segunda-feira, 16 de agosto de 2010

A tribo dos fumantes


Claro que sei: faz mal à saúde, incomoda quem está perto, deixa budum de tabaco no ambiente e nas roupas, mas peço um momento de reflexão sobre o vício de fumar e alguma compaixão com a tribo dos fumantes. A primeira questão é a seguinte: se fumar não fosse prazeroso a gente já tinha abandonado este vício maldito. Lembro a advertência feita pelo médico, um renomado profissional, que me tratou na primeira das seis vezes em que deixei, momentaneamente, de fumar. Perguntado se já tinha experimentado cocaína, ele - especialista no tratamento de todas as formas de drogadição - sentenciou: “Não, porque eu posso gostar”. Bingo, é assim que funciona: o prazer leva ao hábito que leva ao vício, que dá prazer, etc, etc.

Se essa argumentação não convenceu, vamos tentar de outro modo. A segregação cada vez maior a que somos submetidos, produziu na nossa confraria um sentimento de solidariedade que não se observa em outros segmentos, ainda mais nestes tempos de culto ao individualismo. E essa solidariedade tem que se encarada com um valor positivo. Você já viu fumante negar cigarro a outro fumante? Experimente compartilhar dos encontros de fumantes: a conversa flui, a harmonia está presente e às vezes até pinta uma paquera (eu fora!) pelo número cada vez maior de mulheres que se juntaram à confraria. E se tem mulher na parada, deve ser bom.

O Paulo Sant’Anna, um fumante mais compulsivo que este que vos fala, tratou com muito mais propriedade e talento, em crônica mais antiga, da discriminação a que estamos submetidos. E já que estamos falando em discriminação a uma minoria, desafio nossos legisladores a criarem um sistema de quotas para fumantes. Não tenho a mínima idéia de como funcionaria, mas é certo que queremos o mesmo tratamento dispensado as outras minorias. Quotas já! Fumante unido jamais será vencido!

E, por favor, não me entendam mal: não estou fazendo a apologia do vicio, apenas quero ser deixado em paz com meu cigarrinho, minhas reflexões entre uma tragada e outra e meus momentos de solidariedade com os companheiros de infortúnio.

6 comentários:

  1. Frio e chuva lá fora e os fumantes – solidários – apertam-se entre marquises para fumar. Às vezes nem conversam, tragam rapidamente, jogam fora cigarros praticamente inteiros e retornam apressados para as salas onde é vetado o fumo. Não acho nada charmosos momentos assim. Ah! E tem as mutações desse povo. Por exemplo, as cordas vocais acumulam tanto alcatrão que o som da voz com o passar dos anos, sai metalizado e rouco. Nas mulheres, se percebe com mais facilidade essa transformação. E a tosse? Credo! Assustadora e sempre forte, como se o pulmão implorasse: ar! ar! Pelo amor de Deus! Meu querido amigo tabagista, realmente é difícil compreender tal lógica. Tua crônica é de gostosa leitura – mas não me convence – por que o libertino conceito deste prazer, pra mim, será sempre intragável!

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  2. Meu irmão, um ex-fumante, acabou de ler o texto e disse que fui preconceituoso. Mas fez um alerta, "O texto do Flávio me provocou uma baita vontade de acender um cigarrinho..."
    Perigo!

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  3. Caríssimo Ari,
    Tentei deixar claro no texto que não pretendia fazer a apologia do cigarro, mas parece que não fui bem-sucedido. Na verdade, estamos tratando de vício, de entrega a uma prática - boa ou má - e vício não se explica, nem se justfica. Só peço encarecidamente que a patrulha largue do meu pé e leve em conta que o fato de ser fumante não me torna uma pessoa pior ou inferior, mas apenas dependente assumido de uma prática rejeitada pela maioria.

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  4. Eu entendi o texto e entendo também as patrulhas anti-tabaco, assim como a situação chata que os fumantes enfrentam. Um companheiro de confraria, lá no Country Club, depois de muitas safenas e rigoroso tratamento médico, voltou a fumar já fazem dois anos... Vá buscar uma explicação! Continuamos no vinho, que pelo menos, dizem que é bom para o coração. Assim como também é bom para o coração um pouco de prazer.

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  5. algo me diz que tá na hora de trocar de tribo...

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