* Publicado nesta data em coletiva.net
Estive duas vezes na
China, isso bem antes do surgimento do Covid-19. Acompanhei primeiro o
então prefeito José Fogaça em 2008 para
o Congresso Mundial de Cidades, em Nanjing,
e depois José Fortunati em 2010
para a Expo Xangai, a grande feira mundial que teve a participação de Porto
Alegre. Nas duas oportunidades houve ainda uma esticada até Suzhou, cidade irmã
da capital gaúcha.
Os dois roteiros não me tornaram um expert em China, mas os
depoimentos e as observações que colhi durante os 15 dias de estada lá me
autorizam a afirmar que o chinês é um
negociante sem escrúpulos. Exemplos não faltam, um deles envolvendo brasileiros,
no caso churrasqueiros importados daqui. O chinês adora os assados à brasileira
e contratavam nossos churrasqueiros para as redes de restaurantes que se
expandiam pelo país. Na visita à Suzhou, inclusive, verificou-se uma forte demanda por know how para
implantação de churrascarias à gaúcha,
já que as lá existentes deixavam a
desejar para os agora exigentes
paladares chineses. Pois bem,
depois de absorver todos os macetes dos
brasileiros na preparação das carnes, os patrões davam um pé na bunda do assador
e tocavam a operação com os aprendizes locais, pagando menos, é claro. É bem
verdade que o imigrante logo encontrava outra colocação, porque a demanda para
essa mão de obra não parava de crescer.
Um exemplo de dimensão
maior: Suzhou carecia de projetos de tecnologia e inovação e foi buscar a expertise de Singapura para a implantação
de um distrito industrial, que atraiu as 500 maiores empresas mundiais e que o
governo local faz questão de mostrar com orgulho, para inveja dos visitantes terceiro-mundistas como nós. Depois de assimilarem o modus operandi
de Singapura, os chineses dispensaram o parceiro e montaram um parque
industrial de alta tecnologia como espelho do primeiro, que não foi desativado,
mas colocado em concorrência e complementariedade com o novo.
Mesmo no comércio do dia
a dia os chineses revelam seu milenar perfil de negociantes. Lembro
da experiência inesquecível de se aventurar no
comércio informal. Os visitantes são abordados nas ruas por todo o tipo de
ofertas, com destaque para os relógios Rolex – com pouquíssimas chances de
serem verdadeiros. Esse comércio informal, tolerado pelo governo, é acessado
através de corredores muito suspeitos, em prédios ao lado do comércio
legalizado. Mas aparentemente não se correm riscos. O negócio dos chineses é
vender. Lá dentro encontra-se de tudo: relógios em profusão, roupas com
etiquetas copiadas de todas as marcas, malas e bolsas simulando as mais importantes
grifes e eletrônicos para todos os gostos.
Além dos produtos de grife e dos
copiados/falsificados, funciona ainda uma terceira linha, na verdade, segunda, que os produtores
das afamadas marcas disponibilizam, consentidamente, num lote sem etiqueta para o comercio local, extraído da escala
gigantesca de produção a ser distribuída mundo afora.
Não é preciso retroceder
tanto para mais um exemplo. Recentemente, a compra já acertada pelo governo
brasileiro de produtos chineses para o enfrentamento da pandemia, ficou sem
efeito porque os americanos se atravessaram e, com uma proposta superior a
nossa, levaram o lote. Inimigos, inimigos, negócios à parte.
A exposição do
questionável modo chinês de operar nos negócios não autoriza, porém, a endossar
as suspeitas de que o vírus que agora atormenta a humanidade foi criada
deliberadamente pela China para abalar a economia das grandes potencias e
promover a ascensão do pais à primeira posição mundial. As redes sociais estão
repletas de denúncias a respeito, com fatos e dados pouco confiáveis, como
seriam também os números do impacto do Covid-19 em território chinês. Há fortes
suspeitas sobre a manipulação desses números, além do retardamento da
divulgação pública sobre o surgimento do que seria a pandemia. Até por isso, em determinados círculos o coranavírus é chamado de Vírus Chinês.
Na verdade, o que reforça
as teorias da conspiração em curso são
outros fatos, como a declaração do presidente Xi Jinping no recente Congresso
do Partido Comunista: ”Chegou a hora do nosso país liderar o mundo!”, o que vem
se materializando, na prática, por
investimentos maciços em países ocidentais. É provável que Deng Xiaoping, pai da China
moderna, comunista-capitalista, já estivesse prevendo esse salto futuro, quando, ao suceder Mao, liberou a
economia, permitindo o ressurgimento do setor
privado e descentralizando as decisões para as autoridades locais, tudo
embalado pelo mantra “não importa a cor do gato desde que cace ratos”.
Puro pragmatismo,
associado a outra característica deste gigante oriental, que também constatei
nas visitas ao país: o planejamento. As ações são planejadas para um horizonte
de no mínimo 30 anos ( Xiaoping começou a virada em 1978...) e isso, mais a mão
de obra intensiva, pouco ou nenhuma resistência
do povo às intervenções urbanas, articulação entre o poder central e os
governos locais e recursos financeiros abundantes, fazem as coisas
acontecerem na China. A receita se completa com muito trabalho, determinação e
disciplina, valores que fazem parte da cultura chinesa.
O exercício que se impõe
agora é imaginar como será este mundo dominado pelos novos senhores. Pensando bem, não será muito diferente do atual, pelo menos para nós
brasileiros, que consumimos os manufaturados chineses e os eletrônicas
especialmente e em profusão. A China é o principal destino das exportações brasileiras e quem mais exporta para nosso país. Na
América Latina, o comércio dos países com os chineses duplicou nos últimos anos
em comparação com a década anterior. O capital chinês marca presença em áreas
estratégicas como a da energia e sensíveis como a de operadoras de TV. Os
crescentes investimentos chineses na região levaram o secretário americano de Defesa a fazer uma
advertência: “ Existe mais de uma maneira de perder soberania neste
mundo...isso pode ocorrer por conta de
países que chegam com presentes ou empréstimos”.
De minha parte nada mais me
arrisco a prever. Pensaram que ia me atrever a uma análise geopolítica? Sou apenas um observador do cotidiano e não um
especialista em relações internacionais. Só o que sei é que o Eduardo Bolsonaro
não vai se dar bem com a consolidação do novo status dos chineses por aqui. Já
eu, antevendo oportunidades, vou me
inscrever num curso de mandarim.
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