domingo, 29 de agosto de 2010

Pequeno conto que virou crônica: Ícones que se vão

Ao abrir o jornal, ele levou um susto. O restaurante discreto que costumava freqüentar com ela havia incendiado. A notícia não esclarecia o que provocara o fogo, mas a foto do jornal dava dó. O charmoso local estava agora transformado em um monte de cinzas e escombros. Era mais um point de referência no histórico amoroso deles que se ia, no compasso do desgaste do caso. Ele achava, pela seqüência de episódios, que havia relação de causa e efeito.

Começou com aquele motel da primeira noite, quando ele conseguiu finalmente convencê-la a transar e se jogou sobre ela com a fúria da tesão acumulada por meses de tentativas. O mesmo motel, talvez a mesma suíte, serviram para uma das reconciliações, tempos depois. O carro dele estragara e, ao se encontrarem num coquetel, ele pediu carona que no meio do caminho foi desviada para o motel. Ela protestou timidamente quando ele propôs o desvio, mas seguiu para o motel. Lá chegando, discutiram a relação e depois se entregaram aos jogos sexuais.

Ainda freqüentaram aquele motel uma ou duas vezes, mas o estabelecimento já apresentava claros sinais de decadência. Uma noite tiveram que desistir do local, não da transa, porque a suíte a eles destinada aparentemente estava sediando um ritual de luzes e som e sabe-se lá mais o que. Dias depois, as máquinas colocaram tudo abaixo, com direito a placa de Vende-se. Cada vez que ele passava pelo local era tomado por uma pontinha de nostalgia.

A mesma nostalgia estava presente quando ele avistava o terreno repleto de entulhos, onde outrora fora um dos mais conceituados motéis da cidade e outra das alternativas para os encontros deles, a caminho de casa. Cada um seguia no seu carro e era só ele, no carro da frente, sinalizar que iria entrar no motel para ela vir atrás. Às vezes ela ligava pelo celular e dava a senha:

- Caliente? (era esse o nome do estabelecimento)

Gostavam de transar no Caliente, que agora era mais uma fase que se extinguia.

Releu a notícia do jornal e começou a lembrar as noites que jantaram, beberam a trocaram confidências no bar agora destruído. Foi ali, numa mesa externa, que ela declarou que o problema da relação é que ela gostava muito dele. Ele entendeu que ela não queria levar adiante o caso, mas não podia mais voltar atrás. Foi ali também que foram flagrados por um grupo de colegas, eles que primavam pela discrição. Foi ali, no começo de tudo, que retomaram o relacionamento, depois de um período de incertezas.

Outra baixa foi aquele restaurante de nome latino que freqüentavam eventualmente e que, sem aviso prévio, havia fechado as portas. Foi num almoço nesse restaurante que ele tentara uma reaproximação depois de mais um desencontro. Mas a empreitada foi mal sucedida e a conversa derivou para as idas dela ao dentista e as bolhas no pé que o incomodavam na ocasião. Discutir a relação com uma pauta dessas não podia dar certo mesmo.

E havia ainda aquele bar simpático e tradicional na cidade, perto do local onde ela trabalhava que, em dúvida, escolhiam para se encontrar. No início, consideravam tudo muito bom: o atendimento, o ambiente, a comida e o chopp bem tirado. Mas, assim como a relação deles, o local foi se deteriorando, até que mudou de dono, sem resgatar a qualidade dos primeiros encontros. Ou eram eles que haviam mudado e já não viam mais aquele bar com brilho nos olhos e a generosidade dos neo-amantes? O certo é que pouco depois, o local apresentava uma placa de Aluga-se.

O pensamento voltou-se novamente para o bar incendiado e a perda afetiva que isso representava. Afinal, era um ícone no relacionamento deles, tanto assim que foi o local escolhido para a última conversa que tiveram e que ficou marcada como fim de caso. Mas aí já é outra história. O que importa é que todos os sinais alertavam para o desfecho traumático de uma relação que se sustentava só na atração sexual. Deu no que deu.

quarta-feira, 25 de agosto de 2010

Estamos em obras

Por indicação do grande fotógrafo Eurico Sallis decidi trocar a cor do fundo do ViaDutra. Sinceramente, fiquei em dúvida com o resultado...

terça-feira, 24 de agosto de 2010

Ameaça Terrorista, o filme



Um dos melhores filmes de 2010 ficou inédito no circuito cinematográfico. Trata-se de "Ameaça Terrorista", um thiller psicológico que capturei na locadora sem muito entusiasmo. Não me arrependi: "Ameaça Terrorista" é suspense do começo ao fim, sem aquelas correrias dos filmes de ação que tratam de conspirações anti-americanas.

A sinopse padrão dá conta de que, ainda traumatizado pelo 11 de setembro, os EUA não podem baixar a guarda. Na trama, o país enfrentará um filho de sua própria nação, Younger (Michael Sheen), que se converteu ao islamismo e armou três bombas atômicas em diferentes cidades americanas. Apesar de Younger ser facilmente localizado e preso, ele não dá as coordenadas de onde as bombas estão. É quando entram em cena o investigador H (Samuel L. Jackson) e Helen (Carrie-Anne Moss) uma agente do FBI, que terão que pressionar o terrorista para descobrir a localização exata das bombas, numa corrida alucinante contra o tempo.

A sinopse, na verdade, passa ao largo da intensidade do filme dirigido pelo australiano Gregor Jordan. "Ameaça Terrorista" mostra que o fanatismo religioso não tem limites, como não tem limites as formas de enfrentamento das situações que colocam a nação americana em perigo. Ação e reação, uma se justificando pela outra, dependendo de que lado venha a versão. Os fins justificam os meios, ainda mais se o argumento, de um lado, é de que está em jogo é a segurança do país, e de outro, que os americanos devem pagar em vidas humanas os males infligidos aos países do Islã.

Vale detonar bombas em shoppings ou arrasar cidades inteiras com artefatos atômicos. Vale executar a mulher do suspeito e até mesmo torturar seus filhos para obter a informação desejada. São as cenas mais fortes do filme, quase todo ambientado num cenário claustrofóbico de uma câmara de torturas.

"Ameaça Terrorista" revela ainda a desarticulação entre as agências de segurança dos EUA e destas com o Exército, que ganha um papel mais relevante na luta anti-terror. As sucessivas trocas de comando durante a operação são outro produto do bate-cabeça entre os americanos. Será apenas ficção ou dramatização da realidade?

Ao fim e ao cabo, o que fica é que o confronto está longe de terminar. Os atentados de 11 de setembro e a retaliação intervencionista americana resultaram em feridas incuráveis, gerando intolerância de parte a parte. Agora mesmo, a construção de uma mesquita nas proximidades do Marco Zero, local das torres gêmeas, tem provocado manifestações prós e contras. Apesar do apoio do presidente Barack Obama e do prefeito de Nova Iorque, Michael Bloomberg, cerca de 70% dos americanos mostram-se contrários à iniciativa. É bem verdade que manifestações dessa natureza seriam impensáveis em países como o Irã. E fico por aqui, antes que se voltem contra mim, um mero observador da cena e grão de poeira nesse complexo universo.

sexta-feira, 20 de agosto de 2010

A tribo dos fumantes, a polêmica

A jornalista Jandira Feijó é uma das melhores cabeças que conheço. Íntegra até a medula, talentosa, inquieta e uma grande parceira profissional e dos espaços tabagistas. É nestes que, solidários no vício, temos nossos melhores papos. Repicando o artigo “A tribo dos fumantes”, publicado aqui como desabafo de um quase pária da sociedade, a Jandira traz uma contribuição ao debate que não é pouca coisa. Na verdade, trata-se de um libelo de uma mente privilegiada diante da chatice politicamente correta que tenta nos marginalizar. Confira.

"Não daria muitas desculpas, porque, como dizem por aí, “explicações não são necessárias para os amigos e os inimigos não acreditam nelas”. Iria direto ao ponto.

Fumamos porque nos dá prazer, porque nos viciamos, porque talvez tenhamos neurônios de menos ou porque alguns de nossos genes carreguem de forma intensa alguma herança ancestral.

Isto! Gostei desta última hipótese. As perguntas sem respostas nos perseguem de modo muito forte, elas latejam em nós sem que a gente consiga racionalizar. Assim como os homens das cavernas ainda não sabemos o que fazemos aqui, o que é a vida, de onde viemos, para onde vamos.

Necessitamos incontrolavelmente introjetar um pouco de fumaça para suportar o peso desta dúvida existencial.

Isto não nos retira a condição de humanos. Ao contrário. Nos confere muito mais humanidade. Somos sensíveis, frágeis, falíveis e não temos vergonha de assumir este lado meio “emo”.

Admitir tal condição deveria nos assegurar o respeito da sociedade. Entretanto, em algum momento da história alguém conseguiu dividir o mundo entre os politicamente corretos e os meros mortais. Pronto! Foi o que bastou para sermos segregados sem dó nem piedade.

De integrados passamos a apocalípticos. Cidadãos de segunda classe.

Defendo a tese de que somos vítimas de um grande assédio social.

Bullying mesmo!

Uma pressão que tenta afetar nossa auto-estima, que quer reduzir nossa produtividade, que nos imputa uma culpa tão grande quanto a que Igreja quis que carregássemos com o tal pecado original.

O que me angustia é que estamos nos acovardando, quase acreditando na verdade única dos politicamente corretos, dos não fumantes ou, o que é pior, do ex-fumantes histéricos que renegam seu passado. Meu amigo, isto não pode prosseguir assim. Temos que reagir! Nós que lutamos pela democracia, pela liberdade, pelo direito de expressão não podemos sucumbir facilmente a esta perseguição implacável de uma sociedade hipócrita. Senão vejamos: quem se habilita a deixar de recolher impostos e reduzir empregos com a indústria fumageira e tabagista?

É bem verdade que os mal intencionados usariam meus argumentos para justificar outros vícios – socialmente aceitos, como o álcool, e os ilícitos, como o crack! O que eles – os chatos – não compreendem é que não fazemos apologia aos vícios. Somos viciados e viciado que se preze não tenta trazer ninguém para este caminho. Já concordamos em não fumar perto de quem não fuma. Já abrimos as janelas para fumar, já não fumamos nos vôos, nos aeroportos, nos postos de gasolina. Ok, agora chega, né?

Não sei contigo, mas comigo ocorre o seguinte. Acender um cigarro ao invés de ser ríspida, dar uma tragada enquanto conto até mil, fumar simplesmente enquanto “queimo minhas ilusões perdidas” (esta frase maravilhosa é do Mário Quintana) só traz benefícios para as relações em sociedade. Me deixa mais tranqüila, mais tolerante, mais compreensiva. Aliás, por falar em compreensão, não existe pessoa mais solidária do que um fumante. Quando um fumante nega um cigarro a outro fumante? Nunca! Pode ser um completo desconhecido. A empatia é automática. Você compreende o que o outro sente sem que seja preciso dizer uma única palavra!

E fogo? Alguma vez você soube que algum fumante negasse fogo para que outro fumante possa acender seu cigarro? Jamais! Todos sabemos a intensidade do sofrimento de quem está numa situação horrorosa como esta. Tu podes estar no maior sufoco, correndo para não perder um ônibus. Alguém te pede fogo e na hora tu paras! Que gesto mais bonito, solidário, humano! Como é que podem nos condenar de forma tão vil???

Um último exemplo de boa conduta. Fumantes compreendem que alguns queiram deixar de fumar. E não os perseguem, dizendo: “como assim deixou de fumar???” Nada disso. Fumantes respeitam as decisões dos outros. E respeitam tanto que quando resolvem parar de fumar, o fazem com humildade, sem grandes pretensões. Dizemos: “estou sem fumar” e não: “parei de fumar”. Até nisto somos cuidadosos. Sim, porque se dissermos: “parei”, dois segundos depois de ter uma recaidinha logo tem um patrulheiro de plantão pra cobrar: “Como é que é? Voltou a fumar? Mas não tinhas parado?”.

Não quero quotas Flávio! Quero ser como Voltaire e defender até a morte o direito que eles têm de dizer o quê quiserem, mesmo que não concorde com eles. Seria bom se os não-fumantes também defendessem este direito, não te parece?

Abraço, Jandira"

segunda-feira, 16 de agosto de 2010

A tribo dos fumantes


Claro que sei: faz mal à saúde, incomoda quem está perto, deixa budum de tabaco no ambiente e nas roupas, mas peço um momento de reflexão sobre o vício de fumar e alguma compaixão com a tribo dos fumantes. A primeira questão é a seguinte: se fumar não fosse prazeroso a gente já tinha abandonado este vício maldito. Lembro a advertência feita pelo médico, um renomado profissional, que me tratou na primeira das seis vezes em que deixei, momentaneamente, de fumar. Perguntado se já tinha experimentado cocaína, ele - especialista no tratamento de todas as formas de drogadição - sentenciou: “Não, porque eu posso gostar”. Bingo, é assim que funciona: o prazer leva ao hábito que leva ao vício, que dá prazer, etc, etc.

Se essa argumentação não convenceu, vamos tentar de outro modo. A segregação cada vez maior a que somos submetidos, produziu na nossa confraria um sentimento de solidariedade que não se observa em outros segmentos, ainda mais nestes tempos de culto ao individualismo. E essa solidariedade tem que se encarada com um valor positivo. Você já viu fumante negar cigarro a outro fumante? Experimente compartilhar dos encontros de fumantes: a conversa flui, a harmonia está presente e às vezes até pinta uma paquera (eu fora!) pelo número cada vez maior de mulheres que se juntaram à confraria. E se tem mulher na parada, deve ser bom.

O Paulo Sant’Anna, um fumante mais compulsivo que este que vos fala, tratou com muito mais propriedade e talento, em crônica mais antiga, da discriminação a que estamos submetidos. E já que estamos falando em discriminação a uma minoria, desafio nossos legisladores a criarem um sistema de quotas para fumantes. Não tenho a mínima idéia de como funcionaria, mas é certo que queremos o mesmo tratamento dispensado as outras minorias. Quotas já! Fumante unido jamais será vencido!

E, por favor, não me entendam mal: não estou fazendo a apologia do vicio, apenas quero ser deixado em paz com meu cigarrinho, minhas reflexões entre uma tragada e outra e meus momentos de solidariedade com os companheiros de infortúnio.

quinta-feira, 12 de agosto de 2010

Enfrentando o telemarketing

Como a maioria dos brasileiros, tenho sido atormentado com freqüência pelas moças do telemarketing. As ofertas são as mais variadas possíveis: acessíveis planos de consórcios, créditos ilimitados em instituições financeiras, cartões de crédito com vantagens nunca vistas, tentadoras propostas de operadoras de telefonia e por aí vai. Invariavelmente as ligações ocorrem aos sábados pela manhã, ou seja, agora já estou mais preparado para o enfrentamento.

- É a residência do Sr. Flávio Antonio Vieira Dutra? Ele está?

O nome completo denuncia mais um ataque das moças. Um momento de hesitação e acabo enredado na metralhadora oral das telemarqueteiras.

- Para sua segurança, nós estamos gravando essa ligação. Tudo bem?

O “tudo bem”, com a vozinha anasalada, consegue me irritar mais do que a catilinária que vem a seguir, sempre acompanhada do “tudo bem, Sr. Flávio?”. É assim que a autora do telefonema invasivo faz um esforço para se manter condescendente e simpática, mas o resultado, pelo menos para mim, tem o efeito contrário. Sou tomado de uma santa ira e fico a um passo de esganar o telefone, já que não posso fazer isso com a moça do telemarketing. Consigo, porém, manter a civilidade e , no limite, evitar as grosserias.

Só que de nada adiantam os sucessivos “ não” às propostas, porque as moças, bem treinadas, são insistentes e as vítimas de bom coração, como eu, acabam ficando com sentimento de culpa por causa das tantas negativas. Sinto como se estivesse tomando o tempo das moças que estão ali, afinal, desempenhando honestamente sua função. Imagino que depois de tantas rejeições durante o dia elas acabem necessitando assistência psicológica.

Com tempo, evitando deprimir ainda mais as moças, desenvolvi alguns estratagemas para cortar a conversa logo no inicio.

- Este sujeito não mora mais aqui, informo à primeira pergunta.

- O senhor teria algum telefone para contato com o Sr. Flávio? Insiste a moça.

- Não, não tenho e se a senhora descobrir nos informe porque também estamos atrás deste sem-vergonha, replico.

Depois de dois ou três segundos de silencioso pasmo, seguem-se o pedido de desculpas e o agradecimento constrangido da moça.

Outra opção, mais radical:

- O coitado do seu Flávio morreu na semana passada. Se tiveres um tempinho conto como aconteceu.

Dou uma longa fungada e já emendo uma história surreal sobre o meu triste passamento. Mesmo a mais bem treinada atendente fica sem ação diante daquela conversa non sense.

Seguem-se pedidos de desculpas, etc. etc.

Às vezes consigo pressentir que o telefonema – quase sempre no mesmo horário - é para me oferecer algo que não quero, não preciso e não pedi, e saio na frente:

- Crematório da Metrópole, às suas ordens.
- Desculpe, mas esse não é o número do Sr. Flávio? Indaga a moça, já sestrosa.
- Não é mais, agora é do Crematário. A senhora, por acaso, estaria interessada em algum dos nossos planos?

A conversa termina por aí. Juro que me dá um remorso.

Liderança política de minhas relações, adota outra estratégia infalível. Ouve pacientemente a proposta da moça e, revelando algum entusiasmo, responde:

- Tudo bem, agora me dá o telefone da tua casa que à noite te ligo para saber mais detalhes.
- Mas eu não trato desses assuntos em casa, esclarece a moça.
- Eu também não, e dava por encerrada a ligação.

Claro que todos reconhecemos que o telemarketing é um grande gerador de empregos e cumpre seu papel no sistema produtivo. Mas a insistência das moças afronta a paciência de qualquer um. E tem ainda aquele “tudo bem?” e aquela vozinha anasalada. Haja paciência.

segunda-feira, 9 de agosto de 2010

Nem pijama, nem chinelos

Definitivamente sou um pessimista e um mau julgador dos meus entes queridos. Imaginava – e escrevi – que deveria receber ou chinelos ou pijama como presente do Dia dos Pais. Até já estava me acostumando com a idéia, levando em conta que tanto chinelos como pijamas tem sua utilidade para um senhor de hábitos caseiros como eu. Mas fui surpreendido pelos meus queridos filhinhos e pela minha santa parceira de mais de 30 anos - afinal sou um pai para ela e não vai aí qualquer conotação freudiana.

Graças a santinha, minha coleção de canecas foi acrescida de um novo exemplar, saudando minha condição de super vovô, que vale também como uma advertência de que preciso assumir essa nova postura, cheia de limites físicos e comportamentais. Da neta Maria Clara recebi uma camiseta customizada com uma grande estampa em que apareço segurando a pequena – ela já com olhar esperto e eu com cara de babão.

Dos filhos veio um abrigo bem transado, com o qual vou desfilar garboso nas minhas caminhadas de fim de semana no calçadão de Ipanema e usar nas cada vez mais raras sessões de academia. (É bem verdade que eu havia insinuado o interesse em ganhar um novo abrigo de presente, mas isso é detalhe).

Recebi, ainda, da pretendente à nora uma preciosa carga de cervejas pretas, alemãs legitimas, que pretendo degustar em alguma ocasião especialíssima. A moça já sabe como me agradar. Tem futuro na família.

Enfim, foi um Dia dos Pais como nunca antes, exceto pela grana preta que gastei no almoço em um restaurante de excelentes comida e serviço, mas preço salgado.

Quanto a outras manifestações relacionadas à croniqueta “Dia de ganhar chinelos e pijama”, quem não é bruxa não tem o que temer...

domingo, 8 de agosto de 2010

Recomendo



O britânico Terry Eagleton é o conferencista do Fronteiras do Pensamento, nesta segunda-feira, às 19h30, no Salão de Atos da UFRGS. O tema é polêmico: Ateismo e a Guerra a Terror. Imperdível.

sexta-feira, 6 de agosto de 2010

Dia de ganhar chinelos ou pijama




Confesso que não tenho muito saco para essas datas comemorativas, tipo Dia das Mães, dos Pais e Dia da Criança. A partir do momento em que se tornaram mais um evento comercial do que um tributo aos homenageados, tais comemorações perderam sua dimensão afetiva. Nada contra o comércio, que precisa fazer a roda da economia andar, mas não abro mão de decidir se participo ou não da festa e com quê entusiasmo será minha adesão.

Até porque novas datas comemorativas estão surgindo, todas com grande apelo emocional e sendo estimuladas pelo setor produtivo. O Dia dos Namorados já está consolidado, fazendo a alegria das floriculturas, dos restaurantes e dos motéis. O Dia da Mulher vai na mesma direção e já há quem advogue a criação do Dia do Homem, uma vez que outras opções já estão contempladas no Dia do Orgulho Gay.

Há um forte movimento para implantar o Dia do Amigo que, por enquanto, se resume ao envio de mensagens piegas entre aqueles que se julgam amigos do peito. Está pintando com força o Dia dos Avós e logo a meritória homenagem vai se transformar em obrigação de comprar presentes para os vovozinhos. Menos mal que posso ser beneficiário dessa obrigação,se bem que ainda vai levar algum tempo até que Maria Clara tenha discernimento para presentear seus avós queridos.

É preciso tomar cuidado com os exageros. Conheço o caso de marmanjos que até hoje recebem presentes pelo Dia da Criança. Observo também um esforço, inclusive de escolas, para introduzir entre nós o Halloween, o Dia das Bruxas, uma tradição anglo-saxonica que nada tem a ver com a nossa cultura. Só vou aderir se puder mandar um bouquet de espinhos para algumas bruxas que me atormentam no dia a dia.

E tem ainda essa forçação de barra para instituir o Dia da Sogra. Com todo o respeito à categoria, que nos legou nossas amadas parceiras, a figura da sogra ainda é estigmatizada e temo que, ao invés de homenagens, as respeitáveis senhoras sejam objeto de agravos de parte de genros e noras ingratos. Isso sem contar que podem surgir idéias como a criação do Dia dos Ex que pode englobar um naipe diversificado de figuras: ex-marido, ex-mulher, ex-sogra, ex-patrão, ex-amigo.

Antes que vire um ex-qualquer e para que não fique a impressão de que sou um rabugento em tempo integral, admito que estou ansioso pelo presente que vou ganhar dos meus filhinhos. A dúvida é: chinelo ou pijama?

terça-feira, 3 de agosto de 2010

Almas pequenas

A pequenez humana não tem limites. O ato bom, o gesto generoso, o enlace afetivo se transformam em maldade, oportunismo e desafeição sob a ótica da mesquinhez. Não basta mais ser bem-intencionado e agir com integridade porque esses valores nada significam diante dos pobres de espírito que nos julgam não pelo que fizemos, mas pela miúda compreensão que tem da realidade.

Belos projetos são desqualificados após um simples mas. “È bom, mas...” e aí cabe toda a série de torpedeamentos, alguns até sustentáveis, mas a maioria por conta do humor momentâneo ou da má vontade intrínseca dos críticos de tudo e de todos. “Engenheiros do Não”, segundo sintética e apropriada definição do ex-prefeito Fogaça.

A mídia está infestada dessa gente do contra, do nada presta , ou da bancada dos diferentes porque é isso que dá Ibope. Ou ainda dos que se escudam em questionáveis isenção e independência para fustigar, sem dó nem piedade, quem não reza pela sua cartilha. E ai de quem ouse desafiar esses deuses das opiniões definitivas.

Vale mesmo para os ingratos, incapazes de reconhecer uma bondade. Os ingratos nos frustram em nível pessoal, por isso a ferida que provocam é maior. Os do contra são mais nefastos porque estão em toda a parte e nos bombardeiam a toda a hora com sua onipotência.

Tanto um como outro merecem o nosso desprezo e vai chegar o dia em que serão desmascarados. (Tenho que maneirar um pouco, sob pena de ficar contaminado pela raivosidade desse pessoalzinho).

A todos, lembro que não é preciso ter sensibilidade de poeta para entender o recado de Fernando Pessoa no verso imortal: "Tudo vale a pena se a alma não é pequena."

domingo, 1 de agosto de 2010

Confrades, poupanças e consórcios

Uma das tantas confrarias que freqüento reúne, em almoços ou jantares, um grupo de pessoas de reputação tida como ilibada. São profissionais liberais, jornalistas, servidores públicos, empresários, enfim, gente madura e da melhor qualidade. Ocorre que nos últimos encontros gastronômicos, entre a sobremesa e o cafezinho, tenho ouvido revelações surpreendentes sobre as artimanhas que os companheiros de mesa tem adotado para consolidar potenciais conquistas amorosas.

Um deles, abonado financeiramente, decidiu fazer uma poupança, com a qual espera atrair uma colega que sabidamente está com dificuldades para pagar as contas. O ardiloso faz até um levantamento semanal à moça.

- Nossa poupança já esta em 3,5 mil e agora vou depositar mais 500, garante ele à pretendida.

Não se sabe se a poupança é verdadeira, mas a cada prestação de contas os olhinhos da jovem brilham. Entretanto, nosso amigo reconhece, algo resignado, que o resultado final até agora é zero.

-É uma pena, porque nem quero ter um caso com ela, mas apenas poder espalhar, justifica o investidor mal-sucedido.

Se nada der certo ele vai destinar a poupança a uma instituição de caridade, numa demonstração de que no fundo é um bem-intencionado.

Outro confrade, com menos potencial econômico, está montando um consórcio para fazer frente a uma deusa que, pelo relato dele, vale cada cota. O confrade só não explica como se dará o acesso e a partilha do cobiçado prêmio: sorteio, leilão, maior lance? (Cheguei a pensar num primeiro momento em me associar ao consórcio, mas logo desisti da infeliz idéia). Arrisquei perguntar se a jovem já sabia das intenções dele e a resposta foi tão surpreendente como o processo:

- Isso é detalhe. O que vale é o jogo, a disputa!

Um terceiro companheiro, já sessentão, revelou a estratégia que pretende usar para conquistar uma colega de trabalho que vem adulando há tempos. A cantada que está elaborando é tão inacreditável que pode até funcionar:

- Querida, já estou pensando em pendurar a camisinha e escolhi alguém muito especial para compartilhar este momento histórico. Tu és a escolhida!

Na minha santa ingenuidade, fiquei chocado com as revelações. Sequer imaginava que os considerados confrades fossem capazes de tais vilanias. Acho que estou precisando selecionar melhor minhas companhias...