segunda-feira, 12 de novembro de 2018

Exemplo de resistência

* Publicado nesta data no Coletiva.net

Mesmo com o encolhimento de uns anos para cá, não é exagero afirmar que  a Feira do Livro é o maior acontecimento anual de Porto Alegre. O encolhimento, pela diminuição de barracas e concentração de todas  as atividades na Praça da Alfândega,  acho até que  foi benéfico para a Feira na medida em que facilitou a circulação e interação das pessoas.  De minha parte confesso  que gosto tanto da Feira que, se pudesse, passava todos os dias lá, o que ocorria quando trabalhava no Centro Histórico. Sempre dava um jeito de escapar até a praça  para esgravatar as caixas de sebos e olhar invejoso para as estantes cheias de livros e, melhor ainda, tomar um chope ali perto no fim da tarde,

Entretanto, nego peremptoriamente que tenha participado da primeira Feira, em 1955.O idealizador do evento foi o jornalista e depois vereador Say Marques, que era diretor do extinto Diário de Notícias, da rede Associada – a Globo da época. Na época, eu tinha cinco anos apenas. Na verdade, começam pelo visionário jornalista  as minhas afinidades com a Feira, uma vez que ele era amigo do meu pai, que o tratava reverentemente como “dr. Say Marques”;  depois, porque tive o privilégio de trabalhar com a filha dele, a competentíssima Rosana Orlandi, primeiro na TVE e mais tarde na RBS TV, onde produz o Galpão Criollo.

Porém, foi quando passei a trabalhar na também já extinta Folha da Tarde, em meados da década de 70 do século passado, que comecei a frequentar a Feira regularmente.  Da redação na Rua Caldas Junior à Feira era um pulo e não havia como ficar indiferente às barraquinhas instaladas ao longo da praça.  Lembro bem o primeiro livro que adquiri. Foi  O Príncipe, de Maquiavel, que ainda faz parte da minha modesta biblioteca e é consultado sempre que necessário,  esse verdadeiro manual da arte da política. Línguas ferinas e adversários invejosos insinuam que adquiri o livro errado, que estaria à procura de O Pequeno Príncipe, de Saint-Exupéry e me “principitei" (sim, com direito a trocadilho) levando O Príncipe. Nego peremptoriamente de novo. Mais tarde também incorporei o Pequeno Príncipe ao meu acervo para que ficasse à disposição dos filhos. 

Desde aquela pioneira incursão, minha relação com a Feira se diversificou. De leitor passei a me envolver mais diretamente com a organização por conta das minhas atividades profissionais, seja na TVE, seja na Prefeitura de Porto  Alegre. Por fim, o envolvimento foi como autor, com direito a quatro sessões de autógrafos.

Em todas as formas de relação, a obsessão pela aquisição dos livros se mantém, embora ainda não tenha batido o recorde de cinco anos atrás quando levei para casa  mais de 30 livros, entre lançamentos e saldos. Este ano já adquiri Um Gato Que Se Chamava Rex, de Lucas Barroso (um exemplar para cada neta, Maria Clara e Rafaela),  Estrada, Meu Humor, do Jorge Estrada, uma coletânea de histórias e gafes da radiofonia, A Historia de Djalma  Beyer, escrito pelo filho, jornalista Márcio Beyer, sem contar o também biográfico Ayrton Patineti dos  Anjos, com a assinatura de Márcio Pinheiro e Roger  Lerina, lançado pouco  antes da  Feira. Recomendo todos, assim como a edição das charges de Sampaio, Ria Por Favor, organizada pela filha Maria Lucia Sampaio, obra distribuída  gratuitamente na barraca da Associação Riograndense  de Imprensa.

Vou revisitar a Feira para levar pelo menos mais duas obras: O Senador Acaba de Morrer, um retrato da carreira  do senador Pinheiro Machado por seu sobrinho-neto, José  Antonio Pinheiro Machado, também conhecido por Anonymus  Gourmet, e o novo romance da bela e  talentosa Letícia Wierzchowski, O Menino Que Comeu Uma Biblioteca, com autógrafos nesta terça-feira. Preciso  resgatar também Revolução Cidadã, legado deixado pelo queridíssimo Cezar Busatto. Além disso, fico na expectativa de mais dois lançamentos, extrafeira: Cavalos e Armas, terceiro romance, já em pré-venda, de Gustavo Machado, dono de um dos  melhores textos  que conheço, e o segundo livro do meu amigo da adolescência, Léo  Ustarroz, o  instigante  Resgate em Pamplona, que tive a honra  de prefaciar.


Ainda sobre a Feira, é importante enfatizar que ela  transcende a crise do mercado livreiro e o crescente descaso que o poder publico passou a dedicar aos eventos culturais, inclusive em Porto Alegre, que se orgulhava da sua efervescência cultural. E já que o termo está na moda, resistência de verdade é com a Feira do Livro. Longa vida a ela.



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