* O início da saga dos lobos conquistadores começou aqui no ViaDutra em 12 de novembro de 2009, quando o blog recém engatinhava. O tema rendeu, tanto assim que já tivemos quatro postagens revelando a forma de agir dessa ativa alcatéia. Na base do vale a pena ler de novo, aqui está a primeira potagem que, como as outras, apresenta situações inspiradas em fatos reais.
Lobos nunca dormem. Suas vítimas indefesas podem ser atacadas a toda hora e em qualquer lugar e são poucas as que resistem às investidas. Deixemos de lado os lobos que atacam nas academias e nas baladas, locais que favorecem a interação entre as espécies. Esses são lobos manjados, indolentes, indisponíveis para novos desafios. Lobo que se preze, lobo mal intencionado mesmo, ataca em lugares e horários inusitados, cercando progressivamente suas vítimas, quase sempre travestido de cordeiro, até dar o golpe final.
C. advogado, bem de vida e de casamento, é um exemplo. Todas as quartas-feiras ele assume sua porção lobo e sai à caça nos supermercados. Ele varia de estabelecimento para não dar na vista, mas o perfil das suas vítimas não se altera muito: mulheres maduronas, de boa aparência e sem aliança nos dedos – ou seja, solteiras ou descasadas. A estratégia para a abordagem também não varia muito. Assim que escolhe a presa, aproxima-se e pergunta, com o semblante mais inocente do mundo:
- Sabes onde eu posso encontrar sabão em pó?
Pode ser detergente para louça, água sanitária, amaciante de roupa, mas sempre um produto que passe a idéia de um homem afeito às lidas domésticas, vivendo sozinho e atrapalhado com esse universo. As mulheres dificilmente resistem ao perfil de homem maduro numa fase de carência, que é o personagem que, afinal, nosso amigo encarna.
Dependendo da ocasião, nosso causídico muda de tática. Ele é fascinado, por exemplo, por mulheres que consomem produtos orgânicos. Por isso, fica na espreita próximo à gôndola desses produtos, esperando uma vítima. Assim que surge alguma que se encaixa no perfil pré-definido, parte para a abordagem:
- Com licença, tu sabias que na Europa já predominam os produtos orgânicos?
E emenda um ecopapo capaz de fazer inveja aos ecochatos, mas, diferentemente destes, sua conversa é vivaz e convincente, discorrendo sobre o aquecimento global, a diferença entre light e diet, os efeitos perversos dos agrotóxicos na produção de alimentos – e firma posição contra os trangênicos. “O que será das futuras gerações? O que será dos nossos filhos?”, costuma exaltar-se, acentuando o nossos, o que já é uma insinuação. As mulheres ficam maravilhadas com tamanha erudição ecológica que, a bem da verdade, exige tempo de pesquisa, um investimento que ele considera que vale a pena para os fins a que se propõe.
A primeira abordagem não é problema, mas o segredo está no segundo momento, aquele que encarreira a conquista. E nesse aspecto nosso amigo é imbatível. A tática dele consiste em prolongar a conversa e em seguida fazer um convite:
- Conheço uma loja de produtos naturais que tu vais amar. Podemos dar uma escapada lá, se quiseres.
Da loja ao convite para um jantar especial na casa da moça, com pratos natureba, é um passo e aí a história segue seu curso natural. Missão cumprida!
S, economista, ataca em outro cenário. Conhecido como “Lobo de Livraria”, é entre best sellers e um bom sebo que ele fareja suas futuras presas. Escolhe sempre as que usam óculos, porque entende que o adereço lhes dá um ar de intelectual, mas faz também uma pré-seleção pelo gênero de obra que interessa à moça. Se elas estiverem folheando livros de Martha Medeiros ou Lya Luft, ele trata de se aproximar com a mesma obra na mão e lança a isca:
- Já leste Trem Bala? Achei fantástico!
- Já leste O Silêncio dos Amantes? A Lya Luft se superou!
Em seguida a conversa deriva para os temas recorrentes nas duas autoras: as angústias e anseios da mulher moderna, suas frustrações, o amor, o desamor e a paixão, perdas e danos – enfim, tudo o que passe a idéia de um homem sensível e conhecedor da alma feminina. Para reforçar seus argumentos, assiste ao Saia Justa e se diz fã da Márcia Tiburi, embora secretamente tenha uma queda pelo estilo mais maternal da Mônica Waldvogel. A conversa é irresistível. Não foram poucas as ocasiões em que a troca de impressões se completou na cama, após o embate amoroso.
Quando a vítima se mostra interessada em livros do David Coimbra, nosso amigo não tem a mesma fineza, pois considera que as leitoras do cronista são “mais saidinhas”. Aí vai direto ao ponto:
- Conheço o David e tô louco para contar para ele uma história picante sobre tu e eu...Topas?
Ele jura que a abordagem funciona. Não perde tempo, porém, com mulheres que compram livros de Paulo Coelho, pois acha que terá conversas muito aborrecidas. Mas em relação a Dan Brown reconhece o mérito desse escritor, não como valor literário, mas como argumento para suas investidas.
- Já lestes Anjos e Demônios? Recomendo: é melhor do que O Código Da Vinci.
(continua)
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