segunda-feira, 26 de junho de 2023

Confissão de um pai aflito

Na mesma turma que se reunia na mesma mesa, do mesmo bar, nas mesmas quintas-feiras, Ronaldo chamou a atenção para um anúncio:

- Gente, preciso fazer uma confissão pra vocês!

De imediato, os amigos cessaram as conversas paralelas e ficaram à espera da revelação que viria. Não havia segredo entre eles, embora os feitos de cada um sempre fossem vitaminados quando eram relatados à mesa, principalmente as conquistas amorosas. Agora esperavam de Ronaldo, um bem sucedido empresário, uma história picante, vivida com alguma musa de ocasião. Entretanto, Ronaldo assumiu um ar grave e  tomou um gole espichado da cerveja já morna, como se precisasse de aditivo para o complemento do seu anúncio.

- Nem sei como começar. O problema é com meu filho. O rapaz agora parece estar convivendo com uma prática que nem tenho como explicar. 

Deu o gole final na cerveja, serviu-se de mais meio copo, como a ganhar tempo para as revelações que ainda precisaria fazer.  

- Eu tento conversar com ele, acho que o diálogo entre pai e filho é importante, quero ajudar, mas não adianta. Ele gosta mesmo é de estar com aquela nova turma de amigos que são todos do mesmo jeito que ele, usando umas roupas diferentes e umas sacolas suspeitas quando saem não sei pra onde.

Nessa parte do desabafo, os amigos viram que os olhos do companheiro estavam marejados. Quase soluçando, ele deu um longo suspiro e continuou:

- O pior é que a minha ex, a mãe dele, dá força para as esquisitices do Junior e ainda tem a coragem de me dizer que o importante é que ele seja feliz, que não vai deixar de amá-lo por isso e que não está nem aí pra  minha vergonha, ou melhor, a vergonha da família. Tenho até evitado os almoços de domingo na casa dos velhos, pra não ter que dar explicações.

O fato de o filho ter o mesmo nome do pai, agravava a situação, foi o entendimento unânime da mesa. Ronaldo voltou à carga:

- Não sei onde eu errei. O Junior sempre teve do bom e do melhor, escola particular, celulares de última geração, roupas de grife e tênis da moda, curso de inglês e até intercâmbio na Inglaterra. Sei lá se não foi nesse intercâmbio que ele voltou assim, diferente. Agora, o que eu faço? O que vocês me aconselham?

Antes que viessem os conselhos, Ronaldo despejou a angustiante revelação:

- O Junior agora é adepto do beach tênis. Imaginem, do beach tênis!

Caiu um silêncio constrangido sobre a mesa, até que o primeiro parceiro falou:

- Beach tênis, como assim?- exaltou-se o contabilista,

- Bah, essa nova geração..., acrescentou outro, o funcionário público,

- Nem sei o que faria se fosse meu filho, - resmungou o terceiro, o comerciante.

- O governo tinha que fazer alguma coisa com essa gente. No meu tempo...- interveio o ex-delegado.

- Minha solidariedade, Ronaldo e acho que falo em nome de todos os companheiros, - propôs o aspirante a político.  

- Sim, é isso mesmo, tamo junto, amigo - acrescentaram todos.

Ronaldo saiu confortado do encontro. Mas a solidariedade dos parceiros durou só até o final da rodada, porque ele nunca mais foi convidado para a mesma mesa, no mesmo bar, só quem em novo dia, porque já não havia mais ambiente para conviverem com ex-amigo em desgraça.

- Onde já se viu ter um filho adepto do beach ténis? Que pôca vergonha! - foi a justificativa para o seu cancelamento, em mais um momento de unanimidade naquela mesa.

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