quarta-feira, 14 de outubro de 2009

Meio ambiente entra na agenda da China

Para não dizerem que só escrevo bobagens, aí vai um texto, digamos, mais denso, publicado originalmente na última edição da revista Ecos:

O jovem diplomata chinês que acompanha a missão da Prefeitura de Porto Alegre em Xangai (novembro de 2008) suspira de saudade quando lembra, com seu sotaque marcadamente lusitano, o azul dos céus brasileiros, ele que serviu no Rio e foi contagiado pelas belezas e a cultura do nosso país. Xangai, com seus 14 milhões de habitantes, transformada em imenso canteiro de obras para a ExpoXangai 2010, reforça as razões de Jiang Chen para evocar o azul celeste do Brasil, em contraste com o que observamos aqui. É um dia claro de outono, mas Xangai, como todas as grandes cidades chinesas, está coberta por uma densa névoa - a poluição atmosférica, já integrada a paisagem urbana, grande parte resultado do frenético ritmo da construção civil.
Xangai pulsa no compasso da nova China, onde as mudanças têm sido tão dinâmicas e aceleradas, a partir da ascensão do grupo de Deng Xiaoping ao poder, que a economia tem crescido a incrível média de 10% ao ano. As reformas introduzidas, após a era Mao e a Revolução Cultural, catapultaram um dos países mais miseráveis do mundo à condição de segunda potência econômica mundial. Graças a isso, nos últimos 25 anos, mais de 400 milhões de chineses foram tirados da miséria e passaram a integrar o mercado de consumo.
O crescimento econômico da China, com o aumento da demanda por energia, impuseram um preço e quem mais pagou foi o meio ambiente. Ao que parece a modernidade ainda não chegou, por exemplo, às minas de carvão, cuja extração estabelece uma cadeia de insalubridade e poluição intermináveis. As condições de saneamento, especialmente no interior, são precárias e mesmo nos grandes aglomerados urbanos possuir banheiro privativo em casa, com vaso sanitário e instalação hidráulica, agora é sinal de status, como bem relata a ex-correspondente da Rede Globo na China, Sônia Bridi, em seu livro Laowai (Estrangeiro). Não se tem informações adicionais confiáveis sobre o destino e o tratamento dado ao esgotamento sanitário. Relatório do Banco Mundial mostrou que 16 das 20 cidades mais poluídas do planeta ficavam na China, que é o segundo maior emissor mundial (14%) de gás carbônico (CO2), atrás apenas dos EUA (23%). Outro dado preocupante diz respeito ao uso abusivo das águas e a profusão de represas que estão secando os rios do norte.
Entretanto, já é possível observar sinais de mudança nesse quadro. A China, que até 2007 negava sua posição entre os poluidores mundiais, passou a mostrar preocupação diante de seus dados ambientais alarmantes, reconheceu sua contribuição para o cenário atual e lançou uma série de iniciativas para reduzir os impactos no meio ambiente. Destaque para o compromisso de melhorar em 20% sua eficiência energética e obter até o ano que vem 10% de seu consumo de energia de fontes renováveis. O plano de proteção ambiental de cinco anos, aprovado pelo Conselho de Estado da China, colocou o controle e a prevenção da poluição no foco do governo. Os dados disponíveis (2006) indicam que esse esforço se traduziu num investimento histórico de 34,2 bilhões de dólares no controle da contaminação ambiental, ou 1,2% do PIB chinês.
Como o motor da nova China chama-se “planejamento estratégico” – o horizonte futuro tem 20 anos – a esperança é que os investimentos e planos para enfrentar a poluição, que continua grave, se consolidem e se ampliem nesse horizonte. É a mesma esperança que move a população da província de Jiangsu na recuperação integral do lago Taihu, Trata-se do terceiro maior lago de água doce da China e o manancial hídrico mais importante de Jiangsu, onde se localiza Suzhou, cidade irmã de Porto Alegre. O lago fornece água também para Xangai e foi cenário de recente desastre ecológico. Uma espuma verde, causada por reação bacteriana à poluição, literalmente asfixiou as águas do Taihu, comprometendo o abastecimento a mais de um milhão de pessoas.
Na passagem da missão de Porto Alegre por Suzhou, o primeiro compromisso agendado pelas autoridades locais foi exatamente uma visita ao Taihu. O objetivo foi mostrar, orgulhosos, mais do que as belas rochas calcáreas ali encontradas em grande quantidade, os resultados dos esforços dos governos locais e central na recuperação da qualidade da água do Taihu, que já apresenta melhorias visíveis. Foi um processo com direito, inclusive, a ativismo ecológico, ainda incipiente, mas presente nas manifestações contra a contaminação do lago.
A verdade é que às águas do Taihu readquiriram sua tonalidade original, diferentemente dos céus das grandes cidades chineses, que ainda estão longe de permitirem mirar o azul que povoa os sonhos do jovem diplomata Jiang Chen.

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