terça-feira, 30 de janeiro de 2024

No tempo das carreteras

 *Publicado em 29/01/2024 em coletiva.net 

Sou do tempo em que as competições de Automobilismo eram fortes e despertavam grande interesse  no público gaúcho. Havia torcida para os principais pilotos, entre eles os irmãos Catarino e Júlio Andreata, Breno Fornari, Diogo Elwanger, Aristides Bertuol e José Asmuz,- o maior rival de Catarino; depois presidente do Inter. Eles competiam com as carreteras, construídas com base em cupês Ford e Chevrolet dos anos 1930/40. Eram carros altos e desengonçados, mas potentes e resistentes. Os gaúchos haviam herdado o conceito dos argentinos e, com as carreteras, dominaram os primeiros anos das Mil Milhas Brasileiras, em Interlagos,, batendo os pilotos paulistas e cariocas, mais acostumados a competir com carros esporte ou de origem europeia. 

Saudosismo a parte, confesso que nunca fui um aficionado das corridas, nem na fase áurea dos brasileiros na Fórmula 1, com Fittipaldi, Piquet e Senna. Como jornalista da editoria de Esportes acompanhava mais por dever de ofício. E foi como repórter em início de carreira que participei pela Zero Hora, da minha primeira e única cobertura de uma prova automobilística. Isso nos idos dos anos 1970, bem depois do tempo das carreteras. 

A indicação foi da saudosa Joyce Larronda, que já era uma experiente e respeitada especialista em Automobilismo. Indicação validada pelo editor de Esportes, um maluco talentoso, que cedo nos deixou, o Cói Lopes de Almeida. A prova a ser coberta era a tradicional 12 Horas de Tarumã (ainda é promovida?), tão prestigiada à época que teve transmissão ininterrupta das rádios Guaíba, Gaúcha e Continental. Também iniciante na editoria, o  Amauri Mello (que depois fez carreira em O Globo; hoje já falecido) ,  foi meu companheiro na cobertura da prova, que começava a meia noite. 

Como pouco entendia de Automobilismo competitivo, pedi instruções à Joyce, que sugeriu que fizesse uma matéria de ambiente e planilhássemos os problemas de cada carro que entrasse nos boxes. E assim, noite adentro e na manhã seguinte, Amauri e eu percorremos a área dos boxes em Tarumã, questionando cada piloto em sua parada, o que resultaria em matéria depois. Foi quando, no meu caso, o desconhecimento da questão central da cobertura aflorou, assim que o garotão do Simca amarelo entrou nos boxes, abandonando a prova. 

- Qual foi o problema?,- questionei

- Acabou a corda, respondeu o piloto.

Certo de que se tratava de algum desajuste do virabrequim, anotei a informação, até ser interrompido pelo atônito rapaz,

- É brincadeira, brincadeira. Foi outro problema, - emendou ele.. 

Claro que a Joyce, ao editar o material, evitaria o vexame do jovem repórter, mas divertiu-se, junto com o Cói, quando, envergonhado, relatei o episódio. Em compensação, a matéria de ambiente, contando especialmente a movimentação durante a noite em Tarumã, foi publicada e mereceu elogios. 

Agora me dou conta de que dos quatro jornalistas aqui citados, apenas eu sobrevivo com essas memórias. Fica a imensa saudade do Cói, do Amauri e da Joyce, a mais recente perda, em 2021.

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