terça-feira, 22 de março de 2022

Nas mãos do destino

*Publicado em coletiva.net em 21/03/2022

Presidência da República é destino . Acreditava que a frase fosse de Ulisses Guimarães, mas já soube de outras autorias, como Tancredo Neves. O que importa é que a tese contida na frase se confirmou, por exemplo, com a eleição de Dilma Roussef, em 2010. Até ser ungida por Lula para concorrer a sua sucessão, apesar do nariz torcido de parte do PT, dona Dilma não havia disputado sequer uma eleição para síndica. Mas Dilma estava no lugar certo, na hora certa e tinha um padrinho de peso, que garantiu o aval partidário e a empurrou para a vitória, apesar do estilo tosco e da inexperiência eleitoral da candidata.

E o adversário dela, José Serra, que no cotejo de biografias, estava num patamar bem superior, passará a história como o potencial melhor presidente que o Brasil não teve. Foi o destino interferindo no nosso futuro.

Foi assim também na ascensão de Michel Temer à presidência, após o  impeachment da mesma Dilma, reeleita em 2014, ao superar Geraldo Alckmin, agora fardado para ser vice de Lula. Neste caso não é destino, mas as voltas que o mundo da política dá.

Não tenho dúvidas que foi também o destino que conduziu o obscuro ex-governador de Alagoas à presidência, na primeira eleição após a redemocratização. Havia opções bem melhores naquela eleição: Brizola, Covas, Ulisses e mesmo Lula, mas foi Collor, arrancando com 3% das intenções de votos, a quem os deuses eleitorais sorriram. O resto da história é conhecido. Sem base política e soterrado por denúncias de corrupção, Collor foi expurgado do Planalto. O destino levou, então, o vice Itamar Franco à presidência. Por linhas tortas, o destino acertou e Itamar legou-nos a estabilidade econômica que sustentou as duas eleições de FHC. Mas sabe quem Itamar preferia para sucedê-lo? Antonio Brito, que arrepiou e passou a bola para FHC, que estava no lugar certo, na hora certa, etc, etc. (Com o Plano Real, Itamar elegeria até um poste, que, convenhamos, não era o caso de FHC nem de Britto).

O caso mais emblemático foi o da definição do vice de Tancredo Neves, ainda no período da escolha presidencial pelo Colégio Eleitoral. Tancredo preferia o deputado gaúcho Nelson Marchezan, mas o escolhido foi José Sarney. É que Marchezan decidiu manter a coerência ideológica e a fidelidade partidária, não aceitando a indicação. O destino se intrometeu novamente, Tancredo morreu antes de assumir e acabamos penando seis anos com Sarney.

Corta para 2018. Representante do minúsculo PSL, capitão reformado do Exército, deputado do baixo claro, Jair Bolsonaro  encarnou o perfil de candidato “contra tudo o que ai está”, vitaminado pelo atentado que sofreu e uma eficaz  campanha nas redes sociais, superou pesos pesados tradicionais, como Ciro Gomes, Geraldo Alckmin e Marina Silva, mais o articulado Fernando Haddad no segundo turno.

Agora o governador Eduardo Leite deve (deve?) aventurar-se como candidato à presidência da República, tentando furar a polarização Lula-Bolsonaro, inspirado naquela lógica gauchesca do cavalo passando encilhado.  Vai precisar, porém, que as mãos do destino interfiram a seu favor, sabendo que os deuses eleitorais são imprevisíveis, inconfiáveis e sem ideologia.

Além disso, neste período, mais do que nunca, vale aquela dito do bom mineiro Magalhães Pinto: “Política é como nuvem. Você olha e ela está de um jeito Olha de novo e ela já mudou”. Será que não é o destino soprando as nuvens?


Na verdade, o grande dilema de ficar na mão do destino é que destino pode ser sinônimo de fatalidade ou de boa sorte. O histórico nos mostra que nos casos em que interferiu na sucessão presidencial o Brasil mais perdeu do que ganhou. É que destino não tem compromisso com o futuro. Tomara que o futuro nos desminta no caso da escolha do novo presidente. Oremos!

Nenhum comentário:

Postar um comentário