No dia 27 de setembro estávamos, a Santa e eu, em Marrakech quando a Seleção do Marrocos fez um dos seus últimos amistosos antes da Copa do Mundo. Enfrentou o Paraguai, em Sevilha, empatando em 0 x 0. Na mesma noite a seleção brasileira fazia seu último amistoso pré-copa, contra a Tunísia, vencendo por 5 x 1, em Paris.
Os dois jogos estavam
sendo transmitidos pela TV e, jantando no restaurante do hotel, fui conferir
num salão anexo a algazarra dos marroquinos, certo de que era a vibração por
mais um gol do Brasil. Ledo engano: a
cada boa jogada da seleção nacional deles, mais gritaria, gestos de aprovação e
muitas risadas. Imagina se o Marrocos tivesse marcado gols! E olha que estavam
todos de bico seco, pelo menos de bebidas alcóolicas, já que o hotel e seu restaurante não figuravam entre aqueles em que
era permitido servir o produto. Cheguei à conclusão que os marroquinos gostam
tanto de futebol como dos outros esportes de bola - basquete, handebol e rugby.
Abel, nosso guia em
alguns passeios pela cidade, tinha se
mostrado cético quanto ao potencial do Marrocos na Copa, mas dava para observar
em cada canto das ruelas por onde circulamos - cuidando para não sermos
atropelados pela profusão de motos e vespas
-, muitos jovens vestindo, com orgulho, a camiseta vermelha e verde da seleção
nacional. Essa identificação certamente
serviu de emulação para a boa campanha dos marroquinos até agora no Catar.
Vai ter mais algazarra na
volta dos Leões do Atlas - este é o apelido da seleção - pra casa, independente
do que ocorrer daqui pra frente. Isso
porque a eliminação da Espanha, além de ter levado o Marrocos a uma posição
nunca antes alcançada em Copas do Mundo, pode ter representado também uma espécie de desforra
para os marroquinos, que acabaram rendidos pelos espanhóis na chamada Guerra do
Rife, entre 1920 e 27. O Rife é uma região montanhosa ao norte do pais,
defendida por tribos Berberes que, com táticas de guerrilha, inflingiram
inicialmente muitas derrotas às forças espanholas. Após intervenção militar da
França e um grande desembarque de tropas espanholas na região, as tribos locais
foram derrotadas, seu líder Abdel-Krim levado para o exílio e reestabelecido o
domínio dos colonizadores sobre o território.
Parte dessa história é
contada em 13 capítulos na série Tempos de Guerra, exibida pelo Netflix. O enredo se passa
em Melilha, região na qual esteve centralizada uma parte do exército espanhol e
narra a ida de um grupo de enfermeiras, composto por jovens de classe alta de
Madrid e lideradas pela Duquesa Carmen de Angoloti, com a missão de abrir um
hospital no local.
Fui à Wikipedia para mais
informações sobre o conflito, também conhecido como a Segunda Guerra
Marroquina. A enciclopédia pontua que a Guerra do Rife ainda é considerada
controversa entre os historiadores. Para alguns, trata-se do prenúncio do
processo de descolonização no Norte da África. Outros consideram-na uma das últimas guerras
coloniais, já que foi a decisão dos espanhóis de conquistar o Rife -
nominalmente parte do seu protetorado Marroquino, mas de fato independente -
que catalisou a entrada da França no conflito em 1924.
A Guerra do Rife deixou
marcas profundas na memória tanto na Espanha como no Marrocos. A insurgência
Rifenha dos anos 1920 pode ser interpretada como um precursor da guerra de
independência da Argélia, colônia francesa, que ocorreu três décadas depois.
Mas aí já é outra história.
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