sábado, 11 de setembro de 2010

Manual para todas as ocasiões

Há algum tempo passei a colecionar histórias sobre infidelidades conjugais. Asseguro que não se trata de desvio de conduta. O que me move é um sincero interesse em aprofundar conhecimentos e refletir sobre esse aspecto do comportamento humano, eis que tive acesso a casos pitorescos e a outros tantos escabrosos. Um dia talvez escreva um livro, relatando os principais episódios, sem citar nomes, é claro.

O que restou de lição dessas histórias, se fosse para produzir um manual sobre a infidelidade, é que a regra básica, para ter pouco ou nenhum dissabor no processo, é montar uma logística eficiente para a transgressão. Até para a traição é preciso planejamento prévio, ensinam os especialistas consultados.

As recomendações começam pelo básico. Nada de freqüentar motéis ou restaurantes próximos a sua casa e só marcar encontros em locais seguros, de preferência à noite, quando todos os gatos são pardos. A não ser que você seja do tipo que gosta de viver perigosamente, como aquele amigo que namorava uma colega num restaurante ao lado do apartamento em que morava. A mulher dele só não dava o flagra pela área de serviço, com ampla visão para o pátio do restaurante, porque o casal de amantes se abrigava sob uma frondosa mangueira. Ninguém me contou, eu mesmo vi.

Há mais exemplos de imprudência e outros tantos de profissionalismo na arte da dissimulação. Na Europa, uma empresa especializou-se em montar álibis para maridos e mulheres infiéis. A empresa chega ao requinte de providenciar fotos, troféus e certificados de participação para falsos maratonistas que, ao invés de correrem nas ruas, preferiram se exercitar nos lençóis longe de casa, de preferência em outros países. Globalizaram a sacanagem. Detalhe: a lista de clientes tem maioria de mulheres. Que tempos vivemos!

E tem também aquela história de outro amigo, chegado a uma farra noturna, que antes de retornar ao lar, dava uma circulada no cemitério e assinava um livro de presença. Em casa, contava para a mulher que tinha passado à noite velando um conhecido e na semana seguinte, confirmando o álibi, recebia o cartão de agradecimento da família enlutada. Outro exemplo de profissionalismo e capacidade criativa foi daquele dirigente esportivo, já falecido, que, numa sinaleira, foi flagrado na companhia da amante, por uma amiga de sua mulher, que estava no carro ao lado. O homem dispensou a acompanhante, correu pra casa e convidou a mulher para irem a um restaurante que ficava a caminho do local do flagra. A mulher, surpresa com a amabilidade, aceitou. Na sinaleira maldita o nosso amigo fez um gesto largo de cumprimento, chamando a atenção da mulher.

- Olha lá a fulana (seria a tal amiga) - e arrancou o carro.

No dia seguinte, é claro, a amiga da onça ligou para a mulher, "não querendo fazer fofoca, longe de mim", e contou que estranhara muito ter visto o marido dela com outra mulher no carro. E deu detalhes da hora e do local, a víbora.

Pra surpresa da dedo-duro, a esposa confirmou.

- Era eu que estava no carro, criatura, até te abanamos.

A outra ficou sem ação e até hoje está sem entender o que aconteceu.
A lição que o episódio encerra é que sempre é possível dar a volta por cima nesses momentos críticos, mas é preciso estar preparado para a adversidade. È importante ter à mão um portfólio de justificativas, ainda mais em Porto Alegre que, apesar de seus mais de 1,4 milhão de habitantes, é uma província - todo mundo conhece todo mundo. E muitos encontros na noite são tão indesejáveis como inevitáveis.

Um amigo, cansado de ser surpreendido por conhecidos nas suas escapadas, decidiu ir a todos os encontros acompanhado de uma pasta, dessas de cartolina, cheia de papéis e documentos inúteis. A pasta repousava na mesa, enquanto jantava ou almoçava com a namorada. Para todos os efeitos, era uma reunião de trabalho. Não sei se funcionava, mas ele ficava bem mais tranqüilo.

A cautela com o banho pós-sexo é uma unanimidade entre os transgressores. Nada de sabonete e muito cuidado para não molhar o cabelo e mais ainda para não se impregnar com o perfume da parceira. Uma revista detalhada no carro, após os encontros, é vital. É inimaginável como as mulheres "esquecem", ou perdem dentro dos carros, itens sempre comprometedores - batons, outros cosméticos, brincos, sombrinhas, acessórios para cabelo e peças de roupas, incluindo as mais íntimas. A lei das probabilidades indica que esses itens serão encontrados por outra mulher - a esposa. Se o achado não for uma calcinha, ainda resta a desculpa de que foi esquecimento daquela colega, feia de doer, que ganhou uma carona na saída do trabalho. De qualquer forma, convém não correr riscos, recomenda o manual dos mal-intencionados.


*Reciclado a partir e original publicado na Coletiva.net

Um comentário:

  1. Um bom amante precisa de criatividade antes, durante e depois. Caso contrário a casa cai. Ou melhor, as casas caem!

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