* Publicado nesta data em Coletiva.net
De vez em quando é conveniente tratar de temas menos
áridos. Por isso, me permito divagar
hoje sobre paralelepípedos. Sim, paralelepípedos. A primeira lembrança que
tenho desse objeto é do animado carnaval da
rua Carazinho, no bairro Petrópolis. A Carazinho começa na Protásio Alves
e hoje se vai até a Nilópolis. Mas aqueles
anos 1960 o Carnaval ocorria apenas na
primeira quadra e era promovido pelo casal que tinha um posto dos Correios, em
frente ao qual, no outro lado da rua, ficava o coreto de madeira, modestamente
ornamentado, de onde saia a animação, microfone em punho, do homem do casal.
- Agora está chegando a tribula (...) descendo a avenida,
maltratando os paralelepípedos.
Eu tinha 9 ou 10 anos e ficava encantado com aquela movimentação, sem entender., porém, como
o animador não conseguia pronunciar tribo – as tribos tinham presença forte no
carnaval de então - mas paralelepípedo saia sem erro, sílaba a sílaba, mesmo que
maltratado pelos passistas fantasiados de povos originários. “Descendo a
avenida” até se justificava porque aquele trecho da Carazinho, a partir das
Protásio Alves, tem um declive bem acentuado. Entretanto, até hoje não entendo por
que acusava as “tribulas” de maltratarem os paralelepípedos. Talvez quisesse dar
conta da animação dos carnavalescos, cheios de penas e cocares.
Poucos anos mais tarde, nas aulas de geometria, me
reencontrei com os paralelepípedos, agora como um prisma, com seis faces, sendo
que duas são idênticas e paralelas entre si, conforme a descrição dos livros. Só
então é que me dei conta de porque as pedras de calçamento são conhecidas, dado
a seu formato, de paralelepípedos. Hoje, nas principais ruas e avenidas nem podem
mais ser maltratados por passistas animados, eis que a maioria está coberta por
asfalto.
Aí vem o questionamento: a troco de quê o responsável
por este valorizado espaço resolve escrever sobre os prosaicos paralelepípedos?
Ocorre que tempos atrás me desafiei a imitar Chico Buarque, na antológica Vai
Passar, e dar relevância ao paralelepípedo:
Vai passar
Nessa avenida um samba
popular
Cada paralelepípedo
Da velha cidade
Essa noite vai
Se arrepiar
Ao lembrar
Que aqui passaram
sambas imortais.
Claro que nem de longe tenho um mínimo do talento do genial
compositor, mas superei o desafio, mesmo maltratando o vernáculo, como as “tribulas”
maltrataram os paralelepípedos no Carnaval da rua Carazinho. Vale reprisar que o mote para esta crônica não tem qualquer importância
e surpreendo-me ao constatar que o assunto rendeu pelo menos cinco parágrafos. O que faz a ociosidade!
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