*Publicado em 07/02/2022 em coletiva.net
Manifesto aqui minha
irrestrita solidariedade ao amigo Mário Marcos de Souza que foi vilipendiado por outro amigo comum, o David
Coimbra. Este, num surto de insensibilidade, publicou, em recente coluna, que
foi perturbado noites e noites pelos roncos do Mário Marcos, durante a
cobertura da Copa da Alemanha, quando dividiram o mesmo apartamento no hotel.
Foi longe demais o festejado, mas inconveniente, cronista da última página de
ZH, revelando intimidades do sono do companheiro de lida: “O Mário roncava tanto que eu não conseguia dormir. Era um ronco alto e
grave, parecia um motor de trator. Às vezes ele dava uma parada e eu pensava:
será que o Mário morreu?”, descreveu o traquinas David. Não, o Mário Marcos não
havia morrido, tanto assim que já emprestou seu talento para a SporTV como
comentarista e volta e meia dá seus pitacos nas redes sociais. Só não sei até
que ponto a intrigante coluna do
David abalou os alicerces emocionais
deste luminar do nosso jornalismo.
O detalhe é que a
coluna era sobre a Síndrome da Perna Inquieta e sobrou novamente para o coitado
do Mário Marcos, que, segundo a versão indiscreta do David, tinha por hábito
mexer as pernas sem parar, quando estava a editar matérias na ZH.
Se serve de consolo,
valoroso Mário Marcos, também tenho sido vítima desse preconceito, odioso e
odiento como todos os preconceitos, contra os roncadores. E, como no teu caso,
exposto publica cruelmente pelo David, o que mais magoa é que as contrariedade e rejeições vem de parte de gente muito próxima. Em viagem com familiares
à Europa, minhas netas Maria Clara e Rafaela, as amadas netas maiores, as netas
para as quais vou legar um bom quinhão de minha coleção de canecas, as netas as
quais dedico os meus livros, as pequenas ingratas se insurgiram numa estadia em
Barcelona e exigiram que o seu querido e noturnamente barulhento avô fosse exilado para um quarto
isolado, perto da cozinha do apartamento alugado. Lá poderia roncar a vontade,
alegaram. E assim foi feito, com o consentimento do restante do grupo familiar,
bando de traíras. Pior foi aturar a cara faceira, de noite bem dormida, das
duas peraltas nas manhãs seguintes.
Em outra ocasião, o
amigo e parceiro de trabalho Pedro Macedo, com o qual dividi o quarto de hotel
num evento gravou minha roncadeira noturna e depois apresentou a gravação em
reunião de diretoria na instituição onde labutávamos. Foi constrangedor e, por
isso, como no caso do Mário Marcos, recomendo que se escolha pessoas mais
tolerantes como companheiros de
hospedagem.
Já tentei me tratar,
freqüentando duas noitadas em
laboratórios do sono, que rivalizam em mal estar com as tomografias, com o agravante que duram a noite toda e nem café
da manhã te oferecem na saída. Dois CPAPs (aparelhos anti roncos) dormitam
inertes na minha cabeceira, porque usar aquela máscara
toda a noite e todas as noites era um suplicio. Sem contar que em viagens
significam mais um trambolho a ser carregado.
Sei de casos de separações de casais por causa dos roncos
do companheiro de leito, e trato no masculino porque a maioria dos
perturbadores é de homens. Consta que são crises conjugais tão sérias que
rivalizam com as causadas pela infidelidade de um ou outro parceiro, Pelo
visto, estamos diante de uma situação dramática, mas que não precisa chegar ao
ponto de escorraçar e provocar a marginalização de quem ronca, especialmente
pelos mais chegados.
Como todos os discriminados, nós, os roncadores, queremos
reconhecimento, relevância e condescendência diante da nossa condição de quase
rejeição social. Trata-se de uma questão identitária, atestada pela sonoridade
peculiar do nosso sono.
É hora de roncarmos unidos contra a intolerância.
Reparações, já. Tamo junto, Mário Marcos. e vai o meu estridente repúdio ao
David.
Nenhum comentário:
Postar um comentário