terça-feira, 4 de maio de 2010

Nicolelis, pertubador e encantador

Foi perturbadora, para dizer o mínimo, a conferência do médico e cientista Miguel Nicolelis na abertura da edição 2010 do Fronteiras do Pensamento. Perturbadora porque não tinha idéia do alcance do trabalho desenvolvido à frente do Instituto Internacional de Neurociência de Natal-RN, nem maginava o avanço das pesquisas realizadas na Universidade de Duke-EUA e seu potencial de melhorias para a raça humana. A grande mídia parece não se interessar sobre os experimentos e os projetos do dr. Nicolelis.

As experiências com macacos - aos quais Nicolelis se refere amorosamente e não como simples cobaias -, trazem esperança de devolver a mobilidade a portadores de necessidades especiais, por meio das chamadas próteses neurais – equipamentos eletrônicos que podem ser acionados por sinais cerebrais. Igualmente, as pesquisas buscam apontar caminhos para os portadores de doenças degenerativas, como o Mal de Parkinsom - no caso as experiências são com camundongos.

Nicolelis, 49 anos, palmeirense fanático, não se limitou ao relato de cases, mas mostrou macacos e camundongos em ação, durante as experiências, com resultados visíveis. É impressionante o vídeo em que uma de suas macacas preferidas (seria a Aurora?) joga videogame, comandando por estímulos cerebrais um braço mecânico localizado em outra sala. Detalhe importante: a macaca várias vezes tenta trapacear no jogo, como se fosse um humano qualquer. É isso que também me leva a considerar perturbadora a exposição de Nicolelis. Ao assistir aos vídeos a relação obrigatória foi com a obra O Planeta dos Macacos, na qual os símios, de evolução em evolução, acabam dominando a Terra, transformando em escravos os decadentes humanos. Prefiro pensar que as experiências dos neurocientistas vão trazer novas e boas perspectivas para futuro da humanidade. Certamente é isso que move o dr. Nicolelis e suas equipes, nos EUA e aqui.

A conferencia foi também encantadora quando Nicolelis revelou a grande dimensão social do trabalho realizado em Natal, não apenas nos bem aparelhados laboratórios, mas envolvendo crianças e jovens da periferia em uma das áreas mais carentes do país. Um trabalho de iniciação científica e inclusão social de valor incalculável, por meio da Fundação Alberto Santos Dumont que empresta seu apoio a todo o projeto.

A escolha de Santos Dumont para batizar a Fundação não é aleatória. O “Pai da Aviação” é inspiração para Nicolelis. O cientista se emociona quando vincula a obra do brasileiro que tornou realidade o sonho de Ícaro com o trabalho desenvolvido em Natal. Santos Dumont sonhou e foi atrás da realização de seu sonho. E é disso que Nicolelis fala e destaca: de gente que sonha e realiza, que promete e entrega, que projeta e faz acontecer; na crença na energia humana a serviço do bem-comum.

Trata-se de um Paulo Coelho da Ciência, questiona alguém? Devagar com o andor, porque o misticismo passa ao largo das argumentações do pesquisador, seus conteúdos têm sólida base científica e resultados demonstráveis para reforçá-los.

Nicolelis foi aplaudido de pé pelo público que lotou o Salão de Atos da Ufrgs, segunda-feira à noite. Acredito que seja a primeira vez que isso acontece no Fronteiras. O nosso Santos Dumont da neurociência já merece o Prêmio Nobel de Medicina para o qual está sendo cogitado

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