segunda-feira, 17 de dezembro de 2018

A República dos Motoristas


* Publicado  nesta data em Coletiva.net
No Brasil, a assertiva do velho Marx de que a história se repete, a primeira vez como tragédia  e a  segunda como farsa, não é bem assim. Aqui se repete como tragédia, drama, comedia  e, sobretudo, como farsa. E como se repete, repete, repete!

Invoco Marx a propósito da interferência repetitiva dos motoristas na vida brasileira, especialmente no período  da redemocratização. Valeria certamente um estudo acadêmico mais  aprofundado sobre estes profissionais  e a influência deles no curso da história. Não falo dos caminhoneiros  que derrubaram a economia  com a paralisação em maio – foram protagonistas também, apesar  do desserviço prestado -,  mas dos motoristas que tem a responsabilidade do leva e traz  das autoridades.

Um caso notório é  do ex-motorista de Fernando Collor, Eriberto França, que  denunciou  pagamentos indevidos ao  então presidente e isso foi decisivo no processo que resultou no impeachment.



Só que a realidade, às vezes, é cruel, tanto assim que Eriberto, conhecido como “ o motorista que derrubou Collor”, amargou o desemprego por um bom tempo, enquanto o ex-presidente voltou ao Senado e às maracutaias, e tem sido citado com assiduidade na Lava Jato.



Não é motorista, mas mesmo assim merece o registro pelas atitudes que tomou, o caseiro Francenildo  Costa em meio ao escândalo do Mensalão. Ele denunciou os contatos de Antonio Palocci, então ministro da Fazenda de Lula,  com lobistas desejosos de “negociar” com o governo ,  teve seu sigilo bancário quebrado, o que acabou servindo para tornar insustentável a permanência do denunciado no cargo.  



Francenildo  também enfrentou o desemprego, mas, se serve de consolo, Palocci, diferente de Collor, foi encarcerado, se bem que acabou beneficiado agora, depois da delação premiada, com prisão  domiciliar.



Mais recentemente, denúncias de dois motoristas complicam a posse como ministra do Trabalho da deputada  Cristiane Brasil, que descumpriu a legislação trabalhista na relação com os profissionais. A deputada violou uma regra básica: os motoristas, que tudo ouvem e a tudo assistem, são cargos de confiança por excelência e como tal devem ser tratados.



E ganha as manchetes agora a suspeita envolvendo o motorista de Flávio Bolsonaro, filho do presidente eleito. O sujeito, morador de uma casa modesta na periferia do Rio, movimentou mais de R$ 1,2 milhão na sua conta bancária, conforme revelação do atento COAF. Um cheque de R$ 24 mil para a futura primeira dama aproximou  ainda mais Jair Bolsonaro do imbróglio. Até agora as explicações dos envolvidos  revelam um tanto de amadorismo e outro tanto de desfaçatez.



O principal personagem – o motora – até domingo ainda não tinha aparecido para se explicar.  Dependendo dos desdobramentos, o episódio pode ter como inédito efeito na política brasileira uma fragilidade do governo antes mesmo de  assumir. E nem dá pra culpar o motorista, que parece ser mero intermediário nessa malsucedida operação.



Por fim, poderia falar também do papel desempenhado por ex-mulheres, ex-namoradas e ex-amantes nos grandes escândalos nacionais, mas aí é outra história, que também se repete, repete, repete.


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