domingo, 27 de março de 2016

Mui leal e valerosa


O brasão da Capital gaúcha ostenta em destaque os dizeres leal e valerosa cidade de Porto Alegre que muita gente associa à adesão à causa Farroupilha na revolta contra o Império.   Ledo engano. Porto Alegre ganhou esse título justamente pelo seu apoio aos imperiais. A cidade foi invadida em 20 de setembro de 1835 a partir da ponte da Azenha sobre o Arroio Diluvio, onde se deu o primeiro combate entre os cerca de 100 rebeldes contra as forças imperiais que defendiam Porto Alegre.

Sem apoio da população e sem condições de expandir a guerra a partir da Capital, os farrapos tiveram que abandonar a cidade em junho de 1836. Depois da retomada pelos legalistas, Porto Alegre enfrentou mais três sítios, mas a mui leal e valerosa resistiu ao assédio rebelde merecendo por isso o título concedido pelo Imperador.

Viria daí, dessa resistência à rebeldia, tudo às avessas, uma forma de irredentismo de Porto Alegre, impregnada na sua gente e aculturada com o passar do tempo. Uma esquizofrenia de quem ama sua cidade de forma envergonhada, antes é preciso desqualificá-la, potencializar seus defeitos e minimizar suas virtudes, mas ai do estrangeiro que ousar falar mal dela. É um cotidiano feito de rabugices por grandes e pequenas causas, de negações ao novo, de contrariedades ao diferente, embora o porto-alegrense se ache culturalmente evoluído, politicamente esclarecido e receptivo à diversidade, seja ela qual for.

No entanto, parece que o povo age contraditoriamente assim para purgar – ou confirmar? -  uma culpa atávica pelo oficialismo e oposição diante do movimento farroupilha. Não há orgulho em ser mui leal e valerosa. A tese é do meu amigo, o jornalista e escritor, Gustavo Machado e sou tentado a concordar com ela.

Mas Porto Alegre que já foi a Cidade Sorriso hoje procura uma nova identidade, diferente daquela que lhe impôs o PT em 16 anos de gestão, com apelos ao popular e ao participativo que só se efetivavam nas instâncias e mecanismos devidamente aparelhados.  Esse modelo chegou a encantar por um tempo, mas se esgotou como todas as propostas que mais dividem do que buscam o bem comum.

A cidade tem muitos atributos, mas nada que se sobressaia e não me venham com o por do sol ou o Laçador porque não é isso que faz a identidade de uma metrópole. É algo imaterial, maior do que a bela manifestação da natureza ou o portentoso monumento. Houve um tempo em que se tentou o conceito Multicidade, mas não pegou.  A questão, portanto, está em aberto.

Está na hora de deixarmos de ser a Cidade do Mas, a Pequenópolis de alguns, a Caranguejópolis de outros, a Rabugentópolis de todos nós, e voltarmos a ser, quem sabe, a Cidade Sorriso como preconizou Nilo Ruschel,  quando assim a batizou nos seus programas radiofônicos nos idos do século passado.  E voltar a ser não seria retrocesso, mas avanço.
A verdade é que a minha Porto Alegre precisa se redescobrir.

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