*Publicado nesta data em Coletiva.net
Quem diria, Lula tem se
derramado em elogios ao presidente Trump. “No contato pessoal é outra pessoa”, teria falado
ao próprio americano, na conversa telefônica que mantiveram por 40 minutos. A impressão
passada pelo presidente americano coincide com o insuspeito depoimento de Raquel
Krähenbühl , correspondente da Globo em Washington. Segundo ela, em pesquisa
informal com o pessoal de apoio na Casa Branca, Trump aparece como o mais
cordato e gentil dos últimos presidentes americanos, bem diferente no trato
pessoal da persona carrancuda que aparece nas entrevistas à TV. Bush filho também era bem cotado na
preferência dos serviçais, enquanto Obama surpreendia pelo distanciamento que
mantinha com o pessoal de apoio e a mídia credenciada na Casa Branca. Um
comportamento quase arrogante de Obama, mas que mudava integralmente nas aparições
públicas, quando irradiava simpatia.
Esse depoimento comprova
o que canta Caetano Veloso em Vida Profana: “de perto, ninguém é normal”, ou,
usando uma corruptela, longe das câmeras ninguém é normal. E me remete a
um texto que cometi tempos atrás sobre as reações de nossas celebridades
artísticas diante do assédio do público.
Vários deles foram reprovados no quesito receptividade aos fãs, se bem
que falar mal dos famosos é um esporte nacional.
Poderia enumerar muitos
exemplos, incluindo lideranças políticas que só assumem o figurino de gente boa
em período eleitoral. Porém, todos eles têm que saber que a regra é
clara: quem tem exposição pública não pode se valer disso para destratar
aquele que é obrigado a conviver com o famosinho.
A propósito, lembro
também que já escrevi sobre um confrade de minhas relações que costuma julgar
as pessoas nas dimensões física e jurídica. A física diz respeito aos
atributos pessoais - caráter, personalidade, atitudes – e a jurídica ao
desempenho profissional – competência, entregas, relacionamento funcional,
comprometimento. Assim, não é raro se referir a um conhecido no condicional:
- Na física é uma rica de
uma pessoa, mas, na jurídica, um baita incompetente.
Também é recorrente a
sentença inversa:
- Na jurídica é um grande
profissional, mas na física um péssimo caráter.
Nesta minha jornada
septuagenária sou tentado a concordar com o confrade, eis que tenho
convivido com gente de todas as espécies. Conheço perfis, especialmente
entre as chamadas pessoas públicas, que induzem a grandes enganos com suas atitudes.
Fina flor da meiguice para efeito externo, nas internas são verdadeiros
déspotas. E parece haver uma relação direta entre a ascensão do sujeito e
a incivilidade: quanto mais poderosos, mais autocráticos. Os piores são aqueles
que recebem um carguinho e acham que são deuses.
- Dá-lhe o látego e
conhecerás o tirano, - dizia, algo solene, um diretor de rádio que conheci no
passado, ele mesmo um especialista em disseminar o terror entre os seus
colaboradores.
O látego, para quem não
sabe, é o chicote usado pelo verdugo para flagelar suas vítimas. As vítimas são
todos aqueles obrigados a conviver com os opressores de plantão, porque o
sujeito mal avaliado na jurídica, mas de boa índole, ainda passa, porém, o contrário
não é verdade. Do jeito que vai, daqui a pouco seremos obrigados a imitar
Diógenes, que saia as ruas na Grécia antiga carregando uma lamparina, alegando
que estava a procurar um homem honesto e íntegro. Detalhe: o filosofo era
conhecido como Diógenes, o Cínico, o que deve significar alguma coisa sobre o
caráter dele.
Na verdade, Diógenes
procurava a virtude de uma vida simples e natural, dessa simplicidade e
espontaneidade de que são feitas as pessoas do bem, que prescindem do látego
porque são integras na física e na jurídica. Se me pedirem nomes dos outros,
nem com látego revelo.