sexta-feira, 9 de agosto de 2013

O Dia dos Filhos

Reeditado a partir do original publicado em 11/08/2011

Se dependesse de mim, trocava o Dia dos Pais pelo Dia dos Filhos. Parece bobagem, mas o que justifica a paternidade senão os filhos? Filhos são dádivas, sementes que devemos zelar para que cresçam e se transformem em nosso melhor legado para o futuro. Com a certeza de que não errei na receita, celebro então o Dia dos Filhos.

O Dia da Flávia, primogênita, capricorniana como o pai, rebeldia domada pela maturidade, filha e mãe amorosa, solidária e ansiosa com o bem estar dos mais próximos, e agora gerentona. O Dia do Rafael, o atlético do meio, um romântico escorpião, olhos de bolita e um pouco da sina de rabugento, que agora experimenta as venturas da paternidade. O Dia da Mariana, meu nenê, pequeno dínamo, muita sensibilidade, um passarinho que cedo aprendeu a voar e foi crescer lá longe, voltou ao ninho e bateu asas de novo.

Talvez não tenha feito justiça, nessas poucas linhas, ao que meus filhos tem de melhor. Mas eles sabem que sinto um enorme orgulho deles e curto a forma como se curtem. E sabem também que o pai que sou foram eles que moldaram. Agora, mais ainda, é eles que me dão o norte e vou estar cada vez mais dependente do rumo que me apontarem.

Instituo, portanto, o Dia dos Filhos e celebro a data, mas aviso: o velho aqui não abre mão dos presentes no domingo. Podem ser até pijamas e chinelos, canecas e camisas azuis, jaquetas e bons vinhos.

quinta-feira, 8 de agosto de 2013

No calçadão

A fauna humana passa pelo calçadão de Ipanema.  Podem me incluir, eu que frequento aquele espaço quatro ou cinco vezes por semana no horário destinado à terceira idade, ou seja, nas primeiras horas da manhã.  Nos 40 minutos que deambulo por ali conheço praticamente todos os parceiros de caminhada e corrida, incluindo o vice-prefeito Sebastião Melo, com seu andar desengonçado, precedido sempre da esposa Valéria, ela uma corredora de valor.

De resto, posso cronometrar o horário em que cruzo com o ex-comandante da Brigada Militar e sua esposa,  com aquele trio de senhoras que  formam uma escadinha e conversam animadamente,   com aqueles irmãos que vem tangendo um bando de cachorros, com o casal impecável em seus abrigos e que aparentemente passam a caminhada resolvendo problemas profissionais e com o abobado do calçadão, que cumprimenta a todos e a todas.  E tem os veteranos que querem ficar  bombados  e algumas gazelas desgarradas, balançando  eroticamente seus rabos de cavalo.

O pessoal que frequenta outros horários da conta de que ao longo da manhã a parceria feminina se qualifica e rejuvenesce.   Mas eu fora.

Nesse cenário, um caminhante vinha me  chamando a atenção em especial. Aparentando uns 70 anos, abrigo fora de moda, chapéu enterrado na cabeça e radinho na mão , ele cruzava por mim revelando incomum interesse no olhar.  Mal nos cumprimentávamos com um leve aceno de cabeça, mas aquela figura me instigava a imaginação. Por que o senhor idoso, de caminhar arrastado, cruzava daquela forma o meu caminho?

Foi então que caiu a ficha:  o velhinho era eu amanhã, eu retornando do futuro, talvez trazendo   alguma mensagem do porvir, tentando estabelecer contato.  Fiquei impactado com a revelação e enternecido com o meu clone setentão.  Se havia alguma dúvida do que significávamos um para o outro, o radinho companheiro foi a prova das nossas identidades.  E mais aquele jeito, aqueles olhos claros...

Não me perguntem o que tudo isso significa porque perdi o bom velhinho de vista.  Teria passado desta para uma melhor?  Seria essa a mensagem que ele tentava me passar, dando   indicações da minha finitude?  Como me arrependo de não ter dialogado com o outro Flávio .  Quanta informação e conhecimento deixei de absorver!  Pensando bem,  talvez tenha escapado de saber um montão de infortúnios e outro tanto de sacanagens.  Acho que fiquei no lucro, mas se o velho surgir de novo na minha frente passarei a acreditar em reencarnação.



sábado, 3 de agosto de 2013

As detetives

Ser chefe tem lá suas inconveniências. Uma delas é que a chefia acaba se envolvendo em problemas particulares de seus subordinados também conhecidos como “os colaboradores da firma”. Eis que estava tentando desentortar um dos tantos pepinos funcionais do meu dia-a-dia quando sou procurado por dedicado companheiro.  Dedicado demais, eu diria, mas não apenas as suas atividades laborais, mas também as artes amorosas. O sujeito apresentava um passado de conquistas de causar inveja a seus pares.  

Pois foi quase choroso que ele relatou-me que estava sendo pressionado por duas colegas que insistiam em saber quem era sua última conquista. E para isso não mediam esforços que iam desde bisbilhotamentos no seu perfil no Facebook  à ameaças de espalharem para toda a firma que estava pulando a cerca.

- Já não sei mais o que fazer. As duas estão bancando as detetives e nem na hora do almoço tenho sossego. Minha vida virou um inferno, um inferno.

Juro que percebi seus olhos marejados e confesso que minha natureza comprometida com a harmonia e meu culto a fidelidade me complicam na hora de lidar com esses assuntos. Além disso, conheço bem as duas bisbilhoteiras, queridas moças expansivas,  e sei que agem mais pelo prazer de se confrontarem com a verdade do que pela condenação da relação ou maldade para com o colega.

- Veja bem, a natureza humana é assim mesmo..., emendei para ganhar tempo em resposta ao seu apelo.

E completei com um repertório de frases feitas, tipo auto-ajuda, na tentativa de recompor o ânimo do companheiro. Não sei se ajudou, mas ao fim e ao cabo, achei que ele saiu da conversa mais animadinho.

- Se eles sonham quem é..., despediu-se enigmático.

Eu que conheço a tal parceira diria o mesmo, mas espero que as duas detetives não descubram que sei do segredo.  Aí a minha vida é que vai virar um inferno.

domingo, 28 de julho de 2013

Hemingway&Martha


Diferente do meu bom amigo Poti Campos, gostei muito do filme Hemingway&Martha, com Clive Owen no papel do escritor e a bela Nicole Kidman como sua parceira.  Consumidor voraz de DVDs sou atento à cena cinematográfica e não lembrava do lançamento no circuito dos cinemas do filme dirigido por  Philip Kaufman até descobrir que é um telefilme produzido pela HBO, o que o valoriza ainda mais, pois se trata de uma produção bem cuidada para os padrões televisivos.

O interessante do filme é que resgata a figura de Martha Gellhorn. É sob o ponto de vista dela que a história é contada. Gellhorn e Hemingway se conhecem em um bar. Ambos partem para a Espanha em guerra civil por motivos diferentes. Ele acompanha uma equipe de gravação de um filme em favor dos republicanos (The Spanish Earth) e ela como correspondente iniciante da revista Collier’s. Ali iniciam um romance que continua ao retornarem aos Estados Unidos. Casam-se após Hemingway obter o divórcio de Pauline Pfeiffer, sua segunda esposa. Ela prossegue sua carreira cobrindo a Guerra Russo-Finlandesa e a Segunda Guerra Sino-Japonesa.   Ambos vão a Europa em guerra e lá Hemingway conhece a também jornalista Mary Welsh, que se tornaria sua quarta esposa.

O filme revela um Hemingway ainda mais beberrão, necessitado sempre mais de exercer sua masculinidade (as cenas eróticas  merecem um “uau”; e que belo e bem torneado calipigio tem dona Nicole!), ao mesmo tempo em que se afirma católico por conveniência - influência de Pauline.  Gellhorn aparece como o lado mais forte do casal, sempre em busca de uma guerra para cobrir e aí se estabelece a competição entre os dois, que  leva ao rompimento. Profissionalmente eles vão ao encontro dos conflitos e o conflito acaba se instalando entre eles.

No auge do romance, o casal convive com o incensado escritor americano John Dos Passos que durante a guerra civil espanhola se apaixona pelo jovem Paco Zarra, interpretado pelo nosso Rodrigo Santoro. Convivem também com figurões como o presidente americano Franklin Roosevelt e sua Eleanor (no filme, numa montagem à Forrest Gump),  o chinês Chang Kai-Chek (que aparece como um general dominado pela mulher), além revolucionários comunistas chineses.

O mérito de Hemingway&Martha está também em registrar um recorte das principais guerras do século 20, da Guerra Civil Espanhola à da Croácia.  Mostra, por exemplo, como os russos participaram ativamente das brigadas internacionais espanholas, a ascensão do nazismo e do fascismo  os horrores praticados pelos japoneses na China, a crueza do Dia D e por aí vai.

O diretor apela para um efeito que entendi como uma forma de distinguir o que é registro histórico, cenas em tom sépia, da ficção, num belo colorido. Pro meu gosto, funcionou.

Por tudo isso, eu que já era fã do autor de   O Adeus às Armas, Por quem Dobram os Sinos, O Velho e o Mar, fiquei ainda mais inspirado pela figura do irrequieto escritor, beberrão sim, inconstante, sim, mas que não se contentava em apenas registrar a história, mas deixava sua marca como protagonista dos acontecimentos em que participava.

Desculpe, Poti, mas tirante a duração (2h34min), gostei muto de Hemingway&Martha.

sábado, 27 de julho de 2013

Teoria da Conspiração

No meu sobe e desce diário pelo Centro Histórico da cidade procuro atalhar por uma loja de confecção que tem escada rolante. Assim gasto menos energia, penso eu.  Mas é só colocar meus pezinhos na dita loja que o sistema de som do estabelecimento passa a alardear: “G7, G7, atenção ao RM18”. Na real pode não ser bem esta a mensagem, mas é com certeza um código que só os G7 dominam.

Suponho que os G7 e seus similares sejam funcionários da loja ou o pessoal da segurança. Isso porque minha suspeita é que de tanto frequentar a loja e suas escadas rolantes esteja sendo monitorado a cada passo. O chamado pelo sistema de som seria uma espécie de alerta contra um perigo iminente. Será que eles imaginam que o senhor de cabeça e barbas brancas possa ser um perigoso bandido, disfarçado de bom velhinho, mapeando diariamente o local para um futuro arrastão ou algo do gênero?

Pior é que fico com a mesma sensação quando frequento as lojas de shopping e os alto-falantes começam a transmitir essas mensagens cifradas. É comigo, penso. E, se logo após a mensagem, um atendente encosta-se a mim e se coloca à disposição aí mais se reforçam minhas suspeitas. Conspiração ou será um complexo de culpa inconsciente?

Teoria da Conspiração (também chamada de conspiracionismo) é qualquer teoria que explica um evento histórico ou atual como sendo resultado de um plano secreto levado a efeito geralmente por conspiradores maquiavélicos e poderosos, tais como uma "sociedade secreta" ou "governo sombra". Obrigado, Wikipédia.


A Teoria da Conspiração valeu pelo menos um bom filme de ação (Conspiracy Theory), estrelado em 1997 por Julia Roberts e Mel Gibson, ele no papel de um taxista de Nova York. Nos horários de folga, o taxista distribuia um boletim que informava as pessoas a existência de uma conspiração planejada por terroristas para assassinar políticos e pessoas influentes. Ai...não, não vou antecipar a história.

Quem me conhece sabe que não acredito em conspirações, nem mesmo da mídia contra os poderes estabelecidos, como defendem alguns colegas diante de matérias hostis.  No caso, prefiro debitar os desvios da mídia à imaturidade, ao desconhecimento ou ao relaxamento de quem apura as matérias, o que dá na mesma.  E culpar a mídia por tudo  é muito fácil e desculpa para incompetência, assim como é muito cômodo culpar os poderes públicos por todas as mazelas.  A banca paga e recebe, diria o outro.

Voltando ao tema central, reafirmo que me intriga cada vez  mais o comportamento das lojas. Esses recados estão infernizando minha vida. Se continuarem agindo dessa forma, vou deixar de consumir em tais estabelecimentos,  aliás, vou ficar só nas ofertas.  Pensando bem, a mensagem secreta pode ser essa: “G7, G7, lá vem aquele sujeito que só compra ofertas.  Olho nele!”.

terça-feira, 23 de julho de 2013

Perdão,mestre Djalma

Djalma Santos,  falecido hoje,  faz parte das minhas melhores e mais antigas memórias  esportivas.  Junto com Nilton Santos ele integrou a defesa da seleção brasileira campeã de 1958. Na verdade, Djalma só virou titular no jogo final da Copa da Suécia, substituindo De Sordi, que estava machucado. Já Nilton Santos era titularissimo.

Ouvi o jogo entre Brasil x Suécia numa manhã fria de domingo de julho, fascinado com o milagre da técnica que trazia  de Estocolmo até a rua Bagé , onde morávamos no bairro Petrópolis, a voz de Mendes Ribeiro, subindo a descendo pelas ondas da Rádio Guaíba.

Na ingenuidade dos meus 8 anos e sem ter a tv para o tira-teima, imaginava eu que os dois clássicos e talentosos laterais seriam irmãos.  Mesmo com o desmentido da realidade (Djalma era negro quase retinto e Nilton um branquelo), fiquei fã dos dois Santos,  tanto assim que meu primeiro time de botão, um jogo de "panelinhas” era do Botafogo de Nilton Santos.  Anos mais tarde,  jovem e esforçado repórter da  extinta Folha da Tarde, encontrei Nilton Santos em um hotel em Salvador e, cheio de reverência, perguntei se ele me dava uma entrevista.  Sim, sem problema, e aí conheci a grande figura humana que ele era. 

Já o Djalma Santos, que jogava pelo meu verdão Palmeiras,  não tive a ventura de entrevistar e, pior, guardo dele a pior das impressões quando o vi jogar ao vivo.  Foi num jogo entre Grêmio x Palmeiras no velho Estádio Olímpico: ele levou um baile do Volmir,  um ponteiro esquerdo maluquete que se intitulava Volmir Maravilha, gente muito fina e dado a atuações extravagantes, como naquela tarde de domingo de 1965  quando virou Mané Garrincha  e ainda fez um dos gols na goleada de 5 x 1.

Mas nem aquele episódio foi capaz de deslustrar a biografia esportiva de Djalma, nem minha admiração por ele.  Nos tempos da nomenclatura antiga, foi considerado o melhor  lateral direito de todos os tempos, clássico e limpo para um defensor,  capaz de se antecipar aos adversários e, temor das defesas,  cobrava  um arremesso lateral como se fosse um escanteio. 

O atleta varzeano que habitava em mim virou lateral direito, mas diferente do ídolo que sonhava imitar, era tosco e viril, quase desleal como a compensar a falta de condições técnicas.  Reverência demais, futebol  de menos.  Perdão, mestre Djalma e descanse em paz.



domingo, 21 de julho de 2013

A propósito do Dia do Amigo...

*Publicado originalmente em 6/8/2010

Confesso que não tenho muito saco para essas datas comemorativas, tipo Dia das Mães, dos Pais e Dia da Criança. A partir do momento em que se tornaram mais um evento comercial do que um tributo aos homenageados, tais comemorações perderam sua dimensão afetiva. Nada contra o comércio, que precisa fazer a roda da economia andar, mas não abro mão de decidir se participo ou não da festa e com quê entusiasmo será minha adesão. 

Até porque novas datas comemorativas estão surgindo, todas com grande apelo emocional e sendo estimuladas pelo setor produtivo. O Dia dos Namorados já está consolidado, fazendo a alegria das floriculturas, dos restaurantes e dos motéis. O Dia da Mulher vai na mesma direção e já há quem advogue a criação do Dia do Homem, uma vez que outras opções já estão contempladas no Dia do Orgulho Gay.

Há um forte movimento para implantar o Dia do Amigo que, por enquanto, se resume ao envio de mensagens piegas entre aqueles que se julgam amigos do peito. Está pintando com força o Dia dos Avós e logo a meritória homenagem vai se transformar em obrigação de comprar presentes para os vovozinhos. Menos mal que posso ser beneficiário dessa obrigação, se bem que ainda vai levar algum tempo até que Maria Clara tenha discernimento para presentear seus avós queridos.

É preciso tomar cuidado com os exageros. Conheço o caso de marmanjos que até hoje recebem presentes pelo Dia da Criança. Observo também um esforço, inclusive de escolas, para introduzir entre nós o Halloween, o Dia das Bruxas, uma tradição anglo-saxonica que nada tem a ver com a nossa cultura. Só vou aderir se puder mandar um bouquet de espinhos para algumas bruxas que me atormentam no dia a dia.

E tem ainda essa forçação de barra para instituir o Dia da Sogra. Com todo o respeito à categoria, que nos legou nossas amadas parceiras, a figura da sogra ainda é estigmatizada e temo que, ao invés de homenagens, as respeitáveis senhoras sejam objeto de agravos de parte de genros e noras ingratos. Isso sem contar que podem surgir idéias como a criação do Dia dos Ex que pode englobar um naipe diversificado de figuras: ex-marido, ex-mulher, ex-sogra, ex-patrão, ex-amigo.

Antes que vire um ex-qualquer e para que não fique a impressão de que sou um rabugento em tempo integral, admito que estou ansioso pelo presente que vou ganhar dos meus filhinhos. A dúvida é: chinelo ou pijama?



domingo, 14 de julho de 2013

Palavras

As palavras, como as pessoas também tem prazo de validade. Depois de um certo tempo envelhecem e por fim saem de circulação. Um exemplo é carestia que virou custo de vida, que hoje conhecemos por inflação. Um exemplo mais charmoso é meio ambiente que já foi ecologia, ou vice versa, e hoje chamamos de sustentabilidade.  Claro que estou tratando das palavras em seu sentido mais amplo e bota amplo nisso.

Os nomes próprios também têm seus períodos de glória e depois vão para o limbo.  Conheci pelo menos dois Telemacos, o mesmo número de Bartolomeus, alguns Baltazares, sem contar os Alcebíades, os Diamantinos e mesmo os Pafuncios  mas imagina a vaia a quem tentar hoje registrar o filho com esses nomes.  Agora tem que ser Jeferson, Rafael, Rodrigo, Sandro, Gustavo e por ai vai, sem entrar na área dos Michael, dos Maicon e seus assemelhados.  Pouparei o naipe feminino dessa digressão.

Manifestantes de qualquer causa agora constituem movimentos sociais, que não podem ser criminalizados conforme apregoam. Nos tempos em que militava na imprensa – que hoje virou mídia – se escrevesse essas palavras difíceis, como criminalizar,  e recém incorporadas ao vocabulário levaria uma mijada do editor. A propósito, o termo  militava me lembra que militante ganhou um novo apelido: agora é ativista, com respectivos apêndices – cicloativista, por exemplo.

Fazem parte da nova geração de palavras todos esses termos derivados e fomentados pelo mundo digital: migrar, deletar, blogar, tuitar, suitar,  o internetês  em geral. E tem ainda o demanda, o empoderamento, o modelar, o protocolizar,  o gestionar, legados das modernas estratégias de gestão. Interessante é que a maioria não é reconhecida pelo corretor do Word, recebendo por isso aquela ondinha em vermelho por debaixo.

Não sou contra a movimentação e a renovação linguística. Mas acho que foi a associação dos acadêmicos, especialmente os sociólogos, com os sindicalistas que produziu esse linguajar típico das lideranças mais atuantes e com viés à esquerda. Foi uma espécie de agendamento de discurso, que ganhou um verniz pela influência acadêmica e uma ênfase pelo estilo e aderência popular ao discurso dos sindicalistas, mesmo os de língua presa. Ou seja, uma eficaz simbiose entre forma e conteúdo.


A verdade é que os bordões, de tanto serem repetidos,  acabaram incorporados pela mídia que dão expressão e alcance aos mesmos. A reflexão que deve ser feita é se esses modismos linguísticos enriquecem ou empobrecem o idioma.  O pior dos cenários é quando os que não sabem o que estão falando empregam as palavras novas e não consolidadas fora de seu contexto.  De minha parte, sou pela simplicidade e por tudo o que facilite a comunicação. É a minha expertise, com o perdão pela contradição.

sábado, 29 de junho de 2013

O pênalti

Fico com uma pena infinita desses jogadores que perdem pênaltis decisivos e passam carregar nas costas o peso da frustração de uma nação inteira, seja ela representada pela torcida de um time ou a população de um país.  Estou solidário ao italiano que desperdiçou o pênalti na quinta-feira e junto com a bola fora lá se foi a façanha de derrotar os campeões e favoritíssimos espanhóis.

Outro italiano, Baggio maculou sua carreira ao chutar nas alturas a cobrança que deu o tetra mundial ao Brasil, em 1994. O grande Zico também viveu seus piores momentos em uma Copa, a do México em 1986, ao perder um pênalti que poderia ter garantido a vitória contra a França e a passagem às semifinais. Mais tarde a França eliminaria o Brasil de Telê Santana...nos pênaltis!

Dinho e Arce, dois ícones do Grêmio que Luiz Felipe levou a decisão contra o Ajax em 1985, também vão carregar para a vida toda a imperícia e o desperdício dos pênaltis que impediram o tricolor de chegar a mais um titulo mundial.

Infames pênaltis que provocam frustrações e podem arruinar carreiras, mas benditos pênaltis que consagram goleiros, como Júlio César, recentemente contra o México, ou Rogério Ceni, que já defendeu 50 pênaltis e vale incluir Marcos que defendeu 45 pênaltis pelo Palmeiras, embora nada supere o russo Lev Yashin (1929-1990), o Aranha Negra, que somou 150 pênaltis defendidos, além de 270 jogos sem sofrer gol. No Grêmio, Victor tomava alguns gols estranhos, mas se consagrava defendendo pênaltis, como Taffarel na seleção e no Inter.

A história registra que o pênalti foi criado em 1892, mas a primeira cobrança só ocorreu no ano seguinte. Desde então vem atormentando cobradores e goleiros. Tanto assim que Nenén Prancha, o folclórico desportista carioca, teria cunhado a célebre frase: “O pênalti é tão importante que deveria ser cobrado pelo presidente do clube.”

De minha parte prefiro a versão do Irani, um atacante alto, delgado e de chute forte, que enfrentava com maestria os zagueirões malvados nos campos varzeanos do bairro Petrópolis. Irani era exímio cobrador de pênaltis, a maioria que ele mesmo sofria, e indagado sobre qual era a sua técnica, afirmava peremptório:-

-  Simples, miro no distintivo do goleiro e dou uma bicanca. Sempre dá certo.

Nada como a simplicidade, não?!



domingo, 9 de junho de 2013

Felipão e eu




Qual o mérito de entrevistar o Felipão hoje? Campeão do mundo, técnico consagrado, esperança de formação de uma seleção competitiva para a Copa 2014, Luiz Felipe Scolari é atração midiática em qualquer circunstância. Eventualmente até são produzidas matérias diferentes sobre ele, além do feijão com arroz das coletivas. Foi o que apresentou o Esporte Espetacular neste domingo de jogo contra a França. Foi uma bela e bem trabalhada reportagem destacando a trajetória do homem, do jogador e do técnico, com resgate de imagens e depoimentos enriquecedores. Parabéns ao Mariano Batista, mais um dos tantos talentos gaúchos na Globo, que produziu e editou o material.

O que eu queria saber agora é quem prestava atenção no Luiz Felipe, zagueiro tosco do Aimoré no início da década de 70 do século passado. Respondo: euzinho!  Foi assim: o Felipão, que já impunha respeito na zaga do time leopoldense, foi recomendado para fazer testes no Olímpico. Lá estava eu, recém iniciando no jornalismo, fazendo o papel de um esforçado setorista da Zero Hora no Grêmio - ou seria da extinta Folha da Tarde? Nem foi preciso muito tempo de avaliação no coletivo para chegar a conclusão que o gringão não ia ser aprovado no teste, mesmo que o tricolor daquele ano, treinado pelo Daltro Menezes, fosse um time pouco mais do que medíocre. Luiz Felipe era voluntarioso, porém, muito limitado tecnicamente.

Mas acho que me compadeci da situação e decidi entrevistá-lo no vestiário, fazendo aquela pergunta mais banal impossível: Como se sentia?

- Tem muita panelinha aqui, assim fica difícil, mas não me abate, respondeu, mais amargurado do que decepcionado.

A entrevista, a única que fiz com Felipão, rendeu uma nota no final da matéria do treino do dia. Deve estar lá nos arquivos da ZH - ou seria da FT?

E nunca mais nos cruzamos, diferente do Grêmio que foi buscá-lo em Caxias para conquistar o campeonato gaúcho de 1987 como treinador, dispensando-o em seguida. Mas o futebol é feito de ironias e seis anos mais tarde o bi rejeitado Felipão voltou ao Grêmio, levando-o às principais conquistas nos últimos anos: a Copa do Brasil de 1994, a Libertadores de 95, a Recopa e o Brasileiro de 1996, além de dois Gauchão. Na decisão do Mundial Interclubes no Japão perdeu o titulo para o Ajax, da Holanda, nos pênaltis. Só o mítico Osvaldo Rolla, o Foguinho, dirigiu o Grêmio mais vezes que Luiz Felipe: 377 jogos contra 322, dois a mais do que seu mentor Carlos Froner.

Ao fazer esse registro fico imaginando se a carreira de Luiz Felipe não teria sido diferente se tivesse permanecido no Grêmio lá nos idos de 70 do século passado. Pensando bem, acho que não. Na rápida entrevista após o mal sucedido teste já ficava evidente que ali estava um sujeito determinado. O resto da história já é bem conhecido.