sábado, 3 de agosto de 2013

As detetives

Ser chefe tem lá suas inconveniências. Uma delas é que a chefia acaba se envolvendo em problemas particulares de seus subordinados também conhecidos como “os colaboradores da firma”. Eis que estava tentando desentortar um dos tantos pepinos funcionais do meu dia-a-dia quando sou procurado por dedicado companheiro.  Dedicado demais, eu diria, mas não apenas as suas atividades laborais, mas também as artes amorosas. O sujeito apresentava um passado de conquistas de causar inveja a seus pares.  

Pois foi quase choroso que ele relatou-me que estava sendo pressionado por duas colegas que insistiam em saber quem era sua última conquista. E para isso não mediam esforços que iam desde bisbilhotamentos no seu perfil no Facebook  à ameaças de espalharem para toda a firma que estava pulando a cerca.

- Já não sei mais o que fazer. As duas estão bancando as detetives e nem na hora do almoço tenho sossego. Minha vida virou um inferno, um inferno.

Juro que percebi seus olhos marejados e confesso que minha natureza comprometida com a harmonia e meu culto a fidelidade me complicam na hora de lidar com esses assuntos. Além disso, conheço bem as duas bisbilhoteiras, queridas moças expansivas,  e sei que agem mais pelo prazer de se confrontarem com a verdade do que pela condenação da relação ou maldade para com o colega.

- Veja bem, a natureza humana é assim mesmo..., emendei para ganhar tempo em resposta ao seu apelo.

E completei com um repertório de frases feitas, tipo auto-ajuda, na tentativa de recompor o ânimo do companheiro. Não sei se ajudou, mas ao fim e ao cabo, achei que ele saiu da conversa mais animadinho.

- Se eles sonham quem é..., despediu-se enigmático.

Eu que conheço a tal parceira diria o mesmo, mas espero que as duas detetives não descubram que sei do segredo.  Aí a minha vida é que vai virar um inferno.

domingo, 28 de julho de 2013

Hemingway&Martha


Diferente do meu bom amigo Poti Campos, gostei muito do filme Hemingway&Martha, com Clive Owen no papel do escritor e a bela Nicole Kidman como sua parceira.  Consumidor voraz de DVDs sou atento à cena cinematográfica e não lembrava do lançamento no circuito dos cinemas do filme dirigido por  Philip Kaufman até descobrir que é um telefilme produzido pela HBO, o que o valoriza ainda mais, pois se trata de uma produção bem cuidada para os padrões televisivos.

O interessante do filme é que resgata a figura de Martha Gellhorn. É sob o ponto de vista dela que a história é contada. Gellhorn e Hemingway se conhecem em um bar. Ambos partem para a Espanha em guerra civil por motivos diferentes. Ele acompanha uma equipe de gravação de um filme em favor dos republicanos (The Spanish Earth) e ela como correspondente iniciante da revista Collier’s. Ali iniciam um romance que continua ao retornarem aos Estados Unidos. Casam-se após Hemingway obter o divórcio de Pauline Pfeiffer, sua segunda esposa. Ela prossegue sua carreira cobrindo a Guerra Russo-Finlandesa e a Segunda Guerra Sino-Japonesa.   Ambos vão a Europa em guerra e lá Hemingway conhece a também jornalista Mary Welsh, que se tornaria sua quarta esposa.

O filme revela um Hemingway ainda mais beberrão, necessitado sempre mais de exercer sua masculinidade (as cenas eróticas  merecem um “uau”; e que belo e bem torneado calipigio tem dona Nicole!), ao mesmo tempo em que se afirma católico por conveniência - influência de Pauline.  Gellhorn aparece como o lado mais forte do casal, sempre em busca de uma guerra para cobrir e aí se estabelece a competição entre os dois, que  leva ao rompimento. Profissionalmente eles vão ao encontro dos conflitos e o conflito acaba se instalando entre eles.

No auge do romance, o casal convive com o incensado escritor americano John Dos Passos que durante a guerra civil espanhola se apaixona pelo jovem Paco Zarra, interpretado pelo nosso Rodrigo Santoro. Convivem também com figurões como o presidente americano Franklin Roosevelt e sua Eleanor (no filme, numa montagem à Forrest Gump),  o chinês Chang Kai-Chek (que aparece como um general dominado pela mulher), além revolucionários comunistas chineses.

O mérito de Hemingway&Martha está também em registrar um recorte das principais guerras do século 20, da Guerra Civil Espanhola à da Croácia.  Mostra, por exemplo, como os russos participaram ativamente das brigadas internacionais espanholas, a ascensão do nazismo e do fascismo  os horrores praticados pelos japoneses na China, a crueza do Dia D e por aí vai.

O diretor apela para um efeito que entendi como uma forma de distinguir o que é registro histórico, cenas em tom sépia, da ficção, num belo colorido. Pro meu gosto, funcionou.

Por tudo isso, eu que já era fã do autor de   O Adeus às Armas, Por quem Dobram os Sinos, O Velho e o Mar, fiquei ainda mais inspirado pela figura do irrequieto escritor, beberrão sim, inconstante, sim, mas que não se contentava em apenas registrar a história, mas deixava sua marca como protagonista dos acontecimentos em que participava.

Desculpe, Poti, mas tirante a duração (2h34min), gostei muto de Hemingway&Martha.

sábado, 27 de julho de 2013

Teoria da Conspiração

No meu sobe e desce diário pelo Centro Histórico da cidade procuro atalhar por uma loja de confecção que tem escada rolante. Assim gasto menos energia, penso eu.  Mas é só colocar meus pezinhos na dita loja que o sistema de som do estabelecimento passa a alardear: “G7, G7, atenção ao RM18”. Na real pode não ser bem esta a mensagem, mas é com certeza um código que só os G7 dominam.

Suponho que os G7 e seus similares sejam funcionários da loja ou o pessoal da segurança. Isso porque minha suspeita é que de tanto frequentar a loja e suas escadas rolantes esteja sendo monitorado a cada passo. O chamado pelo sistema de som seria uma espécie de alerta contra um perigo iminente. Será que eles imaginam que o senhor de cabeça e barbas brancas possa ser um perigoso bandido, disfarçado de bom velhinho, mapeando diariamente o local para um futuro arrastão ou algo do gênero?

Pior é que fico com a mesma sensação quando frequento as lojas de shopping e os alto-falantes começam a transmitir essas mensagens cifradas. É comigo, penso. E, se logo após a mensagem, um atendente encosta-se a mim e se coloca à disposição aí mais se reforçam minhas suspeitas. Conspiração ou será um complexo de culpa inconsciente?

Teoria da Conspiração (também chamada de conspiracionismo) é qualquer teoria que explica um evento histórico ou atual como sendo resultado de um plano secreto levado a efeito geralmente por conspiradores maquiavélicos e poderosos, tais como uma "sociedade secreta" ou "governo sombra". Obrigado, Wikipédia.


A Teoria da Conspiração valeu pelo menos um bom filme de ação (Conspiracy Theory), estrelado em 1997 por Julia Roberts e Mel Gibson, ele no papel de um taxista de Nova York. Nos horários de folga, o taxista distribuia um boletim que informava as pessoas a existência de uma conspiração planejada por terroristas para assassinar políticos e pessoas influentes. Ai...não, não vou antecipar a história.

Quem me conhece sabe que não acredito em conspirações, nem mesmo da mídia contra os poderes estabelecidos, como defendem alguns colegas diante de matérias hostis.  No caso, prefiro debitar os desvios da mídia à imaturidade, ao desconhecimento ou ao relaxamento de quem apura as matérias, o que dá na mesma.  E culpar a mídia por tudo  é muito fácil e desculpa para incompetência, assim como é muito cômodo culpar os poderes públicos por todas as mazelas.  A banca paga e recebe, diria o outro.

Voltando ao tema central, reafirmo que me intriga cada vez  mais o comportamento das lojas. Esses recados estão infernizando minha vida. Se continuarem agindo dessa forma, vou deixar de consumir em tais estabelecimentos,  aliás, vou ficar só nas ofertas.  Pensando bem, a mensagem secreta pode ser essa: “G7, G7, lá vem aquele sujeito que só compra ofertas.  Olho nele!”.

terça-feira, 23 de julho de 2013

Perdão,mestre Djalma

Djalma Santos,  falecido hoje,  faz parte das minhas melhores e mais antigas memórias  esportivas.  Junto com Nilton Santos ele integrou a defesa da seleção brasileira campeã de 1958. Na verdade, Djalma só virou titular no jogo final da Copa da Suécia, substituindo De Sordi, que estava machucado. Já Nilton Santos era titularissimo.

Ouvi o jogo entre Brasil x Suécia numa manhã fria de domingo de julho, fascinado com o milagre da técnica que trazia  de Estocolmo até a rua Bagé , onde morávamos no bairro Petrópolis, a voz de Mendes Ribeiro, subindo a descendo pelas ondas da Rádio Guaíba.

Na ingenuidade dos meus 8 anos e sem ter a tv para o tira-teima, imaginava eu que os dois clássicos e talentosos laterais seriam irmãos.  Mesmo com o desmentido da realidade (Djalma era negro quase retinto e Nilton um branquelo), fiquei fã dos dois Santos,  tanto assim que meu primeiro time de botão, um jogo de "panelinhas” era do Botafogo de Nilton Santos.  Anos mais tarde,  jovem e esforçado repórter da  extinta Folha da Tarde, encontrei Nilton Santos em um hotel em Salvador e, cheio de reverência, perguntei se ele me dava uma entrevista.  Sim, sem problema, e aí conheci a grande figura humana que ele era. 

Já o Djalma Santos, que jogava pelo meu verdão Palmeiras,  não tive a ventura de entrevistar e, pior, guardo dele a pior das impressões quando o vi jogar ao vivo.  Foi num jogo entre Grêmio x Palmeiras no velho Estádio Olímpico: ele levou um baile do Volmir,  um ponteiro esquerdo maluquete que se intitulava Volmir Maravilha, gente muito fina e dado a atuações extravagantes, como naquela tarde de domingo de 1965  quando virou Mané Garrincha  e ainda fez um dos gols na goleada de 5 x 1.

Mas nem aquele episódio foi capaz de deslustrar a biografia esportiva de Djalma, nem minha admiração por ele.  Nos tempos da nomenclatura antiga, foi considerado o melhor  lateral direito de todos os tempos, clássico e limpo para um defensor,  capaz de se antecipar aos adversários e, temor das defesas,  cobrava  um arremesso lateral como se fosse um escanteio. 

O atleta varzeano que habitava em mim virou lateral direito, mas diferente do ídolo que sonhava imitar, era tosco e viril, quase desleal como a compensar a falta de condições técnicas.  Reverência demais, futebol  de menos.  Perdão, mestre Djalma e descanse em paz.



domingo, 21 de julho de 2013

A propósito do Dia do Amigo...

*Publicado originalmente em 6/8/2010

Confesso que não tenho muito saco para essas datas comemorativas, tipo Dia das Mães, dos Pais e Dia da Criança. A partir do momento em que se tornaram mais um evento comercial do que um tributo aos homenageados, tais comemorações perderam sua dimensão afetiva. Nada contra o comércio, que precisa fazer a roda da economia andar, mas não abro mão de decidir se participo ou não da festa e com quê entusiasmo será minha adesão. 

Até porque novas datas comemorativas estão surgindo, todas com grande apelo emocional e sendo estimuladas pelo setor produtivo. O Dia dos Namorados já está consolidado, fazendo a alegria das floriculturas, dos restaurantes e dos motéis. O Dia da Mulher vai na mesma direção e já há quem advogue a criação do Dia do Homem, uma vez que outras opções já estão contempladas no Dia do Orgulho Gay.

Há um forte movimento para implantar o Dia do Amigo que, por enquanto, se resume ao envio de mensagens piegas entre aqueles que se julgam amigos do peito. Está pintando com força o Dia dos Avós e logo a meritória homenagem vai se transformar em obrigação de comprar presentes para os vovozinhos. Menos mal que posso ser beneficiário dessa obrigação, se bem que ainda vai levar algum tempo até que Maria Clara tenha discernimento para presentear seus avós queridos.

É preciso tomar cuidado com os exageros. Conheço o caso de marmanjos que até hoje recebem presentes pelo Dia da Criança. Observo também um esforço, inclusive de escolas, para introduzir entre nós o Halloween, o Dia das Bruxas, uma tradição anglo-saxonica que nada tem a ver com a nossa cultura. Só vou aderir se puder mandar um bouquet de espinhos para algumas bruxas que me atormentam no dia a dia.

E tem ainda essa forçação de barra para instituir o Dia da Sogra. Com todo o respeito à categoria, que nos legou nossas amadas parceiras, a figura da sogra ainda é estigmatizada e temo que, ao invés de homenagens, as respeitáveis senhoras sejam objeto de agravos de parte de genros e noras ingratos. Isso sem contar que podem surgir idéias como a criação do Dia dos Ex que pode englobar um naipe diversificado de figuras: ex-marido, ex-mulher, ex-sogra, ex-patrão, ex-amigo.

Antes que vire um ex-qualquer e para que não fique a impressão de que sou um rabugento em tempo integral, admito que estou ansioso pelo presente que vou ganhar dos meus filhinhos. A dúvida é: chinelo ou pijama?



domingo, 14 de julho de 2013

Palavras

As palavras, como as pessoas também tem prazo de validade. Depois de um certo tempo envelhecem e por fim saem de circulação. Um exemplo é carestia que virou custo de vida, que hoje conhecemos por inflação. Um exemplo mais charmoso é meio ambiente que já foi ecologia, ou vice versa, e hoje chamamos de sustentabilidade.  Claro que estou tratando das palavras em seu sentido mais amplo e bota amplo nisso.

Os nomes próprios também têm seus períodos de glória e depois vão para o limbo.  Conheci pelo menos dois Telemacos, o mesmo número de Bartolomeus, alguns Baltazares, sem contar os Alcebíades, os Diamantinos e mesmo os Pafuncios  mas imagina a vaia a quem tentar hoje registrar o filho com esses nomes.  Agora tem que ser Jeferson, Rafael, Rodrigo, Sandro, Gustavo e por ai vai, sem entrar na área dos Michael, dos Maicon e seus assemelhados.  Pouparei o naipe feminino dessa digressão.

Manifestantes de qualquer causa agora constituem movimentos sociais, que não podem ser criminalizados conforme apregoam. Nos tempos em que militava na imprensa – que hoje virou mídia – se escrevesse essas palavras difíceis, como criminalizar,  e recém incorporadas ao vocabulário levaria uma mijada do editor. A propósito, o termo  militava me lembra que militante ganhou um novo apelido: agora é ativista, com respectivos apêndices – cicloativista, por exemplo.

Fazem parte da nova geração de palavras todos esses termos derivados e fomentados pelo mundo digital: migrar, deletar, blogar, tuitar, suitar,  o internetês  em geral. E tem ainda o demanda, o empoderamento, o modelar, o protocolizar,  o gestionar, legados das modernas estratégias de gestão. Interessante é que a maioria não é reconhecida pelo corretor do Word, recebendo por isso aquela ondinha em vermelho por debaixo.

Não sou contra a movimentação e a renovação linguística. Mas acho que foi a associação dos acadêmicos, especialmente os sociólogos, com os sindicalistas que produziu esse linguajar típico das lideranças mais atuantes e com viés à esquerda. Foi uma espécie de agendamento de discurso, que ganhou um verniz pela influência acadêmica e uma ênfase pelo estilo e aderência popular ao discurso dos sindicalistas, mesmo os de língua presa. Ou seja, uma eficaz simbiose entre forma e conteúdo.


A verdade é que os bordões, de tanto serem repetidos,  acabaram incorporados pela mídia que dão expressão e alcance aos mesmos. A reflexão que deve ser feita é se esses modismos linguísticos enriquecem ou empobrecem o idioma.  O pior dos cenários é quando os que não sabem o que estão falando empregam as palavras novas e não consolidadas fora de seu contexto.  De minha parte, sou pela simplicidade e por tudo o que facilite a comunicação. É a minha expertise, com o perdão pela contradição.

sábado, 29 de junho de 2013

O pênalti

Fico com uma pena infinita desses jogadores que perdem pênaltis decisivos e passam carregar nas costas o peso da frustração de uma nação inteira, seja ela representada pela torcida de um time ou a população de um país.  Estou solidário ao italiano que desperdiçou o pênalti na quinta-feira e junto com a bola fora lá se foi a façanha de derrotar os campeões e favoritíssimos espanhóis.

Outro italiano, Baggio maculou sua carreira ao chutar nas alturas a cobrança que deu o tetra mundial ao Brasil, em 1994. O grande Zico também viveu seus piores momentos em uma Copa, a do México em 1986, ao perder um pênalti que poderia ter garantido a vitória contra a França e a passagem às semifinais. Mais tarde a França eliminaria o Brasil de Telê Santana...nos pênaltis!

Dinho e Arce, dois ícones do Grêmio que Luiz Felipe levou a decisão contra o Ajax em 1985, também vão carregar para a vida toda a imperícia e o desperdício dos pênaltis que impediram o tricolor de chegar a mais um titulo mundial.

Infames pênaltis que provocam frustrações e podem arruinar carreiras, mas benditos pênaltis que consagram goleiros, como Júlio César, recentemente contra o México, ou Rogério Ceni, que já defendeu 50 pênaltis e vale incluir Marcos que defendeu 45 pênaltis pelo Palmeiras, embora nada supere o russo Lev Yashin (1929-1990), o Aranha Negra, que somou 150 pênaltis defendidos, além de 270 jogos sem sofrer gol. No Grêmio, Victor tomava alguns gols estranhos, mas se consagrava defendendo pênaltis, como Taffarel na seleção e no Inter.

A história registra que o pênalti foi criado em 1892, mas a primeira cobrança só ocorreu no ano seguinte. Desde então vem atormentando cobradores e goleiros. Tanto assim que Nenén Prancha, o folclórico desportista carioca, teria cunhado a célebre frase: “O pênalti é tão importante que deveria ser cobrado pelo presidente do clube.”

De minha parte prefiro a versão do Irani, um atacante alto, delgado e de chute forte, que enfrentava com maestria os zagueirões malvados nos campos varzeanos do bairro Petrópolis. Irani era exímio cobrador de pênaltis, a maioria que ele mesmo sofria, e indagado sobre qual era a sua técnica, afirmava peremptório:-

-  Simples, miro no distintivo do goleiro e dou uma bicanca. Sempre dá certo.

Nada como a simplicidade, não?!



domingo, 9 de junho de 2013

Felipão e eu




Qual o mérito de entrevistar o Felipão hoje? Campeão do mundo, técnico consagrado, esperança de formação de uma seleção competitiva para a Copa 2014, Luiz Felipe Scolari é atração midiática em qualquer circunstância. Eventualmente até são produzidas matérias diferentes sobre ele, além do feijão com arroz das coletivas. Foi o que apresentou o Esporte Espetacular neste domingo de jogo contra a França. Foi uma bela e bem trabalhada reportagem destacando a trajetória do homem, do jogador e do técnico, com resgate de imagens e depoimentos enriquecedores. Parabéns ao Mariano Batista, mais um dos tantos talentos gaúchos na Globo, que produziu e editou o material.

O que eu queria saber agora é quem prestava atenção no Luiz Felipe, zagueiro tosco do Aimoré no início da década de 70 do século passado. Respondo: euzinho!  Foi assim: o Felipão, que já impunha respeito na zaga do time leopoldense, foi recomendado para fazer testes no Olímpico. Lá estava eu, recém iniciando no jornalismo, fazendo o papel de um esforçado setorista da Zero Hora no Grêmio - ou seria da extinta Folha da Tarde? Nem foi preciso muito tempo de avaliação no coletivo para chegar a conclusão que o gringão não ia ser aprovado no teste, mesmo que o tricolor daquele ano, treinado pelo Daltro Menezes, fosse um time pouco mais do que medíocre. Luiz Felipe era voluntarioso, porém, muito limitado tecnicamente.

Mas acho que me compadeci da situação e decidi entrevistá-lo no vestiário, fazendo aquela pergunta mais banal impossível: Como se sentia?

- Tem muita panelinha aqui, assim fica difícil, mas não me abate, respondeu, mais amargurado do que decepcionado.

A entrevista, a única que fiz com Felipão, rendeu uma nota no final da matéria do treino do dia. Deve estar lá nos arquivos da ZH - ou seria da FT?

E nunca mais nos cruzamos, diferente do Grêmio que foi buscá-lo em Caxias para conquistar o campeonato gaúcho de 1987 como treinador, dispensando-o em seguida. Mas o futebol é feito de ironias e seis anos mais tarde o bi rejeitado Felipão voltou ao Grêmio, levando-o às principais conquistas nos últimos anos: a Copa do Brasil de 1994, a Libertadores de 95, a Recopa e o Brasileiro de 1996, além de dois Gauchão. Na decisão do Mundial Interclubes no Japão perdeu o titulo para o Ajax, da Holanda, nos pênaltis. Só o mítico Osvaldo Rolla, o Foguinho, dirigiu o Grêmio mais vezes que Luiz Felipe: 377 jogos contra 322, dois a mais do que seu mentor Carlos Froner.

Ao fazer esse registro fico imaginando se a carreira de Luiz Felipe não teria sido diferente se tivesse permanecido no Grêmio lá nos idos de 70 do século passado. Pensando bem, acho que não. Na rápida entrevista após o mal sucedido teste já ficava evidente que ali estava um sujeito determinado. O resto da história já é bem conhecido.








sábado, 8 de junho de 2013

Os interruptores

Encontrei outro dia um antigo companheiro daquelas tantas confrarias que um dia frequentei. Por razões que desconheço, e já referi essa situação aqui, meus confrades de outrora me tiram para confessionário e com o parceiro desse encontro não foi diferente. Depois da sessão de cinismo inicial, em que cada um jurou que o outro estava em grande forma ("Me dá tua receita pra não envelhecer", insisti, como sempre faço), o  ex-confrade abriu um largo sorriso e com um jeito ligeiramente blasé, disparou:

- Estou de namorada nova e a moça é uma máquina, uma máquina, repetiu.
Ao invés de celebrar a conquista do velho companheiro de tantas batalhas etilicogastronômicas, confesso que fiquei com inveja. Ainda bem que ele não percebeu o meu sentimento perverso, porque logo em seguida desandou a falar em tom queixoso:

- O problema é que na hora do bem-bom tenho sido sistematicamente interrompido por telefonemas de colegas nesta praga que é o celular.

Homem de responsabilidade na firma em que atua profissionalmente, o parceiro não resiste, e no terceiro toque já está atendendo o celular, independente do estágio em que esteja da saliência.

- Sabe como é, pode ser alguma coisa urgente, justifica ele.

Mas completa, pesaroso: “O problema é que a retomada é tão mais difícil....”

Aí fiquei com remorso por causa da inveja anterior. O parceiro estava sendo vítima de uma nova categoria: Os interruptores, agentes de uma forma de bulling sexual, também conhecidos como “os empatadores”.
Na real, são pessoas do bem, mas incluídos na categoria que mais cresce no mundo moderno: os Sem noção.

- O campeão em interrupções é o chefe do jurídico, que me liga sempre quando já consegui engrenar. Acho que como ele não pratica mais agora esta atrapalhando a transa dos outros.

O ranking dos maiores interruptores inclui o vice-presidente, o diretor de marketing e meia duzia de  colegas do mesmo nível, incluindo aquela moça mais expansiva também do marketing.

 A nova namorada estranha a insistência com que ele é procurado, mas tem sido pacenciosa mesmo com as interrupções.  "Mas até quando?", angustia-se ele.

Foi nessa fase da conversa que me comovi e assumi uma atitude solidária com o amigo. Deveria haver uma punição severa para os interruptores. Algo como assistir na primeira fila ao show de Michel Teló ou participar da Dança dos Famosos com a Suzana Vieira ou ser obrigado a torcer para o Ibis.  Interrupção já, aos interruptores.



domingo, 2 de junho de 2013

Expresso da Alegria


Sei lá, acho que estou ficando velho e nostálgico, quase melancólico. Foi o que me ocorreu ao ver a foto  postada no Face pelo jornalista e amigo Caco Belmonte, onde aparece o time de futsal da Rádio Guaíba, nos idos da década de 70, posando antes de um torneio da Associação de Cronistas, a ACEG.  Ali aparecem  o Belmonte, pai do Caco e do Roberto - os dois mascotes da foto -, o falecido  Lupi Martins, grande conquistador, e seu irmão Lasier, ainda com cabelos, e agachados este blogueiro na sua versão grunge, o craque Clóvis Rezende e o meu compadre Edegar Schmidt. As camisas eram em verde e branco para ninguém nos acusar de gremismo ou coloradismo.

Vou ser bem sincero: este time era muito ruim, apenas o Belmonte, com seu chute potente e o Clóvis com seus dribles infernais (até perder a bola e armar os contra-ataques...), jogavam alguma coisa. Mas foi o embrião de uma afamada equipe montada pela determinação do Érico Sauer, o Expresso da Alegria, que se apresentou em mais de 100 cidades gaúchas às sextas-feiras e eventualmente aos sábados.

Funcionava assim: a prefeitura interiorana ou uma entidade assistencial fazia o convite, concordando em pagar as despesas de deslocamento em micro ônibus e se ressarcia no evento beneficente em que se transformavam os jogos com equipes locais.  A Guaíba era um canhão na época e a presença do Expresso lotava ginásios por todo o interior. A exigência dos promotores era sempre pela presença do Lauro Quadros, que não jogava nada, mas enchia os ginásios, dava autógrafos e entrevistas como nunca e posava para fotos com madrinhas de festas, autoridades e gurizada em geral. Jogo sem Lauro era duro de explicar e certa vez em uma vinícola de Garibaldi fomos vaiados do começo ao fim e ainda levamos um balaio de gols. Nessa ocasiões só o que nos salvava era a sessão de piadas contadas pelo Clóvis Rezende  após as churrascadas e jantares que nos ofereciam.

Históricas gloriosas aconteceram nas excursões do Expresso.  Certa vez fomos a Santa Rosa e como a distância era grande exigimos avião para o deslocamento e foi num Navajo que seguimos até lá, jogamos num sabado à tarde e retornamos antes do anoitecer, com ameaça de muita chuva.  O Lauro Quadros ficou verde e os outros mortais não escondiam a apreensão, menos o Érico, que na terceira dose de Campari, não estava nem ai para as ameaçadoras cumulus nimbus que nos acompanharam de Santa Rosa à Porto Alegre.  Em outra ocasião, inauguramos o ginásio municipal de Nova Prata sob um frio de zero grau e a equipe ainda não tinha abrigos. Quase morremos de frio e os abrigos foram providenciados para os jogos seguintes.  Em Osório, jogamos num velho ginásio que tinha um degrau na quadra e levamos um saco de gols do adversário comandado pelos irmãos Benfica.

O Erico era um figuraço. Plantão de estúdio dos bons, com seu sotaque de alemão do Vale do Taquari, valia uma enciclopédia pelos histórias e gafes que protagonizou, especialmente no período em que bebia todas - depois virou abstêmio.  Zagueirão do Estrela em tempos idos, no Expresso atuava como goleiro, depois técnico e sempre como cartola.

No auge do Expresso, o técnico passou a ser o Agomar Martins, que recém havia abandonado a arbitragem e era uma atração extra no interior. O time base na época era formado pelo Pedro Boleiro, que também era o motorista do micro que nos conduzia, o falecido Zé Krebs , chefe da técnica da Guaíba, este que vos fala, Clóvis Rezende e ou Laerte de Francheschi e ou Lauro Quadros.  Também participavam o Flávio Martins, eventualmente o Belmonte e quando o adversário era muito forte convocávamos o Adauri Silveira (hoje na Ampla Eventos), que era jovem e jogava muito.

Em varias incursões levávamos  nossas mulheres e até filhos, como o Lauro que se fazia acompanhar da Laurinha, com seus oito ou nove anos e que era a nossa pequena princesa. Como se vê, era uma indiada família. Melhor que o jogo era a confraternização após. Grandes churrascadas, muitas homenagens e dependendo do local, ótimos mimos para os visitantes.

Minha despedida do Expresso foi em 1983 num jogo em Taquari onde reinava o promotor Cláudio Britto, presente no ginásio do jogo. Ao final, recebi todo o uniforme, ainda suado, como lembrança, e confesso que fiquei engasgado.  Nunca mais viveria aquela alegria do Expresso, com o perdão do trocadilho,  e o carinho, mostrados de forma direta e espontânea, pelos ouvintes da Guaíba. Mas até hoje guardo aquela camisa verde  que será peça fundamental no futuro Memorial Flávio Dutra.

* Em memoria aos que nos deixaram tão cedo.