segunda-feira, 8 de agosto de 2022

Soterrados em senhas

*Publicado nesta data em coletiva.net

O mundo digital nos transformou em refém das senhas. Por alto, calculo que dependo de mais de 20 senhas para terminais bancários, cartões de créditos, aplicativos diversos, redes sociais, sites de compras, etc, etc, etc. Haja memória para tudo isso. Conheço pessoas que anotam suas senhas em papéis, que guardam na carteira ou numa pasta no computador , o que é um convite para quebrar a segurança que a senha exige. Alguns se consideram mais espertos e criam a senha para acessar as senhas e aí se complicam mais ainda.

Interessante as outras artimanhas que observo para criar e preservar senhas. Tem gente que escolhe a data do casamento e com o tempo acaba esquecendo as duas. Ocorre com os homens especialmente. Outros preferem a data de nascimento ou o nome de um dos filhos e criam um mal estar entre os rebentos preteridos, que se acham menos amados pelos seus progenitores, porque sabem como as senhas são importantes nas nossas vidas. Sei de moças que preferem usar como senhas os nomes dos seus pets ou, as mais sofisticadas, optam pela  raça do bichinho, tipo Chowchow, Schnauzer ou Pinscher.  Fácil de memorizar, dificil de digitar.  Tem a turma dos apelidos familiares. No meu caso seria Cabeça, mas não tentem porque não uso tal senha,

Essas soluções vão na contramão do que recomendam os especialistas, porque significam vulnerabilidade. Vale o mesmo para aqueles que usam seqüências de números. O tempo que um hacker pode descobrir sua senha pode ser de alguns segundos ou milhões de anos. Senhas tradicionais com poucos caracteres seriam quebradas quase instantaneamente, enquanto aquelas com símbolos, letras e números dariam mais trabalho aos cybercriminosos.  Se bem que também dificultam a memorização pelo usuário, ou seja, “se ficar o bicho pega, se correr o bicho come”.

Para atenuar um pouco essa aflição e para mostrar que senhas não tem utilidade apenas nas modernidades do mundo digital, relembro a historia – verdadeira – ocorrida com um amigo.

Sucede que no final da primeira transa com uma nova parceira, naquele momento de relaxante aconchego, o prezado amigo foi surpreendido com uma exigência dela, cláusula pétrea  para continuarem a relação, que, aliás, agora  já dura 5 anos:

 

- Preciso saber de duas ou três pessoas a quem possa telefonar caso te aconteça um piripaque aqui no motel.  Sabe como é, a gente  excedeu...

 

Faltou esclarecer que ele era bem mais velho do que ela e ao dizer que excederam  estava implícito um elogio ao desempenho  dele numa quadra da vida em que a natureza conspira e baixa, por assim dizer,  as vontades  e as expectativas.  Mesmo assim o pedido dela era insólito, constrangedor para dizer o mínimo, e capaz de perturbar a elogiada performance do nosso amigo.  Contrariado com o pragmatismo da moça, ele acabou nomeando  dois parentes e um colega de serviço, garantindo que eram gente da maior confiança, que saberiam como agir e preservariam a reputação dela e a memória dele.

 

- Outra coisa, caso aconteça o pior, avisa ao pessoal que, quando eu ligar, a senha será  ‘o Sol apagou’, não esquece, ‘o Sol apagou’...

 

Mais do que uma senha, a menção ao  astro rei foi recebida como uma homenagem, mesmo em se tratando de uma situação limite, e  deixou nosso amigo  reconfortado, cheio de vaidade e ai mesmo é que excedeu, atuando com brilho cada vez maior, como se sua energia fosse inesgotável. 

 

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