson Souza era vítima recorrente de uma brincadeira. O mala aparecia na porta da editoria e perguntava quem era o chefe. O pessoal apontava o Nilson, calvo e com tufos laterais de cabelos brancos, fazendo uma advertência;

- Fala alto porque ele é meio surdo.

E lá se ia o chato ancorar na mesa do Nilson, aos berros:

- O SENHOR É QUE É O CHEFE?

 Concentrado no trabalho, nas primeiras vezes o Nilson sempre levava um susto.

 - Não precisa gritar, meu amigo, que eu não sou surdo.

 Imaginem a cena: toda a redação parada, contendo o riso e esperando o desfecho da abordagem.

Porém, mais do que o Nilson, eu era vítima constante dos chatos de redação. O cara adentrava à sala, sem cerimônia, percorria todas as mesas e parava na minha, nos momentos mais inoportunos, trazendo as questões mais estapafúrdias e que não me diziam respeito.

Isso sem contar a minha coleção particular de chatos, que não é pequena. Acredito que tenho um temperamento afável  e, como já disse,  não hostilizo os vocacionados para a chatice, o que lhes passa a idéia de que sou receptivo aos seus papos e vou resolver seus problemas. Cria-se, então, um circulo vicioso: chato bem tratado vira reincidente e nunca mais larga do teu pé, aumentando gradativamente sua freqüência e suas demandas. O chato te adota.

Houve um período em que era visitado com assiduidade na repartição onde atuava por um sujeito com o qual trabalhei anos atrás. Não importa o que eu estava fazendo, ela sentava na minha frente e começava um diálogo, que respondia educadamente mas por monossílabos, sem que ele parasse de matraquear. Certa vez ele  se superou e, quase aos berros, me avisou da porta de entrada:

 - Tem um maluco aqui na porta querendo reformar o mundo. Como tem chato nesta vida, tu não achas?

 Era só o que me faltava: o chato criticando o mala amalucado.

O que me preocupava, entretanto, era que a atração que exerço sobre essa fauna pudesse ser um indicativo forte de que eu também era um deles. Mas logo afastei a idéia porque chato odeia concorrência de outro chato, como vimos acima. Prefiro pensar que eles grudam em mim em razão daquela lei da física segunda a qual os opostos se atraem.



sábado, 16 de maio de 2015

O novo JN



                                          JN mais informal

Gostei do novo formato do JN.  Americanizou o estilo, ficou mais  informal,  a gesticulação está na medida,  a troca de câmeras é  ágil, com os ancoras se movimentando no cenário e aquela janela para as externas traz um diferencial que, pro meu gosto,  funciona.  Parece que o repórter ou o correspondente estão ai, ao alcance de um aperto de mão. Em TV tudo é linguagem, o meio potencializa qualquer detalhe, por isso a proposta de colocar a externa na tal janela é uma forma de aproximação com os âncoras e, vale dizer, com os  telespectadores.

Gosto também da dupla Willian Bonner- Renata Vasconcellos.  Tem mas empatia que a dupla anterior, Bonner – Patrícia Poeta, talvez porque Bonner tivesse restrições a sua ex-partner e, acreditem, a telinha consegue passar até esse sentimento.  Só que as vezes na tentativa de serem mais informais escorregam em algumas bobagens, como  chamar a nova moça do tempo, Maria Julia Coutinho de Maju, ou tentar explicar porque eventualmente falam Beaga em vez de Belo Horizonte ou  Flópis.por Florianópolis.

A propósito,  a Maria Julia é um achado e falo com a sinceridade de quem era apaixonado pela Michelle Loreto. A morena está no clima do novo formato, apresentando as condições do tempo como se estivesse batendo um papo com a audiência. Mas é justamente na previsão do tempo que está o principal problema do novo JN.  O quadro ganhou em ilustração e perdeu em conteúdo.  O telespectador quer saber se vai chover, fazer frio ou calor, máximas e mínimas e a Maria Julia perde tempo com abobrinhas,  tipo informar o tempo na Chapada dos Veadeiros e nas ouras chapadas conhecidas, como ocorreu no outro dia. A quantas pessoas interessa esse tipo de informação?  Sei que o problema não é da apresentadora, mas de edição. Está na hora do editor-chefe Bonner intervir, caso contrário só vou dar crédito à previsão do Jornal da Band, que é mais detalhada e focada no que interessa.

Quanto ao conteúdo do novo JN vou dar mais um tempo para firmar convicção se está acompanhando essa fase de mudanças no visual.


terça-feira, 12 de maio de 2015

Sobre a Ipanema e outras rabugices

Cada vez mais me convenço que o Facebook é um antro de cinismo e dissimulação. O episódio do encerramento da rádio Ipanema, que vai virar Band FM, é simbólico desses comportamentos.  O cara  nunca ouviu a Ipanema ou  deixou de ouvir há séculos, mas  faz postagens lamentosas, jurando amor eterno ao estilo da rádio.  Pior são aqueles sabidamente adeptos do pagode ou do sertanejo universitário convertidos repentinamente em roqueiros ipanemenses.  Ou seja, nunca uma rádio foi tão falada e tão pouco ouvida. E o nosso bom Facebook é o melhor espaço para dar vazão a tais insinceridades.

Teve até empresário lamentando o fim da rádio, os mesmos que não colocaram  um reclame sequer na rádio em qualquer época (“não era o target dos nossos produtos”, é a justificativa), sem contar aqueles que realmente foram fãs da Ipanema lá na sua origem, mas que agora reclamavam do perfil de programação, mais flexível digamos, porém, clamam aos céus pelo “absurdo que está sendo cometido”. 

Fenômeno parecido ocorre quando morre algum luminar das letras, como foi o caso recente de Eduardo Galeano.  Gente que não passou nem perto das orelhas dos livros dele postou fartos elogios à obra do uruguaio, com direito a citações de As Veias Abertas da América Latina, o que não significa nada em termos de conhecimento do autor porque a Wikipédia está aí para ajudar os despossuídos intelectualmente. E vamos combinar que o Facebook, como o papel, aceita tudo.

Pode ser rabugice, mas é que realmente tenho pouca tolerância com os adesistas de ocasião, com os indignados  das causas de boiada, com os maria-vai-com-as–outras do mundo digital,  que nada acrescentam  aos debates,  pois o que buscam  mesmo é um mínimo de protagonismo em cima do tema da hora.

No caso da mudança Band x Ipanema  até me atrevo a entrar cautelosamente no mérito da decisão da empresa e o faço com a legitimidade de quem atuou por mais de 20 anos em rádio (quatro emissoras, três comerciais e uma pública)  e que tem no veículo seu meio de comunicação preferido.  Chamo  a atenção para a realidade do meio rádio, cuja onda AM está morrendo, embora resistindo bravamente no mercado de Porto Alegre com as rádios Farroupilha e Band. A emissora que  não se bandear para o FM, até que ocorra a  migração total para o sistema digital, está condenada a fenecer por falta de ouvintes.  A Gaúcha e a Guaíba já partilham a programação em AM e FM, além de outras plataformas, e a Farroupilha logo deverá fazer o mesmo. É o movimento que a Band, com sua competitiva programação jornalística, faz agora, preservando empregos  e espaços  em toda a rede, já que é o trem pagador das rádios.


A Ipanema faz historia, teve méritos, palmas pra ela, mas virou rádio de nicho e, assim, deixa a desejar na comercialização. E só quem não precisa faturar é rádio estatal porque estas todos nós pagamos para que continuem funcionando.   De mais a mais, a Ipanema não desaparece.  Apenas perde a frequência no dial e quem gosta mesmo de sua programação vai busca-la na internet. Já os oportunistas e falsos ipanemenses vão continuar buzzando no Face.

sexta-feira, 8 de maio de 2015

Desde os tempos das brizoletas

                                          A brizoleta

É verdade que todos os governadores que assumem as rédeas do Rio Grande reclamam que receberam um  Estado quebrado.   Mesmo Brizola , considerado um dos melhores governadores que tivemos, amargou um período de penúria financeira, tanto assim que passou a emitir as brizoletas e com elas honrava os pagamentos, inclusive os salários dos servidores. 

As brizoletas eram letras do Tesouro do Estado, que substituíam as cédulas do Cruzeiro, a moeda vigente,  e acabaram sendo assimiladas pela população no dia a dia.  Foi uma iniciativa ousada do jovem governador (36 anos à época) e um tempo de dureza para a população em geral e o funcionalismo em particular. Sei disso porque meu pai era oficial da Brigada (capitão, se bem me lembro) e penava para manter a ninhada de oito filhos.

Mas sobrevivemos às brizoletas  - que é até onde a memória alcança -  e a todas as intempéries que marcaram os governos posteriores. Dos governadores nomeados no período da ditadura, sempre dependentes do poder central, aos eleitos na redemocratização, cada um com sua crise, suas carências  e suas inúteis soluções. Todos certamente bem intencionados que conduziram o Rio Grande até aqui, sem que o trem descarrilhasse, apesar dos muitos  solavancos. 

Vale o mesmo para o Brasil, que sobreviveu às gastanças de JK, às  loucuras de Jânio, as confusões com  Jango, ao autoritarismo dos milicos no poder; sobreviveu até mesmo aos marimbondos de fogo do Sarney e à República de Alagoas de Collor, à mediocridade de Itamar,  a era FHC (teria quebrado o Brasil três vezes, segundo seus detratores) e agora aos 12 anos de Lula + Dilma com todo esse lamaçal que está aí.  E o Brasil e o Rio Grande resistem bravamente.


Sem aprofundar as causas das sucessivas crises locais e nacionais, até por falta de maiores conhecimentos, acredito que só há uma explicação para a longeva resistência do Estado e do País: Deus decidiu assumir a sua porção brasileira com extensão gaúcha.  Mas suspeito que fez uma ressalva: não se responsabilizaria pelos governantes que escolhemos. Aí deu no que deu. 

sexta-feira, 1 de maio de 2015

Personal funeral

As comodidades da vida moderna associadas  às agendas apertadas criaram os personals services: personal trainer, personal  stylist, personal  shopper.  Assim mesmo,  in english, como todos denominam tais serviços personalizados.  Pois conhecido amigo nosso acaba de criar uma nova modalidade customizada: o personal funeral.  Segundo a proposta, trata-se de um profissional altamente especializado em administrar possíveis conflitos naquela hora em que se pranteia o ente querido que foi para outro plano.

Nosso amigo tem razões de sobra para temer as reações de ex-parceiras,  eis que foi que um contumaz pulador de cerca, por assim dizer. “Tive uma vida incidentada”, afirma o safo, dando a entender que cada caso amoroso foi um incidente, num trocadilho de gosto duvidoso com acidente.

Agora ele imagina que duas situações podem ocorrer,  ambas com potencial de se transformarem em barraco durante o velório:  a presença de ressentidas que vão conferir se realmente desencarnou e a das que se realizaram plenamente na relação e agora vão dar o último adeus ao falecido.  Não descarta, ainda, uma terceira  categoria, a das que imaginam conseguir alguma vantagem material com a situação.  São as mais perigosas, mas mais difíceis de aparecerem,  acredita, uma vez que não há muito o que dividir.

Por via das duvidas, contratou previamente uma personal funeral a fim de fazer frente a todo e qualquer embaraço.  Sim, o perfil corresponde ao de uma mulher (“mulher com mulher se entende”),  amiga da mais absoluta confiança, que já foi devidamente brifada pelo futuro falecido e estabeleceu um rigoroso planejamento estratégico para a ocasião.

- Não quero que minha família sofra qualquer tipo de constrangimento quando eu me for, sentenciou o cliente, afetando gravidade na parte do “quando eu me for” e aparentando uma pontinha de arrependimento.

A personal funeral,  pessoa expansiva no dia a dia, mas muito despachada,  compenetrou-se de sua missão e até está capacitando outras duas amigas para ajuda-la na primeira empreitada e nas futuras.

- Uma delas vai cuidar das morenas e outra  das loiras.  Eu fico com a abordagem e assim vai funcionar nossa operação.

A abordagem, ensina a profissional, é o segredo de tudo, mas  o processo começa com a identificação da potencial ameaça;

- Moças e senhoras de óculos escuros, daqueles grandes,  vestidas de preto  ou com jeans colado no corpo, aí mora o perigo,  esclarece, abrindo o leque das que devem ser interceptadas.

- A pior situação é se aparecer com criança, ainda mais se a criança for parecida com o falecido,  acrescenta a personal funeral, mas faz questão de dizer que não é o caso do nosso amigo.

A estratégia para a abordagem é seguida à risca. A invasiva é interceptada bem antes de adentrar à capela mortuária e começa recebendo palavrar de conforto.

- Sabemos que o falecido tinha grande apreço pela senhora (todas são tratadas por senhora, independente da idade) e pouco antes de partir nos contou a linda história de amor que vocês viveram e foi quase como um ultimo pedido que tramitássemos o seu sentimento à senhora.  Mas esse é um momento reservado à família e gostaríamos que a senhora entendesse a comoção dessa hora ,enfim, evitando qualquer tipo de constrangimento...

A personal  funeral jura que a fórmula vai  funcionar, mesmo para a mais ressentida das ex. “A essas nós contaremos que o falecido  havia confessado seu arrependimento dos dissabores que lhe  havia causado.  Às outras prometeremos um ato especial só para as despedidas dela, em  outro dia. Depois do enterro, missão cumprida, elas vão esperar sentadas. “


Ao saber dos detalhes desse novo e promissor mercado de trabalho que se abre admito que fiquei curioso com o resultado pratico da ação, mas logo afastei  a ideia sinistra que implicaria o passamento do meu amigo. Pesando  bem  e conhecendo a vida pregressa de  alguns companheiros penso em propor sociedade à personal funeral.  A demanda vai ser tanta que acho que vamos enricar.