segunda-feira, 24 de abril de 2023

Rumo à ABL

*Publicado nesta data em coletiva.net

A Academia Brasileira de Letras, ABL,  acaba de eleger mais uma mulher, a décima a ocupar uma cadeira, agora na  vaga de Nélida Piñon. Trata-se de Heloisa Buarque de Holanda, 83 anos, que além de ostentar um sobrenome de peso no cenário cultural brasileiro, possui uma sólida carreira literária e acadêmica.

A nova imortal, certamente, tem muito mais legitimidade para ingressar na ABL  do que Fernanda Montenegro, com a qual a gestão de Merval Pereira abriu caminho para indicações de nomes distantes das letras, os chamados “notáveis” ou do “poder “, como já ocorreu no passado, inclusive com a indicação de Getúlio Vargas, de Ivo Pitanguy, de Santos Dumont e até de um ministro do Exército do período militar, o general Aurélio de Lyra Tavares, que se assinava com o pseudônimo de Adelita, vejam só . Merval, apesar de ser ele mesmo um escritor de segundo escalão, deve ter muito peso nas decisões da ABL, não apenas por ser o presidente, mas porque é também um valoroso representante das Organizações Globo junto ao grupo de intelectuais que se reúne para o tradicional chá com biscoitos e bolinhos das quintas-feiras.  Assim, todos os atos envolvendo a ABL tem a garantia de generosos espaços nos veículos da Globo, a começar pelo Jornal Nacional.

Cada vez que se abre uma vaga para o panteão desses luminares, lembro da frase, maldosamente talentosa, de Millor Fernandes : “A Academia Brasileira de Letras se compõe de 39 membros e 1 morto rotativo”.  Lembro também a pouca representatividade dos gaúchos na Academia. Seriam 11 no total desde a fundação da instituição em 1897, quase o mesmo número de maranhenses com  10 e bem menos que os 23 pernambucanos e os 20 baianos. Lembro mais: que a Academia rejeitou Mário Quintana e só mais tarde aceitou Moacir Scliar,  que foi se unir a outro gaúcho, o poeta  Carlos Nejar, hoje mais conhecido como pai do Fabricio Carpinejar.  

Para virar esse jogo da nossa participação na ABL, pretendo liderar um movimento que visa pleitear  para  os gaúchos a próxima vaga rotativa. Mais do que isso, a proposta é de que seja a inédita escolha de um coletivo para a tal vaga, como já ocorre em alguns mandatos legislativos municipais.  Participariam meus confrades dos encontros de quinta-feira (olha a coincidência: mesmo dia dos chazinhos na Academia) no boteco do Alemão, gente muito digna e afeita às letras, com obras publicadas de grande repercussão. Convidaria, ainda, para completar um coletivo de 15 autores, o Marino Boeira, porque, afinal, precisamos de um representante comunista na ABL, como já foi Jorge Amado; o irrequieto e provocativo Caco Belmonte; o Arizinho Teixeira, que está escrevendo cada vez melhor suas crônicas; o Auber Lopes de Almeida, meu editor e um sonetista militante, e uma representante do naipe feminino, para não acusarem o coletivo de misoginia. Seria a Indaiá Dillenburg, também conhecida como Pérola Negra e minha parceira no livro ‘Dueto – a dois é sempre melhor’.

Devo acrescentar que a maioria tem idade suficiente para integrar o austero plenário e todos possuem qualidades literárias que vão ao encontro dos valores que inspiraram Machado de Assise seus pares na fundação da Academia Brasileira de Letras. Alguns até gostam de chá. Faremos rodízio para a presença nas reuniões, dividiremos irmãmente os jetons e haverá sorteio democrático para decidir quem terá direito ao sepultamento no mausoléu dos imortais no Cemitério São Joao Batista, no Rio.

Ah, o senhor e a senhora dirão que estou debochando da mais que centenária instituição brasileira. É  verdade, mas quem começou o deboche foi a própria ABL, com algumas escolhas questionáveis, como a de Getúlio Vargas, de Ivo Pintaguy, de Santos Dumont, do general Adelita e por que não ?, da Fernanda Montenegro.

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