segunda-feira, 28 de outubro de 2024

Entre um Gole e Outro , o retorno

* Publicado em Coletiva.net nesta data

A primeira leitura - assim como o primeiro gole - desce suave. A partir de então o prazer vai se renovando a cada página. Um bom livro, como uma boa bebida, depende de uma série de fatores (gosto, intensidade, sabor) mas o resultado quase sempre se vê depois. E, nesse caso, é possível garantir: não há ressaca.

Peraí, esse início é igual ao do texto de lançamento do ano passado? Verdade! E o motivo se explica pelo fato de que o primeiro livro deixou aquela vontade de mais um gole, de mais um prazer. Taí: a sede do leitor será agora saciada com Entre um Gole e Outro - Conversas de Boteco 2.

Nesse novo coquetel literário, os ingredientes aumentaram e a qualidade final – como se parecesse impossível – ficou ainda melhor. Um novo autor entrou, outro novo autor é apresentado (já indicando futuras colaborações) e, no geral, tudo aumentou, em tamanho e em qualidade.

Como nas boas bebidas, essa mesma qualidade precisa ser constante. E esse livro-engarrafado mantém isso. Os Alemers, como ficaram conhecidos os 13 guerreiros que toda semana se reúnem em um tradicional boteco do Menino Deus, estão ainda mais ousados, audaciosos e afiados. Num mix criativo, a obra contempla análises políticas, culturais, assuntos da cidade, memória afetiva e tantos outros temas capazes de alegrar (e até emocionar) o leitor.

Leia sem moderação, saboreie o retrogosto da palavra e venha brindar conosco no próximo dia 31 de outubro, a partir das 18h e até o último gole, no Bar do Alexandre (Rua Saldanha Marinho, 120, esquina Gonçalves Dias - Menino Deus), a adega-literária onde os treze personagens se abrigam semanalmente há mais de seis anos.

Vai aí mais uma dose?

 

Roubartilhei o texto promocional, de autoria do Marcio Pinheiro, para chamar a atenção para o lançamento do segundo volume do livro Entre um Gole e Outro, na próxima quinta-feira. Participam da empreitada os jornalistas Carlos Wagner, Elton Werb, Horst Knak, Luiz Reni Marques, Marcelo Villas-boas, Márcio Pinheiro, Marco Poli, Marcos Martinelli, Mário de Santi, Ricardo Kadão Chaves, Sérgio Schueler, além deste que vos fala. No ano passado, na sessão de autógrafos do primeiro volume, gastamos esferográficas  e quase tivemos câimbras nas mãos de tanto autógrafos que foram dados. Agora esperamos, pelo menos, repetir o mesmo sucesso, porque o livro está tão bom como o primeiro, ou até melhor. Não nos deixem sós.

segunda-feira, 21 de outubro de 2024

Eleições, ontem e hoje, parte 2

*Publicado nesta data em Coletiva.net

Já não se fazem mais campanhas e coberturas eleitorais como antigamente. Sim, sou um saudosista dos dois processos em tempos pretéritos e nem faz tanto tempo assim. Já participei de várias campanhas eleitorais, como profissional ou voluntário, e inúmeras coberturas, especialmente quando atuava em rádio. Neste caso, a primeira foi em 1978, pela Rádio Guaíba, que montou uma grande estrutura e mobilizou uma enorme equipe sob o comando de Antonio Brito, que anos mais tarde se elegeria governador do Estado. A principal disputa foi para o  Senado entre Pedro Simon (MDB) x Mário Ramos, Mariano da Rocha e Gay da Fonseca (Arena). Simon superou os três. Ainda vigorava o regime militar, e os governadores eram escolhidos indiretamente.  

Foram muitas eleições e coberturas desde então. O pessoal do esporte sempre era chamado a integrar e reforçar a equipe envolvida nas transmissões que varavam os dias e as noites para registrar os votos, urna a urna em todo o Estado. E lá estava eu, lépido e faceiro,  normalmente coordenando a cobertura do interior.  A movimentação durava de cinco dias até uma semana, à espera de fechar a última urna, pois as emissoras promoviam a contagem paralela dos votos, concorrendo com a Justiça Eleitoral e sempre anunciavam os vencedores com antecedência. E sempre, também, se vangloriavam de que a margem de erro em relação aos números oficiais era ínfima, o que, de alguma forma, era a gratificação pelo investimento na contratação de dezenas de pessoas para receberem as informações – por telefone – das zonas eleitorais. A concorrências entre as emissoras, Gaúcha  Guaíba principalmente, era  tão ou mais acirrada que os enfrentamentos eleitorais da época.

A disputa pelo anúncio do primeiro voto era feroz e lembro que nas eleições  de 1982 o saudoso Edison Moiano, da Guaíba, que acompanhava  em Canoas a abertura de uma das primeiras urnas, transmitiu  do ginásio onde ocorria a apuração:  “Atenção, saiu o primeiro voto no Estado. É para Alceu Collares!” .  Foi uma vibração incontida na Central de Eleições da então Caldas Junior e aquela “vitória” diante da concorrência serviu de emulação para toda a cobertura.  Indagado mais tarde como conseguira o furo, o esperto Moiano teria confessado que viu de relance o voto que seria de Collares caindo da urna para a contagem e decidiu antecipar o tal primeiro voto.  “E, afinal, um voto para Collares teria que ter naquela urna”, justificou.

Volto bem mais no tempo para lembrar que minha iniciação política começou muito cedo, lá pelos 10 anos, quando meu pai instalava perto de casa, no bairro Petrópolis, uma banquinha para distribuirmos material de meu tio que disputava uma cadeira na Câmara Federal - foi um dos mais votados e mais tarde elegeu-se  senador e depois virou biônico.  Éramos muito politizados a escadinha de oito irmãos, tanto assim  que na disputa pelo governo do Estado , em 1958, meu irmão Telmo instalou em casa um comitê para  o Brizola e minha irmã Silvia um para o Peracchi, com farto material de campanha que buscavam nos comitês de verdade.  Os dois não tinham mais de 15 anos!

Consta que, na época, eu teria me atritado e até chegado as vias de fato com um primo querido, que apareceu lá em casa em uma Kombi totalmente adesivada com material de um candidato que não era o de preferência da minha família. Não lembro do episódio e, como sempre fui um devoto juramentado da paz e da harmonia, afirmo que a tal briga não ocorreu.

Fake news a parte, hoje, graças a votação eletrônica, poucas horas após o fechamento das urnas já se sabe o resultado da eleição. As raras  emoções das jornadas eleitorais ficam por conta dos casos em que a decisão passa para o segundo turno ou de situações peculiares, como o candidato que venceu por um voto no município de Gentil, a disputa  entre dois irmãos em Capão da Canoa ou em que cidade o eleito conquistou o maior índice.  Sim, sou um saudosista das campanhas e coberturas eleitorais de antigamente.

segunda-feira, 14 de outubro de 2024

Eleições, ontem e hoje

 *Publicado nesta data em Coletiva.net

No Brasil, ao invés de promovermos uma reforma política pra valer,  aperfeiçoa-se tão somente o processo de votação. Mesmo que os bolsonaristas e o ditador venezuelano lancem desconfianças sobre a urna eletrônica, o sistema brasileiro é moderno, funciona e é confiável. Os mais antigos vão lembrar das maracutaias dos tempos da votação em cédula de papel. Muito voto em branco foi preenchido por escrutinadores desonestos  à serviço de determinada candidatura e, na sequência,  os mapas de totalização eram fraudados.  Compra de votos, então, era comum, se bem que essa prática voltou a ser denunciada aqui no RS e em outros estados, na atual eleição municipal, inclusive com a participação do crime organizado.

Em passado não muito distante, o caso mais notório de tentativa de trapacear no processo eleitoral envolveu Leonel Brizola na disputa para o governo do Rio em 1982. O episódio ficou conhecido como Caso Proconsult, a empresa contratada pelo TRE para a totalização dos votos, depois acusada de manipular os resultados para favorecer o candidato do então PDS, Moreira Franco. Brizola botou a boca no trombone e com isso conseguiu sustar a fraude e garantir sua eleição, naquele que foi o primeiro pleito direto para escolher governadores, já nos estertores da ditadura militar. Detalhe importante: o voto à época era em cédula de papel.

Hoje, uma grande e custosa estrutura da Justiça Eleitoral (orçamento de R$ 11,8 bilhões em 2024) atua para garantir a lisura dos pleitos, impondo uma série de vedações às candidaturas.  Mesmo assim, as manipulações eleitorais  não foram totalmente eliminadas e surgem de outras formas, além das fake news e uso da IA.  Os fundos partidário e eleitoral (R$ 6 bilhões no total, ou mais de 22 mil Minha Casa, Minha Vida) garantem o financiamento das campanhas, ou seja, o dinheiro público, o nosso dinheiro, fazem a festa dos partidos. A legislação sobre a aplicação do fundos é clara, mas quem não cumpriu as regras pode ganhar perdão   e, assim, a fraude eleitoral, pelo uso irregular dos recursos, é oficializada.

Com isso, aumenta ainda mais o descrédito na política e nos políticos, o que pode ser apontado como a causa de duas anomalias presentes na atual eleição: a alta abstenção e o surgimento de figuras como Pablo Marçal, fazendo o tipo “contra tudo isso que está aí’.

Evidente que existem outras motivações para os dois casos, mas deixo para a colega de página, a cientista social  Elis Radmann, do Instituto Pesquisas de Opinião, avaliar as incidências  com muito mais propriedade do que este bissexto analista.

O  que me desconsola, por um lado, é que Porto Alegre, pela segunda eleição consecutiva, seja a capital campeoníssima em não comparecimento dos eleitores e me conforta, por outro lado, que não tenha surgido aqui nenhum clone do Pablo Marçal buscando espaço na campanha majoritária. Porém, pouco ou nada a comemorar.

segunda-feira, 7 de outubro de 2024

Cancelamento reverso

*Publicado nesta  data em Coletiva.net

Woke é um termo da moda surgido na comunidade afro-americana e que originalmente significava estar alerta para a injustiça racial. Depois, tornou-se sinônimo de políticas  liberais ou de esquerda, que defendem temas como igualdade racial e social, feminismo, o movimento LGBTQIA+, o uso de pronomes de gênero neutro, o multiculturalismo, a ecologia, o direito ao aborto,  entre outros ativismos.  O termo ressurgiu na última década com o movimento Black Lives Matter, criado para denunciar a brutalidade policial contra  afrodescendentes. Dessa vez, seu uso se espalhou para além da comunidade negra e passou a ser empregado com significado mais amplo, chegando mundialmente, com suas bandeiras de luta, a todos os segmentos.

Agora, entretanto, constata-se um forte movimento anti-woke em grandes empresas e manifestações culturais. Gigantes como Ford, Microsoft, Google e Meta, dona do Facebook, Instagram e WhatsApp começam a abandonar as políticas de diversidade. Por aqui, a  John Deere, com sede em Illinois (EUA) e fábrica em Horizontina,  já anunciou   distanciamento de medidas de inclusão e diversidade  Ganha força nos Estados Unidos o abandono da agenda ESG (Environmental, Social and Governance)  sigla que se traduz pela prática da sustentabilidade no universo corporativo,

Na indústria cultural as reações não são diferentes. As produções de Hollywood, por exemplo, enfrentam uma crise evidente ao priorizar narrativas alinhadas com temas woke., afastando-se daquilo que a média do público busca nos filmes, ou seja, boas histórias e personagens envolventes. Resultado: queda no interesse dos espectadores e no retorno dos bilionários investimentos. Com isso, empresas como a Disney, sempre elogiada por sua adesão à cultura woke, já começam a rever sua estratégia e focar no entretenimento para toda a família.

Matéria da BBC News (“O que é 'woke' e por que termo gera batalha cultural e política nos EUA?”) é esclarecedora sobre a questão: “Os críticos da cultura ‘woke’ questionam principalmente os métodos coercitivos adotados por pessoas que eles acusam ser ‘policiais da linguagem’ — sobretudo em expressões e ideias consideradas misóginas, homofóbicas ou racistas”.  E acrescenta: “Um método que vem gerando muito mal estar é o ‘cancelamento’,  o boicote social e profissional, normalmente realizado por meio das redes sociais, contra indivíduos que cometeram ou disseram algo que, para eles, é intolerável”.

Só para ilustrar,  numa redação jornalística de Porto Alegre um colunista usou o termo “frescura” em conversa com outro colega, foi denunciado ao setor de Compliance por alguém que ouviu o palavra, teve que se explicar  e acabou recebendo uma advertência . Esse extremismo, primo irmão do politicamente correto, é que está fragilizando o que deveria ser uma prática saudável,  de defesa de boas causas, de tolerância e aceitação do contraditório, mesmo que não haja convergência de posições.  

A resposta dos críticos é uma espécie de cancelamento reverso à cultura woke. Só que essa  resposta no mundo empresarial é determinada mais pela perspectiva de prejuízos nos negócios, do que por ideologia ou crença em valores. Assim como os bancos e o comércio varejista.do Brasil, que clamam por medidas para restringir  as apostas nas bets, não porque estejam preocupados com as finanças dos despossuídos, mas porque a fezinha que eles fazem estaria drenando, em escala,  recursos que seriam das  operações bancárias ou do consumo. Esse pessoal detesta concorrência, ainda mais quando ameaça os lucros deles.