segunda-feira, 9 de janeiro de 2017

Provocações eróticas

A provocação continua. Acho mesmo que estou sendo vítima de uma quadrilha organizada para me desestabilizar. É que todos os dias  meus e-mails pessoais são infestados por  mensagens que relatam maravilhas de aditivos para turbinar  a relação sexual.  Ainda não entendi porque sou alvo deste insidioso marketing erótico. Suspeito que pela faixa etária o algoritmo - ou  será logaritmo? – escolhe a quem direcionar a mensagem. Quanto mais idade,  mais  necessidade de um incentivo químico, deve ser a lógica dos logaritmos – ou será algoritmos? –,  só que no meu caso quebraram a  cara.  Garanto que não preciso e  quando declaro isso publicamente sempre  tem alguém maldoso para acrescentar ...”claro, não pratica mais!”.  De fato, a maldade humana não tem limites.

Apenas a título de ilustração e, reafirmo, só por isso, vale a pena publicizar algumas dessas mensagens provocativas. Exemplos: “Tenha  DUREZA (assim, com caixa alta) que as mulheres  gostam”, postagem de um tal de Jair Ribeiro, que convida para conhecer a erva afrodisíaca  Maca Peruana. O produto deve ser uma maravilha porque promete corrigir a impotência e a disfunção erétil, aumenta a fertilidade, proporciona reposição hormonal natural, com ganhos de energias, força e vigor, isso para resumir os benefícios da Maca Peruana.

Outro exemplo: “Uma noite com mais intensidade e prazer na sua cama”, mensagem de Rodrigo Escobar, parecida com a de da Carolina Correa “Suas noite (sim, maltratando a concordância) com mais intensidade e prazer na sua cama”.  O que não faltam são mensagens apelativas, tipo “Sexoando pra valer sem murchar”, de Rebeca Amaral; “Jamais seja debochado  por falta de desempenho”, de Camila Ribeiro e uma bem direta : “Sua cama vai pegar fogo”, de Salete Duarte. Interessante notar que são todos nomes comuns, como se dessem depoimentos d e usuários  ou beneficiários de um mesmo  produto, comercializado pela mesma empresa.

Já o Rodrigo Duarte apela  para o depoimento do que seria um especialista de credibilidade, o cientista e  endocrinologista Gustavo  Gonzales, de uma  tal Universidade Cayetano Heredia, que trata a Maca Peruana como “milagre dos Andes”, afirmando que “no Peru, muitos homens e mulheres usam a planta para  melhorarem sua vida sexual.” 

Apesar de toda publicidade não me arrisco a usar os produtos anunciados que, repito, aparecem nos meus e-mails para me provocar e desestabilizar.
Alias, é tanto o bombardeio sobre a tal Maca Peruana que não resisto a fazer ilações de mau gosto entre o nome do país de origem da planta e o órgão genital  masculino, reconhecendo que foi uma  bobagem do Peru...
É a minha vingança.


sábado, 7 de janeiro de 2017

Coisas que ainda preciso aprender

Chego aos 6.7 meio lanhado,  aqui e ali, mas inteiro nas funções vitais. Entretanto, estou a dever para o meu dia a dia algumas coisas que nunca aprendi a exercitar e que dificilmente vou incorporar à gama de meus conhecimentos. Esse passivo compreende um rol de coisas simples, prosaicas até, que fazem parte da existência de cada um de nós. É verdade que consegui sobreviver sem elas, se bem que um tanto envergonhado pelo despreparo.

Um exemplo clássico é fazer nó de gravata. Já tentei mil vezes, mas o resultado final fica tão diferente dos arranjos conhecidos que até pensei em patentear o Nó Flávio Dutra, assim mesmo, em caixa alta, como se  fosse nome próprio.  Continuo, porém, sendo um Sem Nó, que só adquire gravata com nó pronto.  Igualmente não consigo dar nó duplo nos cadarços de sapatos e tênis e sou obrigado e cortar os cordões mais longos. A inabilidade manual se estende até a caligrafia, que é incompreensível às vezes até pra mim e que me deu uma trabalheira danada quando tive que autografar o Crônicas da Mesa ao Lado, pois fui obrigado a traduzir, caso a caso, as mensagens que escrevia.  
  
Usar o potencial dos celulares, suas funções e aplicativos, então, nem pensar. Morro de inveja daqueles nerds que sabem tudo e todas as operações dos eletrônicos, enquanto eu me limito as funções de telefone, mensagens, internet e tirar retrato.  Outro dia assisti a minha mulher pagando contas por telefone e descobri que isso é possível, além de outras operações bancárias, mas não me arrisco  com medo de causar enormes complicações ao sistema financeiro nacional e quiçá internacional. 

Gostaria também de saber cozinhar  para preparar do trivial variado à pratos sofisticados, porém, não passo do ovo frito e da torrada, embora seja um competente e elogiado churrasqueiro.

Teria outros projetos a cumprir, alguns deles inconfessáveis, diria escabrosos em alto teor. Mas até mesmo um vô de 6.7 tem direito a sonhar com metas, digamos, diferenciadas. E se, de repente, eu aparecer mais sorridente do que de costume, podem crer que não foi porque aprendi a fazer nó de gravata.


sexta-feira, 23 de dezembro de 2016

Reflexões natalinas

Há uma certa melancolia, quase deprê, neste período de festas. Talvez seja pela obrigatoriedade de mostrar felicidade, enquanto a realidade é desanimadora. Culpa também das revisões que o fim de uma etapa impõe e a conclusão de que muito foi sonhado e pouco concretizado e isso vale tanto para a vida pessoal como para o lado profissional.  Se pelo menos os presentes compensassem as frustrações, mas nem isso tem ajudado.

Foi-se o tempo das cestas de Natal repletas de produtos importados, ou das bebidas finas ou, ainda, dos eletrônicos de última geração oferecidos como mimos por clientes e fornecedores. No Jornalismo tal prática é conhecida como “toco”. Escapa ao meu conhecimento a origem da expressão. Talvez represente coisa pequena e o uso  parece ser exclusivo dos jornalistas gaúchos.

Hoje o recebimento dos regalos é visto com restrições ou tratado como folclore, mesmo porque a operação Lava Jato desnudou o toma lá, da cá em nível bilionário.  E, assim, ofertantes e recebedores foram para a retranca, com os toqueiros bagrinhos, aqueles que recebem um misero espumante moscatel ou um panettone, pagando pelos peixes grandes, pós graduados em mamarem nos recursos públicos.

Não estou aqui para lamentar por nenhum deles. Na verdade, quero deixar meu protesto veemente, em nome de todos os capricornianos que fazem aniversário no Natal ou nos dias próximos. Não são poucos, garanto, mas a maioria alega que é discriminada quanto aos presentes, recebendo um que vale por dois devido a coincidência de datas. Por muito tempo fui vitima dessa sovinice, eis que nasci em 6 de janeiro, dia de Reis (mera coincidência), embora  a data seja referencia a chegada dos reis Magos Melchior, Baltasar e Gaspar à gruta de Belém para presentear o Menino Jesus com ouro, incenso e mirra. No  Uruguai a troca de presentes ocorre nesse dia. Mesmo assim, apesar  de  todo esse respaldo bíblico e de tradição, muitas vezes eu ficava sem o  presente de aniversário.

Nem por isso precisei apelar para o divã dos analistas a fim de curar minha frustração por não ser presenteado  e olha que   nem precisava ser ouro, mirra e incenso, bastava um carrinho, uma bola, um joguinho qualquer.


Não vão faltar línguas maldosas para dizer que estou aqui apelando para o coitadismo e  insinuando  a necessidade de ser presenteado no aniversário próximo -  com vinhos importados, espumantes de boa cepa, cervejas  artesanais, camisas azuis de grife, utensílios para churrascos. Não, gente,  não precisa se incomodar. 

terça-feira, 13 de dezembro de 2016

Autofagia colorada

Se algo de bom aconteceu ao Inter neste ano foi ter jogado fora de casa a última e decisiva partida que confirmou o descenso. Imaginem se o jogo fosse no Beira-Rio: não haveria grade que segurasse a torcida e os gomos do estádio correriam sérios riscos.  Se bem que o time, diante da sua massa torcedora, não seria passivo nem conformista como o que enfrentou o Fluminense. Se...

Nada pode ser pior para um clube da grandeza do Inter do que frequentar a Série B e seus adversários aguerridos e campos que deixam a desejar, Brasil afora. Mas nada pode ser melhor para a coesão de uma grande torcida do que o desafio de empurrar o time para voltar ao convívio dos maiorais.  E vamos combinar que o rebaixamento não é o fim do mundo, ainda mais se cotejarmos com outros acontecimentos trágicos deste 2016 e com toda a agitação do cenário político brasileiro durante o ano.

O que fica do episódio, além da inevitável busca dos culpados pela derrocada –  temos obsessão por apontar culpados, como se isso resolvesse -   é que alguns dos principais personagens do drama vivido pelos colorados ficarão marcados para todo o sempre, assim como o foram Rafael Bandeira dos Santos e Flávio Obino nas quedas gremistas.

Como a confirmar a máxima do velho Marx de que a história só se repete em forma de tragédia e farsa, nem Celso Roth, nem Fernando Carvalho conseguiram honrar seus currículos na hora do cai-não-cai. O resultado  esteve mais para  tragédia do que farsa.  Pior ficou a situação de Fernando Carvalho, o mais vitorioso dirigente colorado de todos os tempos, que acabou sendo uma nova vítima de uma certa autofagia que tem contaminado o Inter e que consome a reputação de personagens colorados icônicos.  Ocorreu com Dunga e Falcão, antes e recentemente, e com Fernandão, este felizmente já resgatado e agora imortalizado no pátio do Beira-Rio.

Nesta hora vale para o Inter e para todos os que amargam reveses no esporte e na vida, uma crônica memorável do mestre Drumond, “Perder, Ganhar, Viver”, a propósito da inesperada eliminação do Brasil para a Itália, na Copa de 82: “(...) chego à conclusão de que a derrota, para a qual nunca estamos preparados, de tanto não a desejarmos nem a admitirmos previamente, é afinal instrumento de renovação da vida.(...) Se uma sucessão de derrotas é arrasadora, também a sucessão constante de vitórias traz consigo o germe de apodrecimento das vontades, a languidez dos estados pós-voluptuosos, que inutiliza o indivíduo e a comunidade atuantes. Perder implica remoção de detritos: começar de novo.”


Fica essa modesta, porém sincera, colaboração de um gremista que já penou duas vezes pela Segundona.

sábado, 26 de novembro de 2016

Bom de cama

O caso da jurada que tirou um cochilo em pleno depoimento do acusado de atropelar os ciclistas na Cidade Baixa e, com isso, obrigou o atropelador a refazer sua defesa, me remete aos constrangimentos que já passei por dormir em público e em situações as mais inusitadas.

Lembro que em determinado período era forçado a participar de demoradas discussões salariais com sindicalistas e eventualmente dormia no meio do encontro. Só era acordado quando o ronco ultrapassava os decibéis dos bate-bocas entre as partes.  Outro caso: como assessor comparecia aos debates eleitorais de um candidato a cargo no executivo e desenvolvi uma técnica que sempre deu certo, eis que conseguia despertar do soninho assim que meu candidato devia perguntar ou responder. Em uma dessas situações, o assessor de outro candidato fotografou a dormida e postou nas redes sociais, com um comentário malicioso. Quando fui acordado parti para cima do sujeito, que era mais alto, mais forte e bem mais jovem do que eu, enchi ele de desaforos, sem que o cacalhão reagisse. Baixinho enfezado é fogo.

Já fui flagrado cochilando no Tá na Mesa da Federasul e olha que o palestrante era dos bons, além de apagões em reuniões de diretoria e de comitês. Num congresso em Canela, em que o presidente da empresa ia palestrar, resolvi sentar na segunda fileira, só que o baba ovo aqui não levou em conta que a apresentação se dava logo após o lauto almoço. Aí aconteceu o inevitável, uma vontade quase insuperável de jiboiar quando as luzes foram reduzidas durante as projeções da palestra. O companheiro ao meu lado não resistiu e se entregou a Morfeu, aumentando a minha aflição, ao imaginar que o presidente poderia pensar que, naquele escurinho, era eu o roncador. Mas bravamente consegui superar aquele momento de puxa-saquismo explicito na fila do gargarejo.

Pior mesmo foi o período em que dormia com o carro parado em sinaleiras, aproveitando aqueles 30 segundos de sinal vermelho, até ser acordado pelas insistentes buzinadas dos outros motoristas. 

Esses casos confirmam que sou bom de sono, o popular ¨bom de cama¨. À noite, deito e logo durmo, mesmo que quase sempre dê uma “pescada” durante a novela, ainda mais se a janta foi acompanhada de uma taça de vinho. É que cada vez mais não consigo resistir aquele apelo ao soninho que vem vindo lá do fundo, os olhos pesam e, de repente, apago. 

Contando assim até parece que sempre tive o melhor dos sonos. Ledo engano. Meu sono era pesado, interrompido várias vezes, até que no laboratório, onde a gente passa a noite cheio de fios conectados, os exames registraram que eu era recordista em apneias, ou seja, tinha qualquer coisa como umas 50 paradas repetidas ou temporárias da respiração por hora. Sobrevivi porque devo ser um forte. Agora aderi ao tratamento recomendado, uso um aparelho que me devolveu a tranquilidade do sono e acabou com os resmungos da Santa, que não conseguia dormir por causa dos meus roncos.


Gostaria de saber mais sobre o caso da jurada dorminhoca. Vai ver a coitada está casada com um sujeito que assumiu o posto de recordista em apneias.

sábado, 19 de novembro de 2016

Enfrentando o medo pânico

Das poucas coisas que me desestabilizam a principal é ter que falar em público. Beira o medo pânico, mas já foi pior. Nos tempos de ginásio no Rosário nas aulas de português o grêmio literário era uma atração para quem gostava de brilhar frente aos colegas, declamando poesia, discursando ou recitando uma redação. Todos os alunos deviam se apresentar pelo menos uma vez e quando chegava a minha era como se fosse para o patíbulo. E lá ia eu para a frente da turma gaguejando um texto, enquanto o pessoal do fundão da aula se divertia com minha timidez em público, diante do olhar reprovador do mestre.  E olha que eu era um estudante bem integrado com os outros colegas, já escrevia razoavelmente bem para aquele período escolar, fazia redações para os outros, mas no dia do malfadado grêmio literário tinha um bloqueio.

Mais tarde, essa dificuldade de me expressar em público contribuí certamente para que não tentasse falar no microfone nos tempos em que atuei em rádio, deixando de investir numa carreira que poderia me ampliar as ofertas no mercado de trabalho da comunicação.  Preferi a retaguarda, um tanto invejoso dos colegas que dominavam a arte de tagarelar  para grandes e pequenas audiências.

Quando assumi certas funções públicas que eventualmente exigiam que fizesse algum pronunciamento não tinha como escapar. Assim que o pessoal do cerimonial informava que deveria obrigatoriamente dirigir algumas palavras à assistência em determinado evento eu queria me enfiar num buraco, sair pela janela, fugar pelos bastidores ou torcer para que uma catástrofe natural qualquer interrompesse a cerimônia. Mas isso nunca aconteceu e aí tive que dominar minha timidez e o bloqueio e inventar alguns artifícios para enfrentar as situações com um mínimo de dignidade.

A primeira lição que ofereço a quem padece do mesmo mal é falar pouco e já anunciar essa disposição no início, especialmente naqueles atos de muitos discursos.  Sempre que possível, pedia ao cerimonial para ser o primeiro a falar,  na esperança de que o meu titubeante pronunciamento seria esquecido na sequência das outras participações, normalmente de cobras criadas na arte de discursar. Além disso, sendo o primeiro, poderia apresentar uma ou outra ideia original, sem o risco de ficar repetitivo.

Também fazia ´parte do meu repertório de enganação, quando representava algum figurão, abrir com o anuncio de que trazia o ¨fraterno abraço¨ e o ¨reconhecimento dele ao valoroso¨ (aqui pode haver uma variação de termos, tipo generoso, aguerrido, corajoso, etc) ¨ao trabalho desenvolvido¨ pelo segmento presente e sua inestimável (aqui também cabem variações como importante, imprescindível,  indispensável, etc) ¨contribuição ao  desenvolvimento da nossa terra¨, ou ¨para beneficiar nossa gente , ou ¨para o pleno exercício da democracia¨, e por aí vai.

Depois era só alinhar mais duas ou três ideias bem básicas, agradecer a acolhida, elogiar os organizadores, sempre olhando em rodízio para a plateia à esquerda, à direita e ao fundo. Quando estava mais seguro, até tentava fazer uma graça. Só que,  como não tinha muito jeito para bancar o engraçado, passei por saias justas, como quando tive que falar num evento promocional pré Copa do Mundo em Punta del Este, diante de representantes do corpo consular. Ao destacar o esforço dos uruguaios para realizar a Copa de 30, fiz referência ao fato de que, naquele tempo, ¨vejam vocês, nem existiam celulares ainda¨, uma bobagem que ninguém entendeu e nem sei porque inclui na peça oratória. Pelo menos me obrigou a abreviar a lengalenga.   

Por fim, sempre que era possível, acrescentava um entusiasta desejo de ¨longa vida à...¨, e customizava à atividade ou aos profissionais presentes. Funcionou sempre e, em contrapartida, até mereci aplausos mais prolongados de plateias menos exigentes.

E assim consegui sobreviver a essa provação que é enfrentar o público, mesmo admitindo que ainda não me livrei de um  incômodo ¨tᨠao final das frases, tá, que não sei quando começou, tá, mas que provavelmente incorporei como bengala, tá, para emendar a frase seguinte, tá.



sábado, 12 de novembro de 2016

Nos tempos do Maipu


¨Na mocidade frequentava todas as noites o Maipu¨.  Foi assim que o Neni abriu a conversa na mesa ao lado. Embora a presença feminina fosse maioria naquele fórum etílico e gastronômico, a sentença do Neni foi a deixa para que os talheres e as taças de espumante ficassem de lado e toda a atenção concentrada no que seria relatado depois. Aqui convém esclarecer que o Maipu era um afamado cabaret que marcou época nos anos 40 e 50 do século passado, com diversificado e qualificado elenco de moças. Ficava no Centro de Porto Alegre e tocava tangos e boleros.  Exceto pelo cardápio musical, seria um Carmen´s Clube de hoje.

O fato de recordar o Maipu e de usar o termo mocidade são reveladores da senioridade do Neni, ele que já foi um guerreiro pegador dos mais bem-sucedidos.

Pois na mocidade o nosso amigo batia ponto todas as noites e arrastava uma asa para uma das moças mais bonitas da casa, mas não era correspondido.

- Eu era um pelado, vivia de mesada e ela dizia que de graça nem pensar.

O tempo foi passando e o Neni curtindo aquele desejo reprimido e rejeitado, até que um dia a sorte lhe sorriu.

- A moça aquela me procurou e disse que queria passar uma noite comigo.

Parece que ouvi um ohh de aprovação das colegas de mesa, enquanto o Neni continuava sua narrativa:

- Eu ainda expliquei para a moça que não tinha dinheiro para ela, nem para o quarto e o táxi, que era o mínimo que a gente oferecia nessas circunstâncias...

De novo parece que ouvi um outro ohh, mas em tom de frustração, até que Neni retomou o assunto em tom triunfal.

- Aí ela disse que eu não me preocupasse porque naquela noite era tudo com ela.

E lá se foram para um hotelzinho de encontros que existia no Menino Deus.  Era o clímax da história e dava para sentir uma tensão quase física no ar, ao redor da mesa ao lado. O clímax virou anticlímax diante da revelação de Neni:

- Na hora H, tudo pronto para uma grande noitada, eu vacilei...

O tal vacilo foi a forma atenuada de dizer que havia brochado, o que arrancou ohhs solidários de um lado e decepcionados de outro. Pior foi enfrentar a ira da parceira, como contou.

- Eu banquei tudo, motel, táxi e nem estou cobrando a minha grana e a única coisa que não podia acontecer era tua  brochada. Que papelão, não me procura mais. Aliás, nem me olha mais, - teria dito a moça, diante de um Neni envergonhado e à beira de uma depressão.

Ficou tão abatido e de tal forma preocupado com o episódio que decidiu consultar um psicólogo, pai de um amigo também frequentador do Maipu.

- Olha, acho que a não ereção se deveu a tua ansiedade, meu rapaz, - ensinou o especialista. E sugeriu:

- Faz o seguinte: consegue dinheiro com teu pai e parentes e tenta de novo com outra moça. Se não funcionar, volta aqui.

Neni seguiu à risca a receita e garante que dessa vez funcionou, sem dar maiores detalhes, obtendo mesmo assim ohhs vitoriosos das senhoras e senhoritas da mesa.

Foi então que me dei conta que tinha começado lá atrás, com um enorme fracasso, a trajetória de grandes e variadas conquistas amorosas do querido Neni. As derrotas, como se sabe, podem ser pedagógicas para os que sabem tirar delas lições para outros enfrentamentos. E foi assim que Neni havia se transformado num mestre e alvo de minha confessada inveja, eu que nunca mereci ohhs da mesa ao lado.




quarta-feira, 2 de novembro de 2016

Se fosse o contrário

Um instigante exercício a ser feito é descrever como os analistas relatariam as causas da derrota de Marchezan, se este fosse o caso. Certamente falariam das suas intermináveis caminhadas pela cidade nos programas de TV, dando a entender que caminhava demais para compensar seu pouco conhecimento da cidade. A equipe de Comunicação seria responsabilizada pelo equívoco. 

Alegariam ainda que seu pavio curto se manifestava nos debates em respostas ríspidas e agressivas às investidas do adversário. Desconstituiriam suas propostas, especialmente as dos pardais denunciadores de carros roubados e a do atendimento médico por telefone.  Parece que estou lendo: ¨O eleitorado não se deixou enganar por tais propostas¨.  Mais ainda: apontariam que o fato de não assumir que fora governo no município e no Estado seria decisivo para a rejeição do eleitorado, que havia flagrado a deslealdade.

Falariam da falta de apoio explícito das lideranças nacionais do partido e do aporte financeiro dos mais ricos.  Até o porte físico em comparação com o adversário seria cotejado: ¨Ele era sempre sorridente mesmo diante de temas complexos, enquanto o oponente se revelava sisudo, preocupado com os problemas em debate¨, alguém por certo escreveria.

Não faltariam outros exemplos, mas a verdade verdadeira é que a história é escrita pelos vencedores.

domingo, 14 de agosto de 2016

O Dia dos Filhos

Reeditado a partir do original publicado em 11/08/2011, mas sempre atual.

Se dependesse de mim, trocava o Dia dos Pais pelo Dia dos Filhos. Parece bobagem, mas o que justifica a paternidade senão os filhos? Filhos são dádivas, sementes que devemos zelar para que cresçam e se transformem em nosso melhor legado para o futuro. Com a certeza de que não errei na receita, celebro então o Dia dos Filhos.

O Dia da Flávia, primogênita, capricorniana como o pai, rebeldia domada pela maturidade, filha e mãe amorosa, solidária e ansiosa com o bem estar dos mais próximos, e agora gerentona. O Dia do Rafael, o atlético do meio, um romântico escorpião e um pouco da sina de rabugento, que agora experimenta as venturas da paternidade. O Dia da Mariana, meu nenê, pequeno dínamo, muita sensibilidade, um passarinho que cedo aprendeu a voar e foi crescer lá longe, voltou ao ninho e se prepara para bater asas de novo.

Talvez não tenha feito justiça, nessas poucas linhas, ao que meus filhos tem de melhor. Mas eles sabem que sinto um enorme orgulho deles e curto a forma como se curtem. E sabem também que o pai que sou foram eles que moldaram. Agora, mais ainda, é eles que me dão o norte e vou estar cada vez mais dependente do rumo que me apontarem.


Instituo, portanto, o Dia dos Filhos e celebro a data, mas aviso: o velho aqui não abre mão dos presentes no domingo. Podem ser até pijamas e chinelos, canecas e camisas azuis, jaquetas e bons vinhos.

segunda-feira, 1 de agosto de 2016

Xô, complexo de viralatas

Entramos na reta final para a Olimpíada do Rio e eu, como a maioria dos brasileiros, está torcendo para não passar a chamada vergonha alheia. Já demos vexames suficientes com os problemas da Vila Olímpica, as declarações infelizes do prefeito do Rio, os serviços básicos que não funcionam, a podridão das águas reservadas aos esportes náuticos, a ameaça terrorista tupiniquim, tudo isso ganhando uma dimensão na mídia que de certa forma abala nossa confiança na capacidade realizadora do país. Havia o mesmo sentimento pré-Copa do Mundo de 2014 e, apesar da torcida do pessoal do contra e à parte as obras superfaturadas e o 7 x 1, fizemos uma competição bem sucedida em termos de organização.  Participei diretamente do trabalho realizado em Porto Alegre e testemunhei o esforço para que tudo desse certo.

A Copa mostrou que tínhamos condições de superar novamente o complexo de viralatas, do qual falava Nelson Rodrigues, inconformado com o sentimento de inferioridade que nos acometia diante dos grandes eventos esportivos. ¨O brasileiro é um narciso às avessas, que cospe na própria imagem. (...) não encontramos pretextos pessoais ou históricos para a autoestima¨, reclamava o mestre.  Assino embaixo.

Faço essas constatações depois de ler as postagens no Facebook dos múltiplos jornalistas esportivos José Alberto Andrade e Sérgio Boaz, recordando os 20 anos da cobertura da Rádio Gaúcha nos Jogos Olímpicos de Atlanta, nos Estados Unidos.  Foi a primeira grande cobertura olímpica da Gaúcha e o evento passou a fazer parte do calendário permanente da emissora. Na postagem dos dois ex-colegas e amigos de sempre, lembrei que de alguma forma contribui para essa investida ao visitar Atlanta, num trabalho de percursoria, logo após a Copa de 94, também realizada nos Estados Unidos. A ideia foi do grande Armindo Ranzolin que queria consolidar o novo conceito adotado pela Gaúcha – ¨a rádio de todos os esportes¨-  e ampliar o leque de produtos oferecidos pelo Departamento de Esportes.

E lá fomos, Cézar Freitas, da RBS TV, e este que vos fala para Atlanta, capital da Geórgia, sede da Coca Cola e da CNN, mas uma cidade com um terço da população de Porto Alegre.  Graças a ajuda do pessoal da TVE espanhola que organizava as comunicações da Copa do Mundo e estava envolvida também com a Olimpíada, fomos muito bem recebidos pelo Comitê Organizador, visitamos todos os locais disponíveis e levantamos os dados necessários para a cobertura prevista pela Gaúcha.

No ano seguinte deixei a RBS e não acompanhei a evolução do projeto, que foi bem-sucedido e, confesso, me deixou emocionado quando começaram as primeiras transmissões.  Diferente, porém, da cobertura da Gaúcha os Jogos Olímpicos de Atlanta foram marcados pela desorganização, especialmente nas questões logísticas, sem contar que um atentado à bomba no Parque Olímpico matou dois e feriu mais de 100.  

A opinião negativa sobre Atlanta 96 não é minha, mas do competente repórter da Globo, Marcos Uchoa, que cobre Olimpíada desde Seul, em 1988, em recente depoimento no Sport TV.  Os jogos de Montreal em 1976 também foram um fracasso, só que financeiro, quase levando a cidade canadense à insolvência. Montreal só se recuperou do baque depois de 20 anos.  Em compensação, Barcelona, 1992 é reconhecida como o melhor exemplo de Jogos bem sucedidos  contribuindo também para recuperar uma parte degrada da cidade.  Aliás, foi naquela competição que a Gaúcha fez seu primeiro investimento em Olimpíada enviando à Barcelona o então repórter Antônio Carlos Macedo, numa dobradinha com a Cláudia Coutinho, da Zero Hora.

A contagem regressiva para os jogos do Rio já começou e mesmo quem não queria a Olimpíada no Brasil parece se alinhar na torcida para que sejamos mais Barcelona e menos Atlanta ou Montreal. Apesar de tudo, o Brasil merece o lugar mais alto no pódio. Xô, complexo de viralata!