quinta-feira, 26 de janeiro de 2012

Sessão desapego

Entrei num processo sofrido de desapego.  Aos poucos, comecei a me livrar de roupas, sapatos, papelada e objetos que já tiveram sua utilidade, mas agora só ocupavam espaço.  Fisicamente o espaço foi recuperado, mas há um outro espaço, o das lembranças, que se vai  junto com o descartável.  Se o que agora foi liberado resistiu tanto tempo junto da gente é porque certamente evocava boas lembranças. Por isso, recuso-me a tratar o descarte como entulho.  Na verdade, é preciso uma boa dose de coragem para o desapego, que é renúncia e despojamento, mas que não deixa de ser também uma forma de traição ao abrir mão do que vale a pena recordar, substituindo por novos focos de atenção.

Lá se foram camisas puídas de tanto uso e só estavam nesse estado deplorável porque eram as preferidas. Minhas queridas camisas azuis quadriculadas, que lástima. Junto foram aqueles sapatos confortáveis que, de tão usados, já deixavam a desejar na pisada e nem suportavam mais um trato do engraxate.  Não sei se ocorre igual com vocês, mas independente do numero de peças de vestuário e calçados disponíveis, a gente acaba usando sempre os mesmos e os mesmos sempre.  Vá explicar.
A papelada é o que merece ainda uma atenção especial porque ainda há muito para ser descartado. Mas a cada descoberta nas inúmeras caixas e pastas instala-se a dúvida: será que não vou precisar disso mais tarde? Mania de jornalista que ainda não enveredou para os arquivos digitais.  

E o que fazer com aqueles objetos que um dia representaram afeto e atenção?  Retornar as origens é preciso, que é a forma de desapego pelo que não quer valer, como no verso de Clarice Lispector. O que sobrar vai para a coleta seletiva, que não tem o mesmo apelo poético, mas fazer o quê?!
“Afinal, se coisas boas se vão é para que coisas melhores possam vir. Esqueça o passado, desapego é o segredo”. Voto com o relator, que seria o grande Fernando Pessoa. E se não for, assino embaixo assim mesmo.

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