quinta-feira, 28 de junho de 2012

Um certo restaurante em Dallas e outras anotações


                      Hotel Melrose: treme-treme nos fins de semana

O repórter de campo anuncia no meio do jogo Grêmio x Flamengo:

- Vai entrar Matheus. Ele é filho de Bebeto e era o recém nascido saudado no gesto do “nana, nenê” pelo pai,  no jogo contra a Holanda na Copa de  94.

A informação foi suficiente para  voltar 18 anos no tempo e avivar minha memória, eu que era um dos tantos brasileiros presentes no velho estádio Cotton Bowl, de Dallas, e me vi torcendo descaradamente pela seleção do Parreira, contrariando minha índole de cronista esportivo sempre tão contido. Estava a serviço, pela Rádio Gaúcha,  e o jogo Brasil x Holanda, pelas quartas de final,  foi um dos dois únicos a que assisti ao vivo, em estádio em uma Copa, e que jogo! – o outro foi Arábia Saudita x Suécia, no mesmo Cotton Bowl, com Renato Marsiglia no apito.

1994: depois de coordenar quatro copas do mundo na retaguarda fui finalmente escalado para a Copa dos Estados Unidos.  Quase não cheguei lá.  No voo intercontinental , ainda no tempo da saudosa Varig, Varig, Varig tive uma  queda de pressão tão forte que pensei que ia retornar  ao Brasil num pijama de madeira, encoberto pelo pavilhão nacional e da RBS. Em frações de segundos passou o filme da minha vida e eu me desesperei só de pensar que não veria mais meus filhos.  O atendimento dos comissários, entretanto, foi eficiente e eu ainda contei com a assistência de uma verdadeira junta médica, um grupo de profissionais paulistas reunidos a bordo rumo a um congresso nos EUA.  Logo me recuperei, mas o companheiro de viagem e de uma jornada de 52 dias em Dallas não sossegou. A cada movimento meu, nos desconfortáveis bancos da classe econômica, o engenheiro Gilberto Kussler tinha um  sobressalto.  Mas sobrevivemos os dois.
Durante a Copa, convivendo a toda hora no nosso estúdio do Centro Internacional de Radiodifusão, em  Dallas , o nosso Giba, gringão de Casca, profissional dos bons, tanto assim que hoje presta serviços a rede Globo de rádios,  tinha, porém, momentos de rabugice especialmente quando eu escapava para fumar.  Mas quando os trabalhos se encerravam lá pelas 10 da noite,  era um grande parceiro para jantar e tomar uma cervejinha.

Numa dessas incursões noturnas descobrimos o London, London ,um restaurante ao lado do nosso hotel com uma comida maravilhosa, cerveja sempre gelada e atendimento atencioso.  Atencioso até demais, eu diria.  Já na primeira noite, o garçon perguntou se gostaríamos de ficar num lugar mais reservado. Recusamos a oferta e tratamos de comer, beber e, cansados da longa jornada, nos recolhemos logo ao hotel.  No segundo dia, voltamos ao restaurante e foi aí que notamos a estranha movimentação de casais do mesmo sexo nas mesas. Homem com homem, mulher com mulher em discretas mas intensivas confraternizações.  A essa altura o garçon já estava imaginando que o alemão Kussler e eu formávamos mais um casal gay. A verdade é que a comida e a bebida do London, London caíram no nosso gosto e, até pela conveniência  e pelo preço da refeição, continuamos a frequentar o local, se bem que evitávamos manifestações mais expansivas, mantendo sempre uma postura circunspecta, como convinha.
Nosso hotel era o Melrose,  uma construção vitoriana na entrada do bairro que lhe empresta o nome. O bairro de Melrose é uma espécie de mistura de Cidade Baixa com Bom Fim, zona boêmia de Dallas, de muita diversidade em todos os sentidos.  O hotel tinha um dos melhores bares do gênero em todos os EUA, frequentado pela fina flor de Dallas, mas nas sextas e sábados transformava-se num treme-treme pelas festas particulares e de empresas, que bloqueavam um andar inteiro para os executivos e suas acompanhantes.  Se aqueles corredores, elevadores e quartos falassem...

Minhas reminiscências daquela Copa   da estada no Texas me obrigam a voltar ao jogo Brasil x Holanda para afirmar, sem dúvida, que o juiz da Costa Rica garfeou o time laranja, não marcando pênalti de concurso do Mauro Silva.  Na real, seria uma injustiça perder aquele jogo épico, depois dos belos gols de Romário, Bebeto – o gol da cena do “nana,nenê” – e daquela falta cobrada pelo Branco, um canhonaço que garantiu a vitória.
À noite, as ruas centrais de Dallas foram invadidas por torcedores do Brasil e da Holanda,  estes com suas lindas loiras e homens de cabeleiras também loiras, numa saudável confraternização, regada a muita cerveja.

Hoje, passados 18 anos, pergunto aos mais ansiosos em relação às obras da Copa: quantos estádios os Estados Unidos construíram para o mundial de 94? Depois da hesitação do interlocutor, respondo: Nenhum! Os americanos deram um trato em seus velhos estádios, adaptaram para o futebol os campos destinados a outros esportes, enveloparam antigas instalações e, a agora exigente FIFA, não chiou na época, aceitando tudo em nome da abertura de um novo e promissor mercado para o futebol.
Em compensação, os aeroportos, a hotelaria,os outros serviços dos EUA...


sábado, 16 de junho de 2012

Sobre hienas e lobos

*Publicado originalmente em 16/11/09

Cansa este negócio de escrever sobre coisas ditas sérias. Por isso, decidi voltar às futilidades, para fazer um importante alerta: cuidado, muito cuidado, atrás de um lobo sempre vem uma hiena. A advertência nem é minha, mas do meu bom amigo LFA depois de ler a crônica Lobos em Ação, que cometi no ano passado e Coletiva.net se atreveu a publicar. Tenho boas razões para suspeitar que o próprio LFA seja um lobo disfarçado, daqueles que atacam em eventos musicais. Convém lembrar que os lobos são aquelas criaturas que, na busca de suas conquistas amorosas, atuam em locais e horários diferenciados, cercando suas presas com sutileza e determinação. Distinguem-se dos comuns mortais pelo gosto ao inusitado, pelo enfrentamento das adversidades, pela ousadia na ação e pela técnica refinada na abordagem. O maior risco que as mulheres correm com essa espécie é de terem suas expectativas atendidas, porque o verdadeiro lobo valoriza suas conquistas e quer fazê-las felizes.

Já as hienas são lobos fracassados. Elas bem que gostariam de ascender a condição maior, mas lhes falta finesse e, porque são hienas, ficam com as sobras. Alguns, de tanto viverem à sombra e no rastro dos lobos, acabam aprendendo e ocasionalmente podem se transformar em lobos juniores, mas jamais chegam a seniors e muito menos a masters.

A diferença entre as duas espécies não está na condição social ou em qualquer outro tipo de segmentação, mas na atitude. O lobo prima pela finura, a hiena é sinistra; o lobo é pacencioso, a hiena é afoita; o lobo é seletivo, a hiena está aí para o que der e vier. Mas não é justo afirmar que a hiena só tem defeitos. É ainda o LFA quem observa que, embora cheguem depois, nem por isso as hienas têm uma tática menos ofensiva e letal. Podem parecer desengonçadas, mas são resistentes, capazes de perseguir suas presas por muito tempo sem esmorecer.

É o caso da Hiena Eleitoral que só participa de caminhadas de partidos nanicos, mas suporta carregar bandeiras com mastros enormes sem jamais perder o alvo de vista. SCA. analista de sistemas, se encaixa neste perfil. A preferência pelos partidos menores e mais radicais se explica: ele entende que grupos reduzidos já estabelecem uma seleção natural para escolher a presa que vai ser atacada e acredita, ainda, que o radicalismo das moças pode se transformar em intensidade na hora do vamos ver.

VJB., que se apresenta como bacharel em direito, mas na verdade atua como despachante, é outra hiena típica. Ele até freqüenta as baladas mais descoladas, mas é traído pelo medalhão no peito, pelo vistoso anel de formatura, pelas cantadas sem rodeios e o resultado final é zero. Por isso, a esticada é nos festerês mais populares, onde é conhecido como a Hiena dos Bailões. Entre músicas do Sidnei Magal, Wando, pagodeiros românticos e vanerões modernosos, ele se sente em casa. Aí ataca com fúria. È dois pra lá, dois pra cá e ele já começa a percorrer a anatomia da vítima. Quando sente reciprocidade, vai direto ao ponto:

- Tá na hora da gente partir.

A Hiena dos Bailões garante que a cada duas dessas abordagens uma pelo menos funciona, o que determina que ele trabalhe em dobro para não terminar a noite invicto.

A hiena tem uma linguagem toda própria para se relacionar com suas vítimas, que podem ser honradas com expressões tipo “minha Deusa”, “Gatosa” , “minha Ídala” e outras meiguices do gênero. PNS., corretor imobiliário, prefere usar “minha Diva”, certo de que esse tratamento confere algum requinte as suas investidas. Ele é conhecido como “Hiena Bus Stop” porque seu habitat são as paradas de ônibus na região central, onde atua no final da tarde, à espera das moças que terminam seus turnos nas repartições públicas, bancos e comércio em geral. O elenco é numeroso e ele tem o cuidado de rejeitar as universitárias que se dirigem aos cursos noturnos porque sabe que vai ter poucas chances se a moça tiver que escolher entre o aprendizado e uma hienada. A hiena é hiena, mas não pra boba não serve.

A existência de lobos e hienas, cada um com seu estilo e forma de atuação, mostra como a natureza é sábia. Há espaço para todas as espécies, a convivência pode ser harmoniosa e uma complementa o trabalho da outra, de forma a contentar vítimas de todos os perfis.

*Publicado originalmente em Coletiva.net

domingo, 10 de junho de 2012

As brasileiras

Brasileiros em viagem ao exterior aprontam cada uma! Um exemplo recente: amiga do ViaDutra, em missão profissional pela Europa e Norte da África,  estabeleceu longa conversação com um interlocutor que julgava ser estrangeiro.  Só que ele falava um português fluente e ela respondia num inglês quase oxfordiano. Efeito do Jet leg da viagem recente.  A moça ainda se gabava para a acompanhante, falando em português:

- Viu, aquelas aulas particulares de inglês com a teacher Lu estão dando resultado: eu entendo tudo o que ele fala.
O interlocutor, um experiente consultor internacional, ouviu a observação e resolveu entrar na brincadeira:

- Sorry, but I’m brazilian!
Ao que ela respondeu, ainda em inglês;

- You must be joking!  I’m brazilian too!
(Perdão leitores: o english do ViaDutra is very bad!,mas a gente se esforça.)

E entabularam, com muita naturalidade, uma conversação de mais meia hora...em inglês, para pasmo da acompanhante, uma brasileira mais afeita ao francês.
Na volta ao Brasil, as duas moças preferiram se vangloriar do sucesso que fizeram num subdesenvolvido país do norte da África.  Até propostas de casamento receberam dos comerciantes. As propostas envolviam dotes de camelos, cabras e algumas sacas de tâmaras, o que, convenhamos, era uma muquiranagem. Consta que o marido de uma delas só não aceitou a oferta porque não teria onde hospedar os camelos e cabras...

O que elas não sabem é que aquele pessoal, comerciantes milenares, fazem qualquer coisa – até propor casamento – para vender suas bugigangas.  E as lambisgóias acreditaram!

quinta-feira, 7 de junho de 2012

Lobos nunca dormem - final

Recomenda-se ler a primeira parte, publicada dia 2/junho

Mais intelectualizado, V, professor universitário, investe fortemente na área de cursos, seminários e palestras, desde que os temas tratados possam atrair vítimas potenciais. É capaz de sacrificar o fim de semana em cursos de extensão só para alargar o horizonte de seus conhecimentos e seu currículo com o conquistador. No primeiro dia de aula escolhe a vítima e no último ela está dominada. E não tem qualquer restrição às temáticas de auto-ajuda. Raciocina, com boa lógica, que as mulheres interessadas neste assunto estão carentes de apoio, de um ombro amigo e ali está ele para suprir essa necessidade.

Curso do Lair Ribeiro, seminário com Roberto Shinyashiki, palestra do professor Marins, contam sempre com a presença do nosso amigo. Durante a exposição do palestrante, ele mostra grande interesse, anota frases e conceitos que considera importantes e serão seus argumentos depois, enquanto seus olhos, não de lobo, mas de águia, varrem o ambiente a procura das suas vítimas. Não demora muito e encontra a mulher ideal: é aquela desacompanhada que mantém os olhos vidrados no conferencista e aprova, com leves maneios de cabeça, tudo o que é dito. Uma mulher receptiva. No final, dá um jeito de encontrar a mulher visada e, com a maior naturalidade, propõe a conversa:

- Que conteúdos! Que clareza! Não achastes? Eu gostaria tanto de aprofundar essas idéias com outras pessoas...

Daí em diante o ritual não varia: trocam cartões e telefonemas, compartilham cafés no fim da tarde e jantares noite adentro, e logo estão compartilhando também a mesma cama, embora ele faça questão de dizer que o sexo é apenas uma etapa para chegarem a um entendimento superior sobre a condição humana nestes conturbados tempos pós-modernos.

O “Lobo Eleitoral”, J, é um capítulo à parte. Sempre atento ao calendário eleitoral, ele entra em êxtase neste período e se torna freqüentador assíduo de passeatas, bandeiraços, comícios, inaugurações de comitês, enfim, de qualquer ato público que possa reunir militantes femininas. É metódico e trata desde cedo de armazenar bandeiras, adesivos, bandanas, bottons de todas as candidaturas, até porque seu lema é “respeito à pluralidade ideológica e prazer para todas”. O “Lobo Eleitoral” tem uma preferência toda especial pelos comícios, o que tem sua lógica. O espaço é delimitado, é mais fácil cercar as futuras presas e o tom dos discursos, carregado de emocionalismo, é o mote que ele usa para a primeira investida. Funciona assim: ele chega cedo ao local, agitando a bandeira da candidatura e se posiciona onde constata a maior concentração feminina. Durante o comício, canta animadamente todos os jingles e é o primeiro a puxar o coro compassado com o nome do candidato. Aquela animação toda contagia as circunstantes e logo ele está interagindo com a militância.

- Sabe, guria, me emocionei com o discurso do nosso candidato. Presta atenção no que eu vou te dizer: assim não tem prá ninguém.

Não há como resistir a tanta devoção, tanto ardor cívico, tanto comprometimento com a causa, tanta certeza na vitória, e logo ele passa para a etapa seguinte:

- Puxa, acho que essa demonstração de cidadania merece uma comemoração. Vamos tomar uma cerveja ali no Mercado?

Depois, é só questão de incrementar a conversa, oscilando à direita e à esquerda, dependendo do matiz ideológico da vítima, ora ressaltando as virtudes do neoliberalismo, ora espinafrando o capitalismo selvagem, ora insinuando ligações com o pessoal da luta armada, ora condenando os “baderneiros dos movimentos sociais”. Por fim, o arremate:

- Na verdade, sou mesmo um liberal, no sentido da liberdade das pessoas, entende? Liberdade para tudo, compreende? Tenho o maior respeito por essa questão da liberalidade, da liberdade, as pessoas poderem fazer sexo com quem quiser, entende? A propósito, conheço um lugar...

O ato cívico-sexual vai se dar no seu apartamento, previamente ornamentado com motivos da coligação que está prestigiando na ocasião. Esse lobo nunca perdeu uma disputa eleitoral.

Especialistas que estudam o comportamento da espécie anotam a existência de outros tipos bizarros, alguns inclusive com slogans marketeiros. Exemplo é o “Lobo da Carris”, que atua nas alongadas linhas T e que garante: “Comigo não tem viagem perdida”. Registra-se ainda o “Lobo dos Estádios” (“antes do apito final, uma grande conquista”, vangloria-se), que não perde jogo nem no Passo da Areia e tem predileção pelas moças das torcidas organizadas; o “Lobo Bancário”, que ataca nas filas dos caixas e promete “crédito amoroso sem limites para todas”, o “Lobo das Manifestações”, uma variação do “Lobo Eleitoral”, auto-intitulado “Ativista do Amor” e que não renega nem caminhada do MST. Por fim, o mais bizarro de todos, o “Lobo de Velórios”, que se anuncia às enlutadas como ‘um conforto no momento da dor”. É muita cara de pau. Acreditem, eles existem e estão por toda a parte.

*Publicado originalmente em Coletiva.net

sábado, 2 de junho de 2012

Lobos nunca dormem

* O início da saga dos lobos conquistadores começou aqui no ViaDutra em 12 de novembro de 2009, quando o blog recém engatinhava. O tema rendeu, tanto assim que já tivemos quatro postagens revelando a forma de agir dessa ativa alcatéia. Na base do vale a pena ler de novo, aqui está a primeira potagem que, como as outras, apresenta situações inspiradas em fatos reais.

Lobos nunca dormem. Suas vítimas indefesas podem ser atacadas a toda hora e em qualquer lugar e são poucas as que resistem às investidas. Deixemos de lado os lobos que atacam nas academias e nas baladas, locais que favorecem a interação entre as espécies. Esses são lobos manjados, indolentes, indisponíveis para novos desafios. Lobo que se preze, lobo mal intencionado mesmo, ataca em lugares e horários inusitados, cercando progressivamente suas vítimas, quase sempre travestido de cordeiro, até dar o golpe final.

C. advogado, bem de vida e de casamento, é um exemplo. Todas as quartas-feiras ele assume sua porção lobo e sai à caça nos supermercados. Ele varia de estabelecimento para não dar na vista, mas o perfil das suas vítimas não se altera muito: mulheres maduronas, de boa aparência e sem aliança nos dedos – ou seja, solteiras ou descasadas. A estratégia para a abordagem também não varia muito. Assim que escolhe a presa, aproxima-se e pergunta, com o semblante mais inocente do mundo:

- Sabes onde eu posso encontrar sabão em pó?

Pode ser detergente para louça, água sanitária, amaciante de roupa, mas sempre um produto que passe a idéia de um homem afeito às lidas domésticas, vivendo sozinho e atrapalhado com esse universo. As mulheres dificilmente resistem ao perfil de homem maduro numa fase de carência, que é o personagem que, afinal, nosso amigo encarna.

Dependendo da ocasião, nosso causídico muda de tática. Ele é fascinado, por exemplo, por mulheres que consomem produtos orgânicos. Por isso, fica na espreita próximo à gôndola desses produtos, esperando uma vítima. Assim que surge alguma que se encaixa no perfil pré-definido, parte para a abordagem:

- Com licença, tu sabias que na Europa já predominam os produtos orgânicos?

E emenda um ecopapo capaz de fazer inveja aos ecochatos, mas, diferentemente destes, sua conversa é vivaz e convincente, discorrendo sobre o aquecimento global, a diferença entre light e diet, os efeitos perversos dos agrotóxicos na produção de alimentos – e firma posição contra os trangênicos. “O que será das futuras gerações? O que será dos nossos filhos?”, costuma exaltar-se, acentuando o nossos, o que já é uma insinuação. As mulheres ficam maravilhadas com tamanha erudição ecológica que, a bem da verdade, exige tempo de pesquisa, um investimento que ele considera que vale a pena para os fins a que se propõe.

A primeira abordagem não é problema, mas o segredo está no segundo momento, aquele que encarreira a conquista. E nesse aspecto nosso amigo é imbatível. A tática dele consiste em prolongar a conversa e em seguida fazer um convite:

- Conheço uma loja de produtos naturais que tu vais amar. Podemos dar uma escapada lá, se quiseres.

Da loja ao convite para um jantar especial na casa da moça, com pratos natureba, é um passo e aí a história segue seu curso natural. Missão cumprida!

S, economista, ataca em outro cenário. Conhecido como “Lobo de Livraria”, é entre best sellers e um bom sebo que ele fareja suas futuras presas. Escolhe sempre as que usam óculos, porque entende que o adereço lhes dá um ar de intelectual, mas faz também uma pré-seleção pelo gênero de obra que interessa à moça. Se elas estiverem folheando livros de Martha Medeiros ou Lya Luft, ele trata de se aproximar com a mesma obra na mão e lança a isca:

- Já leste Trem Bala? Achei fantástico!

- Já leste O Silêncio dos Amantes? A Lya Luft se superou!

Em seguida a conversa deriva para os temas recorrentes nas duas autoras: as angústias e anseios da mulher moderna, suas frustrações, o amor, o desamor e a paixão, perdas e danos – enfim, tudo o que passe a idéia de um homem sensível e conhecedor da alma feminina. Para reforçar seus argumentos, assiste ao Saia Justa e se diz fã da Márcia Tiburi, embora secretamente tenha uma queda pelo estilo mais maternal da Mônica Waldvogel. A conversa é irresistível. Não foram poucas as ocasiões em que a troca de impressões se completou na cama, após o embate amoroso.

Quando a vítima se mostra interessada em livros do David Coimbra, nosso amigo não tem a mesma fineza, pois considera que as leitoras do cronista são “mais saidinhas”. Aí vai direto ao ponto:

- Conheço o David e tô louco para contar para ele uma história picante sobre tu e eu...Topas?

Ele jura que a abordagem funciona. Não perde tempo, porém, com mulheres que compram livros de Paulo Coelho, pois acha que terá conversas muito aborrecidas. Mas em relação a Dan Brown reconhece o mérito desse escritor, não como valor literário, mas como argumento para suas investidas.

- Já lestes Anjos e Demônios? Recomendo: é melhor do que O Código Da Vinci.

(continua)