* Publicação nesta data em Coletiva.net
Ano de eleição é ano de
escolhas, que vão influir no nosso dia a dia para o bem ou para o mal. Por
isso, me atrevo a fazer essas recomendações aos eleitores menos afeitos às
artimanhas da política. Não vá atrás do candidato que diz ‘Vem Comigo”. Você
pode entrar numa fria. Preste atenção no que conclama “Você me conhece”, porque
é um ilustre desconhecido. Desconfie dos
que são “contra a velha política”, porque estão prenhes de vontade de fazer
parte dela. Não leve a sério os que usam em vão o santo nome do “povo” e relativize quem diz que defende
ardorosamente o “estado democrático de direito”, porque pode estar diante de um
autoritário raiz. Nas eleições, mais vale o que parece do que aquilo que é falado.
Dito isso, confesso que
tenho uma inveja danada desse pessoal mais apetrechado intelectualmente que
consegue definir pessoas e situações com uma frase, uma tirada. O saudoso ex-deputado
Ibsen Pinheiro, um frasista talentoso, falava de um dos seus tipos
inesquecíveis, o Banal Solene, exemplificando com um
colega de parlamento e conhecido homem de comunicação, como ele. O sujeito
usava citações do tipo “os rios correm inexoravelmente para o mar”, uma lição
que qualquer criança do nível fundamental já sabe, mas que dita com a
devida formalidade e acompanhada de um advérbio, ganhava uma conotação de
ineditismo e frase de efeito.
Em tempo de campanha
eleitoral, faço essa introdução sobre os ardis que a maior ferramenta que
possuímos, a palavra, pode mostrar, a propósito de um livro que encontrei num
balaio na Feira do Livro de Porto Alegre. O título
já diz tudo: “38 estratégias
para vencer qualquer debate’, com o subtítulo “A arte de
ter razão”. Trata-se de uma preciosidade, com métodos e
truques no uso das palavras na argumentação, escrito por Arthur
Schopenhauer, filósofo alemão que viveu entre 1788 e 1860. Mais de dois séculos
depois, a obra se mantém atual como nunca e poderia servir de manual para
qualquer campanha eleitoral moderna, ou como afirma o linguista
alemão Karl Otto Erdmann (1858-1931) na apresentação do livro “ (...) até mesmo
em discussões acadêmicas nos deparamos hoje com os mesmos truques
utilizados há séculos”, muitos deles remontando aos escritos
de Aristóteles (384 AC - 322 AC), sempre citado pelo
autor. Partindo desses escritos, Schopenhauer desenvolve sua
Dialética Erística, a arte de discutir de modo a ter razão.
Aqui vão algumas das
estratégias elencadas pelo filósofo alemão. São aparentemente simples, mas
diretamente eficazes para vencer debates.
Estratégia 9: “Disfarce
seu objetivo final”, de forma que o oponente não saiba aonde você quer chegar e
não possa se precaver.
Estratégia 20: “Não
arrisque num jogo ganho”, se as premissas foram aceitas pelo oponente, não
buscar nova confirmação, mas apresentá-las como verdades absolutas.
Estratégia 28: “Ganhe a
simpatia da audiência e ridicularize o adversário”, aplicável especialmente
quando pessoas cultas discutem diante de uma plateia leiga.
Algumas estratégias são
auto explicáveis como as de numero 29 –“ Não se importe em fugir do assunto se
estiver a ponto de perder” – ou a 36 - “Confunda e assuste o
oponente com palavras complicadas.”
A cada uma das
estratégias corresponderia um exemplo no atual momento politico
brasileiro ou em episódios recentes, como a 32, que os editores do
livro no Brasil (Faro Editorial) escolheram para ilustração. O enunciado é “
Cole um sentido ruim na proposta do outro” e o exemplo é o ataque do
então candidato Bolsonaro, com a ideia do Kit Gay, à
campanha do Ministério da Educação para combater a homofobia. A
pregação amedrontou a população mais conservadora e desinformada e,
como resultado, conseguiu que vários políticos deixassem de apoiar o projeto.
O rol de dissimulações e
pragmatismo do livro de Schopenhauer se encerra com esta pérola na estratégia
38: “Como último recurso parta para o ataque pessoal”, bem assim, no melhor
estilo Pablo Marçal, em São Paulo, deixando de lado o assunto em discussão
(porque ali o jogo está perdido) para atacar de forma ofensiva e rude o
adversário como última esperança de vencer o confronto. O autor ressalta que se
trata de um truque muito apreciado, pois pode e costuma ser usado por qualquer
um, por isso assume como única regra segura contrária aquela que Aristóteles
(sempre ele) apresentou no último capítulo dos Tópicos: não discuta
com o primeiro que aparecer, mas só com quem tem conhecimento suficiente para
não dizer coisas absurdas, que dispute com argumentos e não com afirmações de
força e que valorizem a verdade.
Pelo visto, Schopenhauer
e Aristóteles não tinham nada de banais, nem de solenes.
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