*Publicado nesta data em Coletiva.net
Cheguei a uma fase na vida em que praticamente
todos os
dias recebo intimações do tipo “precisamos
almoçar qualquer hora dessas”, ou então
“temos que tomar um café”, interpelações próprias a que fica submetido um semi-aposentado como eu. Os quase
convites partem de ex-companheiros na
mesma condição e necessitados de companhia, passa pelos que tem projetos para
mostrar e buscam opiniões favoráveis ou uma forcinha junto a alguma instância e
chegam até daqueles que me tiram para
guru e estes existem mesmo, não é balaca minha. Todos merecem minha maior consideração e uma
resposta padrão:
- Me convoca. Marca o
dia, a hora e o lugar que me apresento.
E fico aguardando ansioso
para que a convocação se confirme, o que
dificilmente acontece, diferente das minhas prazerosas confrarias, que ocorrem
com a regularidade de um relógio suíço.
É diferente também lá
fora e lembro o ocorrido com um companheiro das antigas, momentaneamente
exiliado nos Estados Unidos, que convidou um novo amigo americano para um
“aparece lá em casa”. No dia seguinte, o amigo se apresentou acompanhado da
mulher, para pasmo do dono da casa que precisou providenciar comes e bebes às
pressas. A lição que o brasileiro
aprendeu é que nos países tidos como civilizados a cordialidade é pra valer.
Aqui ainda estamos naquela do brasileiro cordial da boca pra
fora. Ele se manifesta em todo o seu potencial nas despedidas dos
encontros fortuitos. O quase convite reforça os laços de amizade, é demonstração de intimidade e de reconhecimento
entre os convivas, mesmo que o ágape não
se realize.
A classe politica sabe
disso e usa e abusa dos cafés da manhã, almoços e jantares quando busca apoio
para determinadas questões mais sensíveis ou polêmicas. Os
conquistadores amorosos também investem nos prazeres da mesa que
propiciam as suas parceiras para chegarem aos
prazeres da cama. Aí já é
pragmatismo explicito.
A verdade é que os
convites que eu gostaria de receber, sem desfazer das convocações sinceras e
que se consumam, são para aquele emprego maravilhoso, ganhando bem e com poucas
responsabilidades; ou de um editor generoso disposto a bancar os livros que
sazonalmente tento emplacar ou, melhor ainda, daquela caldável que se insinuou
mas não dá mais sinal de vida. Mas também nestes
casos a efetividade deixa a desejar. Assim, só me resta apelar: toca, telefone, toca.
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