sexta-feira, 30 de janeiro de 2015

Nossa TVE

* Artigo publicado em Zero Hora, página 33, nesta data

Entre tantos assuntos candentes deste tórrido janeiro surpreende que a TVE figure como fonte de debates e polêmica.  De um lado questiona-se a suspensão do edital para a produção de séries para TV, devido à falta de previsão de recursos para as contrapartidas; de outro critica-se a drástica redução orçamentária da Fundação Cultural Piratini, o que inviabilizaria boa parte das produções das suas emissoras, a TVE e a FM Cultura.  Na raiz dos problemas está a precária situação financeira do Estado, a exigir sacrifícios de todos os seus órgãos.

Entretanto, o debate não se esgota  na dificuldade financeira, que é episódica, nem envolve o uso político dos canais, como em passado recente.  Questiona-se agora a própria vinculação das emissoras à estrutura estatal, sob a alegação de que  não é função do Estado manter veículos de comunicação. Uma posição que não leva em conta experiências bem sucedidas de canais públicos, como a PBS nos EUA, a BBC inglesa, a TVE espanhola e mesmo a TV Cultura-SP.

Diferente do amigo e confrade David Coimbra, acredito firmemente que as emissoras públicas têm papel relevante a desempenhar. No caso da TVE e da FM Cultura, o de expressar  toda a diversidade e riqueza  da cultura gaúcha, dos concertos da Ospa aos eventos tradicionalistas, da literatura às produções audiovisuais e de dramaturgia, do Carnaval ao Hip Hop, com espaço para a cidadania, a educação,  programas infantis, e até para a  informação e o debate, por que não?   O Rio Grande precisa se ver e ser visto na TVE, a quem cabe exibir o que as emissoras comerciais não mostram porque estão focadas no entretenimento para as grandes audiências.

Foi o que busquei construir nas minhas três passagens pela Fundação, duas delas como presidente. E é na condição de quem se sente comprometido com o futuro da instituição que confesso o quanto me dói cada vez que ouço que só os governos do PT valorizaram os dois veículos, enquanto as outras administrações só querem sucateá-los e forçar sua privatização, mais uma besteira recorrente.  A verdade é que cada dirigente que por ali passou  deu o melhor de seus esforços, mesmo diante das adversidades,  para que se consolidassem como inalienáveis emissoras públicas dos gaúchos. 

Conhecendo  a atual presidente, a jornalista Isara Marques, profissional experiente,  com liderança e comprometimento diante dos desafios propostos, tenho absoluta certeza de que ela  conseguirá dar a volta por cima e fazer da TVE e da 107,7 verdadeiras expressões da nossa cultura e patrimônios de todos nós. Especialmente se contar com a mobilização dos servidores e o apoio do Conselho e de seu público – que não é massivo, mas é fidelíssimo.


quinta-feira, 29 de janeiro de 2015

As 10 pragas modernas da nação amiga

No livro do Êxodo encontra-se uma das mais dramáticas histórias relatadas pelo Antigo Testamento: as 10 pragas do Egito.  Existem divergências quanto a data, mas foi mais de um século antes de Cristo quando o deus de Israel escolheu Moisés para liderar a  saída do povo hebreu do Egito, onde era escravizado. O Faraó da época (Ramsés?), como todo poderoso autoritário e insensível, negou os pedidos de Moisés para que deixasse o povo partir. Diante disso, o Senhor enviou dez sinais, dez pragas que assolaram o Egito, um recado para mostrar ao Faraó quem era mais poderoso.

As pragas começaram com todas as águas do Egito convertidas em sangue; em seguida surgiram rãs em todos os lugares; depois vieram infestações de mosquitos e moscas; na sequencia, os animais ficaram pesteados e as cinzas se transformaram em ulceras nas pessoas e animais; a sétima praga foi uma chuva de pedras e a oitava uma nuvem de gafanhotos que dizimou as colheitas; por fim fez-se escuridão no Egito e, derradeira crueldade divina, todos os primogênitos do país, inclusive de animais e do próprio faraó foram sacrificados. É o que dá brincar com o poder que emana dos céus, embora o perverso efeito das pragas contrarie o conceito, modernamente aceito, de um Deus acima de tudo misericordioso. Mas aí já é outra história.

Como é outra história também o épico bíblico Êxodo: Deuses e Reis, filme dirigido por Ridley Scott, que mostra a chegada das pragas ao Egito e o momento que o Mar Vermelho se abre para Moisés, interpretado por Christian Bale, num papel que fora imortalizado por Charlton Heston em Os 10 Mandamentos, de Cecil B DeMille, rodado em 1956.

Resgates bíblico e cinematográfico a parte, me ocorreu que uma nação que conheço pode estar sendo vítima de flagelos modernos, 10 pragas que são a resposta das divindades à praga maior, a Rainha Corrupção, que reina soberana no tal país como um faraó da antiguidade, corroendo os valores da população.

Há quem entenda que as pragas que assolam o povo do país amigo começaram a evoluir cerca de 12 anos atrás, quando assumiu o poder um grupo de servos que ascendeu socialmente.  Houve grande euforia com a nova ordem, euforia que se transformou em frustração com o fortalecimento da Rainha Corrupção e o advento das pragas, uma a uma, a atormentar o populacho, como se fosse um castigo por terem aderido aos novos poderosos.

Então, começou a faltar energia e luz nas casas, nos espaços públicos  e empresas (praga  1); depois escassearam as águas nos mananciais das grandes cidades (praga 2); e, como nunca antes, o pais foi assolado por grandes temporais (praga 3),  que provocaram inundações, prejuízos materiais e vitimas (praga 4);  proliferaram doenças que deviam estar erradicadas como a Dengue (praga 5);  a violência urbana recrudesceu (praga 6), devido em grande parte à disseminação das drogas que criaram as chamadas Cracolândias (praga 7) em praticamente todas as cidades; a poluição ambiental passou a ser uma séria ameaça no campo e na cidade (praga 8) e a desordem da economia (praga 9) acabou sacrificando ainda mais a população.  Por fim, supremo castigo: o futebol, paixão nacional, foi humilhado em competição mundial, sofrendo impensável goleada para nação de outro continente (praga 10).

Em alguns casos a analogia entre as pragas egípcias e os flagelos modernos é inevitável, como se a história se repetisse em forma de tragédia e farsa, lembram Marx? As pragas envolvendo águas, por exemplo; as trevas egípcias e os apagões no país amigo; a chuva de pedras e os temporais atuais, com chuvas de granizo e muitos raios.  Bem, chega de abrir essa versão moderna  da Caixa de Pandora, até porque o coitado do povo,  diferente dos hebreus confinados no Egito, não tem para onde escapar.




domingo, 18 de janeiro de 2015

Não sou Marco Archer

Uma pesquisa feita agora não apenas aprovaria a execução do traficante brasileiro na Indonésia, mas também diria "sim" à pena de morte no Brasil. Fiz esta postagem no Facebook e o resultado foram dezenas de curtições, não sei se contra ou a favor da execução e da pena de morte, se bem que os comentários mostraram-se majoritariamente favoráveis à punição. O mesmo comportamento pode ser constatado nas postagens em outros perfis.

No noticiário dos principais portais a constatação é mais dramática: grosso modo, mais de 90% dos comentários torciam pela execução do brasileiro, mesmo em terras distantes.  Não só torciam, mas em alguns casos integrariam o pelotão de fuzilamento, se isso fosse possível, tudo na base do “mata e arrebenta”. Tal nível de rejeição, beirando o ódio, afronta nossa tão decantada matriz de gente cordial e generosa, da qual falava Sergio Buarque de Holanda.  

Acabou sobrando para a presidente Dilma, que apenas cumpriu seu papel de estadista e buscou interceder pela vida do condenado. Um gesto inútil e desgastante, mas necessário, mesmo para uma governante já fragilizada. Como bom brasileiro, o assessor para assuntos internacionais da presidência, o gaúcho Marco Aurélio Garcia admitiu que esperaria até a última hora por  um jeitinho que livrasse o brazuca traficante. Acredito mesmo que a posição da presidente só aumentou a adesão à decisão da Indonésia, até pelo fato de ser um país que leva a sério o cumprimento das suas leis.

A pergunta que não quer calar é: por que tanta intolerância diante de um condenado à morte? Marco Archer Moreira - este é o nome -, até tem jeito daquele tio amigo ou do vizinho boa praça, preso ha  ais de dez aos e confessadamente arrependido, estaria a merecer clemência dos indonésios e um mínimo de nossa solidariedade. Mas que observamos é um clamor pela execução. O caso não está fora do contexto do complicado momento que vivemos, de comoção provocada pelos episódios de Paris, aos quais se associam as denuncias de corrupção por aqui e o massacrante cotidiano de violência e insegurança geradas pelo tráfico de drogas. Estaria eu a misturar alhos com bugalhos? Pode ser, mas estou convencido que a banda boa da população, na verdade, não tem ânsia punitiva, mas sede de justiça. Não é um sim à intolerância, mas um não à impunidade.


Particularmente, não concordo com a pena de morte, nem mesmo para traficantes, mas não sou Marco Moreira, assim como não há o que justifique os massacres de Paris, nem mesmo uma charge grosseira e antirreligiosa, por isso sou Charlie Hebdo.

terça-feira, 6 de janeiro de 2015

No lucro

Tô no lucro.  Chego aos 6.5 lépido e faceiro, ativo e operante, a cabeça a mil, sem queixas de dores aqui e ali, eterno aprendiz e fazendo projetos para o futuro.  Envelheço com dignidade, sem exageros, mas com alguma extravagancia de vez em quando que é para temperar a vida.

Não enriqueci, nem fiquei famoso, mas tenho uma linda família, me orgulho dos filhos bem criados e das netas a mil, e já contabilizo mais de mil amigos, pelo menos no Facebook.  Também desfruto da convivência de vários e fiéis amigos na vida real, amizades que celebramos em frequentes confrarias.


A verdade é que já entrei naquela fase de não comemorar, mas sofrer aniversário, eis que a contagem regressiva já começou. Se  bem que é melhor sofrer com as demonstrações de carinho e consideração dos amigos, mesmo que os mimos estejam rareando ano  a ano.  Enfim, tô pronto para novas empreitadas.  Como diria aquele veterano treinador de futebol: vocês ainda vão ter que me aturar.