quarta-feira, 1 de agosto de 2012

Na Moral e outros equivocos

A nova (?) programação da Rede Globo esta me deixando tonteado.  Os recém-estreados “Encontro com Fátima Bernardes”  e o “Na Moral”, com Pedro Bial, não conseguiram emplacar e dificilmente isso acontecerá, a não ser que haja uma virada de 180 graus nas produções, uma virada capaz de trazer os diferenciais que as chamadas dos programas prometiam.

O caso mais grave é o do programa da Fátima, preparado há quase um ano e que se revela um equívoco monumental, não fazendo justiça ao talento da apresentadora.  Uma regrinha básica quando se cria uma nova atração – e isso vale para todas as mídias e para outras formas de entretenimento – é focar no público alvo do horário ou pretendido. Ou muito me engano ou o público das manhãs é constituído de donas de casas e crianças, mas o que vi num dos primeiros programas foi o futebol como tema central.  A rigor, o equívoco mastodôntico foi estrear um programa para adultos em horário de público infantil em plenas férias escolares. A coisa é tão tediosa que outro dia uma senhora do auditório foi flagrada dormindo durante o programa. Aliás, a nova mania televisiva são esses mini auditórios, que servem de claque, jurados e cenários, sem o menor critério.

Tenho prestado mais atenção ao Pedro Bial do que a Fátima Bernardes e conto pra vocês a síntese do programa: muito ritmo, pouco conteúdo; muito discurso, pouca profundidade. É um tal de entra e sai de convidados e assuntos que resta pouco recall.  Parece que os luminares da programação global ficaram reféns de uma fórmula que vou chamar de Jornalismo Revista Contigo e sua variação Revista Nova, ou seja, uma mistura de temas comportamentais da hora,  alguma coisa  pretensamente polêmica, uma pitada de sexo,  a presença de alguns artistas globais e cantores do hit parade e mais um auditório adestrado, tudo isso costurado por um âncora famoso . Nessa linha, sou mais o Serginho Groismann. O resto está mais pra fake e o público, que está amadurecendo e sabe o que quer, reage com indiferença.
Lastimo a posição em que ficaram a Fátima e o Bial, mais pelo que representaram no passado e menos pela guinada equivocada que deram em suas carreiras.
Para não dizerem que tenho má vontade com a Globo, admito que na teledramaturgia a rede esta acertando em cheio. “ Avenida Brasil” vai entrar para o rol das melhores novelas de todos os tempos, não tanto pelo enredo, mas pelo desempenho superior de todo o elenco, exceto o canastrão Murilo Benicio. E arrisco dizer que o remake de “Gabriela” é tão bom ou melhor que o original, com aquele luminosidade e cenários baianos, seios e bundas à mostra e,  de novo, uma grande  atuação de todo o  elenco, ai incluída até a Ivete Sangalo como Maria Machadão. Só implico com aqueles figurinos masculinos que não dispensam o colete no tórrido sertão da Bahia. Até a novela das sete, Cheias de Charme,  misturança de ficção e realidade, acertou na fórmula e também vai marcar época.

A essa altura do campeonato, se eu fosse a Fátima e o Bial pedia transferência para o núcleo das novelas.




quarta-feira, 25 de julho de 2012

Barca furada

Realmente acho que estou ficando passado. Outro dia frequentei conhecido lupanar – há séculos pretendo usar essa palavra – lupanar, repito, numa daquelas transversais da Farrapos e fiquei negativamente surpreso. Antes é preciso explicar que fui ao local prestigiar um evento de uma produtora de audiovisuais, gente talentosa mas desconectada. Onde já se viu promover evento num lupanar?

A verdade é que em paralelo ao evento a casa estava aberta para, digamos, sua atividade fim. E aí começa a minha decepção.  As moças da casa circulavam com ar blasé, sem esboçar um sorriso sequer, um arreganho qualquer, um olhar mais convidativo ao público masculino presente ao evento – alguns bem assanhados com o ambiente. Foi deprimente ver aquelas moças, todas  bem  dotadas de calipígios, sentadinhas comportadas, lado a lado, a espera dos primeiros clientes de uma segunda-feira pouco promissora. Isso sem contar a decoração brega, que abusa dos neons, das pinturas de gosto duvidoso e dos painéis com mulheres seminuas.
Talvez o encolhimento das moças da casa – eu quase usei recato – se deva a inesperada concorrência das gurias presentes ao evento, belas, altivas, encantadoras, desejáveis, todas valendo uma incomodação – eu fora.  Talvez, ainda, eu esteja influenciado pela boate Bataclan, da novela Gabriela, sempre tão feérica e animada, contrastando com esse ambiente quase lúgubre e essas moças tão desacorçoadas e a ficção  superando a realidade.

Num rasgo de generosidade, ao me despedir do evento, passei pelas moças e, tentando animá-las, prometi que voltaria no dia seguinte para festar com elas.  Só o que recebi de volta foram um ou outro olhar desinteressado.
Mudei eu ou mudaram os lupanares? Não sei, mas acho que estava numa barca furada.

sexta-feira, 20 de julho de 2012

A propósito do Dia do Amigo

*Publicado originalmente em 6/8/2010


Confesso que não tenho muito saco para essas datas comemorativas, tipo Dia das Mães, dos Pais e Dia da Criança. A partir do momento em que se tornaram mais um evento comercial do que um tributo aos homenageados, tais comemorações perderam sua dimensão afetiva. Nada contra o comércio, que precisa fazer a roda da economia andar, mas não abro mão de decidir se participo ou não da festa e com quê entusiasmo será minha adesão.

Até porque novas datas comemorativas estão surgindo, todas com grande apelo emocional e sendo estimuladas pelo setor produtivo. O Dia dos Namorados já está consolidado, fazendo a alegria das floriculturas, dos restaurantes e dos motéis. O Dia da Mulher vai na mesma direção e já há quem advogue a criação do Dia do Homem, uma vez que outras opções já estão contempladas no Dia do Orgulho Gay.

Há um forte movimento para implantar o Dia do Amigo que, por enquanto, se resume ao envio de mensagens piegas entre aqueles que se julgam amigos do peito. Está pintando com força o Dia dos Avós e logo a meritória homenagem vai se transformar em obrigação de comprar presentes para os vovozinhos. Menos mal que posso ser beneficiário dessa obrigação, se bem que ainda vai levar algum tempo até que Maria Clara tenha discernimento para presentear seus avós queridos.

É preciso tomar cuidado com os exageros. Conheço o caso de marmanjos que até hoje recebem presentes pelo Dia da Criança. Observo também um esforço, inclusive de escolas, para introduzir entre nós o Halloween, o Dia das Bruxas, uma tradição anglo-saxonica que nada tem a ver com a nossa cultura. Só vou aderir se puder mandar um bouquet de espinhos para algumas bruxas que me atormentam no dia a dia.

E tem ainda essa forçação de barra para instituir o Dia da Sogra. Com todo o respeito à categoria, que nos legou nossas amadas parceiras, a figura da sogra ainda é estigmatizada e temo que, ao invés de homenagens, as respeitáveis senhoras sejam objeto de agravos de parte de genros e noras ingratos. Isso sem contar que podem surgir idéias como a criação do Dia dos Ex que pode englobar um naipe diversificado de figuras: ex-marido, ex-mulher, ex-sogra, ex-patrão, ex-amigo.

Antes que vire um ex-qualquer e para que não fique a impressão de que sou um rabugento em tempo integral, admito que estou ansioso pelo presente que vou ganhar dos meus filhinhos. A dúvida é: chinelo ou pijama?


quinta-feira, 12 de julho de 2012

Transparência não é isso

Essa preocupação toda com os salários dos agentes públicos transcende a transparência apregoada pelos que advogam o livre acesso a todos os números e nomes das folhas de pagamento dos órgãos públicos. Trata-se, primeiramente, de um assunto da hora, um daqueles temas que rendem reportagens, entrevistas, colunas opinativas, programas de debates na mídia e, de repente, somem das páginas e dos outros espaços midiáticos.

É também  uma questão que permite o exercício do viés que definiríamos como moralista, primo-irmão do politicamente correto, de parte dos chamados formadores de opinião. O argumento é simples: se é o povo que paga o funcionalismo,  através dos impostos arrecadados pelo poder público, é  legal e moralmente justificável abrir os valores salariais para aqueles que, em última – ou seria em primeira? – análise são os patrões desse pessoal todo.

Tudo certo, até porque virou lei e lei é para ser cumprida. Mas tem uma coisa nesse processo que me deixa  apoquentado, descrente novamente na grandeza do gênero humano. É a sanha para descobrir quanto os colegas ganham e, se for alguns tostões a mais, destilar todo o ódio contra o agora desafeto. Esse é o efeito mais nefasto da divulgação pela imprensa dos salários dos funcionários púbicos, sem contar as repercussões familiares na casa daqueles que precisam esconder seus ganhos da patroa, sei lá por quais razões.  Sei de repartições que quase pararam nos últimos dias por causa do ti-ti-ti dos salários. 
E tem ainda essa caça às bruxas, verdadeira cruzada ensandecida,  aos que não fazem jus aos salários que recebem, como o caso dessa senhora da Assembleia Legislativa, um evidente caso de inocente útil.  Quero ver ser ousado na denúncia contra membro do judiciário que ganha mais de R$ 100 mil ou muito mais. Isso, sim, é um escândalo!

O ViaDutra ia espichar esse assunto,mas vai ficar por aqui, fazendo a indagação que não quer calar: a quem interessa demonizar o servidor e o serviço público?

sábado, 7 de julho de 2012

Livrai-me das homenagens

Quintana e Drummod,em bronze na Praça da Alfândega, em Porto Alegre: não é engano eterno


“Um engano em bronze é um engano eterno”. A frase foi a desculpa de Mário Quintana para evitar ser homenageado – com uma placa em bronze - pela prefeitura de Alegrete, terra natal do poeta.  Mas o prefeito não desistiu e usou a frase, simples e genial como o poeta, no bronze que hoje é uma das atrações da praça central da cidade fronteiriça. Por necessário, foi acrescentada uma explicação na placa: “Frase com que o poeta Mario Quintana se eximiu de escolher um verso seu para gravar em bronze”.

Eximir é um verbo mais correto para recusar determinadas homenagens. No serviço público é comum empresas promotoras de evento menos sérias, vigaristas mesmos, oferecerem troféus e diplomas de Destaque  disso ou daquilo a prefeitos e vereadores. A comunicação da “homenagem” é acompanhada de um doc para depósito bancário, com quantias variáveis dependendo do caso, a título de “despesas administrativas”, “aquisição de convites” ou outra designação qualquer porque, nesse âmbito, a criatividade não tem limites.
Também tem muito amadorismo no meio. Certa vez fui representar uma importante liderança política num evento em Porto Alegre e, além de ter de pagar o jantar (o tradicional fricasse de galinha com batata palha e arroz à  grega,  que de grego só tinha os pequenos nacos de cenoura), acabei sendo também homenageado, eu um mero jaguané,  com direito a uma biografia que foi pronunciada pelo mestre de cerimônia no triplo do tempo dedicado ao principal homenageado. O pior é que a gente tem que subir nos palcos e fazer cara de horizonte, enquanto despejam aquele montão de falsidades sobre você. Nessas horas,  que, graças ao bom deus dos assessores não tem acontecido com frequência, assumo um ar grave e concordo com tudo, maneando a cabeça afirmativamente. Mas é uma experiência duramente constrangedora.

Há coisas piores, como a que se tornou uma cruel homenagem feita pelo piloto que despejou a primeira bomba atômica sobre o Japão. O sujeito, certo de que estava fazendo a coisa apropriada, batizou de Enola Gay, nome de sua mãe, o quadrimotor B-29 que destruiu Hiroshima em agosto de 1945 e matou milhares de pessoas. 
Não teve a mesma dimensão dramática, mas não deixou de ser uma crueldade o que fizeram com Paulo Roberto Falcão, anos atrás, quando indicaram o craque para receber o título de Cidadão de Porto Alegre e a proposta foi vetada, por maioria, na Câmara de Vereadores. Ou seja, o coitado do Falcão não pediu para ser homenageado e ainda passou pelo vexame de ter seu nome rejeitado, por razões que já nem interessam mais, na cidade que o consagrou para o futebol.

Essa é a questão crucial que envolve as homenagens e que Mário Quintana expressou  como só ele saberia fazer. Se os homenageados pudessem antever o futuro e o que aconteceria com os espaços e situações dos tributos que lhe seriam prestados, mesmo os mais bem-intencionados, ficaria mais fácil de lidar com a questão.
Mas sabemos que não é assim.  Por exemplo, não terei como impedir que  a Travessa Flávio Dutra ou algo do gênero , que algum baba-ovo vai querer batizar quando eu partir para outra dimensão, passe a figurar nas páginas do Diário Gaúcho. Já estou até vendo as manchetes e títulos: “Traficantes tomam conta do Beco Flávio Dutra”,  ou “Prostituição infesta praça Flávio Dutra”, ou ainda “Ruela Flávio Dutra virou foco de lixo”,  ou a pior  - “Ninguém aguenta o mau cheiro da Flávio Dutra”.  Vou me remexer na cova.  O que me conforta é que ainda vai demorar muito até eu virar placa!


quinta-feira, 28 de junho de 2012

Um certo restaurante em Dallas e outras anotações


                      Hotel Melrose: treme-treme nos fins de semana

O repórter de campo anuncia no meio do jogo Grêmio x Flamengo:

- Vai entrar Matheus. Ele é filho de Bebeto e era o recém nascido saudado no gesto do “nana, nenê” pelo pai,  no jogo contra a Holanda na Copa de  94.

A informação foi suficiente para  voltar 18 anos no tempo e avivar minha memória, eu que era um dos tantos brasileiros presentes no velho estádio Cotton Bowl, de Dallas, e me vi torcendo descaradamente pela seleção do Parreira, contrariando minha índole de cronista esportivo sempre tão contido. Estava a serviço, pela Rádio Gaúcha,  e o jogo Brasil x Holanda, pelas quartas de final,  foi um dos dois únicos a que assisti ao vivo, em estádio em uma Copa, e que jogo! – o outro foi Arábia Saudita x Suécia, no mesmo Cotton Bowl, com Renato Marsiglia no apito.

1994: depois de coordenar quatro copas do mundo na retaguarda fui finalmente escalado para a Copa dos Estados Unidos.  Quase não cheguei lá.  No voo intercontinental , ainda no tempo da saudosa Varig, Varig, Varig tive uma  queda de pressão tão forte que pensei que ia retornar  ao Brasil num pijama de madeira, encoberto pelo pavilhão nacional e da RBS. Em frações de segundos passou o filme da minha vida e eu me desesperei só de pensar que não veria mais meus filhos.  O atendimento dos comissários, entretanto, foi eficiente e eu ainda contei com a assistência de uma verdadeira junta médica, um grupo de profissionais paulistas reunidos a bordo rumo a um congresso nos EUA.  Logo me recuperei, mas o companheiro de viagem e de uma jornada de 52 dias em Dallas não sossegou. A cada movimento meu, nos desconfortáveis bancos da classe econômica, o engenheiro Gilberto Kussler tinha um  sobressalto.  Mas sobrevivemos os dois.
Durante a Copa, convivendo a toda hora no nosso estúdio do Centro Internacional de Radiodifusão, em  Dallas , o nosso Giba, gringão de Casca, profissional dos bons, tanto assim que hoje presta serviços a rede Globo de rádios,  tinha, porém, momentos de rabugice especialmente quando eu escapava para fumar.  Mas quando os trabalhos se encerravam lá pelas 10 da noite,  era um grande parceiro para jantar e tomar uma cervejinha.

Numa dessas incursões noturnas descobrimos o London, London ,um restaurante ao lado do nosso hotel com uma comida maravilhosa, cerveja sempre gelada e atendimento atencioso.  Atencioso até demais, eu diria.  Já na primeira noite, o garçon perguntou se gostaríamos de ficar num lugar mais reservado. Recusamos a oferta e tratamos de comer, beber e, cansados da longa jornada, nos recolhemos logo ao hotel.  No segundo dia, voltamos ao restaurante e foi aí que notamos a estranha movimentação de casais do mesmo sexo nas mesas. Homem com homem, mulher com mulher em discretas mas intensivas confraternizações.  A essa altura o garçon já estava imaginando que o alemão Kussler e eu formávamos mais um casal gay. A verdade é que a comida e a bebida do London, London caíram no nosso gosto e, até pela conveniência  e pelo preço da refeição, continuamos a frequentar o local, se bem que evitávamos manifestações mais expansivas, mantendo sempre uma postura circunspecta, como convinha.
Nosso hotel era o Melrose,  uma construção vitoriana na entrada do bairro que lhe empresta o nome. O bairro de Melrose é uma espécie de mistura de Cidade Baixa com Bom Fim, zona boêmia de Dallas, de muita diversidade em todos os sentidos.  O hotel tinha um dos melhores bares do gênero em todos os EUA, frequentado pela fina flor de Dallas, mas nas sextas e sábados transformava-se num treme-treme pelas festas particulares e de empresas, que bloqueavam um andar inteiro para os executivos e suas acompanhantes.  Se aqueles corredores, elevadores e quartos falassem...

Minhas reminiscências daquela Copa   da estada no Texas me obrigam a voltar ao jogo Brasil x Holanda para afirmar, sem dúvida, que o juiz da Costa Rica garfeou o time laranja, não marcando pênalti de concurso do Mauro Silva.  Na real, seria uma injustiça perder aquele jogo épico, depois dos belos gols de Romário, Bebeto – o gol da cena do “nana,nenê” – e daquela falta cobrada pelo Branco, um canhonaço que garantiu a vitória.
À noite, as ruas centrais de Dallas foram invadidas por torcedores do Brasil e da Holanda,  estes com suas lindas loiras e homens de cabeleiras também loiras, numa saudável confraternização, regada a muita cerveja.

Hoje, passados 18 anos, pergunto aos mais ansiosos em relação às obras da Copa: quantos estádios os Estados Unidos construíram para o mundial de 94? Depois da hesitação do interlocutor, respondo: Nenhum! Os americanos deram um trato em seus velhos estádios, adaptaram para o futebol os campos destinados a outros esportes, enveloparam antigas instalações e, a agora exigente FIFA, não chiou na época, aceitando tudo em nome da abertura de um novo e promissor mercado para o futebol.
Em compensação, os aeroportos, a hotelaria,os outros serviços dos EUA...


sábado, 16 de junho de 2012

Sobre hienas e lobos

*Publicado originalmente em 16/11/09

Cansa este negócio de escrever sobre coisas ditas sérias. Por isso, decidi voltar às futilidades, para fazer um importante alerta: cuidado, muito cuidado, atrás de um lobo sempre vem uma hiena. A advertência nem é minha, mas do meu bom amigo LFA depois de ler a crônica Lobos em Ação, que cometi no ano passado e Coletiva.net se atreveu a publicar. Tenho boas razões para suspeitar que o próprio LFA seja um lobo disfarçado, daqueles que atacam em eventos musicais. Convém lembrar que os lobos são aquelas criaturas que, na busca de suas conquistas amorosas, atuam em locais e horários diferenciados, cercando suas presas com sutileza e determinação. Distinguem-se dos comuns mortais pelo gosto ao inusitado, pelo enfrentamento das adversidades, pela ousadia na ação e pela técnica refinada na abordagem. O maior risco que as mulheres correm com essa espécie é de terem suas expectativas atendidas, porque o verdadeiro lobo valoriza suas conquistas e quer fazê-las felizes.

Já as hienas são lobos fracassados. Elas bem que gostariam de ascender a condição maior, mas lhes falta finesse e, porque são hienas, ficam com as sobras. Alguns, de tanto viverem à sombra e no rastro dos lobos, acabam aprendendo e ocasionalmente podem se transformar em lobos juniores, mas jamais chegam a seniors e muito menos a masters.

A diferença entre as duas espécies não está na condição social ou em qualquer outro tipo de segmentação, mas na atitude. O lobo prima pela finura, a hiena é sinistra; o lobo é pacencioso, a hiena é afoita; o lobo é seletivo, a hiena está aí para o que der e vier. Mas não é justo afirmar que a hiena só tem defeitos. É ainda o LFA quem observa que, embora cheguem depois, nem por isso as hienas têm uma tática menos ofensiva e letal. Podem parecer desengonçadas, mas são resistentes, capazes de perseguir suas presas por muito tempo sem esmorecer.

É o caso da Hiena Eleitoral que só participa de caminhadas de partidos nanicos, mas suporta carregar bandeiras com mastros enormes sem jamais perder o alvo de vista. SCA. analista de sistemas, se encaixa neste perfil. A preferência pelos partidos menores e mais radicais se explica: ele entende que grupos reduzidos já estabelecem uma seleção natural para escolher a presa que vai ser atacada e acredita, ainda, que o radicalismo das moças pode se transformar em intensidade na hora do vamos ver.

VJB., que se apresenta como bacharel em direito, mas na verdade atua como despachante, é outra hiena típica. Ele até freqüenta as baladas mais descoladas, mas é traído pelo medalhão no peito, pelo vistoso anel de formatura, pelas cantadas sem rodeios e o resultado final é zero. Por isso, a esticada é nos festerês mais populares, onde é conhecido como a Hiena dos Bailões. Entre músicas do Sidnei Magal, Wando, pagodeiros românticos e vanerões modernosos, ele se sente em casa. Aí ataca com fúria. È dois pra lá, dois pra cá e ele já começa a percorrer a anatomia da vítima. Quando sente reciprocidade, vai direto ao ponto:

- Tá na hora da gente partir.

A Hiena dos Bailões garante que a cada duas dessas abordagens uma pelo menos funciona, o que determina que ele trabalhe em dobro para não terminar a noite invicto.

A hiena tem uma linguagem toda própria para se relacionar com suas vítimas, que podem ser honradas com expressões tipo “minha Deusa”, “Gatosa” , “minha Ídala” e outras meiguices do gênero. PNS., corretor imobiliário, prefere usar “minha Diva”, certo de que esse tratamento confere algum requinte as suas investidas. Ele é conhecido como “Hiena Bus Stop” porque seu habitat são as paradas de ônibus na região central, onde atua no final da tarde, à espera das moças que terminam seus turnos nas repartições públicas, bancos e comércio em geral. O elenco é numeroso e ele tem o cuidado de rejeitar as universitárias que se dirigem aos cursos noturnos porque sabe que vai ter poucas chances se a moça tiver que escolher entre o aprendizado e uma hienada. A hiena é hiena, mas não pra boba não serve.

A existência de lobos e hienas, cada um com seu estilo e forma de atuação, mostra como a natureza é sábia. Há espaço para todas as espécies, a convivência pode ser harmoniosa e uma complementa o trabalho da outra, de forma a contentar vítimas de todos os perfis.

*Publicado originalmente em Coletiva.net

domingo, 10 de junho de 2012

As brasileiras

Brasileiros em viagem ao exterior aprontam cada uma! Um exemplo recente: amiga do ViaDutra, em missão profissional pela Europa e Norte da África,  estabeleceu longa conversação com um interlocutor que julgava ser estrangeiro.  Só que ele falava um português fluente e ela respondia num inglês quase oxfordiano. Efeito do Jet leg da viagem recente.  A moça ainda se gabava para a acompanhante, falando em português:

- Viu, aquelas aulas particulares de inglês com a teacher Lu estão dando resultado: eu entendo tudo o que ele fala.
O interlocutor, um experiente consultor internacional, ouviu a observação e resolveu entrar na brincadeira:

- Sorry, but I’m brazilian!
Ao que ela respondeu, ainda em inglês;

- You must be joking!  I’m brazilian too!
(Perdão leitores: o english do ViaDutra is very bad!,mas a gente se esforça.)

E entabularam, com muita naturalidade, uma conversação de mais meia hora...em inglês, para pasmo da acompanhante, uma brasileira mais afeita ao francês.
Na volta ao Brasil, as duas moças preferiram se vangloriar do sucesso que fizeram num subdesenvolvido país do norte da África.  Até propostas de casamento receberam dos comerciantes. As propostas envolviam dotes de camelos, cabras e algumas sacas de tâmaras, o que, convenhamos, era uma muquiranagem. Consta que o marido de uma delas só não aceitou a oferta porque não teria onde hospedar os camelos e cabras...

O que elas não sabem é que aquele pessoal, comerciantes milenares, fazem qualquer coisa – até propor casamento – para vender suas bugigangas.  E as lambisgóias acreditaram!

quinta-feira, 7 de junho de 2012

Lobos nunca dormem - final

Recomenda-se ler a primeira parte, publicada dia 2/junho

Mais intelectualizado, V, professor universitário, investe fortemente na área de cursos, seminários e palestras, desde que os temas tratados possam atrair vítimas potenciais. É capaz de sacrificar o fim de semana em cursos de extensão só para alargar o horizonte de seus conhecimentos e seu currículo com o conquistador. No primeiro dia de aula escolhe a vítima e no último ela está dominada. E não tem qualquer restrição às temáticas de auto-ajuda. Raciocina, com boa lógica, que as mulheres interessadas neste assunto estão carentes de apoio, de um ombro amigo e ali está ele para suprir essa necessidade.

Curso do Lair Ribeiro, seminário com Roberto Shinyashiki, palestra do professor Marins, contam sempre com a presença do nosso amigo. Durante a exposição do palestrante, ele mostra grande interesse, anota frases e conceitos que considera importantes e serão seus argumentos depois, enquanto seus olhos, não de lobo, mas de águia, varrem o ambiente a procura das suas vítimas. Não demora muito e encontra a mulher ideal: é aquela desacompanhada que mantém os olhos vidrados no conferencista e aprova, com leves maneios de cabeça, tudo o que é dito. Uma mulher receptiva. No final, dá um jeito de encontrar a mulher visada e, com a maior naturalidade, propõe a conversa:

- Que conteúdos! Que clareza! Não achastes? Eu gostaria tanto de aprofundar essas idéias com outras pessoas...

Daí em diante o ritual não varia: trocam cartões e telefonemas, compartilham cafés no fim da tarde e jantares noite adentro, e logo estão compartilhando também a mesma cama, embora ele faça questão de dizer que o sexo é apenas uma etapa para chegarem a um entendimento superior sobre a condição humana nestes conturbados tempos pós-modernos.

O “Lobo Eleitoral”, J, é um capítulo à parte. Sempre atento ao calendário eleitoral, ele entra em êxtase neste período e se torna freqüentador assíduo de passeatas, bandeiraços, comícios, inaugurações de comitês, enfim, de qualquer ato público que possa reunir militantes femininas. É metódico e trata desde cedo de armazenar bandeiras, adesivos, bandanas, bottons de todas as candidaturas, até porque seu lema é “respeito à pluralidade ideológica e prazer para todas”. O “Lobo Eleitoral” tem uma preferência toda especial pelos comícios, o que tem sua lógica. O espaço é delimitado, é mais fácil cercar as futuras presas e o tom dos discursos, carregado de emocionalismo, é o mote que ele usa para a primeira investida. Funciona assim: ele chega cedo ao local, agitando a bandeira da candidatura e se posiciona onde constata a maior concentração feminina. Durante o comício, canta animadamente todos os jingles e é o primeiro a puxar o coro compassado com o nome do candidato. Aquela animação toda contagia as circunstantes e logo ele está interagindo com a militância.

- Sabe, guria, me emocionei com o discurso do nosso candidato. Presta atenção no que eu vou te dizer: assim não tem prá ninguém.

Não há como resistir a tanta devoção, tanto ardor cívico, tanto comprometimento com a causa, tanta certeza na vitória, e logo ele passa para a etapa seguinte:

- Puxa, acho que essa demonstração de cidadania merece uma comemoração. Vamos tomar uma cerveja ali no Mercado?

Depois, é só questão de incrementar a conversa, oscilando à direita e à esquerda, dependendo do matiz ideológico da vítima, ora ressaltando as virtudes do neoliberalismo, ora espinafrando o capitalismo selvagem, ora insinuando ligações com o pessoal da luta armada, ora condenando os “baderneiros dos movimentos sociais”. Por fim, o arremate:

- Na verdade, sou mesmo um liberal, no sentido da liberdade das pessoas, entende? Liberdade para tudo, compreende? Tenho o maior respeito por essa questão da liberalidade, da liberdade, as pessoas poderem fazer sexo com quem quiser, entende? A propósito, conheço um lugar...

O ato cívico-sexual vai se dar no seu apartamento, previamente ornamentado com motivos da coligação que está prestigiando na ocasião. Esse lobo nunca perdeu uma disputa eleitoral.

Especialistas que estudam o comportamento da espécie anotam a existência de outros tipos bizarros, alguns inclusive com slogans marketeiros. Exemplo é o “Lobo da Carris”, que atua nas alongadas linhas T e que garante: “Comigo não tem viagem perdida”. Registra-se ainda o “Lobo dos Estádios” (“antes do apito final, uma grande conquista”, vangloria-se), que não perde jogo nem no Passo da Areia e tem predileção pelas moças das torcidas organizadas; o “Lobo Bancário”, que ataca nas filas dos caixas e promete “crédito amoroso sem limites para todas”, o “Lobo das Manifestações”, uma variação do “Lobo Eleitoral”, auto-intitulado “Ativista do Amor” e que não renega nem caminhada do MST. Por fim, o mais bizarro de todos, o “Lobo de Velórios”, que se anuncia às enlutadas como ‘um conforto no momento da dor”. É muita cara de pau. Acreditem, eles existem e estão por toda a parte.

*Publicado originalmente em Coletiva.net

sábado, 2 de junho de 2012

Lobos nunca dormem

* O início da saga dos lobos conquistadores começou aqui no ViaDutra em 12 de novembro de 2009, quando o blog recém engatinhava. O tema rendeu, tanto assim que já tivemos quatro postagens revelando a forma de agir dessa ativa alcatéia. Na base do vale a pena ler de novo, aqui está a primeira potagem que, como as outras, apresenta situações inspiradas em fatos reais.

Lobos nunca dormem. Suas vítimas indefesas podem ser atacadas a toda hora e em qualquer lugar e são poucas as que resistem às investidas. Deixemos de lado os lobos que atacam nas academias e nas baladas, locais que favorecem a interação entre as espécies. Esses são lobos manjados, indolentes, indisponíveis para novos desafios. Lobo que se preze, lobo mal intencionado mesmo, ataca em lugares e horários inusitados, cercando progressivamente suas vítimas, quase sempre travestido de cordeiro, até dar o golpe final.

C. advogado, bem de vida e de casamento, é um exemplo. Todas as quartas-feiras ele assume sua porção lobo e sai à caça nos supermercados. Ele varia de estabelecimento para não dar na vista, mas o perfil das suas vítimas não se altera muito: mulheres maduronas, de boa aparência e sem aliança nos dedos – ou seja, solteiras ou descasadas. A estratégia para a abordagem também não varia muito. Assim que escolhe a presa, aproxima-se e pergunta, com o semblante mais inocente do mundo:

- Sabes onde eu posso encontrar sabão em pó?

Pode ser detergente para louça, água sanitária, amaciante de roupa, mas sempre um produto que passe a idéia de um homem afeito às lidas domésticas, vivendo sozinho e atrapalhado com esse universo. As mulheres dificilmente resistem ao perfil de homem maduro numa fase de carência, que é o personagem que, afinal, nosso amigo encarna.

Dependendo da ocasião, nosso causídico muda de tática. Ele é fascinado, por exemplo, por mulheres que consomem produtos orgânicos. Por isso, fica na espreita próximo à gôndola desses produtos, esperando uma vítima. Assim que surge alguma que se encaixa no perfil pré-definido, parte para a abordagem:

- Com licença, tu sabias que na Europa já predominam os produtos orgânicos?

E emenda um ecopapo capaz de fazer inveja aos ecochatos, mas, diferentemente destes, sua conversa é vivaz e convincente, discorrendo sobre o aquecimento global, a diferença entre light e diet, os efeitos perversos dos agrotóxicos na produção de alimentos – e firma posição contra os trangênicos. “O que será das futuras gerações? O que será dos nossos filhos?”, costuma exaltar-se, acentuando o nossos, o que já é uma insinuação. As mulheres ficam maravilhadas com tamanha erudição ecológica que, a bem da verdade, exige tempo de pesquisa, um investimento que ele considera que vale a pena para os fins a que se propõe.

A primeira abordagem não é problema, mas o segredo está no segundo momento, aquele que encarreira a conquista. E nesse aspecto nosso amigo é imbatível. A tática dele consiste em prolongar a conversa e em seguida fazer um convite:

- Conheço uma loja de produtos naturais que tu vais amar. Podemos dar uma escapada lá, se quiseres.

Da loja ao convite para um jantar especial na casa da moça, com pratos natureba, é um passo e aí a história segue seu curso natural. Missão cumprida!

S, economista, ataca em outro cenário. Conhecido como “Lobo de Livraria”, é entre best sellers e um bom sebo que ele fareja suas futuras presas. Escolhe sempre as que usam óculos, porque entende que o adereço lhes dá um ar de intelectual, mas faz também uma pré-seleção pelo gênero de obra que interessa à moça. Se elas estiverem folheando livros de Martha Medeiros ou Lya Luft, ele trata de se aproximar com a mesma obra na mão e lança a isca:

- Já leste Trem Bala? Achei fantástico!

- Já leste O Silêncio dos Amantes? A Lya Luft se superou!

Em seguida a conversa deriva para os temas recorrentes nas duas autoras: as angústias e anseios da mulher moderna, suas frustrações, o amor, o desamor e a paixão, perdas e danos – enfim, tudo o que passe a idéia de um homem sensível e conhecedor da alma feminina. Para reforçar seus argumentos, assiste ao Saia Justa e se diz fã da Márcia Tiburi, embora secretamente tenha uma queda pelo estilo mais maternal da Mônica Waldvogel. A conversa é irresistível. Não foram poucas as ocasiões em que a troca de impressões se completou na cama, após o embate amoroso.

Quando a vítima se mostra interessada em livros do David Coimbra, nosso amigo não tem a mesma fineza, pois considera que as leitoras do cronista são “mais saidinhas”. Aí vai direto ao ponto:

- Conheço o David e tô louco para contar para ele uma história picante sobre tu e eu...Topas?

Ele jura que a abordagem funciona. Não perde tempo, porém, com mulheres que compram livros de Paulo Coelho, pois acha que terá conversas muito aborrecidas. Mas em relação a Dan Brown reconhece o mérito desse escritor, não como valor literário, mas como argumento para suas investidas.

- Já lestes Anjos e Demônios? Recomendo: é melhor do que O Código Da Vinci.

(continua)