*Publicado em coletiva.net em 13/12
Fico encantado cada vez
que passo, nas minhas caminhadas de fim de semana, pelo espaço no Calçadão de
Ipanema onde se reúne a tribo dos aeromodelistas. Confesso que diminuo o passo
e aguço a audição para acompanhar os diálogos sobre as pequenas aeronaves,
civis e militares, que aterrissam naquele espaço à beira do Guaíba e que em
seguida estarão fazendo acrobacias e zumbindo pra lá e pra cá, manejadas à
distância por seus pilotos em terra e
acompanhadas com interesse e entusiasmo
pelos parceiros e os passantes. Poderia ser brincadeira de criança, mas
não há criança entre os aeromodelistas, apenas senhores de meia idade ou mais,
com muitas horas de voo dos seus pequenos pássaros motorizados.
O fascínio por esses
brinquedinhos certamente remete aos melhores anos da infância, só que agora se
apresentam como uma terceira infância, travestida de animados encontros de
homens e suas máquinas. Nada a ver com a terceira infância do desenvolvimento
das crianças, a etapa dos 10 aos 12 anos. Quem sabe não estão ali no mini campo
de pouso improvisado pilotos frustrados a resgatar um sonho de guri, agora
realizado em outra dimensão? Não me
animo a questioná-los a respeito porque certamente vão tomar por provocação,
além de atrapalhar os preparativos para a decolagem que virá a seguir.
Também me identifico com outra tribo da terceira infância, a dos
praticantes do futebol de mesa, os botonistas. Essa identificação remonta à
verdadeira infância, quando recebi de presente no Natal um jogo de botões
panelinha com a estrela solitária do
Botafogo, para o qual comecei e torcer fervorosamente, além do Grêmio, claro.
Mais adiante, passei a fazer botões de plástico derretidos em fôrmas de
tampinhas, já que não tinha grana para os puxadores manufaturados de então, e
usar caixas de fósforo como inconfiáveis goleiros. Hoje, sei de marmanjos que
acondicionam seus times, misturando Neymar, Messi, Cristiano Ronaldo, Mbappé e
outros menos votados, em caixas cheias de mordomias, como talco e flanelas
especiais, a fim de conservar e lustrar seus craques de acrílico.
Não me surpreenderei se
barbados de todas as idades resgatarem pistas e bólidos de Autorama e, radicalizando, no rastro dos resultados
olímpicos dos jovens brasileiros, aparecerem veteranos se arriscando a tombos e
fraturas no skate ou a caldos nas
ondas marítimas com novíssimas pranchas
de surfe ou, ainda, piruetas em street
dance. Melhor – e mais seguro -
seria se voltassem a jogar taco nas calçadas, nicar bolitas no
triângulo, empinar pandorgas e acelerar em carrinhos de lomba. Isso sim é
atividade raiz.
Manifestações da
Síndrome de Peter Pan, decretariam os especialistas, referência ao menino,
personagem de livros e filmes, que
permanece sempre criança. Permito-me contraditar, com uma frase
atribuída à Freud: “As vezes um charuto é apenas um charuto” - e não um
símbolo fálico (ele era um contumaz fumante de charutos).
As vezes, muitas vezes
eu diria, uma sessão de aeromodelismo ou
uma competição de futebol de mesa é
apenas um saudável encontro entre amigos, e não uma manifestação da terceira
infância, de brinquedos de gente grande.
Agora, se me derem
licença, vou parar por aqui porque preciso arrumar os soldadinhos de chumbo
para a defesa do meu Forte Apache. Rápido que os selvagens já estão saindo da
caixinha.
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