* Publicado nesta data em coletiva.net
Hoje cedo o espaço para o jornalista e escritor
Antônio Goulart. Além de bom de texto, Goulart é um colecionador de divertidas ou
curiosas histórias, como estas:
O lado folclórico do futebol
A história não guardou o
nome do técnico de origem nordestina que, décadas atrás, foi trabalhar num
pequeno clube do interior paulista, mas tornou-se
logo popular pela maneira como transmitia suas instruções aos jogadores. Usava
uma linguagem cheia de imagens pitorescas e comparações originais. Contam que, antes
do primeiro treino, o homem reuniu o grupo e começou a dar as seguintes
orientações:
-
Quero um goleiro que nem bananeira no vento.
- De
que jeito? – perguntou o titular da posição.
-
Caindo para os dois lados. E tem mais, quero os laterais que nem parafuso: indo
e voltando. Beque de área que nem coqueiro: plantado. O ataque que nem rabo de
vaca: se mexendo de um lado para o outro.
A
esta altura o pessoal da meia-cancha quis saber: - E nós?
-
Vocês que nem balaio de pastel: alimentando o ataque.
************
Amaral,
o simpático volante negro do Palmeiras, antes de se profissionalizar como
jogador, trabalhou numa funerária de Goiânia, sua cidade natal. Certa vez, ao desembarcar na África do Sul para um amistoso da seleção, na época do famigerado regime racista, um
repórter perguntou:
- E
daí, Amaral, como vais encarar aqui o apartheid? Não te preocupa? – A
resposta veio direta:
-
Olha, eu nunca vi esse cara jogar. Mas se eu tiver que marcá-lo, ele não vai
ter moleza.
**************
Antes
de um clássico no Pacaembu, começou a cair o maior toró. Um locutor famoso, em
sua cabine, emposta a voz e anuncia:
-
Senhores e senhoras ouvintes, chove torrencialmente nos quatro cantos do
gramado.
O
repórter, que se encontrava no meio do campo, acrescenta:
- E
aqui no círculo central também.
*************
João
Mendonça Falcão foi uma figura folclórica. Além de político e empresário, dirigiu
a Federação Paulista de Futebol por quase 15 anos. Quando chefiava a delegação
brasileira, num giro da nossa seleção
pela Europa, ao ser homenageado em Lisboa pela Federação Portuguesa de Futebol,
ao final de um banquete de luxo, em seu discurso de agradecimento, Mendonça
falou: “Saúdo em primeiro lugar o ilustre presidente desta federação e também
sua digníssima esposa, senhora Filomena. (E, após breve pausa, acrescenta):
Esta, sim, a verdadeira portuguesa de desportos!” Dizem que os aplausos foram
demorados.
*************
Em 1916, como conselheiro do Governo, Rui
Barbosa deveria viajar à Argentina, onde representaria o país numa importante
reunião. Quando soube que o mesmo navio do Loide levaria também o escrete
brasileiro que iria jogar em Tucumã, o conselheiro foi taxativo: "Eu não
posso viajar com um time de futebol". Resultado: nossa seleção teve que
fazer os 4 mil quilômetros de trem. Hoje, semelhante atitude seria um escândalo
sem tamanho.
***********
Eduardo
Galeano, o escritor uruguaio falecido em 2015, amante do futebol, conta no seu
livro “Futebol ao sol e à sombra” um episódio bizarro que chamou de “gol bis”,
e que provavelmente nunca irá se repetir. O craque Zizinho, durante a Copa de 1950 no
Brasil, no jogo contra a Iugoslávia, tinha feito um gol legítimo, que o árbitro
anulou. “Então – relata Galeano -, ele repetiu igualzinho, passo a passo.
Zizinho entrou na área pelo mesmo lugar, esquivou-se do mesmo beque iugoslavo
com a mesma delicadeza, escapando pela esquerda como tinha feito antes, e
cravou a bola exatamente no mesmo ângulo. Depois, chutou com fúria, várias
vezes contra a rede.” E o escritor conclui: “O árbitro compreendeu que Zizinho
era capaz de repetir aquele gol dez vezes mais, e não teve outro remédio senão aceitá-lo.”