segunda-feira, 29 de maio de 2023

O Planeta dos Cães

*Publicado nesta data em coletiva.net

Fosse eu um roteirista medianamente talentoso adaptaria para o cinema um roteiro tipo o que produziu O Planeta dos Macacos, mas agora como O Planeta dos Cães, ou The Pets Planet na versão em inglês. A história seria mais ou menos assim: a cachorrada, graças ao tratamento refinado recebido ao longo dos anos  em alimentação,  suplementos, cuidados veterinários, adestramento, confortos em casa e muito carinho, evolui para um estágio superior, enquanto os humanos, entretidos nas redes sociais e acomodados às modernidades, involuíram cada vez mais, perdendo espaço e poder para os seus mascotes.

Só que os cães, um tanto agradecidos, não tratarão mal seus ex-tutores, garantindo-lhes o mínimo para a sobrevivência: comida, água e uma casinha no quintal para dormirem. Não haverá coleira para os humanos, pois  os cães não perderão tempo em sair a passear com as pessoas. Mas os celulares ou similares serão confiscados e a circulação humana ficará restrita, até  porque os automóveis serão transformados em habitações populares para os animais em situação de rua. Assim eles não ficariam vagando por aí, a esmo, como os humanos.

Os gatos, entretanto, serão discriminados e hostilizados porque concorriam com os cães na conquista do planeta. Mais frágeis e menos combativos, ficaram um degrau abaixo na escala evolutiva e agora pagam caro por esse retardo. A vingança dos gatos é miarem todas as noites e a noite toda  para perturbar o sono dos cachorros, que revidam com uma severa repressão aos felinos.  Os macacos também estão na mira da cachorrada, só que os espertos símios, que já comandaram o planeta e sabem como a coisa funciona, ficam lá na copa das árvores, mexendo com os novos donos do pedaço e defecando nas cabeças deles. Até por isso, é considerada ofensa grave, passível de prisão por crime de racismo, um cão ser chamado de “macaco”.

O roteiro irá mostrar também as dificuldades para a implantação do Regime Canino. Os cães mais ferozes, dos  clãs dos Mastiff, dos Pitubull, dos Cães-Lobos, dos Bulldog passam se digladiando pelo poder e nem o líder máximo, o autoritário Dobermann, conseguia neutralizar os briguentos. Os cães mais representativos dos raças populares, liderados pelo Vira-lata Caramelo, reclamavam que os animais das raças tidas como nobres, os Fox Terrier, os Bichon Frisé, os Chow Chow, os Lulus da Pomerânia recebiam privilégios e se assumiram como elites da sociedade canina. Criaram-se verdadeiras castas. “Continuam sendo cachorros de madame”, acusava a turma do Caramelo . Os clãs de cães do hemisfério Sul como o Fila Brasileiro, o Pila Argentino, o Pastor Australiano  denunciaram que  estavam sendo vítimas de discriminação do europeu Dogue Alemão e do Buldog Americano.  Já os primos Lobos, conhecidos arruaceiros, formaram gangues que passaram a ameaçar os cães de bem, sem que fossem combatidos nas suas investidas.

Enfim, a utopia canina virou um mero canil, um mundo cão e, ainda, reproduzindo o que de pior havia na sociedade humana. O Cãonselho dos Sábios, integrado pelo Pastor Alemão, o Labrador Retrevier, o Border Collie, o Husk Siberiano e o Rottweiller destitui o líder e decide devolver o poder aos humanos. Aí acontece o inesperado: a raça que sucedeu os humanos, provida das necessidades básicas, havia aderido a uma zona de conforto e, assim, continuou involuindo e ficou inapta para retomar o status anterior.

Foi então que os ladinos e ágeis macacos deram o golpe e reassumiram o poder que um dia  fora deles, restaurando o Planeta dos Macacos. E ainda desdenharam dos ex-senhores: “Aquele pessoal ainda andava de quatro patas!”. Os de quatro patas perderam o poder e as mordomias de antes, passando a dividir com os humanoides os espaços que restaram, os restos de comida, uma tigela de água e a casinha no pátio. Uma cena dramática para finalizar a o roteiro.Para efeito de produção cinematográfica pode começar na sequência uma nova saga da franquia O Planeta dos Macacos, com várias continuações.

Alô, Netflix, alô Spielberg. Podem me contatar. Não tenho agente, é negociação direta pelos direitos do roteiro.

Claro que tudo isso é ficção, mas por via das dúvidas vou ficar atento às reações e atitudes da Felícia e do Godo, os pets aqui de casa. Vai que...

 

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