Jornalista tem mania de guardar papéis, recortes de jornal, contas pagas, documentos e similares na esperança de que um dia vai organizar tudo e que aquele manancial terá alguma utilidade. Ledo Ivo engano. A papelada acumulada serve apenas para atrair poeira, mofo e traças.
A importância que determinado documento tinha há 15 ou 20 anos se diluiu no tempo e o artigo de jornal que causou tanta polêmica perdeu seu valor. Com os recursos da informática nem faz mais sentido manter um arquivo físico nos moldes antigos.
Pois semana passada decidi enfrentar o desafio de vasculhar meus guardados para uma sessão de descarte e encontrei verdadeiras preciosidades. Descobri, por exemplo, que já fui milionário. A descoberta se deu quando encontrei a declaração de renda de 1985, atestando que eu recebi naquele ano a fortuna de 60 milhões, 286 mil cruzeiros, o que representava, em média, um salário de mais de 4 milhões e 600 mil por mês. Uma Mega Sena acumulada! Só o Imposto de Renda me mordeu em mais de 6 milhões e 700 mil retidos na fonte e ajudei a diminuir o déficit da Previdência contribuindo com 5 milhões e 400 mil.
E havia ainda a confusão com a troca de moedas.Em 1988, por exemplo, pagava 15 mil cruzadosde mensalidade na creche de um dos filhos e, no ano seguinte, 29 mil cruzados novos para outro numa escola particular. Uma verdadeira fortuna.
Devo ter empobrecido com o passar dos anos, pois em 1991 recebi míseros 5 milhões, 279 mil cruzeiros. No ano seguinte fui obrigado, inclusive, a vender um Passat, ano 78, por 2 milhões e 700 mil cruzeiros. Era dura a vida de milionário naqueles tempos de inflação galopante.
O poder aquisitivo ficava corroído da noite para o dia. A moeda ganhava novo nome a cada plano econômico, mas a desejada estabilidade durava pouco tempo ou era mantida artificialmente. Os preços eram remarcados todos os dias e o valor de hoje já não vigorava no dia seguinte. O overnight, uma aplicação bancária corrente na época, dava alguma proteção aos nossos ganhos e fez a fortuna de muitos espertalhões. Para se ter uma idéia de como funcionavam as contas públicas, o governo Collares (1990-94) se financiou graças à inflação alta: era só atrasar, sem correção monetária, o pagamento aos fornecedores por um mês ou pedalar o aumento do funcionalimo e o caixa estava garantido.
A empresa onde trabalhava na época decidiu, para preservar minimamente o poder aquisitivo dos funcionários, pagar os salários a cada 15 dias e depois semanalmente. Um expediente comum era o cheque pré-datado que permitia algum fôlego às finanças pessoais. Era comum também o pedido de antecipação de parte do 13º salário porque o montante no final do ano, com a correção monetária, ficava recomposto e ainda garantia-se um plus nos ganhos.
E assim sobrevivíamos quase numa boa, acostumados a espiral inflacionária, consumindo um pouco aqui um pouco ali, administrando as contas, fazendo ginástica com os salários e até planos para o futuros, na certeza de que mais dia menos dia nossa moeda deixaria de nos envergonhar.
Então, em 1994 veio o Plano Real.
(continua)
segunda-feira, 30 de novembro de 2009
sexta-feira, 27 de novembro de 2009
Situações extremas - final
*Recomenda-se ler a postagem anterior
Outra história, baseada em fatos reais, envolveu dois repórteres esportivos, rapazes com família constituída, que decidiram dar uma escapada depois da cobertura de um Grenal noturno. Duas amiguinhas foram contatadas, toparam o programa e a noitada se prolongou madrugada à dentro. E aí chegou a hora de voltar para casa. Um dos repórteres, que identificaremos como o Desencaminhador, porque foi o responsável por todas as iniciativas, estava dirigindo o carro para devolver o Desencaminhado ao lar quando pintou o drama.
- Cara, tu estás impregnado do perfume da fulana, acusou o Desencaminhador.
- E agora o que eu faço?, desesperou-se o Desencaminhado, que era uma santa criatura.
- Vamos dar um jeito.
O Desencaminhador, escolado por muitas jornadas, era do tipo prático. A primeira providência foi sujar as mãos do Desencaminhado nos pneus, sugerindo um árduo trabalho de borracheiro. Depois, motor ligado, colocou a camisa dele junto ao cano de descarga e substituiu o perfume da parceira pelos cheiros característicos da máquina automotiva. E assim, vítima das falsetas de um carro velho, o Desencaminhado se apresentou em casa e, mais do que aplacar a fúria da patroa, virou o jogo porque sua aparência era de quem realmente tinha sido solidário no enfrentamento de problemas mecânicos e pneumáticos.
E agora vamos ao caso daquele consagrado músico gaúcho, bandalho de boa cepa, que ficou muito angustiado quando, em viagem pelo interior, deu pela falta de sua aliança de casamento. Ele costumava retirar o objeto na hora do banho e chegou a conclusão que perdera no banheiro da casa onde estava hospedado. As buscas foram inúteis. A aliança provavelmente caíra no ralo e estava irremediavelmente perdida.
De imediato acionou seu anfitrião que providenciou junto a um joalheiro local a confecção, em regime de urgência, de uma nova aliança. Por sorte, nosso amigo ainda lembrava do nome da mulher e da data do casamento, que foram gravados na nova aliança. Ele não poderia chegar em casa sem ela porque precisaria dar muitas explicações e, no entrevero, talvez surgissem desconfianças e acusações sobre suas andanças pretéritas. Estava com saldo devedor na conta corrente matrimonial e agora – que ironia! - poderia se enredar por uma situação em que era inocente. Enfim, retornou ao lar no dia seguinte e foi surpreendido com a reação da esposa:
- Amor, o que é isso aí no teu dedo?
- A aliança de casamento, benzinho.
- Ah é, vem comigo.
A mulher conduziu-o até o banheiro e lá estava a aliança original, boiando na saboneteira. Ao nosso amigo só restou contar toda a verdade, incutindo, porém, na mulher aquela dúvida que consome: “o que será que ele já não aprontou por aí?” Como penitência, passou usar as duas alianças juntas, que era a forma de expressar que aquele corpinho tinha uma dona vigilante.
Outra história, baseada em fatos reais, envolveu dois repórteres esportivos, rapazes com família constituída, que decidiram dar uma escapada depois da cobertura de um Grenal noturno. Duas amiguinhas foram contatadas, toparam o programa e a noitada se prolongou madrugada à dentro. E aí chegou a hora de voltar para casa. Um dos repórteres, que identificaremos como o Desencaminhador, porque foi o responsável por todas as iniciativas, estava dirigindo o carro para devolver o Desencaminhado ao lar quando pintou o drama.
- Cara, tu estás impregnado do perfume da fulana, acusou o Desencaminhador.
- E agora o que eu faço?, desesperou-se o Desencaminhado, que era uma santa criatura.
- Vamos dar um jeito.
O Desencaminhador, escolado por muitas jornadas, era do tipo prático. A primeira providência foi sujar as mãos do Desencaminhado nos pneus, sugerindo um árduo trabalho de borracheiro. Depois, motor ligado, colocou a camisa dele junto ao cano de descarga e substituiu o perfume da parceira pelos cheiros característicos da máquina automotiva. E assim, vítima das falsetas de um carro velho, o Desencaminhado se apresentou em casa e, mais do que aplacar a fúria da patroa, virou o jogo porque sua aparência era de quem realmente tinha sido solidário no enfrentamento de problemas mecânicos e pneumáticos.
E agora vamos ao caso daquele consagrado músico gaúcho, bandalho de boa cepa, que ficou muito angustiado quando, em viagem pelo interior, deu pela falta de sua aliança de casamento. Ele costumava retirar o objeto na hora do banho e chegou a conclusão que perdera no banheiro da casa onde estava hospedado. As buscas foram inúteis. A aliança provavelmente caíra no ralo e estava irremediavelmente perdida.
De imediato acionou seu anfitrião que providenciou junto a um joalheiro local a confecção, em regime de urgência, de uma nova aliança. Por sorte, nosso amigo ainda lembrava do nome da mulher e da data do casamento, que foram gravados na nova aliança. Ele não poderia chegar em casa sem ela porque precisaria dar muitas explicações e, no entrevero, talvez surgissem desconfianças e acusações sobre suas andanças pretéritas. Estava com saldo devedor na conta corrente matrimonial e agora – que ironia! - poderia se enredar por uma situação em que era inocente. Enfim, retornou ao lar no dia seguinte e foi surpreendido com a reação da esposa:
- Amor, o que é isso aí no teu dedo?
- A aliança de casamento, benzinho.
- Ah é, vem comigo.
A mulher conduziu-o até o banheiro e lá estava a aliança original, boiando na saboneteira. Ao nosso amigo só restou contar toda a verdade, incutindo, porém, na mulher aquela dúvida que consome: “o que será que ele já não aprontou por aí?” Como penitência, passou usar as duas alianças juntas, que era a forma de expressar que aquele corpinho tinha uma dona vigilante.
Recomendo
quinta-feira, 26 de novembro de 2009
Situações extremas
È dura a vida dos homens de vida dupla. O pior momento é ter que enfrentar a mulher na volta ao lar, depois de uma sessão de adultério. Acredito que com as mulheres aconteça o mesmo quando elas são agentes e não vítimas, mas não tenho elementos suficientes para julgar. Entre os homens, fica sempre aquela expectativa de que vai ser desmascarado e que ao chegar em casa encontrará as malas depositadas na sala como um veredito. “Pega tuas tralhas e some daqui, seu cafajeste”.
É uma situação extrema, mas existe coisa pior. Foi o que aconteceu com um jornalista, da área de artes gráficas, que saiu de casa no meio da tarde de um sábado de Carnaval para comprar pão, leite e frios para prover sua numerosa prole. No trajeto de volta da padaria para a casa, não mais do que quinhentos metros, nosso amigo acabou envolvido pelo baticumbum de uma banda que, na vizinhança, se aquecia para o Carnaval. Deu meia volta e se entregou para a folia. A batucada era irresistível e o time de mulatas um convite à perdição. A partir daí, sob as bênçãos de Momo, Baco e Eros, ele pintou e bordou durante os quatro dias de Carnaval, sempre acompanhado de uma bela passista que correspondeu as suas investidas.
Na quarta-feira de Cinzas, todo estropiado, lá estava ele de volta ao lar, após o meio dia. Carregava ainda, zelosamente, a sacola com os pãezinhos, o leite e a mortadela para a filharada. Ao entrar em casa, já levou o primeiro susto. A mulher o esperava, sentada no sofá da sala, armada com uma reluzente faca. Uma faca dessas de churrasco que ele mesmo havia afiado na semana anterior. Ele bem que tentou contornar a situação com um diálogo, que reproduzimos ligeiramente dramatizado:
- Pára com isso, mulher. Eu posso explicar.
- Não quero saber de explicação. Eu vou é cortar aquilo.
- Não faz isso, eu só tenho esse. Deixa eu explicar...
- Chega de conversa. Te prepara que eu vou cortar.
- Pô, eu to cansado, deixa eu dormir e depois a gente fala.
- Se dormir, vai acordar sem.
Em pânico, nosso amigo conseguiu sentar numa cadeira e ficou ali, com as mãozinhas gorduchas protegendo seu bem anatômico mais precioso. Às vezes, vencido pelo sono, ele dava uma cochilada, mas acordava em seguida com os berros da mulher e a faca rebrilhando.
- Olha que eu vou cortar.
Fiquem tranqüilos, infiéis. O cara escapou dessa. Num descuido da mulher, ele saiu porta a fora e foi se homiziar em casa de amigos até a poeira baixar. Acabou voltando ao lar pelo clamor dos filhos, que sentiam falta, não tanto do pai trêfego, mas do pão, leite e frios de todo o dia. Mas, por precaução, desde então abandonou a prática de afiar as facas de churrasco.
(continua)
É uma situação extrema, mas existe coisa pior. Foi o que aconteceu com um jornalista, da área de artes gráficas, que saiu de casa no meio da tarde de um sábado de Carnaval para comprar pão, leite e frios para prover sua numerosa prole. No trajeto de volta da padaria para a casa, não mais do que quinhentos metros, nosso amigo acabou envolvido pelo baticumbum de uma banda que, na vizinhança, se aquecia para o Carnaval. Deu meia volta e se entregou para a folia. A batucada era irresistível e o time de mulatas um convite à perdição. A partir daí, sob as bênçãos de Momo, Baco e Eros, ele pintou e bordou durante os quatro dias de Carnaval, sempre acompanhado de uma bela passista que correspondeu as suas investidas.
Na quarta-feira de Cinzas, todo estropiado, lá estava ele de volta ao lar, após o meio dia. Carregava ainda, zelosamente, a sacola com os pãezinhos, o leite e a mortadela para a filharada. Ao entrar em casa, já levou o primeiro susto. A mulher o esperava, sentada no sofá da sala, armada com uma reluzente faca. Uma faca dessas de churrasco que ele mesmo havia afiado na semana anterior. Ele bem que tentou contornar a situação com um diálogo, que reproduzimos ligeiramente dramatizado:
- Pára com isso, mulher. Eu posso explicar.
- Não quero saber de explicação. Eu vou é cortar aquilo.
- Não faz isso, eu só tenho esse. Deixa eu explicar...
- Chega de conversa. Te prepara que eu vou cortar.
- Pô, eu to cansado, deixa eu dormir e depois a gente fala.
- Se dormir, vai acordar sem.
Em pânico, nosso amigo conseguiu sentar numa cadeira e ficou ali, com as mãozinhas gorduchas protegendo seu bem anatômico mais precioso. Às vezes, vencido pelo sono, ele dava uma cochilada, mas acordava em seguida com os berros da mulher e a faca rebrilhando.
- Olha que eu vou cortar.
Fiquem tranqüilos, infiéis. O cara escapou dessa. Num descuido da mulher, ele saiu porta a fora e foi se homiziar em casa de amigos até a poeira baixar. Acabou voltando ao lar pelo clamor dos filhos, que sentiam falta, não tanto do pai trêfego, mas do pão, leite e frios de todo o dia. Mas, por precaução, desde então abandonou a prática de afiar as facas de churrasco.
(continua)
quarta-feira, 25 de novembro de 2009
Interatividade questionável
A mídia descobriu o filão da interatividade. Rádios, tvs, jornais e portais da internet usam e abusam do recurso, certos de que a abertura de espaços para os usuários potencializa a repercussão de seus conteúdos, vale dizer, aumenta a “audiência”. E tome interatividade, agora acrescida também de torpedos telefônicos.
Chega a ser constrangedor o papel de porta-voz dessas mensagens imposto a alguns comunicadores de prestígio. Sim, porque a interatividade que deveria ser um canal de dupla mão – a fonte influenciando o destinatário da mensagem e sendo por ele influenciado, numa interpretação simplista da teoria da comunicação – foi desvirtuada por fonte (emissor) e destinatário (receptor). Pela fonte, a medida em que busca demagogicamente acarinhar o destinatário, passando-lhe a falsa impressão de que é mais do que um receptor passivo, mas um parceiro de verdade, cujas opiniões interessam e serão consideradas. É aquele negócio de “aqui você tem vez e voz”. Isso é falso e tem o mesmo valor do dólar de Burkina Fasso, sem contar que, em várias situações, a interatividade representa ganhos financeiros para a mídia, através de acordos com operadoras de telefonia, por exemplo.
Entre os receptores identificamos dois tipos de comportamento, ambos também enganadores. Há os crédulos e sinceros que ingenuamente acreditam que suas opiniões serão mesmo levadas em conta e que, a partir delas, o mundo será diferente, para melhor, é claro. E existem os mal-intencionados de carteirinha, os detratores de plantão, os raivosos de todo o dia, os metidos a engraçadinhos, os falsos moralistas, os malas opiniáticos, os comprometidos com essa ou aquela corrente política, à esquerda e à direita. Infelizmente, o segundo tipo é maioria e está contaminando todo um processo que, na sua concepção, encerra uma idéia generosa. Mais ainda: uma avaliação criteriosa revelaria que são quase sempre as mesmas pessoas opinando sobre tudo e sobre todos, o que me faz crer que se trata de um bando de ociosos, ávido de seus 30 segundos de exposição na mídia.
Excluo dessa análise as descompromissadas participações nos espaços esportivos e até sou tolerante com as chamadas pesquisas interativas, embora nem sempre fique claro na sua formulação não se tratar de uma enquête de caráter científico. Reconheço, ainda, os méritos de algumas experiências, como as do programa Gaúcha Hoje, que oferece a posição de especialistas para dirimir dúvidas dos ouvintes. Neste caso, a interatividade faz sentido e cumpre seu papel de prestadora de serviço.
Desde já refuto o rótulo de censor, que certamente virá, porque o que está faltando neste processo é filtro, para separar as contribuições de conteúdo, positivas para os debates propostos, das mal-intencionadas, que acusam sem provas, atacam pessoas de forma gratuita, julgam e condenam prévia e apressadamente. São opiniões inconseqüentes, irresponsáveis, sem compromisso com os valores da justiça e da verdade.
Publicado originalmente em Zero Hora, em 1º/10/2008
Chega a ser constrangedor o papel de porta-voz dessas mensagens imposto a alguns comunicadores de prestígio. Sim, porque a interatividade que deveria ser um canal de dupla mão – a fonte influenciando o destinatário da mensagem e sendo por ele influenciado, numa interpretação simplista da teoria da comunicação – foi desvirtuada por fonte (emissor) e destinatário (receptor). Pela fonte, a medida em que busca demagogicamente acarinhar o destinatário, passando-lhe a falsa impressão de que é mais do que um receptor passivo, mas um parceiro de verdade, cujas opiniões interessam e serão consideradas. É aquele negócio de “aqui você tem vez e voz”. Isso é falso e tem o mesmo valor do dólar de Burkina Fasso, sem contar que, em várias situações, a interatividade representa ganhos financeiros para a mídia, através de acordos com operadoras de telefonia, por exemplo.
Entre os receptores identificamos dois tipos de comportamento, ambos também enganadores. Há os crédulos e sinceros que ingenuamente acreditam que suas opiniões serão mesmo levadas em conta e que, a partir delas, o mundo será diferente, para melhor, é claro. E existem os mal-intencionados de carteirinha, os detratores de plantão, os raivosos de todo o dia, os metidos a engraçadinhos, os falsos moralistas, os malas opiniáticos, os comprometidos com essa ou aquela corrente política, à esquerda e à direita. Infelizmente, o segundo tipo é maioria e está contaminando todo um processo que, na sua concepção, encerra uma idéia generosa. Mais ainda: uma avaliação criteriosa revelaria que são quase sempre as mesmas pessoas opinando sobre tudo e sobre todos, o que me faz crer que se trata de um bando de ociosos, ávido de seus 30 segundos de exposição na mídia.
Excluo dessa análise as descompromissadas participações nos espaços esportivos e até sou tolerante com as chamadas pesquisas interativas, embora nem sempre fique claro na sua formulação não se tratar de uma enquête de caráter científico. Reconheço, ainda, os méritos de algumas experiências, como as do programa Gaúcha Hoje, que oferece a posição de especialistas para dirimir dúvidas dos ouvintes. Neste caso, a interatividade faz sentido e cumpre seu papel de prestadora de serviço.
Desde já refuto o rótulo de censor, que certamente virá, porque o que está faltando neste processo é filtro, para separar as contribuições de conteúdo, positivas para os debates propostos, das mal-intencionadas, que acusam sem provas, atacam pessoas de forma gratuita, julgam e condenam prévia e apressadamente. São opiniões inconseqüentes, irresponsáveis, sem compromisso com os valores da justiça e da verdade.
Publicado originalmente em Zero Hora, em 1º/10/2008
terça-feira, 24 de novembro de 2009
Santa inveja: textos que eu gostaria de ter escrito
Adeus Tia Chica, como diz o outro
Paulo Tiaraju*
O outro é um personagem misterioso e onipresente no inconsciente coletivo do brasileiro; ele é quase um cúmplice das pessoas.
O outro está sempre pronto a ser responsabilizado por qualquer opinião, frase ou mesmo palavras soltas, quando quem disse não quer assumir descaradamente o que está dizendo. Por exemplo, a mulher que sugere sua disponibilidade sexual e afetiva, mas não quer fazê-lo de modo direto, o que ela diz? "Estou leve, livre e solta, como diz o outro". O outro passa a ser co-responsável por esta declaração, não foi ela quem disse. O lobista mal intencionado e covarde, o que ele diz? "Quero levar a minha beira neste negócio, como diz o outro". Com esta simples transferência de responsabilidade, ele desagrava-se: foi o outro quem disse. O outro é o bode expiatório caso dê alguma zebra. No receio de a vaca ir para o brejo, apela-se para o outro. Quem não tem cão caça com gato, como diz o outro.
Outra personagem misteriosa das lendas urbanas brasileiras é a Tia Chica. Sempre que algo dá errado, ela parte, se manda. Não quer participar daquela comédia de erros. Faz as malas e vai embora. As pessoas sensatas que predisseram o malfadado erro, imediatamente antecipam o adeus para a Tia Chica: "... Eu avisei, não quis me ouvir, agora, adeus, Tia Chica". E não por coincidência, quando Tia Chica parte, simultaneamente a Inez morre e o leite derrama. Portanto, em casos mais greves utiliza-se todas as expressões: "Não quis me ouvir, agora, adeus, Tia Chica, Inez é morta, e não adianta chorar sobre o leite derramado".
Imagino a Tia Chica fazendo as malas e o corpo de Inez estirado no chão, em meio a uma poça de leite derramado. Um gato se aproxima para beber o leite e alguém atira um pau no gato, mas o gato não morre. Um pouco antes de bater a porta, Tia Chica admira-se do berro que o gato deu. Na cantiga popular ela é descrita como Dona Chica, mas sei de fonte confiável tratar-se da mesma pessoa, não duvido.
Contudo, as metáforas não são menos interessantes quando os brasileiros falam dos seus problemas. Para omitir a gravidade deles buscam inspiração em produtos horti-fruti-granjeiros. O pepino, óbviamente pela evidente alusão a sua forma fálica e o risco e o temor que isto representa, é amplamente utilizado. Por exemplo, meu prazo para escrever esta crônica começou a se esgotar, eu estava com um baita pepino. Depois me dei conta da diferença entre pepino e abacaxi. Escrever nunca é um abacaxi. Claro, há sempre o risco de, na falta de assunto, falar-se em abobrinhas. Neste caso eu precisava fazer deste limão uma limonada, sob pena de levar uma banana do editor. Sei não, com esta crise que anda rondando, muitos cronistas estão aceitando numa boa protestos em que as pessoas atiram ovos e tomates, desde que estejam frescos e prontos para o consumo – e, se a moda pega, solicitamos que atirem sapatos aos pares, e de preferência de número 42.
*Paulo Tiaraju
paulotiaraju@terra.com.br
Paulo Tiaraju é publicitário, diretor de Criação da agência Match Point, cronista e violeiro. Foi o primeiro criativo gaúcho a ganhar o prêmio Publicitário do Ano, concedido pela Associação Riograndense de Propaganda (ARP). O texto foi escrito para o portal Coletiva.net
Paulo Tiaraju*
O outro é um personagem misterioso e onipresente no inconsciente coletivo do brasileiro; ele é quase um cúmplice das pessoas.
O outro está sempre pronto a ser responsabilizado por qualquer opinião, frase ou mesmo palavras soltas, quando quem disse não quer assumir descaradamente o que está dizendo. Por exemplo, a mulher que sugere sua disponibilidade sexual e afetiva, mas não quer fazê-lo de modo direto, o que ela diz? "Estou leve, livre e solta, como diz o outro". O outro passa a ser co-responsável por esta declaração, não foi ela quem disse. O lobista mal intencionado e covarde, o que ele diz? "Quero levar a minha beira neste negócio, como diz o outro". Com esta simples transferência de responsabilidade, ele desagrava-se: foi o outro quem disse. O outro é o bode expiatório caso dê alguma zebra. No receio de a vaca ir para o brejo, apela-se para o outro. Quem não tem cão caça com gato, como diz o outro.
Outra personagem misteriosa das lendas urbanas brasileiras é a Tia Chica. Sempre que algo dá errado, ela parte, se manda. Não quer participar daquela comédia de erros. Faz as malas e vai embora. As pessoas sensatas que predisseram o malfadado erro, imediatamente antecipam o adeus para a Tia Chica: "... Eu avisei, não quis me ouvir, agora, adeus, Tia Chica". E não por coincidência, quando Tia Chica parte, simultaneamente a Inez morre e o leite derrama. Portanto, em casos mais greves utiliza-se todas as expressões: "Não quis me ouvir, agora, adeus, Tia Chica, Inez é morta, e não adianta chorar sobre o leite derramado".
Imagino a Tia Chica fazendo as malas e o corpo de Inez estirado no chão, em meio a uma poça de leite derramado. Um gato se aproxima para beber o leite e alguém atira um pau no gato, mas o gato não morre. Um pouco antes de bater a porta, Tia Chica admira-se do berro que o gato deu. Na cantiga popular ela é descrita como Dona Chica, mas sei de fonte confiável tratar-se da mesma pessoa, não duvido.
Contudo, as metáforas não são menos interessantes quando os brasileiros falam dos seus problemas. Para omitir a gravidade deles buscam inspiração em produtos horti-fruti-granjeiros. O pepino, óbviamente pela evidente alusão a sua forma fálica e o risco e o temor que isto representa, é amplamente utilizado. Por exemplo, meu prazo para escrever esta crônica começou a se esgotar, eu estava com um baita pepino. Depois me dei conta da diferença entre pepino e abacaxi. Escrever nunca é um abacaxi. Claro, há sempre o risco de, na falta de assunto, falar-se em abobrinhas. Neste caso eu precisava fazer deste limão uma limonada, sob pena de levar uma banana do editor. Sei não, com esta crise que anda rondando, muitos cronistas estão aceitando numa boa protestos em que as pessoas atiram ovos e tomates, desde que estejam frescos e prontos para o consumo – e, se a moda pega, solicitamos que atirem sapatos aos pares, e de preferência de número 42.
*Paulo Tiaraju
paulotiaraju@terra.com.br
Paulo Tiaraju é publicitário, diretor de Criação da agência Match Point, cronista e violeiro. Foi o primeiro criativo gaúcho a ganhar o prêmio Publicitário do Ano, concedido pela Associação Riograndense de Propaganda (ARP). O texto foi escrito para o portal Coletiva.net
sexta-feira, 20 de novembro de 2009
E então a briga começou...
Sexta-feira bate uma preguiça, por isso resolvi editar essa série de situações, que encontrei na internet. Quero crer que são baseadas em fatos reais:
1) Minha esposa sentou-se no sofá junto a mim enquanto eu passava pelos canais.
Ela perguntou, "O que tem na TV?
"Eu disse, "Poeira. "
E a briga começou...
==============================
2) Minha esposa estava dando dicas sobre o que ela queria para seu aniversário que estava próximo.
Ela disse, "Quero algo brilhante que vá de 0 a 200 em cerca de 3 segundos. "
Eu comprei uma balança para ela.
E então a briga começou...
==============================
3)Quando cheguei em casa ontem a noite, minha esposa exigiu que a levasse a algum lugar caro.
Então eu a levei ao posto de gasolina.
E então a briga começou...
==============================
4)Minha esposa e eu estavamos sentados numa mesa na minha reunião de colegial, e eu fiquei olhando para uma moça bêbada que balançava seu drinque enquanto estava sozinha numa mesa próxima.
Minha esposa perguntou, "Você a conhece ?"
"Sim," disse eu, "Ela é minha antiga namorada...Eu sei que ela começou a beber logo depois que nos separamos há tantos anos, e pelo que sei ela nunca mais ficou sóbria."
"Meu Deus!", disse minha esposa, "quem pensaria que uma pessoa poderia ficar celebrando por tanto tempo?"
E então a briga começou...
==============================
5) Depois de aposentar-me, fui até o INSS para poder receber meu benefício.
A mulher que me atendeu solicitou minha identidade para verificar minha idade.
Chequei meus bolsos e percebi que a tinha deixado em casa.
Disse à mulher que lamentava, mas teria que ir até minha casa e voltar depois.
A mulher disse, "Desabotoe sua camisa."
Então, desabotoei minha camisa deixando exposto meus cabelos crespos prateados.
Ela disse, "Este cabelo prateado no seu peito é prova suficiente para mim," e processou meu benefício.
Quando cheguei em casa, contei entusiasmado o que ocorrera para minha esposa.
Ela disse, "Por que você não abaixou as calças? Você poderia ter conseguido auxilio-invalidez também.... "
E então a briga começou...
==============================
6)A mulher esta nua, olhando no espelho do quarto de dormir.
Ela não está feliz com o que vê e diz para o marido, "Sinto-me horrível; pareço velha, gorda e feia. Eu realmente preciso de um elogio seu. "
O marido retruca, "Sua visão está perto da perfeição. "
==============================
7) Eu levei minha esposa ao restaurante.
O garçom, por algum motivo, anotou meu pedido primeiro.
"Eu vou querer churrasco mal-passado, por favor."
Ele disse, "Você não está preocupado com a vaca louca ?"
"Não, ela mesma pode fazer seu pedido."
E então a briga começou...
1) Minha esposa sentou-se no sofá junto a mim enquanto eu passava pelos canais.
Ela perguntou, "O que tem na TV?
"Eu disse, "Poeira. "
E a briga começou...
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2) Minha esposa estava dando dicas sobre o que ela queria para seu aniversário que estava próximo.
Ela disse, "Quero algo brilhante que vá de 0 a 200 em cerca de 3 segundos. "
Eu comprei uma balança para ela.
E então a briga começou...
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3)Quando cheguei em casa ontem a noite, minha esposa exigiu que a levasse a algum lugar caro.
Então eu a levei ao posto de gasolina.
E então a briga começou...
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4)Minha esposa e eu estavamos sentados numa mesa na minha reunião de colegial, e eu fiquei olhando para uma moça bêbada que balançava seu drinque enquanto estava sozinha numa mesa próxima.
Minha esposa perguntou, "Você a conhece ?"
"Sim," disse eu, "Ela é minha antiga namorada...Eu sei que ela começou a beber logo depois que nos separamos há tantos anos, e pelo que sei ela nunca mais ficou sóbria."
"Meu Deus!", disse minha esposa, "quem pensaria que uma pessoa poderia ficar celebrando por tanto tempo?"
E então a briga começou...
==============================
5) Depois de aposentar-me, fui até o INSS para poder receber meu benefício.
A mulher que me atendeu solicitou minha identidade para verificar minha idade.
Chequei meus bolsos e percebi que a tinha deixado em casa.
Disse à mulher que lamentava, mas teria que ir até minha casa e voltar depois.
A mulher disse, "Desabotoe sua camisa."
Então, desabotoei minha camisa deixando exposto meus cabelos crespos prateados.
Ela disse, "Este cabelo prateado no seu peito é prova suficiente para mim," e processou meu benefício.
Quando cheguei em casa, contei entusiasmado o que ocorrera para minha esposa.
Ela disse, "Por que você não abaixou as calças? Você poderia ter conseguido auxilio-invalidez também.... "
E então a briga começou...
==============================
6)A mulher esta nua, olhando no espelho do quarto de dormir.
Ela não está feliz com o que vê e diz para o marido, "Sinto-me horrível; pareço velha, gorda e feia. Eu realmente preciso de um elogio seu. "
O marido retruca, "Sua visão está perto da perfeição. "
==============================
7) Eu levei minha esposa ao restaurante.
O garçom, por algum motivo, anotou meu pedido primeiro.
"Eu vou querer churrasco mal-passado, por favor."
Ele disse, "Você não está preocupado com a vaca louca ?"
"Não, ela mesma pode fazer seu pedido."
E então a briga começou...
quinta-feira, 19 de novembro de 2009
O Circo de Petrópolis vai à Praia - final
*Recomenda-se ler a postagem anterior, em 18/11

O aguerrido exército brancaleone de Rondinha, em 1974, na Praia da Cal: da esquerda para a direita, acima, Roberto, Medina, este que vos fala, Piero, Mário e Beto; agachados: Sérgio Português, Dedé, Falcetta, Juquinha e Julinho Sarará. (Foto Arquivo Caldas Junior)
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Outra alternativa para as viagens era lotar uma Kombi, pilotada pelo Rebelde, com partida na noite de sexta-feira, utilizando a Capivari-Osório e depois a Inrterpraias e a beira da praia. Junto iam os instrumentos musiciais, aos cuidados do mestre Galego, porque onde estivesse a turma de Petrópolis estaria também a banda. A chegada daquele verdadeiro exército brancaleone à Rondinha era uma festa. As cervejas estavam nos esperando e às vezes era servido um carreteiro com muito arroz e pouca carne, seguidos das primeiras performances musicais.
Durante o dia o ponto de encontro era a lancheria do seu Lotufo, junto a Rodoviária, onde se podia comer um honesto sanduíche para contrapor às muitas cervejas. O Hotel Rondinha, que hospedava os veranistas do SESC, era freqüentado sempre na esperança de tentarmos uma integração maior com as comerciarias. Conheço gente que se deu bem na empreitada sesqueana. Na época, o fornecimento de energia elétrica era precário e só nos fins de semana a pequena usina que abastecia e região prolongava o abastecimento até mais tarde, permitindo os bailarecos na Saron ou o mexe-mexe na boate Biafra, outra invenção do Beto que adaptou uma peça da sociedade para atrair a gurizada da praia. Nos outros dias, ali pelas dez da noite, vinha o sinal com três piques na eletricidade anunciando que em seguida seria cortada a luz. Casais recém formados aguardavam com ansiedade o corte de luz para uma pegada mais firme, que ninguém era de ferro e a escuridão, um manto protetor. Gente,é incrível, mas nem faz tanto tempo assim.
As noitadas se prolongavam, não interessando se havia jogo na manhã seguinte. E assim o valoroso time de Rondinha ganhou conjunto, mas fora de campo, nas mesas de bar e nas rodas de samba, dando início a amizades que perduram até hoje. Isso porque o time foi formado a partir da reunião de um grupo de petropolitanos aos quais se agregaram os amigos dos amigos. O resultado dessa mescla até que era promissor em termos esportivos não fosse o fato de que todos compartilhavam o mesmo prazer pela cerveja e pelas noitadas. Realmente, neste sentido, era uma equipe homogênea.
Nossa chave era a Norte, enfrentando adversários fortes e tradicionais como Torres, formado pelo pessoal da terra que apelidamos de marisqueiros, Praia da Cal, time de caxienses com o Pauletti, craque do salão, Bom Jesus, que sempre apresentava boas equipes e Arroio do Sal, à época ainda distrito de Torres e que não era páreo para os demais. O time de Rondinha era esforçado, brigador e com alguns jogadores de boa técnica, mas na hora da bola rolar pesava o retrospecto das atividades fora de campo. Além disso, a areia fofa da beira da praia exigia mais, exaurindo logo os atletas tresnoitados. O resultado é que viramos saco de pancadaria da chave. A exceção era Arroio do Sal que nos salvava do vexame completo.
Na última temporada, precisávamos de pelo menos uma vitória e o jogo final seria contra Arroio do Sal, que já estava desmobilizado. Domingo de manhã cedo reunimos o pessoal, só Deus sabe em que condições, e nos tocamos para Arroio, cerca de dez quilômetros ao Sul, em busca de uma vitória redentora. Lá chegando, encontramos o adversário com apenas seis jogadores. A regra é clara, como diz o Arnaldo: time com menos de sete jogadores leva WO. E nós precisávamos fazer placar para tentar o milagre da classificação. O pessoal de Arroio do Sal que não tinha nada a perder, a não ser a dignidade, para dar quorum concordou em enxertar um ou dois jogadores recrutados na hora. O representante da Federação, que eu conhecia da redação da Folha, fez vistas grossas e o jogo saiu. Ainda assim penamos para fazer três gols e a memória me trai para saber se foi suficiente para passarmos à fase seguinte. Mas a vitória nos reanimou e ali mesmo em Arroio do Sal começaram as comemorações que se estenderam a Rondinha e tarde a dentro. Regadas a cerveja, é claro.

O aguerrido exército brancaleone de Rondinha, em 1974, na Praia da Cal: da esquerda para a direita, acima, Roberto, Medina, este que vos fala, Piero, Mário e Beto; agachados: Sérgio Português, Dedé, Falcetta, Juquinha e Julinho Sarará. (Foto Arquivo Caldas Junior)
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Outra alternativa para as viagens era lotar uma Kombi, pilotada pelo Rebelde, com partida na noite de sexta-feira, utilizando a Capivari-Osório e depois a Inrterpraias e a beira da praia. Junto iam os instrumentos musiciais, aos cuidados do mestre Galego, porque onde estivesse a turma de Petrópolis estaria também a banda. A chegada daquele verdadeiro exército brancaleone à Rondinha era uma festa. As cervejas estavam nos esperando e às vezes era servido um carreteiro com muito arroz e pouca carne, seguidos das primeiras performances musicais.
Durante o dia o ponto de encontro era a lancheria do seu Lotufo, junto a Rodoviária, onde se podia comer um honesto sanduíche para contrapor às muitas cervejas. O Hotel Rondinha, que hospedava os veranistas do SESC, era freqüentado sempre na esperança de tentarmos uma integração maior com as comerciarias. Conheço gente que se deu bem na empreitada sesqueana. Na época, o fornecimento de energia elétrica era precário e só nos fins de semana a pequena usina que abastecia e região prolongava o abastecimento até mais tarde, permitindo os bailarecos na Saron ou o mexe-mexe na boate Biafra, outra invenção do Beto que adaptou uma peça da sociedade para atrair a gurizada da praia. Nos outros dias, ali pelas dez da noite, vinha o sinal com três piques na eletricidade anunciando que em seguida seria cortada a luz. Casais recém formados aguardavam com ansiedade o corte de luz para uma pegada mais firme, que ninguém era de ferro e a escuridão, um manto protetor. Gente,é incrível, mas nem faz tanto tempo assim.
As noitadas se prolongavam, não interessando se havia jogo na manhã seguinte. E assim o valoroso time de Rondinha ganhou conjunto, mas fora de campo, nas mesas de bar e nas rodas de samba, dando início a amizades que perduram até hoje. Isso porque o time foi formado a partir da reunião de um grupo de petropolitanos aos quais se agregaram os amigos dos amigos. O resultado dessa mescla até que era promissor em termos esportivos não fosse o fato de que todos compartilhavam o mesmo prazer pela cerveja e pelas noitadas. Realmente, neste sentido, era uma equipe homogênea.
Nossa chave era a Norte, enfrentando adversários fortes e tradicionais como Torres, formado pelo pessoal da terra que apelidamos de marisqueiros, Praia da Cal, time de caxienses com o Pauletti, craque do salão, Bom Jesus, que sempre apresentava boas equipes e Arroio do Sal, à época ainda distrito de Torres e que não era páreo para os demais. O time de Rondinha era esforçado, brigador e com alguns jogadores de boa técnica, mas na hora da bola rolar pesava o retrospecto das atividades fora de campo. Além disso, a areia fofa da beira da praia exigia mais, exaurindo logo os atletas tresnoitados. O resultado é que viramos saco de pancadaria da chave. A exceção era Arroio do Sal que nos salvava do vexame completo.
Na última temporada, precisávamos de pelo menos uma vitória e o jogo final seria contra Arroio do Sal, que já estava desmobilizado. Domingo de manhã cedo reunimos o pessoal, só Deus sabe em que condições, e nos tocamos para Arroio, cerca de dez quilômetros ao Sul, em busca de uma vitória redentora. Lá chegando, encontramos o adversário com apenas seis jogadores. A regra é clara, como diz o Arnaldo: time com menos de sete jogadores leva WO. E nós precisávamos fazer placar para tentar o milagre da classificação. O pessoal de Arroio do Sal que não tinha nada a perder, a não ser a dignidade, para dar quorum concordou em enxertar um ou dois jogadores recrutados na hora. O representante da Federação, que eu conhecia da redação da Folha, fez vistas grossas e o jogo saiu. Ainda assim penamos para fazer três gols e a memória me trai para saber se foi suficiente para passarmos à fase seguinte. Mas a vitória nos reanimou e ali mesmo em Arroio do Sal começaram as comemorações que se estenderam a Rondinha e tarde a dentro. Regadas a cerveja, é claro.
Todos os ventos do Litoral
“Vento sul é céu azul
Vento norte não tem sorte
A lestada é chuvarada
Nordestão é viração
Se vai da terra é terral
Se vem do mar é maral
Todos os ventos me levam
Pras bandas do litoral”
Da música Todos os Ventos do Litoral, de Elton Saldanha e Ivan terra
Vento norte não tem sorte
A lestada é chuvarada
Nordestão é viração
Se vai da terra é terral
Se vem do mar é maral
Todos os ventos me levam
Pras bandas do litoral”
Da música Todos os Ventos do Litoral, de Elton Saldanha e Ivan terra
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