*Publicado nesta data em coletiva.net
A Páscoa que vem aí será
mais triste do que o significado da própria data para os cristãos, que relembram o sacrifício de
Jesus Cristo na cruz . Já vou esclarecendo que este não é um texto sobre religiosidade, muito menos uma
profissão de fé, apenas a rememoração de
um tempo em que a Páscoa era celebrada em grande estilo e o que isso
representava para minha geração.
Podem me chamar de velho
saudosista. Assumo e confesso. Confesso mais: era a minha festa religiosa preferida, porque, além
dos mimos de chocolate, desfrutávamos do maior feriadão escolar. Começava na
quinta-feira e incluía até a segunda-feira, na chamada Pascoela (o
prolongamento da Páscoa), pelo menos nas escolas religiosas, como o marista
Rosário, onde eu estudava.
O inconveniente é que não
se comia carne vermelha, a abstinência, e os peixes de então eram cheios de
espinhas, acho que para forçar a gente a ser
comedido nas refeições, seguindo a recomendação católica para jejum (nada a ver com o jejum sugerido agora por
Bolsonaro) e sacrifício no período pascal. Não respeitar essas tradições era
pecado - será que mortal? - e podíamos ser condenados à danação eterna no
inferno. Vade retro satanás.
Nas igrejas, as imagens
dos santos eram cobertas de tecido roxo e só descobertas no domingo, quando, segundo relato dos
evangelistas, Jesus Cristo ressuscitou dos mortos. Fui pesquisar e soube que o
roxo é uma das cores da quaresma, porque teria sido em panos dessa cor que
Cristo foi coberto quando levado à cruz. Até hoje tenho minhas reservas com o
roxo pela associação inevitável com
sacrifício e morte.
As rádios só tocavam réquiens,
no máximo musica orquestrada, e os apresentadores caprichavam ainda mais na
locução em tom grave. É bem verdade que ainda não existiam as barulhentas FMs.
Os cinemas reexibiam “os filmes de romanos”. Assim eram genericamente
conhecidos entre a garotada épicos como O Manto Sagrado (com Vitor Mature,
Oscar de canastrice), Rei dos Reis, Bem Hur, Quo Vadis, Os 10 Mandamentos,
entre outros. As tvs preparavam
programas especiais ou também apelavam para os mesmos filmes antigos que, à época,
nem eram tão antigos. Nas famílias,
falava-se em voz baixa em respeito ao morto ilustre e também não era
incentivada qualquer tipo de confraternização.
Eis que chegava o domingo
e a alegria voltava. Era o renascimento em forma de chocolates, mesa farta no
almoço em família, podíamos até beber um pouco de vinho misturado com água e a
contrição de antes era substituída por saudáveis algazarras, pelo menos entre a criançada. E a vida seguia seu curso.
Quero minha Páscoa
saudosa de volta, mas se a pandemia não permitir que a mensagem do renascimento
da festa cristã esteja presente como um manto de esperança sobre todos nós, tão
frágeis neste momento. Por uma Páscoa de
esperança redentora, roguemos com fervor.
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