*Publicado nesta data em Coletiva.net
Sei lá, acho que com o avanço da idade a gente fica menos
tolerante ao barulho e passa a cultuar o silêncio como uma manifestação de
civilidade e respeito anti-etarismo. Falo em causa própria: nada me incomoda
mais no trânsito do que mania dos nossos motoristas de usarem a buzina de forma
desproporcional.
Devia ser infração gravíssima e não apenas leve como
prevê o artigo 227 do Código Nacional de Trânsito o uso exagerado do
equipamento, próximo a hospitais, por exemplo. A penalidade é multa, mas acho
que deviam recolher o veículo e suspender por um bom período a CNH do motora
barulhento. Aliás, o portalegrense é um péssimo e incivilizado motorista.
Esclareço que só uso a buzina, sempre com um toque
breve, como prevê e legislação, quando cruzo ruas onde possam aparecer, de surpresa, outros veículos que não respeitem a
preferencial ou como alerta à pedestres distraídos,
Não estou sozinho nesta cruzada anti-barulheira e de
culto ao silêncio. Só que os exemplos são de
um patamar bem mais qualificado nas reflexões. ” Penso noventa e nove
vezes e nada descubro; deixo de pensar, mergulho em profundo silêncio - e eis
que a verdade se me revela”, afirmava Albert Enisten. Pablo Neruda expressa bem
o culto à quietude como valor no poema O Silêncio:
Agora contaremos até doze
e ficaremos todos quietos.
Por uma vez sobre a terra
não falemos em nenhum idioma,
por um segundo nos detenhamos,
não movamos tanto os braços.
Seria um minuto flagrante,
sem pressa, sem automóveis,
todos estaríamos juntos
em uma quietude instantânea.
Poetas e escritores têm especial predileção pelo
silêncio. Vamos a mais exemplos:
“Minha infância de menina sozinha deu-me duas coisas
que parecem negativas, e foram sempre positivas para mim: silêncio e solidão”.
(Cecília Meireles)
“O campo para que a palavra se instale para o autor e
para o leitor é o campo do silêncio e da audição”. (Adélia Prado)
Para Michel de Montaigne , “O silêncio, tal como a modéstia, ajuda muito
numa conversação”.
Eu só queria falar em silêncio, derivou para buzina e
chegou à poesia. Só que essa misturança não dá rima, pois enquanto faço essas
citações de luminares da palavra, os sujeitos continuam buzinando adoidado lá
fora, mas aqui vou continuar buzinando contra os buzinadores.
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