sexta-feira, 25 de março de 2022

Nossa Porto Alegre

* Publicada nesta data em coletiva.net

O brasão da Capital gaúcha ostenta em destaque os dizeres leal e valerosa cidade de Porto Alegre que muita gente associa à adesão à causa Farroupilha na revolta contra o Império.   Ledo engano. Porto Alegre ganhou esse título justamente pelo seu apoio aos imperiais. A cidade foi invadida em 20 de setembro de 1835 a partir da ponte da Azenha sobre o Arroio Dilúvio, onde se deu o primeiro combate entre os cerca de 100 rebeldes contra as forças imperiais que defendiam Porto Alegre. 

Sem apoio da população e sem condições de expandir a guerra a partir da Capital, os farrapos tiveram que abandonar a cidade em junho de 1836. Depois da retomada pelos legalistas, Porto Alegre enfrentou mais três sítios, mas a mui leal e valerosa resistiu ao assédio rebelde merecendo, por isso, o título concedido pelo Imperador.

 Viria daí, dessa resistência à rebeldia, tudo às avessas, uma forma de irredentismo de Porto Alegre, impregnada na sua gente e aculturada com o passar do tempo. Uma esquizofrenia de quem ama sua cidade de forma envergonhada, antes é preciso desqualificá-la, potencializar seus defeitos e minimizar suas virtudes, mas ai do forasteiro que ousar falar mal dela. É um cotidiano feito de rabugices por grandes e pequenas causas, de negações ao novo, de contrariedades ao diferente, embora o porto-alegrense se ache culturalmente evoluído, politicamente esclarecido e receptivo à diversidade, seja ela qual for.  

No entanto, parece que o povo age contraditoriamente assim para purgar – ou confirmar? -  uma culpa atávica pelo oficialismo e oposição diante do movimento farroupilha. Não há orgulho em ser mui leal e valerosa. A tese é do meu amigo, o jornalista e escritor, Gustavo Machado e sou tentado a concordar com ela. 

Mas Porto Alegre que já foi a Cidade Sorriso hoje procura uma nova identidade, diferente daquela que lhe impôs o PT em 16 anos de gestão, com apelos ao popular e ao participativo que só se efetivavam nas instâncias e mecanismos devidamente aparelhados.  Esse modelo chegou a encantar por um tempo, mas se esgotou como todas as propostas que mais dividem do que buscam o bem comum.

 

A cidade tem muitos atributos, mas nada que se sobressaia e não defendo o por do sol ou o Laçador como marcas-símbolos porque não é isso que faz a identidade de uma metrópole. É algo imaterial, que revele alma da cidade e maior do que a bela manifestação da natureza ou o portentoso monumento. Houve um tempo em que se tentou o conceito Multicidade, mas não pegou.  O que pegava era o Porto Alegre é Demais, dos versos de Fogaça, que o Zaffari resgata todos os anos, mas que não podia ser adotada oficialmente.  A questão esteve em aberto e agora, quando a cidade celebra seus 250 anos, a iniciativa do Pacto Alegre proporcionou que uma consulta pública escolhesse, entre três opções, a proposta Horizontes,  com o conceito para a marca-símbolo de  “Porto Alegre para se encontrar”. 

É uma forma de reconhecimento à Porto Alegre acolhedora, desde que aqui aportaram os 60 casais açorianos – hoje convivem na cidade originários de 17 etnias. É também um convite à convergência para o que é de  interesse publico, de valorização dos espaços e de atratividade aos visitantes. Isso vale para os investimentos na orla, novos cartões postais da Capital, que, entretanto, vem recebendo criticas oportunistas e de ativistas que perderam suas bandeiras. Alegam que só Centro Histórico é contemplado – como se isso fosse pouco - e não a periferia, desconhecendo a origem da maioria dos frequentadores dos espaços, especialmente nos fins de semana. Na falta de outros argumentos, apelam para a xenofobia e torcem o nariz para  o nome dado a uma das áreas, homenagem  ao autor do criativo projeto, o paranaense Jaime Lerner, ou, ainda, que os espaços têm concreto demais e árvores de menos, opinião reveladora de quem não circula por ali.  

O caso da orla e aí incluo as contestações feitas ao bem sucedido empreendimento do Embarcadero no Cais Mauá, é apenas um exemplo de tantos outros que receberam um olhar enviesado e manifesta má vontade na avaliação do que passaram a representar para a Capital. Ser do contra é preciso. 

Com a autoridade de quem é porto-alegrense há 72 anos proclamo que está na hora de deixarmos de ser a Cidade do Mas, a Pequenópolis de alguns, a Caranguejópolis de outros, a Rabugentópolis de todos nós, e voltarmos a ser, quem sabe, a Cidade Sorriso como preconizou Nilo Ruschel, quando assim a batizou nos seus programas radiofônicos nos idos do século passado.  E voltar a ser não seria retrocesso, mas avanço. A verdade é que a minha Porto Alegre precisa se redescobrir. Que a celebração dos 250 anos seja um marco nesta virada.

 

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