segunda-feira, 4 de setembro de 2023

Histórias do Goulart

* Publicado nesta data em coletiva.net

Hoje cedo o espaço para o jornalista e escritor Antônio Goulart. Além de bom de texto, Goulart é um colecionador de divertidas ou curiosas histórias, como estas:

O lado folclórico do futebol

A história não guardou o nome do técnico de origem nordestina que, décadas atrás, foi trabalhar num pequeno clube  do interior paulista, mas tornou-se logo popular pela maneira como transmitia suas instruções aos jogadores. Usava uma linguagem cheia de imagens pitorescas e comparações originais. Contam que, antes do primeiro treino, o homem reuniu o grupo e começou a dar as seguintes orientações:

            - Quero um goleiro que nem bananeira no vento.

            - De que jeito? – perguntou o titular da posição.

            - Caindo para os dois lados. E tem mais, quero os laterais que nem parafuso: indo e voltando. Beque de área que nem coqueiro: plantado. O ataque que nem rabo de vaca: se mexendo de um lado para o outro.

            A esta altura o pessoal da meia-cancha quis saber: - E nós?

            - Vocês que nem balaio de pastel: alimentando o ataque.

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            Amaral, o simpático volante negro do Palmeiras, antes de se profissionalizar como jogador, trabalhou numa funerária de Goiânia, sua cidade natal.  Certa vez, ao desembarcar  na África do Sul para um  amistoso da seleção,  na época do famigerado regime racista, um repórter perguntou:

            - E daí, Amaral, como vais encarar aqui o apartheid? Não te preocupa? – A resposta veio direta:

            - Olha, eu nunca vi esse cara jogar. Mas se eu tiver que marcá-lo, ele não vai ter moleza.

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            Antes de um clássico no Pacaembu, começou a cair o maior toró. Um locutor famoso, em sua cabine, emposta a voz e anuncia:

            - Senhores e senhoras ouvintes, chove torrencialmente nos quatro cantos do gramado.

            O repórter, que se encontrava no meio do campo, acrescenta:

            - E aqui no círculo central também.

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            João Mendonça Falcão foi uma figura folclórica. Além de político e empresário, dirigiu a Federação Paulista de Futebol por quase 15 anos. Quando chefiava a delegação brasileira,  num giro da nossa seleção pela Europa, ao ser homenageado em Lisboa pela Federação Portuguesa de Futebol, ao final de um banquete de luxo, em seu discurso de agradecimento, Mendonça falou: “Saúdo em primeiro lugar o ilustre presidente desta federação e também sua digníssima esposa, senhora Filomena. (E, após breve pausa, acrescenta): Esta, sim, a verdadeira portuguesa de desportos!” Dizem que os aplausos foram demorados.

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 Em 1916, como conselheiro do Governo, Rui Barbosa deveria viajar à Argentina, onde representaria o país numa importante reunião. Quando soube que o mesmo navio do Loide levaria também o escrete brasileiro que iria jogar em Tucumã, o conselheiro foi taxativo: "Eu não posso viajar com um time de futebol". Resultado: nossa seleção teve que fazer os 4 mil quilômetros de trem. Hoje, semelhante atitude seria um escândalo sem tamanho.

 

 

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            Eduardo Galeano, o escritor uruguaio falecido em 2015, amante do futebol, conta no seu livro “Futebol ao sol e à sombra” um episódio bizarro que chamou de “gol bis”, e que provavelmente nunca irá se repetir. O  craque Zizinho, durante a Copa de 1950 no Brasil, no jogo contra a Iugoslávia, tinha feito um gol legítimo, que o árbitro anulou. “Então – relata Galeano -, ele repetiu igualzinho, passo a passo. Zizinho entrou na área pelo mesmo lugar, esquivou-se do mesmo beque iugoslavo com a mesma delicadeza, escapando pela esquerda como tinha feito antes, e cravou a bola exatamente no mesmo ângulo. Depois, chutou com fúria, várias vezes contra a rede.” E o escritor conclui: “O árbitro compreendeu que Zizinho era capaz de repetir aquele gol dez vezes mais, e não teve outro remédio senão aceitá-lo.”

 

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