*Publicado nesta data em coletiva.net
Deve haver uma relação
muito estreita entre gastronomia e decisões políticas. Só assim para justificar
cafés da manhã, almoços e jantares que reúnem lideranças políticas quando
alguma decisão importante precisa de adesões, principalmente se é o executivo
cortejando os legisladores. A harmonia entre os poderes fica mais harmônica em
torno de uma mesa.
Outro dia ouvi de um
desses comentaristas televisivos que para melhorar a contestada articulação
política do governo federal, o presidente Lula deveria promover mais almoços
com o pessoal da sua base. Ou seja, mais conchavadas políticas. Lula foi além e promoveu até uma sessão no Alvorada para
destrinchar assados de carnes nobres com ministros do STF, no caso Gilmar
Mendes e Alexandre de Moraes. A pauta
com certeza foi sobre assuntos republicanos, ou não, como diria Caetano Veloso.
Mais antigamente, em Brasília,
esses conchavos aconteciam em restaurantes que reuniram a fina flor do PIB político
nacional, como o Piantella, palco de muitos acordos, eis que era frequentado pelo
pessoal da oposição e da situação. Era lá que, sob o comando de Ulysses
Guimarães, se reunia o Clube do Poire, nome de um digestivo à base de pera muito
apreciado pelo veterano deputado.
“Comer é um ato politico”
é a frase que tem sido repetida com frequência por ativistas de diversas áreas,
mas não com o sentido que quero mostrar, de um momento, em torno de uma mesa, de
facilitação do diálogo entre partes discordantes. Além disso, hábitos
alimentares e alguns produtos comestíveis foram incorporados ao linguajar
cotidiano do ambiente político. Coxinha, por exemplo, passou a ser uma
designação para os aliados dos tucanos, enquanto mortadela, como o sanduíche
servido aos simpatizantes nas manifestações, passou a ser sinônimo de
petista. Político em campanha faz questão de ser visto, fotografado e filmado
saboreando um pastel de feira, com café pingado, mostrando que “é gente como a
gente”. Por falar em pingado, vale
lembrar que tivemos por muito tempo a “politica café com leite”, praticada por
São Paulo (produtor de café) e Minas Gerais (produtora de leite). Já a
expressão “acabou em pizza” é usada para uma situação que ficou da mesma
maneira como começou, a exemplo das CPIs que não levam a nada ou para se
referir à acontecimentos de impunidade, muito comuns no universo da política.
As pizzas, especialmente as de calabresa e portuguesa, não merecem essa
analogia.
Quero crer que os
governantes saem mais obesos no fim de mandato pelo consumo de tantas calorias
em galinhadas, churrascadas ou filés com guarnições variadas, sem contar aqueles
cafés da manhã dignos de hotel cinco estrelas, sempre pagos pelo erário. Em circunstâncias diversas, participei de
alguns desses ágapes e, a bem da verdade, tirando os cafés da manhã que não têm
como errar, o cardápio das outras refeições beira o medíocre pela repetição das
mesmos iguarias e sem um mísero Romanée-Conti para acompanhar. Nem o Lula, chegado
a um vinho de boa cepa e acostumado aos cardápios internacionais, aguenta mais
os regabofes palacianos, como comentou após recepção ao presidente argentino. Também
pudera: a chef convidada, Elisa Fernandes, primeira vencedora do Masterchef
Brasil, preparou um cardápio “caipira”, que teve rabada como prato principal.
Aposto que a escolha foi coisa da Janja.
Sei lá, se eu fosse
parlamentar, acho que esses rangos não seriam suficientes para “comprar” meu
voto, mas com um Romanée-Conti a gente podia começar a conversar.
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