quarta-feira, 20 de junho de 2018

Reflexões em tempo de Copa


As duas funções que mais evoluíram no futebol foram as do goleiro e do árbitro. Por motivos diferentes, é óbvio. O goleiro é o mais privilegiado dos  jogadores porque é o único que pode jogar com as mãos  e  também é  o único a contar com um treinador só para ele,  o que talvez explique a evolução desses profissionais da bola. Entretanto, é no uso dos pés em saídas de bola mais qualificadas, ao invés dos chutões  a deus dará, que ocorreu mais um fator  de diferenciação dos goleiros. O futsal já  usava essa estratégia do goleiro-linha e no futebol acredito que o alemão Neuer a consagrou na Copa  de 2014. Pelo menos, foi a primeira vez que assisti a um goleiro tão adiantado e tão desenvolvo  nas saídas da área, no jogo Alemanha x Argélia, no Beira-Rio.

Segundo os estudiosos do tema, a grande transformação que fez com que o goleiro fosse visto como um jogador a mais, começa a partir  de 1993 quando a Fifa proíbe que ele agarre com a mão as bolas recuadas pelos companheiros.  O objetivo era acabar com o antijogo, mas o resultado superou a isso, obrigando o goleiro a ser hábil com os pés e gerando novas possibilidades para seu time.

Antes disso, o futebol brasileiro já começara a se livrar da fama de não ser um grande formador  de goleiros, fama originada talvez no histórico de duas excepcionais seleções  nacionais contarem como titulares no gol com profissionais inconfiáveis, para dizer o mínimo, no caso  Félix (1970) e Valdir Peres (1982). É bem verdade, também, que desde as peladas na infância nossa vocação ofensivista reservava aos “perebas” a alternativa de ser goleiro, exceto se o garoto fosse o dono da bola.

Aí veio a era “vai que é tua Taffarel” nas três copas dos anos 1990 e o Brasil passou a ser exportador de craques no gol, a começar pelo próprio Taffarel,  hoje o treinador de goleiros da seleção, que saiu do Inter para os italianos Parma, depois Reggiana e mais tarde o Galatasaray (Turquia).  Não dá para esquecer de Rogério Ceni, o goleiro artilheiro do São Paulo.  Essa geração resultou numa linhagem de grandes goleiros, que se dá ao luxo de deixar Marcelo Grohe fora da seleção. Vale  lembrar que dois dos três convocados para a posição atuam no exterior, Alisson no Roma  e Éderson no Manchester  City.

Já o árbitro ganhou nova dimensão graças a tecnologia, que, afinal, chegou ao futebol, vencendo a resistência dos velhinhos da International Board, o órgão da FIFA que dita as regras do futebol. O VAR (o árbitro assistente de vídeo, em tradução livre)  e o chip, que alerta se a bola ultrapassou ou não a linha de  gol, já foram apelidados de “paraquedas das arbitragens”, embora para os críticos seja mais gente cometendo erros.

Graças a interferência do VAR quatro pênaltis foram confirmados pelos árbitros na Copa até agora.  A aplicação do sistema, entretanto,  ainda é controversa e as incidências do jogo Brasil x Suíça servem de exemplo, no caso pela omissão.  Por outro lado, a controvérsia reduz  o temor dos mais fanáticos de que essa tecnologia acabaria com as acaloradas polêmicas em torno de lances duvidosos. E, dessa forma, os árbitros que deveriam ser figuras secundárias no jogo  (“árbitro bom é o que  não aparece”, é uma das máximas do futebol), foram guindados à posição de grandes destaques, merecedores, já há um bom tempo,  de credenciados observadores da sua atuação nas coberturas esportivas de rádio e tv.

A verdade é que todos os méritos dos goleiros e  os eventuais acertos do arbitro caem por terra  quando um e outro falha. No caso do goleiro, vale de novo o exemplo do Brasil: Alisson, de grandes atuações até aqui, teve a  reputação arranhada por não ter saído do gol e interceptado o cruzamento que resultou no empate  da Suíça. Já os árbitros são historicamente  responsabilizados quando o resultado não favorece ao time para  o qual se torce. O VAR pode  ajudar, mas não resolve tudo, porque a decisão da arbitragem em campo sempre estará sujeita ao fator humano, até  mesmo se deve ou não acionar o sistema.

Assim, o arbitro e o goleiro não escapam à grandeza ou à desdita do futebol, ditadas sempre pela emoção que move milhões de entusiastas pelo mundo todo.

Nenhum comentário:

Postar um comentário