*Publicado nesta data em coletiva.net
A perda do amigo e
confrade David Coimbra no triste 27 de junho me fez antecipar para sexta-feira
a coluna que a coletiva.net publica nas segundas-feiras. O tema da coluna era
sobre prefácios e aí me permiti um adendo, reproduzindo a introdução que o
David fez para meu primeiro livro, Crônicas da Mesa ao Lado, lançado em 2015.
Está tudo lá na aba de colunas do portal, com minha homenagem ao generoso
companheiro que nos deixou.
Até preciso confessar
que foi a falta de assunto que me levou
a apelar, na original coluna anterior, antes do adendo, para as regras básicas
do que, no meu entendimento, deve conter um prefácio. Como se sabe, o prefacio é algo que antecede um escrito, um
esclarecimento prévio, uma apresentação.
Assim, diante do pedido de um amigo, aflito com um prefácio que lhe fora
encomendado e baseado na minha experiência
de prefaciador – reduzida – e de prefaciado - um pouco maior – fiz duas recomendações
apenas: não queira brilhar mais do que o autor da obra e não economize nos
elogios, mesmo que insinceros.
Mas ai a curiosidade
interveio e resolvi pesquisar mais a respeito de prefácios e deparo com um
texto do grande Otto Maria Carpeaux, austríaco naturalizado brasileiro, autor,
entre outras preciosidades, de A História da Literatura Ocidental. No artigo Sobre os Prefácios, de 1965,
Carpeaux se queixa de que o assunto é totalmente inédito, inexistindo no mundo
livros sobre o tema, nem fontes de referência. “Os prefácios nem sequer tem
verbetes nas enciclopédias de termos literários”,
lamenta ainda. Ou seja, acrescento eu, trata-se de um tema menor, mas que
ganhou dimensão pelo ineditismo.
Na sequência, o
consagrado articulista desfila sua
erudição que parece não ter limites, resgatando célebres prefácios que
fizeram historia na literatura universal.
Cita, entre outras, a dedicatória que Cervantes, já doente, fez no
prefácio para Persiles y Segismunda,
do Conde de Lemos.
“Puesto ya el pie en el
estribo,
con las ansias de la muerte…”
Cervantes morreria quatro dias depois.
Conclui Carpeaux que “existem
prefácios-justificativas, prefácios-pedidos de desculpa, prefácios-desafios,
prefácios-manifestos, prefácios-críticas, prefácios-sentenças. O prefácio é
prólogo e pode ser epílogo e, como no caso de Cervantes, epitáfio”.
E como enquadrar
prefácios que mais desqualificam do que
enaltecem a obra e o autor, diferente do que recomendei ao amigo demandado para escrever uma
apresentação? Como seriam estes prefácios?
É o exercício proposto pelo designer, blogueiro, escritor e
escultor Philipe Kling David, que é brasileiríssimo apesar do nome. Dois
exemplos, começando pelo prefácio de Diário de Um Mago, do nosso Paulo Coelho:
“No final do diário,
o Mago chega em Santiago de Compostela e está transformado. E você, querido leitor,
também. Ele em milionário, mostrando que magia existe mesmo, sobretudo a
que faz ganhar dinheiro. E você, num fã, que vai comprar toda e qualquer
baboseira misticóide, parte chupada de Carlos Castañeda, parte chupada de ensinamentos
copydesk das filosofias orientais. Aqui está uma obra transformadora. Boa
leitura”. Sobra também para outro campeão de
audiência, O Código Da Vinci, de Dan Brown. Prefacia o mordaz Philipe: “As pessoas vão ver você com este livro e pensarão que você é apenas um
bobo, que lê esta merda porque todo mundo que você conhece também leu. E como
você não quer ficar no vácuo nas conversas de rodinha nos aniversários de
criança, resolveu se inteirar que diabo a Mona Lisa da capa e seu sorriso
enigmático tem a ver com Jesus e Maria Madalena”.
Minha sugestão para
esta categoria, se os textos correspondessem à realidade, seria prefácio-super sincero.
E já que estamos falando em sinceridade, sinceramente falando consegui terminar
mais uma coluna de muitas palavras e poucas idéias próprias, como alguns
prefácios que se cometem por aí.
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