quinta-feira, 31 de julho de 2014

O fingidor

Comecei a trabalhar aos 17 anos e lá se vão mais de 45 anos. Cruzes,  agora que fiz as contas é que vi como o tempo passou. Minha inquietude me levou a sempre buscar novos horizontes, novos aprendizados (o pessoal gosta de falar em novos desafios) e com isso nunca fiz carreira por onde passei e foram tantos os empregadores que tenho até medo de contabilizar todos eles.

As exceções talvez fiquem por conta das passagens pelas rádios Guaíba e Gaúcha, sete anos e um pouco em cada uma. O rádio sempre foi minha paixão, daí porque tenha ancorado mais nesses dois empregos, ainda mais que lidava com o esporte, outra paixão.  Apesar de ser recordistas de entradas e saídas da RBS – cinco vezes, saindo sempre por iniciativa própria – nunca recebi o reloginho e o troféu entregues pela empresa aos jubilados, que começam a ser agraciados com 10 anos de firma.  Isso não é motivo de frustração, nem de mágoa com a empresa.  Na verdade, sempre me orgulhei das empresas onde trabalhei, a maioria do ramo da comunicação.  E quando a relação não estava a contento, picava a mula.

Trabalho é meio de sustentação, mas é também caminho para realização profissional, é aprendizado permanente e forma de convivência, de novos e duradouros relacionamentos, que, afinal, é o que fica e o que se leva dessa vida.


Por isso é tão difícil a despedida, mesmo para quem já passou por esse processo inúmeras vezes.  Pode não parecer, mas sou uma pessoa emotiva, contida mas emotiva. E cada despedida é um suplício porque exige desapego, deixar para trás relações e afetividades que talvez não se repitam.  Eu devia estar acostumado, mas não adianta. É preciso sair, mas querer ficar  e essa esquizofrenia é torturante, mesmo para a pessoa mais calejada. Fico moído de emoção.  Pelo menos, com o tempo,  tenho conseguido fingir melhor, a exemplo do poeta descrito por Pessoa, “um fingidor; finge tão completamente que chega a fingir que é dor a dor que deveras sente”. 

Para que não pensem que tem só melancolia nas despedidas, deixem que lhes diga que graças ao mais recente episódio minha adega se renovou em qualidade e quantidade. Obrigado aos que assim me mimosearem. O sagu aqui de casa está garantido por um bom tempo.

Um comentário:

  1. Tenho certeza que fizeste carreira por onde passaste, meu nobre colega e amigo. Uma carreira que valorizou antes de tudo, a fidelidade, o respeito e a autonomia profissional. Isso conta pontos e faz criar sempre novas amizades e muito mais do que isso, propostas de trabalho, em espaços às vezes inéditos. E sei muito bem que serás "caldável" neste mercado da comunicação por muitos e muitos anos. Por enquanto, boas caminhadas à beira do Guaíba, para assegurar quilos de sagu sem culpa.

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