* Publicado originalmente em maio/2010, mas o tema está atualíssimo.
Foi perturbadora, para dizer o mínimo, a conferência do médico e cientista
Miguel Nicolelis na abertura da edição 2010 do Fronteiras do Pensamento.
Perturbadora porque não tinha idéia do alcance do trabalho desenvolvido à frente
do Instituto Internacional de Neurociência de Natal-RN, nem maginava o avanço
das pesquisas realizadas na Universidade de Duke-EUA e seu potencial de
melhorias para a raça humana. A grande mídia parece não se interessar sobre os
experimentos e os projetos do dr. Nicolelis.
As experiências com macacos
- aos quais Nicolelis se refere amorosamente e não como simples cobaias -,
trazem esperança de devolver a mobilidade a portadores de necessidades
especiais, por meio das chamadas próteses neurais – equipamentos eletrônicos que
podem ser acionados por sinais cerebrais. Igualmente, as pesquisas buscam
apontar caminhos para os portadores de doenças degenerativas, como o Mal de
Parkinsom - no caso as experiências são com camundongos.
Nicolelis, 49
anos, palmeirense fanático, não se limitou ao relato de cases, mas mostrou
macacos e camundongos em ação, durante as experiências, com resultados visíveis.
É impressionante o vídeo em que uma de suas macacas preferidas (seria a Aurora?)
joga videogame, comandando por estímulos cerebrais um braço mecânico localizado
em outra sala. Detalhe importante: a macaca várias vezes tenta trapacear no
jogo, como se fosse um humano qualquer. É isso que também me leva a considerar
perturbadora a exposição de Nicolelis. Ao assistir aos vídeos a relação
obrigatória foi com a obra O Planeta dos Macacos, na qual os símios, de evolução
em evolução, acabam dominando a Terra, transformando em escravos os decadentes
humanos. Prefiro pensar que as experiências dos neurocientistas vão trazer novas
e boas perspectivas para futuro da humanidade. Certamente é isso que move o dr.
Nicolelis e suas equipes, nos EUA e aqui.
A conferencia foi também
encantadora quando Nicolelis revelou a grande dimensão social do trabalho
realizado em Natal, não apenas nos bem aparelhados laboratórios, mas envolvendo
crianças e jovens da periferia em uma das áreas mais carentes do país. Um
trabalho de iniciação científica e inclusão social de valor incalculável, por
meio da Fundação Alberto Santos Dumont que empresta seu apoio a todo o
projeto.
A escolha de Santos Dumont para batizar a Fundação não é
aleatória. O “Pai da Aviação” é inspiração para Nicolelis. O cientista se
emociona quando vincula a obra do brasileiro que tornou realidade o sonho de
Ícaro com o trabalho desenvolvido em Natal. Santos Dumont sonhou e foi atrás da
realização de seu sonho. E é disso que Nicolelis fala e destaca: de gente que
sonha e realiza, que promete e entrega, que projeta e faz acontecer; na crença
na energia humana a serviço do bem-comum.
Trata-se de um Paulo Coelho da
Ciência, questiona alguém? Devagar com o andor, porque o misticismo passa ao
largo das argumentações do pesquisador, seus conteúdos têm sólida base
científica e resultados demonstráveis para reforçá-los.
Nicolelis foi
aplaudido de pé pelo público que lotou o Salão de Atos da Ufrgs, segunda-feira à
noite. Acredito que seja a primeira vez que isso acontece no Fronteiras. O nosso
Santos Dumont da neurociência já merece o Prêmio Nobel de Medicina para o qual
está sendo cogitado
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