segunda-feira, 24 de agosto de 2015

Os lobos da mesa ao lado

“Lobos nunca dormem”, sentenciou na mesa ao lado um parceiro das antigas. Era uma provocação e uma lembrança que remete a uma crônica cometida anos atrás aqui neste descaminho do ViaDutra. O texto fazia uma analogia entre os canídeos e aqueles humanos masculinos que, na busca de suas conquistas amorosas, atuam em locais e horários diferenciados, cercando suas presas com sutileza e determinação. Distinguem-se dos comuns mortais pelo gosto ao inusitado, pelo enfrentamento das adversidades, pela ousadia na ação e pela técnica refinada na abordagem. O maior risco que as mulheres correm com essa espécie é de terem suas expectativas atendidas, porque o verdadeiro lobo valoriza suas conquistas e quer fazê-las felizes. 

Conhecedor do histórico,  o parceiro da mesa ao lado achegou-se a nós e passou a enriquecer a galeria de lobos com novos tipos que jura existirem, até porque a categoria, assim como os costumes, está sempre se renovando.

Revelou, por exemplo, que está na moda o Lobo Sertanejo que ataca nos shows das duplas e cantores do gênero na certeza de que encontrará uma infinidade de fãs receptivas às más  intenções – ou seriam boas?.  Pode ser a mais melosa das duplas ou o mais brega dos cantores lá está nosso amigo, sabendo de cor a maioria das canções (“preparação é a chave do sucesso”, explica)  e movimentando os bracinhos levantados na hora do “ todo o mundo cantando comigo agora”.  Vale até show de padre sertanejo, que é o que não falta no cenário musical da atualidade. “Como o padre não pode 'pegar' as moças, sobra mais para o pessoal laico”, esclarece didaticamente.  O bote nem requer muito esforço porque a plateia feminina está no clima das musicas e com um pouco de habilidade e um repertorio de informações sobre os cantores e sua obra aí fica mais fácil ainda. Os habitués destas abordagens ensinam que, às vezes, funciona elogiar um artista que se contraponha ao que esta se apresentando. “O contraditório aproxima e sempre rende uma boa conversa  que vai se estendendo até chegar aos finalmente, com direito a bis...”, conclui o falso caipira,  que se apresenta como “um romântico universitário e sertanejo” e é facilmente reconhecido nos shows por dois detalhes: o figurino,  de jeans apertados, camisas xadrez e  chapéu de cowboy, e a proximidade das belas e bem produzidas fãs de quem se apresenta no palco.

As revelações rendem e o companheiro velho de guerra já está falando de outro personagem, o Lobo das Redes,  também conhecido como Lobo Digital, que ataca preferencialmente no Facebook, Segundo ele,  essa rede apresenta uma cartela de perfis femininos variados e instigantes, ao mesmo tempo em que  despreza a  Tinder porque entende  que proporciona muitas facilidades e é da natureza dos lobos enfrentar uma dose de desafios. No caso do Lobo das Redes a estratégia é sempre começar curtindo as postagens da presa escolhida. A etapa seguinte é fazer comentários frequentes e  de preferência espirituosos.  Depois de fincar  bandeira na timeline da futura parceira ele faz uma chamada inbox, a propósito de algum tema levantado por ela na rede.  Se a outra parte corresponder e mantiver a conversação  por mais de cinco diálogos o Lobo despe a pele de cordeiro e parte para o ataque. Um ataque matreiro,  com questionamentos aparentemente inofensivos, tipo hábitos após o trabalho,  indicações de onde encontrar um bom sushi, preferencias musicais, gastronômicas e etílicas. Conversas sobre cães e gatos sempre funcionam. Um bom estoque de frases de Caio Fernando Abreu, Arnaldo Jabor, Cora Coralina, Clarice Lispector, mesmo que de autoria duvidosa, também ajudam. Daí para o convite para aquele encontro é só questão de tempo e aí a vida seguirá seu curso.  Mas nosso amigo faz um alerta: nestes tempos de radicalismo é vital saber se a moça é simpática aos petralhas ou aos coxinhas.  São raros os casos de convivência pacifica entre as duas espécies, e um obstáculo para que esse esperto lobo torne realidade seu slogam:  "Meu negócio é curtição!"


O narrador já ia emendar mais um perfil, o do sujeito que decidiu investir nos shows de musica gospel, acreditando firmemente que o recato das crentes pode esconder uma energia erótica a ser explorada e compartilhada, mas aí já outra história.

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