quinta-feira, 29 de abril de 2010

O Circo de Petrópolis: Roberto Carlos no cine Ritz

"Era tanta palhaçada que para virar circo só faltava a lona"

Minha vocação para o jornalismo nasceu certamente de duas experiências da adolescência. A primeira foi o jornal Na Onda, fundado pelo meu irmão Tadeu e os amigos Léo Ustarroz e Piero D’Alascio. O Léo, hoje advogado, tinha em casa uma preciosidade: um mimeógrafo à álcool, onde o jornalzinho em papel A4 era rodado todas as semanas. O Piero, engenheiro bem-sucedido, e o Tadeu, causídico dos bons, eram os redatores e editores.

Fiquei tão fascinado com aquela iniciativa que logo me integrei ao grupo como editor e editorialista. Sim, as duas folhas de cada edição do Na Onda, impressas na frente e no verso, comportavam um editorial pretensioso, além das notícias do bairro Petrópolis, muita fofoca e uma boa dose de humor – e nisso o Tadeu era imbatível, com tiradas maliciosas que incomodavam alguns dos amigos que ele pegava no pé.

O jornalzinho acompanhava de perto os jogos do Tupy e do Bagé, os times dos quais participávamos. E era implacável quando davam vexames. As chamadas de capa normalmente não tinham qualquer relação com a realidade, como na edição em que mancheteamos “O Rei vem aí”, anunciando a presença de Roberto Carlos no cine Ritz para o lançamento do filme “Roberto Carlos em ritmo de aventuras”. Pura cascata. Ainda bem que ninguém acreditou que o RC teria coragem de aportar no fim da linha de Petrópolis.

Na Onda foi, de alguma forma, pioneiro dos jornais de bairro, hoje tão disseminados. A brincadeira durou mais de 20 edições e chegamos a montar um serviço de assinaturas, garantindo um dinheiro antecipado dos interessados. Na ingenuidade própria dos adolescentes, imaginávamos que poderíamos faturar alguma grana com o jornal, nós que éramos uns pelados e precisávamos de reforço orçamentário para fazer frente as festas dos fins de semana. Mas a grana que entrava da venda avulsa e das assinaturas mal dava para cobrir as despesas com a compra de papel, as matrizes e o álcool para o mimeógrafo, que sustentavam as tiragens de cerca de 50 exemplares.

E assim o Na Onda, depois da fase de dedicação e entusiasmo pelo projeto, deixou de circular. Nossos interesses passaram a ser outros – o vestibular que se avizinhava, as namoradas, os jogos da dupla grenal, a busca de um emprego – e lá se foi a primeira oportunidade de me tornar um barão da mídia. Mas o vírus do jornalismo estava inoculado em mim. Após três fracassadas tentativas de ingressar na Arquitetura da Ufrgs, me reencontrei com a vocação despertada pelo Na Onda, passando de primeira no vestibular de Jornalismo da Federal.

Passam-se os anos, a turma se desgarrou e acabei sem saber que fim levara a coleção do Na Onda, que tinha guardado para o acervo da futura Fundação Flávio Dutra (brincadeira, gente). Até que no dia do meu aniversário, há cinco anos, meu pai me acarinhou com um presente especial: o bau das minhas reminiscências, em forma de uma caixa de papelão: cadernos amarelecidos, sofríveis boletins escolares, cartas de namoradas com letras caprichadas, cartões de felicitações em datas diversas e...uma coleção completa do Na Onda. O resgate daquele passado feito de papel, álcool e entusiasmo juvenil foi de pura emoção e o melhor presente de aniversário que já recebi.
(continua)

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